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Expresso 25 anos

09-JAN-99

GUINÉ-BISSAU

Marcelo aconselha Nino a sair

MARCELO Rebelo de Sousa considera que, depois de ter servido o seu país durante mais de 20 anos, é altura de o Presidente da Guiné-Bissau, João Bernardo («Nino») Vieira, abandonar a chefia do Estado, «com acrescida dignidade e elevação», «transmitindo-a ao sucessor a designar em próximas eleições presidenciais».

Para Marcelo, que conhece pessoalmente Nino Vieira, «o Presidente da Guiné tem simbolizado, anos a fio, a unidade interna e externa do Estado guineense».

Considerando que os «verdadeiros estadistas, os políticos que ficam para a História, são aqueles que sabem ver longe» e têm «a coragem de antecipar os acontecimentos», Marcelo Rebelo de Sousa pensa que essa capacidade de entender, por antecipação, «os sinais dos tempos» tem sido uma das qualidades de Nino.

Neste sentido, o líder do PSD considera perfeitamente compreensível que Nino Vieira «entenda que se lhe coloca um novo e não menor desafio - o de antecipar os tempos que aí podem vir e, nessa medida, querer encerrar pela sua própria mão um ciclo histórico que não criou», não se recandidatando às próximas presidenciais.


OPINIÃO

Nino Vieira deve sair com dignidade

1. OS POLÍTICOS, os governos, os regimes, passam e os laços de amizade e de fraternidade entre os povos ficam. Assim tem sido, desde a independência, com a amizade e a fraternidade entre Portugal e a Guiné-Bissau.

2. Desde logo foi e tem sido intensa a cooperação cultural e social. Na educação, na cultura, na saúde, nas questões sociais, muito foi feito para corresponder a solicitações prementes de um Estado jovem, com poucos meios, com enormes necessidades, com desafios internos e externos exigentes.

Pude, por exemplo, testemunhar, em 1988, como chefe da delegação conjunta das Faculdades de Direito de Coimbra e de Lisboa que celebrou o Protocolo inicial, o arranque da Faculdade de Direito da Guiné-Bissau. Escola esta que se afirmaria depois, ligada à sua congénere de Lisboa, com o impulso do doutor Sérvulo Correia, e se converteria num factor essencial de desenvolvimento e de justiça da sociedade guineense.

3. Não menos significativas foram as relações económicas e financeiras criadas e mantidas ao longo dos anos, com a aposta de inúmeros empresários portugueses nas virtualidades da economia da Guiné-Bissau.

Da agricultura ao comércio, passando pela indústria e as actividades financeiras, turísticas ou de outros serviços - aos poucos foi-se estabelecendo uma cumplicidade criativa entre portugueses e guineenses na gestão de uma economia carenciada e, nalguns casos, ainda incipiente.

4. Claro que o que foi ou tem sido realizado fica, em quase todos os domínios, aquém do necessário e do sonhado. Mas seria pura injustiça dizer-se que não existe ou não tem valia. Como seria extremamente injusto esquecer-se o papel de tantas pessoas e instituições, incluindo a Igreja Católica portuguesa, as ONG e as autarquias locais, que protagonizaram as acções de cooperação não oficial e não estatal.

5. Manda ainda a justiça que se reconheça o magnífico relacionamento político que, desde sempre, existiu entre os governantes dos dois países. No plano do Presidente da República, sem excepção, a começar no general António Ramalho Eanes. No plano do Governo, também sem soluções de continuidade, e, com maior duração e intensidade, nos Executivos presididos pelo doutor Aníbal Cavaco Silva.

6. Esta linha de amizade e fraternidade assinalou a política externa portuguesa, desde a independência da Guiné-Bissau às recentes diligências governamentais na procura da paz naquele país-irmão, e tem sido partilhada por Governo e oposição e por todos os partidos políticos nacionais. Isto é, apesar de se tratar de matéria que ultrapassa os políticos, já que respeita aos povos, aqueles têm contribuído para a salvaguardar e promover.

7. O Partido Social Democrata mantém, desde os anos 80, relações privilegiadas com o PAIGC, até agora o único partido governante na Guiné-Bissau, sem embargo dos contactos amistosos com outras forças políticas, em especial o Partido Movimento da Resistência Bafatá. Neste quadro nasceriam e se desenvolveriam relações também muito cordiais com governantes e políticos guineenses, a começar no Presidente Nino Vieira.

8. A política é feita de mudanças e, nas democracias pluralistas, de alternâncias também. O que em certa época é precursor ou pioneiro, pode converter-se em ultrapassado ou serôdio anos volvidos. Assim tem sido na democracia portuguesa. Assim é provável que seja em qualquer outra democracia.

9. No Partido Social Democrata acompanha-se com extrema atenção e empenhamento a situação vivida na Guiné-Bissau. Com a mesma amizade e fraternidade de sempre, mas com ainda mais atenção, e com a preocupação de não suscitar problemas à necessária unidade da política externa portuguesa, matéria de regime e, por isso mesmo, de convergência e não de divisão entre os portugueses.

Desejamos todos paz duradoura para a Guiné-Bissau, paz que permita o regresso das pessoas deslocadas, o reinício da vida económica normal, a estabilização social e a criação de estruturas políticas pluralistas e também enraizadas e funcionais.

Sabemos todos que o tempo é um bem precioso e que cada minuto que passa é mais um minuto perdido no desafio do desenvolvimento e da justiça na Guiné-Bissau.

Sabemos todos que os verdadeiros estadistas, os políticos que ficam para a História, são aqueles que sabem ver longe, não olham para o dia seguinte, têm a coragem de antecipar os acontecimentos, não vão a reboque deles.

Sabemos todos, por exemplo, que uma grande força do Presidente Nino Vieira residiu - já lá vão quase 20 anos - em ter sabido entender, por antecipação, os sinais dos tempos que apontavam para a separação da Guiné-Bissau em relação ao país irmão Cabo Verde. E, anos a fio, o Presidente Nino Vieira tem simbolizado a unidade interna e externa do Estado guineense.

Quase 20 anos depois, compreendemos perfeitamente se o Presidente Nino Vieira entender que se lhe coloca um novo e não menor desafio - o de antecipar os tempos que aí podem vir, e, nessa medida, querer encerrar pela sua própria mão um ciclo histórico que não criou, não se recandidatando, saindo com acrescida dignidade e elevação, e transmitindo a chefia do Estado ao seu sucessor, a designar em próximas eleições presidenciais.

A opção é sua e só sua, e não cabe a ninguém, muito menos estrangeiro, imiscuir-se nela. Mas, se ela vier a ser feita, certamente todos, admiradores ou adversários políticos, a compreenderão, reconhecendo a lucidez e a visão de futuro de um tal gesto.

10. Em democracia não há nem poder absoluto nem poder eterno. Por isso, aquilo que une duradouramente países que se querem democráticos são as relações entre os povos, muito mais do que as relações entre os governantes. Por isso, é incontestável a certeza em Portugal de que os actuais e os futuros governantes guineenses querem e quererão sempre contribuir para promover e aprofundar laços entre os dois povos, tal como os sucessivos Governos portugueses o têm feito ao longo das últimas duas décadas.

Os políticos passam e a amizade e a fraternidade entre os povos ficam.

Marcelo Rebelo de Sousa

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