poemas, de Ricardo M. Nachmanowicz

  e essa minha cara de tacho!

É desgostoso construir-se.
Não sei sorrir,
tinha que ficar treinando no espelho
que vergonha que dava.
Consegui entortar a boca muito feio.

Poderia fazer daquelas perguntas que não existem:
- O que acham do meu sorriso?

Não dava para sorrir na presença de estranhos
amigos

De onde vem esta cara, que nem imagem de santa,
um joelho danado
que observa tudo

e que passa o dia no banheiro,
e que adorável seria ter entre os dentes um pedaço de feijão
e que vergonha nenhuma terá em sorrir.

 

caiu o firmamento

Não parou o trânsito, não cisou a grife, não furou a imprensa

agora podemos trancar as gavetas
agora podemos lavar os pincéis
temos pisos de madeira e mármore de peso de papéis.

ajoelhados e ouvintes
ajoelhados e boca pendente - os braços desabando, ao som ao som
do trompete com panela

Veio uma brisinha, nem subindo, mas eriçando a poeira
umas letrinhas se esquadrilham
na coincidência

a     e
    t  
  r    

que nos deixa.

 

olhos irmãos

Procurei meu gêmeo
as vezes o fiz até de verdade
Temia tê-lo perdido para uma esquina
na decisão esquerda, direita, esquerda, Meu deus, o lado de casa

Descobri que não quero um gêmeo
quero eu.
Quero eu me ver e olhar-me eu
me trocar tocar.
Me pedir em namoro
com a certeza, primeira certeza.

Mesmo completo, só um espelho nos aposta
Queremos em dobro
Temos que viver sozinhos
que seja consigo.

 

sem título

Por favor, você têm horas?
Ah, isto é uma pulseira, me desculpe!!

Desculpe, não tenho trocado.

..

Sabe, não sei o que está acontecendo
mas é tanta gente na rua
e tudo se resume nisto

..

Meu deus, você viu aquilo?
Vi, será que ele anotou a placa?

..

Passo sempre pela garota
que me pediu em namoro na 3 série
ambos sabemos que lembramos,
e nenhum oi-tchau, educado

..

oi, meu nome é amizade
Não!
Por favor, meu nome é amor eterno
Não!
aí vira a esquerda e segue toda vida,
meu nome é pedestre e te vi, me apresento

 

hipnose

Ouscutem conjugados

mente[m
Pontaesvárzia bússola

Pólo que a]trai aspira inspirador
inspira aspirador

O quê que.. o quê que.. o quê que
pouse

hipnose
hipnose

 

sem título

Precisaremos de gênios.
Compreendo que nunca existiram.
Retomemos pela moldura, a lenda do cidadão comum.

Se todos cegos, uma sociedade de cegos
se todos surdos-mudos, uma sociedade
sem palavra, uma publicidade
sem visão, uma bíblia.

CÉREBRO
SEU
CORPO
SEM
GUARDADO
NUM
VIDRO
NÃO
VOLTA
REFLEXOS
REPITO:
TOCA A
BLINDAGEM
ASCENTO:
REFLEXO
ABSORTO.