velório, de Karl Von Hollermann

  Passos... rua movimentada... comício... muitos carros... uma freada... um grito...

MORTE.

No velório, muita gente com suas máscaras de sempre, falsas lágrimas, pessoas cochichando, elogiando, é claro. Depois que morre é sempre santo.

Não choro na presença de todos, sou forte. Casa vazia, fim do velório; restam somente eu e meu pai na sala. Meu pai permanece imóvel em seu berço de madeira. Coloco nele minhas mãos... Está gélido como um floco de neve sob a telha verde, suas rugas mostram o seu sofrimento, sua boca está roxa, deve ser frio; ele está com os olhos fechados, deve ser sono. Mas porque tantas flores ao seu redor? Acho que ele gosta de rosas.

"Pai" - eu chamo... ele não responde; deve estar dormindo...

"Já acabou o velório, podemos ir agora!" - eu insisto...

"Pai, vamos para casa" - ele permanece quieto.

Preparo um café bem forte para despertá-lo, ele recusa e continua no seu sono profundo.

Não vou incomodá-lo mais, acho que o dono da casa não vai se importar se dormimos aqui.

Deito-me no sofá ao lado do meu querido pai.

AMANHECE.

Ele permanece inalterado (ele costuma dormir muito), vou deixá-lo descansar mais um pouco...

Preparo um café para dois; meu pai continua a dormir enquanto tomo o meu café.

11:27

Já está tarde, agora vou acordá-lo de qualquer jeito.

"Pai, acorda"- digo, sacudindo-o.

Ele nem se move.

Jogo um pouco de água fria sobre sua fronte inexpressiva... e nada.

Me exalto um pouco, dou-lhe tapas, grito com ele (algo que nunca fiz); ele parece um boneco e continua na posição em que o deixei.

Já sei o que farei...

Visto minhas roupas de tênis; pego duas raquetes e a bola; papai adora jogar tênis, ele nunca recusou...

"Vamos àquela partidinha?" Chamo-o sorrindo.

Ele não responde.

ESPERE......

Onde estão os donos desta casa? Como minhas roupas de tênis vieram parar aqui?

Meu corpo se arrepia todo quando não me lembro de quem é o velório.

Meu pai está em um caixão!? O que ele faz lá?

ELE NÃO RESPONDE.

ELE NÃO SE MOVE.

ELE NÃO RESPIRA.

SEU CORAÇÃO NÃO BATE!

DESESPERO..........

Começo a chorar, pois não há ninguém para presenciar; minhas lágrimas são negras e densas, pois manifestam minha dor; meu coração vai explodir em chamas de dor e lavas de solidão.

Arranco meus cabelos, estou desesperado como nunca...

O relógio - sofá - cadeira - tapete - piano - carpete - telefone - flores - velas - estão me encarando, as paredes querem me engolir, o teto está caindo sob minha face, a luz do lustre me queima como as chamas da paixão infernal.

Não sou nada sem papai querido!!!

SUJEIRA...

GAVETA...

CHAVE...

REVÓLVER...

BALAS...

BARULHO...

ARMA NA CABEÇA...

UM TIRO...

MORTE...