M A R I O G A M E S

 

Por Luiz Roberto Guedes

   

 

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PREFALSO

 

                       

                          “...ainda acabo forjando uma carta de Mário a mim mesmo”.

 

                                                                                     Antonio Callado

 

 

Mas os Mariogames... Serão Mariogramas genuínos?

Caso de possessão por mariolatria desvairada? Ou só

compulsão descarada de materializar a máscara,

mimetizar a voz, um mood, uns tons e timbres entre

os “trezentos-e-cincoenta” do Multimário de Andrade?

O caso é que hoje em dia essas incorporações não têm

nada de extraordinário ou original... Pois quando que

escrita mediúnica primou por ser única e original?

O espírito da coisa é arlequinagem por amor a Mário.

Visitação do fantasmário. Louvação do Mário vivo.

Vivomário!                                                  

 

 

 Irmão X

 

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(*) Mário em código Morse   


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“Garoa, sai dos meus olhos”

 

 

Garoa intemporal...

A mesma que matou o padre Manoel da Nóbrega...

A mesma Piratininga ensimesmada

Que costumava liquidar seus poetas...

Com estrela na gola, sem escola

Ou com mil hordas na cachola!

 

Uma camisa grossa de neblina

Veste a torre andrógina da Paulista...

Cartão postal alugado...

Ofusca o falobelisco

Obscuro no Ibirapuera...

 

Eh Megaburgo pardacento!

Os ossos dos jesuítas

Deviam sentir milhor

A mais-valia de um dia de sol...

Libidinal!

 

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“Sou um tupi tangendo um alaúde!”

 

 

Solzão fogaréu lambe os vidros da Paulista...

Janeirão de ouro esparramado...

Luxo de luz! Brilhos incisivos!

O Museu de Arte megartrópode

Lampeja levíssimo sobre patas vermelhas.

A Grande Boca range dentes de metal.

Sombra minha vadia se evade num pinote

                               prá sombra do parque...

O Trianon das bofetadas líricas!

Só a brisa preguiçando maciota,

Largando tapas de folhas soltas...

Ota, gostosura...

 

Deslizo e me tupiniquizo na mata mirim!

Espacejo meu olhar grávido de palavras.

As árvores usam crachás de identidade...

Borboletas borbolinando nas verdezas...

Cigarras que nem motores... Oficinatura!

 

Vai meu olho armado de palavras,

Que olho que vê sem palavras!

Fecho o olho ávido de ver,

Deixa ver se vejo sem ele...

 

Quanta voz de passarinho

Quanto zumbido zumbindo

Língua de folha falando

Ô que brisa cariciosa...

Nenhuma fala comigo

Acorda, índio cativo

Confinado em sapatos,

Chapéu, colarinho e gravata...

 

Tinturinha de tristura índia

Suspira mais fundo que a alma...

 

 

O urrurbano trovoando surdo

Vaivagando volitando olho errante

Abraçador de aparências

Colando palavras na pele

De toda sensação serelepe...

 

Um ancião japonês recolhe folhas secas...

Trauteia um monotom oriental...

Risca ondas na areia cuma bengalinha de bambu...

Transporte do jardim minipônico

Pro aranhol do Burajiru!

 

Fauno perdido na vertigem verde!

Florando semprenunca da pedra,

O fauno de Brecheret desemaranha

                          músculos de pedra...

Refoge ao fogo fêmeo de Vei *

Soprando silêncio na siringe...

Quedê que não tem um índio de bronze por aqui!

Paulistanos! Nobres vereadores!

Carece um cacique da terra no Trianon!

 

Sensações serpentinando no coalho de luz...

O olho insaciado radiando palavras...

Nunca que tem silêncio em mim...

 

O olho vigilante do pássaro

Investiga ruídos de presenças.

O bico agressivo vai catando

Delícias invisíveis nos canteiros

Com AVISO - NÃO PISE.

Inteireza do passarinho

Pulveriza meu dicionário...

Fuga de flautas aflitas...

 

Meu olho silente mira agora

Uma folha que gira

— Velozmente! —

Prestes a voar

Solta no ar...

Quando?

 

 

[*Vei - A deusa-sol na mitologia indígena.]

 

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“Futilidade, civilização...”

 

 

Noite de intensidades intermitentes...

Certezas de beleza tremulantes...

Futilidades multicoloridas...

Tempestade de sinais radielétricos

No espinhaço da Paulista!

 

Megaburgo acende seus nirvanas de neon

E fornece mil sensações sob encomenda...

Euforizações! Califórnias eletrônicas!

Copulações telefônicas! Disque Imaginários!

 

Japoneses comendo pizza...

Moçada se rindo pra hamburgers...

Ou serão megaburgers? Macche!

Sanduíches com nomes de bairros... Garçom!

Me vê um Barra Funda, por favor.

Custa quanto? Trezentos e cinquenta? Quá! Quá! Quá!

Um mendigo moço petisca no saco de lixo na calçada...

Ninguém não vê...

 

                                          Nostracity dança frenética

As últimas noites do século

E estala o látego do tempo

Sobre todo lombo...

Mas toda noite a tevê vem vestir os nus...

 

Nada de novo sob o pico do Jaraguá...

Custa muito aprender o gosto

Do que é humano, seu mano!

 

 

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“O sinal dos meus pés é invisivel agora...”

 

O rio Anhangabaú

É um rio que não há:

Está sepulto debaixo

Do viaduto do Chá.

Tem outro rio no alto,

Rolando pra-lá-pra-cá:

A multidão está só

No viaduto do Chá.

 

Cada um com seu tributo,

Com seu toma-lá-dá-cá,

No passo de contradança

Do viaduto do Chá.

Talqual monções se aviando

Cada qual com seu pra-já

Por sobre um rio havido

Que não tinha mais lugar.

 

Meu rebanho turbulento

— Minhas alucinações! —

Vai relendo os mudamentes

Entalhados nas feições...

É ver novelos de rios

Desenrolando distâncias...

Assim vão pastando os anos,

Verdes pastos de esperança...

 

Sob trapos e molambos,

Bem debaixo dos narizes,

A miséria faz seu rancho

De viventes invisíveis...

Em vão esmolando olhos...

A esmo... Sonambulando...

Fantasmas que nem o rio,

Fantasma subterrâneo...

 

Vem chuva lavar o vale!

Fogem farrapos em farrancho.

Águas e ventos guaiando

Prantos por rios defuntos.

E a correnteza arremete,

Que seu lema é avanço,

Recomeça em todo o braço,

Traça o rumo, risca o traço...

 

A multidão está só

No viaduto do Chá —

Cada um com seu minuto,

Cada qual com seu jamais.

Ronda que ronda, o rondó

Nunca acaba de acabar —

A multidão está só

No viaduto do Chá.

 

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MARIO

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