ENTREVISTA COM MICHEL LAUB |
Meu
currículo é breve: nasci em Porto Alegre (1973), formei-me em direito
(UFRGS) e estudei jornalismo (não completei o curso: um dia completo).
Fui advogado durante um curto período e me mudei para São Paulo para ser
editor de livros e cinema da Bravo. Antes, no jornalismo, escrevi por dois
anos para as revistas Carta Capital e República, além de outras publicações. 1.No conto FíSICA E
FILOSOFIA você fala de si e de sua geração. Os escritores contemporâneos
têm qualidade ou só as gerações passadas sabem o que é literatura?
A geração que está para além dos cinqüenta é a gora da
intelectualidade brasileira de todos os tempos? Claro
que os escritores contemporâneos têm qualidade. Só que, na literatura,
as coisas demoram um pouco para acontecer - tanto em termos de maturidade
artística quanto de reconhecimento -, o que dá essa impressão de
marasmo geral. De qualquer forma, há
ótimos nomes na faixa dos 25 anos aos 50, digamos assim, o que seria uma
geração mais ou menos "nova". 2.”(...)interpretação
é o sangue do vocalista, a jugular visível a distância”. O estilo é
o sangue do escritor? Existe alguma correspondência? O
estilo pode ser o sangue, os músculos, os ossos, qualquer metáfora do gênero
serve. Obviamente que é algo imprescindível, mas não é tudo na
literatura. Aliás, o que mais há são escritores com estilo que não têm
o que dizer. 3.”passei
a agradecer aos céus por não ter publicado nada.” Não é meio difícil
saber o que publicar e quando? Como diz um amigo, quem publica é vaidosa
e quem não publica é mais vaidoso ainda. Concorda? Até
posso concordar, mas essa não é a principal questão. Saber quando
publicar é difícil, mas o pior é conseguir publicar. Ninguém quer
financiar iniciantes - caso do personagem - hoje em dia. 4.O
fenômeno Paulo Coelho tem alguma explicação racional? Claro:
o fato de as pessoas gostarem de ler Paulo Coelho. Por que você gosta de
um autor? Há motivos psicológicos, históricos, sociológicos etc., etc.
- o que há no caso dele, evidentemente. Todos esses motivos já foram
repetidamente analisados por jornalistas e intelectuais. De minha parte,
acho ótimo que um autor venda tanto, pois aquece o mercado e ajuda a
difundir, de alguma maneira, o hábito da leitura. Em tempo: não li Paulo
Coelho e não poderia entrar no mérito se é "bom" ou
"ruim". 5.Alguma
das características da arte moderna viraram uma bengala. Na literatura, a
utilização do fluxo de consciência não é uma destas bengalas? É, mas não a
única. Nada é novo em literatura, então tudo é "bengala",
inclusive o diálogo, o monólogo interior, o discurso direto etc., etc. A
questão é como saber usar essas bengalas. 6.”Pessoas
que cantam pela manhã, informo-o, são como passarinhos: difícil de
serem aprisionadas.” O homem não busca uma prisão, um alçapão estético,
filosófico que o defina? Talvez...
O trecho em questão, do conto "Morando Longe", não é nada
filosófico ou metafísico: é apenas uma pista sobre a identidade do
narrador. 7.Qual personagem
merece nome em seu conto? Alguns têm nome:
Denizard, Salim e outros. Os nomes não têm importância para mim: não
sou um adepto desse recurso, aliás muito comum hoje em dia (referências
bíblicas, literárias etc.). 8.Faltou algum
contista no livro do professor Italo Moriconi OS CEM MELHORES CONTOS
BRASILEIROS DO SÉCULO XX? Faltou o Guimarães
Rosa, evidentemente, mas por questões de direitos autorais. Em termos de
nomes, foi uma boa seleção. Discordo, mas isso é puramente pessoal, da
escolha de alguns contos e do espaço demasiado ou mínimo dado a alguns
deles. 9.Quais são as
dores e as delicias de trabalhar na revista Bravo? As dores, além do
fato de trabalhar, o que eu não faria se tivesse como viver de rendas, são
algumas inimizades devidas ao "estrito cumprimento do dever",
como diria o Código Penal. Não dar espaço a um livro ou a um filme, por
exemplo, mesmo quando não é uma decisão do editor, acarreta esse tipo
de reação. Uma crítica negativa, mesmo assinada por alguém
reconhecido, é, na visão do criticado, responsabilidade "da
revista" (conseqüentemente, do editor). Mas não há o que fazer,
isso é parte do jogo. A delícia é fazer
um produto caprichado, que tem falhas, claro, mas jamais é concebido com
desleixo ou sob pressão de quem quer que seja. 10.Como utiliza a
internet? Como fonte de
pesquisa, leitura e comunicação, basicamente. 11.Tem alguma epígrafe
que o acompanhe? Não que eu lembre.
Aliás, não uso epígrafes no livro. No romance que estou escrevendo, vou
usar uma do Raduan Nassar. 12.Qual o papel do
escritor na sociedade? Escrever. Não
acredito, sinceramente, que a arte mude a vida de ninguém. Parafraseando
um amigo sábio - e contestando o igualmente sábio Harlod Bloon -,
a oscilação de um ponto no índice Dow Jones tem mais relevância
que toda a obra de Shakespeare... |