manga com leite
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n. 13 - a variação da aplicação Quoth the raven, "nevermore". "Estando assim determinados a extensão, a província e o tom, entreguei-me à indução normal, a fim de obter algum efeito artístico agudo que me pudesse servir de nota-chave na construção do poema, algum eixo sobre que toda a estrutura devesse girar." Sempre tendo em mente o efeito desejado, Edgar Allan Poe encontra como nota-chave mais apropriada o uso do refrão, no caso específico de "O corvo", um refrão de uma só palavra, o que facilitaria a aplicação com sentidos variados. Mas qual seria então o caráter desta palavra? Optando pelo refrão, forçosamente o poema teria de ser dividido em estâncias, sendo esta palavra o fecho de cada uma, fecho que deveria ser "sonoro e suscetível de ênfase prolongada", como o "o" prolongado. "Ficando assim determinado o som do refrão, tornou-se necessário escolher uma palavra que encerrasse esse som e, ao mesmo tempo, se relacionasse o mais possível com a melancolia predeterminada como o tom do poema." Sem muitas dificuldades Poe encontra a palavra certa: "nevermore". Para possibilitar a constante repetição desta palavra, como pretendido, ele opta por uma criatura irracional, capaz de falar, ou imitar a fala humana e que contribua com a atmosfera desejada, encontrando assim sua primeira personagem, aquela que durante todo o poema repetiria a palavra-refrão "nevermore". "Eu já havia chegado à idéia de um corvo, a ave do mau agouro, repetindo monotonamente a expressão 'nunca mais' na conclusão de cada estância de um poema de tom melancólico e extensão de cerca de cem linhas. Então, jamais perdendo de vista o objetivo - o superlativo, ou a perfeição em todos os pontos -, perguntei-me: 'de todos os temas melancólicos, qual, segundo a compreensão universal da humanidade, é o mais melancólico?' A morte - foi a resposta evidente. 'E quando - insisti - esse mais melancólico dos temas se torna o mais poético?' Pelo que já explanei, um tanto prolongadamente, a resposta também aí era evidente: 'Quando ele é, inquestionavelmente, o mais poético tema do mundo e, igualmente, a boca mais capaz de desenvolver tal tema é a de um amante despojado de seu amor'." Restava apenas combinar as duas idéias, as duas personagens, o corvo que repete o refrão "nevermore" e o amante que lamenta a morte de sua amada. Para isto, e como modo de utilizar o desejado efeito da variação da aplicação do refrão, de seu sentido, Poe resolve unir num mesmo aposento as duas personagens e coloca o amante a inquirir o corvo. No próximo número veremos como começa o poema. Daniel Gomes |
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