FERNANDO CARREIRO Engajada As alternativas nativas de velozes algozes levam a uma só opção, dolorosa solução, sem floreios ou devaneios implacável como desejado, objetivo almejado, desinfectando as almas, desintoxicando o cárcere que mantém preso a melancolia: expressão prodrômica da felicidade. Pois desça rápida a cabeça ao cesto, pelo fio aguçado da lâmina inteligente, derrotando toda reação, violando toda concepção energúmeno-burguesa da vida que tola, se leva; não assim de repente, que o instante não se estique em infinitos milênios, desdobre-se em recordações dentro de recordações, como no filme cada fragmento de segundo fique estampado na película etérea da alma. E não podemos pedir mais das sócias vida e morte esta no calcanhar daquela efetuando os desígnios fundamentais, flutuando entre galhos, sobre o cadafalso, retirando, debochado, todo o perigo do nó do carrasco, ressurge ao contrário de tudo para o pó como é e deve ser. - Entrevista - SM - Como foi o seu caminho até a poesia? FC - Não sei se realmente houve um caminho, comecei a escrever não só poemas, mas prosa , porque achava muito normal e minhas pretensões eram (e ainda são , um pouco) apenas a de registrar vivências e impressões, nada muito elaborado, os poemas foram no início, embora tivesse conhecimentos básicos de concepção poética, livres e descompromissados, tiveram fase de intensa elaboração e hoje são livres novamente, às vezes me arrisco em sonetos , que gosto muito entre as formas mais rígidas (os do Maurício , do Félix e do Aníbal Beça, que talvez conheçam de outras listas, são muito bons), mas são , como disse, riscos que assumo, não tenho mais preocupações de ter meus poemas rejeitados ou aceitos, mas já tive esta obsessão. SM - Em que a internet te ajuda? FC - Acredito qua a Internet ainda seja um edifício no início da construção e que talvez nunca fique pronto como sonhamos. Nós, anônimos e voluntariosos desbravadores desta nova senda, aproveitemos pois enquanto a coisa rola solta e libertária, em breve a internet não passará de domínio das corporações e a liberdade será relativa, a televisão passará a ser interativa através deste canal, e as coisas evoluirão sutilmente na direção do controle econômico da opinião e expressão... Quem viu e pensou o tema do filme "The Matrix" sabe o que nos espera, guardando os limites ficcionais e reais já vivemos em parte esta sub-realidade imposta pela mídia que controla as informações. É a concretização (e virtualização) do quarto-poder. Por enquanto ela permite uma divulgação inédita e impensável há pouco tempo da minha obra, como esta entrevista que concedo... SM - Você gosta de música e cinema. Colabora com o Caox. O que há de comum entre estas artes? O que há de diferente? FC - Bem, a música é arte, não esta que vemos na superfície ercantilista envernizada do "showbiz" , mas a música de fato, sou eclético mas minha paixão é o acervo erudito, que o Osvaldo Luiz do Fórum nos supre com gotas lisonjeiras. O cinema , que amo muito, este ainda não consegui enxergá-lo como arte em sua plenitude, acho que seria mais uma tentativa de colagem de diversas manifestações de arte, mas não consigo vê-lo como arte integral, acho muito "Kitsch", exagera no simulacro. Há alguns anos as possibilidades para esta evolução "artística" do cinema eram muitas, mas a industrialização e a "entretenimentalização" contaminaram estas perspectivas, cada vez vejo com mais reservas as possibilidades artísticas do cinema. SM - Como é morar em IVAIPORÃ? FC - Rapaz, minha herança longina é notável, morei em algumas cidades grandes (Rio de Janeiro, onde nasci, Belo Horizonte , Goiânia, Brasília e São Paulo, estas duas por poucos meses), viajei boa parte do Brasil e do mundo. Cheguei num ponto que trabalhava em cinco lugares diferentes, ficava cerca de três horas por dia preso no trânsito em Goiânia e estressado diuturnamente , correndo atrás de algo que não existia, optei por uma mudança radical e escolhi esta aprazível região do Paraná, pelas condições de trabalho e de vida, posso dizer que foi acertada minha opção, pelo menos até agora. Voltei até a escrever e a cozinhar, coisa que amo e não fazia há cinco anos. Foi uma guinada