ENTREVISTA COM MONA GADELHA
MONA por MONA
Comecei a fazer música porque gostava muito de ler e ouvir
rádio. Desde pequena já escrevia pequenos contos e fazia umas
canções de forma intuitiva. Um dia tomei coragem e fui cantar
na TV Ceará com alguns amigos. Descobri, aos 12 anos, que era
isso que eu queria para o resto da vida. Na época, o punk
ganhava o mundo e me juntei aos amigos Sigbert Franklin e
Lúcio Ricardo para fazer o nosso rock from Ceará. Era tudo
muito divertido, absolutamente underground. Mas com tantos
shows acontecendo, fomos nos profissionalizando. Ganhamos um
espaço na mídia cearense, fizemos shows em cidades vizinhas.
Ficamos amigos do Pessoal do Ceará (grupo de músicos que
despontou nos anos 70, como Ednardo, Téti e Rodger, Ricardo
Bezerra, Petrúcio Maia, entre outros). Depois nos
dispersamos, infelizmente.
Eu fui fazer faculdade de comunicação, trabalhei em jornal,
rádio (tinha um programa na Rádio Universitária FM),
televisão e agência de propaganda. Começou a ambigüidade, a
vontade de cantar e compor, mas havia também a necessidade de
sobreviver, claro. No final da faculdade fiz um single
independente com a cara, a coragem e a ajuda de alguns
amigos. Fiz uns shows em Fortaleza que até hoje as pessoas me
relembram, o que me deixa muito feliz. Daí meu mundo em
Fortaleza começou a ficar pequeno e eu arrumei minhas malas
para São Paulo. As oportunidades no jornalismo foram maiores
e melhores. Fiquei escrevendo e pensando em música, tentando
encontrar um jeito de voltar a cantar, compor. Conheci
músicos paulistanos, fiz músicas em parceria com os
guitarristas Sérgio Cruz e João Alberto. Formamos uma banda,
mas curiosamente nunca fizemos shows. A gente só ensaiava.
Não dava mesmo para editar jornal e tocar. Em 91 fui conhecer
Londres e na volta decidi que ia voltar definitivamente a
fazer música. Mas isso só foi se concretizar em 95 quando
produzi meu primeiro CD solo. Esse disco tem músicas que
vinha fazendo por todo esse tempo, como Imagine Nós, Cor de
Sonho, um hit nas rádios de Fortaleza. Mas Cinema Noir tocou
bastante em São Paulo, um pouco no Rio e Minas Gerais. Desde
então venho dando muito duro para divulgar minhas músicas.
Uma das melhores formas é fazer shows. Fiz muitos shows por
todo o Brasil nestes dois anos do primeiro CD. Não há nada
mais legal do que está no palco. Recomeço tudo agora com meu
novo disco, Cenas & Dramas, produzido por André Magalhães e
Alvaro Faria. Novas canções, nova banda, novos amigos, novos
lugares. Tem melhor?
- Mona é um nome forte e com Gadelha fica ainda com mais
força. Como surgiu o seu nome?
Mona é meu apelido de adolescência. Meu avô, que era
cearense, dizia que Gadelha tem origens espanhola e
portuguesa. Tem uma história interessante sobre o meu nome
artístico. Uma vez cantando num festival de música na praia,
em Fortaleza, Alceu Valença sugeriu que eu adotasse Mona
Gadelha. Talvez ele nem lembre disso. Mas ficou.
- A estética de um quarteto ou quinteto, dependendo da
música, é uma opção consciente e estética? É mais fácil
trabalhar com pouca gente?
Não pensei muito na formação. Foi surgindo naturalmente.
Tenho muita vontade de experimentar formatos diferentes. Já
tive percussão na banda. Não tinha tecladista, agora tenho.
Gosto muito de mexer nas coisas, sou inquieta. Agora, é claro
que financeiramente é mais fácil tocar com um grupo pequeno.
- O CD é uma tentativa, espero que bem sucedida, de se
inserir no mercado pop? Você pensou em algum público
específico quando fez a seleção de repertório?
Não pensei no mercado quando estava criando. Essa preocupação
vem depois, e isso é muito complicado. As pessoas tendem a
colocar as cantoras num balaio só. Como se cantora fosse um
estilo. Não têm muita paciência para ouvir com calma cada uma
e ver que existem aquelas que compõem, as que são rockeiras,
as que são transgressoras etc. Entrar nesse mercado é briga
de Davi e Golias. Ainda mais quando você é uma artista
independente.
- Há uma variedade de gêneros, estilos dentro do seu
trabalho. Quais são as sua influências? Quais músicos estão
presentes em Mona Gadelha quando ela canta?
Os músicos que mais me influenciam são os inquietos,
angustiados, incompreendidos, os poetas. Tem uma lista
imensa. Acabei de ver um show de Marianne Faithful em São
Paulo. Sem dúvida que ela é uma referência. Também John
Lennon, Joni Mitchel, Janis Joplin, Lou Reed, Mutantes, Tom
Jobim, Rita Lee, Jimi Hendrix, Leonard Cohen, John Cale,
Radiohead, Morrissey...
- Você diz, em O amante: "já disse que não vou abandonar o
meu lar", e, em Johnny você vai a guerra: "Vou provar a vida
sem rumo". Até quando deve existir um relacionamento amoroso?
Quando é necessário sair de casa?, ficar em casa?
O relacionamento deve durar enquanto não pintar o tédio que,
como dizia Oscar Wilde, é o maior pecado. Saí de casa cedo
porque senti necessidade de ficar mais livre. Mas é difícil,
um processo às vezes traumático, pelo menos para mim.
- Por que regravou Lobão?
Tem muitas canções do Lobão de que eu gosto. Fiquei entre Por
tudo o que for e Chorando no campo, que também é igualmente
bela. Gravo e canto músicas que tenham a ver comigo, que eu
goste de ouvir.
- Suas letras falam de amor: Para indagar com uma deles: "só
cama é muito pouco"?
Depende. No caso da música Ouvindo o Coração, de onde essa
frase foi retirada, a paixão é muito grande, por isso que só
cama é muito pouco.
- Você considera letra de música poesia ou é uma confissão
bem feita?
É legal quando uma letra é tão boa que pode ser um poema. Tem
centenas de casos assim. Mas a letra faz parte da canção, foi
escrita para essa função. É diferente.
- O jornalista Xexéo, do JBrasil, disse que hoje em dia seria
impossível aparecer um compositor com a qualidade de um Chico
Buarque, isso devido à falta generalizada de apoio e também
devido à ausência de renovação. Qual seria a solução para uma
maior divulgação da música de qualidade?
É utopia, mas a solução seria a melhor distribuição de
oportunidades na mídia. Rádios que tocassem mais gente nova e
não só os listões das grandes gravadoras.
- Um LP que custava cinco reais é, hoje, um CD que não sai
por menos que 17 reais. A passagem do vinil para o CD não foi
um golpe mercadológico?
As novas tecnologias são um fato, não dá para voltar, e eu
prefiro ficar com os benefícios, embora tenha CD e LP. Quanto
ao preço do CD, também acho caríssimo. Pode ser bem mais
barato. Chego a vender os meus em shows a R$ 10,00 só para
possibilitar a compra por parte de mais pessoas.
- Você utiliza o computador para compor? Qual uso faz da
Internet?
Ainda não, mas tenho muita vontade. Quanto à Internet, não
vivo mais sem ela. Uso intensamente. Neste momento, é o
melhor meio para divulgar discos independentes.
- Qual deve ser a função do músico para a sociedade?
Principalmente divertir. Se desse para ajudar a refletir e
transgredir, também seria ótimo.
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