Momento importante, sem
dúvida, o acto oficial de inauguração das novas instalações da RDP/RTP, as
estações de rádio e televisão públicas portuguesas.
Subitamente, perante o nosso
olhar atónito, no inevitável pequeno ecrã das nossas salas de estar, lá estão
«Eles», todos (ou quase todos) «Eles»: Sua Excelência o Sr. Primeiro Ministro
do Governo da República, Sr. Dr. (José Manuel) Durão Barroso, Sua Eminência o
Sr. Cardeal Patriarca de Lisboa, Sr. D. José (da Cruz) Policarpo, Sua Alteza
Real, o Sr. D. Duarte (Pio João Miguel Gabriel Rafael) de Bragança...!
Não saberá o Presidente do
Governo da República Portuguesa que, por claros e indiscutíveis imperativos
constitucionais, nem o mais alto dignatário da Igreja Católica Apostólica Romana
Portuguesa, nem qualquer (suposto) representante de uma qualquer (suposta)
«Casa Real Portuguesa» podem integrar os actos oficiais do Estado?
Assombrados e impotentes,
assistimos à transmissão daquele cerimonial pleno de oficialidade, seguimos os
gestos rituais do Cardeal a benzer o edifício, ouvimos as palavras de ocasião
do pretenso «rei»... e, revoltados, damo-nos conta de viver num país que
persiste em ser um «reino do deixa-andar», um «reino do faz-de-conta», onde até
valores e perspectivas fundamentais da afirmação da República continuam a
claudicar perante óbvios gestos de oportunismo do exercício pequeno (minúsculo
mesmo) da política e da religião.
É por recusarmos, quer o
laxismo, quer o gerúndio –que é o tempo verbal das acções que se espraiam
indefinidamente pelo tempo– deste quotidiano ainda tão enformado pela velha,
conformada e «salazarenta» marcha do “cá vamos, cantando e rindo”, é por querer
lutar contra uma atitude tão generalizada de falta de clareza e de coerência
nas ideias e nos procedimentos políticos que nós, militantes assumidos da
República e da Laicidade, não podemos deixar passar em claro mais uma violação
da nossa lei fundamental.
Efectivamente, por mais que
isso custe aos adeptos da demagogia, da monarquia e do clericalismo –do
oportunismo, também–, queremos aqui lembrar uma vez mais que a República
Portuguesa se tem de assumir claramente como... republicana e, na mesma linha de
coerência, como laica, também!
Luis Manuel Mateus (Presidente
da Direcção)
(1/4/2004)