mas felizmente surtiu os resultados desejados. SM - Você é médico. O que um poeta deve ter de médico? FC - A medicina, apesar da modernidade que ostenta, ainda é, impreterivelmente, uma arte, não há como desenvolvê-la para o lado automatizado que se deseja pelo simples fato que mais da metade das doenças e problemas médicos serem psicossomáticos. A psicologia médica é muito clara quanto à importância do fenômeno da transferência no processo terapêutico, sem ela não se estabelece a relação médico-paciente, só a técnica não supre as demandas do paciente, é necessário um talento para "dosar" as necessidades físicas e psíquicas do paciente e chegar-se ao resultado desejado. O poeta deve ser tanto melhor quanto tiver desta capacidade de se dividir entre o tecnicismo (formalismo) e a intuição (inspiração), além do mais, o poeta "finge a dor, que deveras sente", já ao médico isto não é possível no exercício pleno, ele tem de ser preciso, sem excesso ou falta de envolvimento. SM - O que faz nas horas vagas? FC - O que mais gosto de fazer é dormir, mas ultimamente tenho dormido menos do que gostaria ou mesmo deveria. SM - Quais as sua influências literárias? FC - Já li de tudo um pouco, numa determinada época Mário Quintana me entusiasmou muito , Walt Whitman também inspirou alguns rabiscos. Idem Carlos Drummond de Andrade , Cecília Meirelles e Thomas Mann. Nietzsche ainda assombra minha alma e Kant minha razão, mas o melhor de tudo foi a obra de Willian Shakespeare, esta sim está acima de qualquer coisa já escrita e influencia a todos nós. mesmo sem sabermos. É o verdadeiro início da literatura como conhecemos hoje, com multiplicidade, clareza, sentido trágico insuperável, humor, projeção metafísica de temas universais, tudo perfeito, sem retoques, imortal, atemporal, maravilhoso, foi o primeiro autor a abordar sem recalques e definitivamente a natureza humana com uma sabedoria de fazer Aristóteles morrer de inveja... No fórum tenho admiração pelo Manuel Rodrigues. SM - Acredita na inspiração? FC - Hmmm! Brujos? No los creo. Pero que los hay, los hay... Não sei se meu espanhol está certo, mas todos entenderam, é um ponto obscuro ainda no meu processo de criação... SM - E letra de música é poema? FC - Poderia dizer é ou não é, ou responder como vou fazê-lo: Depende:acredito que Renato Russo fazia mais poemas que letras, algumas músicas só tem na letra uma desculpa para que a voz se manifeste com maior virtuososmo e controle de ritmo, seria mais um "compasso" fonético. Chico Buarque, Caetano, Roberto Carlos são poetas ocasionais, já Gilberto Gil privilegia o ritmo com sua "Refazenda", ou "Palco", (música que está entre melhores da MPB, no meu ver) mas não deixa a os poemas de lado mesmo nestas músicas. João Gilberto não está nem aí para a poesia de sua música, mas não interessa na verdade, pois música é música , música e poesia é poesia (admitindo o poema estar inserido no conceito de poesia), poema é poema. SM - Diga uma epígrafe ou mote que o acompanha. FC - "Toda regra tem sua exceção" e complementado por "tudo é relativo" SM - Qual o papel do poeta na sociedade? FC - O poeta, cheguei eu a esta conclusão depois de muito refletir, está sempre engajado. Tudo que escreve, seja o mais alienado dos poemas, demonstra de uma maneira mesmo que velada pelo fingimento ou metáforas, sua postura. Reconheço a posição política do colega quase de imediato quando o leio e creio que todos os colegas conseguem divisar estas nuances nos escritos postados nestas listas independente do tema e abordagem. Os poemas mais passionais e desabafados, geralmente repercutem uma forma revolucionária-idealista, já os mais comedidos, com teor mais clássico na forma e contido na expressividade, são os de centro, os liberais. Esta é a importância do poeta: ele insiste em escrever porque é engajado, deseja fazer algo mais não só por ele como pelos que o rodeiam, é um eterno bem intencionado. Mas leia toda esta resposta, caro leitor-ouvinte, lembrando-se das minhas epígrafes: Tudo é relativo e toda regra tem sua exceção. Obrigado Minha página está com novos poemas Fernando Carreiro Albuquerque _____________________________________________________________