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Expresso 25 anos   Expresso de 31/10/98

As 25 horas da mediação de Jaime Gama


Jaime Gama durante o primeiro encontro com o líder da revolta guineense, Ansumane Mané, no sábado passado

O ENCONTRO de Banjul entre o Presidente João Bernardo Vieira e Ansumane Mané, líder da Junta Militar guineense, foi o resultado de uma missão-relâmpago e de «verdadeira emergência» - como o próprio a caracterizou - desenvolvida por Jaime Gama no passado fim-de-semana.

Com o ultimato lançado na sexta-feira pela Junta Militar ao Presidente Nino Vieira, restavam 48 horas para evitar o «assalto final a Bissau» por parte dos revoltosos - com o objectivo confesso de derrubar o regime -, e a diplomacia portuguesa empenhou-se a fundo para explorar esta última oportunidade de resolver o conflito pela negociação.

A intervenção foi cuidadosamente preparada, através de inúmeros contactos telefónicos. Jaime Gama falou com os seus homólogos da França, Hubert Védrine, e do Senegal, Jacques Bodin. Contactou com Abidjan, a capital da Costa do Marfim, que detém a presidência da Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO). Conversou com os chefes da diplomacia dos restantes países da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP). E sobretudo falou com os dois líderes inimigos, Nino Vieira e Ansumane Mané, que concordaram com a deslocação do MNE português a Bissau para se fazer uma última tentativa de mediação.

Quando Jaime Gama chegou a Bissau, no sábado, a bordo de um «Hércules C-130» da Força Aérea Portuguesa, já estava na capital guineense o general Lamine Cissé, ministro do Interior do Senegal, que entregou mensagens pessoais do Presidente senegalês, Abdou Diouf, a Nino Vieira e ao líder da Junta.

Velhos conhecidos e amigos, Lamine Cissé e Ansumane Mané conversaram durante quase três horas. Desconhecem-se as conclusões, mas as discussões andaram à volta da questão nuclear desta fase do conflito: a presença dos militares do Senegal na Guiné-Bissau.

O primeiro encontro

O primeiro encontro entre Gama e a Junta teve lugar logo a seguir. Foi uma reunião curta, mas frontal. A Junta traçou o quadro militar da situação. Confirmou a conquista de Babamdica, Bafatá, Tapu, Titche, Fulacunda, depois da ocupação de Bafatá e Gabu, logo depois do reinício dos combates, uma semana antes. Para ter o controlo completo do país faltavam apenas os Bijagós e Bissau, que Ansumane Mané garantiu poder conquistar em 24 horas.

Gama, por seu turno, pôs os dados políticos e diplomáticos na mesa. Argumentou que a tomada do poder pela via armada nunca seria aceite pela comunidade internacional - nem por Portugal, nem pela CPLP, nem pela CEDEAO, nem pela União Europeia. Seria natural que à condenação internacional se seguisse um boicote económico, de efeitos catastróficos para um país pobre como a Guiné-Bissau. E disse que não era de excluir até a hipótese de uma intervenção militar multinacional.

Pouco mais de 40 minutos foram necessários para convencer Ansumane Mané de aceitar o encontro com Nino, que este propusera três dias antes sem sucesso.

De regresso a Bissau, Jaime Gama recebeu sucessivamente, na embaixada portuguesa, o seu homólogo guineense, Delfim da Silva, e o Grupo de Contacto do Bureau Político do PAIGC, uma das entidades guineenses que mais tem procurado a mediação.

Os dois encontros foram dedicados a um exercício de engenharia política e constitucional: como preparar a transição para um regime pós-Nino, no respeito pela legalidade, por forma a não humilhar excessivamente o Presidente e a satisfazer as principais exigências da Junta Militar?

Só depois do jantar é que o MNE português foi avisado que o Presidente Vieira o receberia às 22,15 horas. O encontro, a sós e sem testemunhas, durou duas horas. «Foi a primeira vez que me foi propiciada uma conversa sozinho com o Presidente Nino durante toda a crise», observou mais tarde Jaime Gama.

Nino insistiu na legitimidade democrática do seu cargo. Gama fez-lhe ver o seu crescente isolamento, nacional e internacional. Falou-se do próximo encontro entre Nino e Mané, da data, do local e da agenda da reunião. Mas também do futuro imediato: as eleições, o futuro Governo, a estada das tropas senegalesas, a reintegração dos homens da Junta nas Forças Armadas e em particular o lugar do seu comandante supremo.

No fim, Nino não fez declarações; Gama repetiu o que dissera à chegada a Bissau - «Há uma ténue réstia de esperança» - e anunciou uma nova ronda para o dia seguinte.

Apoio popular a Gama e à CPLP

No domingo, Jaime Gama avistou-se com o Presidente da Assembleia Nacional Popular, Malam Baicai Sanhá, o homem que, segundo a constituição guineense, seria chamado a assumir interinamente a Presidência em caso de renúncia de Nino.

A seguir foi ter com a Junta, para a pôr ao corrente das suas diligências e para procurar limar algumas das arestas mais agudas. Enquanto decorria esta reunião, a rádio Voz da Junta Militar lançava para o ar uma violentíssima arenga contra Nino Vieira, a quem o locutor, em tom de comício radiofónico, chamou «mentiroso, assassino, bandido, criminoso, Satanás...».

A reunião foi mais demorada que a primeira, mas, no final, Zamora Induta anunciou que o «tête a tête» entre Mané e Nino poderia realizar-se na semana imediata.

Depois do almoço, na embaixada portuguesa, partilhado com os dois outros chefes de missão presentes em Bissau - o embaixador francês, François Chappellet, e a encarregada de Negócios da Suécia, Ulla Andren -, Jaime Gama dirigiu-se ao Palácio para o último encontro com o Presidente.

No caminho deparou com uma inesperada manifestação, convocada por um denominado Comité Ad-Hoc da Sociedade Civil para a Paz, a maior desde o início da guerra, segundo um dos organizadores. Os manifestantes, cerca de 500, empunhando cartazes exigindo a retirada das tropas senegalesas, aplaudiram Jaime Gama e a comitiva e lançaram vivas à CPLP.

J.P.C.

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