ENTREVISTA COM ERIC PONTY

Eric Ponty nasce na histórica São João del-Rei (MG) no ano de
1968.  Filho  de  Aline Tirado Viegas  (prof.  De  Ballet)  e
Vicente  de  Paulo Viegas (funcionário público  aposentado  e
tenor)  e irmão de Everton Tirado Viegas (funcionário público
e músico diletante).
Começa a escrever e a desenhar aos 9 anos de idade e desde aí
já   não   tinha   muitos   amigos  e   parou   de   desenhar
sistematicamente aos 12.
Aos  14  após  se ter  trancado num silêncio e numa  angústia
inexplicável já freqüentava terapia que fez por  longos  anos
até  abandonar definitivamente pois a "angústia"os  moços  de
Viena  não conseguiram resolver com aquela leréia chata  para
ganhar  dinheiro.           Nesta  fase  dedicava-se  a   ler
críticas  de  cinema em alguns jornais e além de  ver  muitas
peças  de  teatro  no  "Teatro Municipal"  da  cidade  e  aos
dezesseis começa a ler sistematicamente dramaturgia.
Aos   dezoito  anos  apresenta  a  primeira  peça  de  teatro
"Guernica"  texto  inspirado  no  quadro  do  catalão   Pablo
Picasso,  com  influências dos textos  de  Brecht  e  Gabriel
Garcia   Lorca,   embora   já  tenha  escrito   "Decomposição
friedrich" entre outras.
Nesta  época  fica amigo por acaso na do intelectual  carioca
João da Penha " que estava fazendo uma reportagem que é autor
dos   livros   "O   que   é   existencialismo",   "Princípios
Filosóficos",  "Wittgenstein" a quem é um  dos  dedicados  na
dedicatória do livro entre outros títulos.
Aos  21 anos escreve "Dueto Abstrato" que apresenta no Teatro
da  Reitoria  da Universidade Federal de Minas Gerais  com  o
seguinte  texto critico de João da Penha que peço licença  de
reproduzi-lo por considerar a mesma tão fundamental quando  a
peça  de  teatro: " Rilke nos lembra que cada um de nós  traz
sua  própria morte. Por isto mesmo, ela é inconfundível. Como
o  ecoar  do poeta nas "Elegias de Duino", numa das vozes  de
Dueto  Abstrato lamenta a "Solidão de estar em decomposição".
As  duas vozes deste amargo dueto, implacáveis, não nos deixa
esquecer  o  caráter  perecível das coisas.  A  vida,  triste
constatação, é efêmera. Algum consolo? Nenhum, salvo para  os
que  insistem em acreditar em deuses e quejados (a maturidade
aliás,  não  está ao alcance de todos).Para  os  céticos    e
realistas, inútil é a ilusão de eternidade. Uma quimera, nada
mais.  O  destino  é  inflexível a morte  (decomposição)  nos
espreita.  Algo  perturbador  ronda  o  ser:  sua  inapelável
finitude.  Segundo  Someset  Manghaus  o  '"  sofrimento  não
enobrece,   apenas   nos  torna  mais  amargos."   Presa   da
contigência  o homem sofre. A vida dessa triste  figura  é  o
mero percorrer de uma trajetória rumo ao inexorável: O Nada."
E  quero  deixar registrado que só fui ler qualquer coisa  de
Rainer Maria Rilke ao 28 anos de idade.
Aos 23 anos de idade tornar-se ouvinte do Curso de Letras  da
Funrei  onde fica por um ano e meio até ser "dispensado"  por
não  concordar  com certas mazelas e a forma  superficial  de
como  era dado o curso, talvez pela qualidade dos alunos  que
queriam  apenas um papel do que propriamente um  embasamento.
Nesta época com uma profunda depressão começa a se dedicar ao
estudo  da  filosofia de Friedrich Nietzsche por um  longo  e
solitário  tortuoso ano embora a pratica de poesia  seja  uma
coisa recorrente.
Aos  26 anos no ápice mais grave de sua depressão escreve seu
longo  poema  "Pompas de Abril" (inédito) que definitivamente
cria  um  território de existência possível e onde "funde"sua
voz poética.
Neste período conhece o poeta intelectual Ivo Barroso, pessoa
que  este sentia enorme admiração por estar sempre lendo suas
traduções e que lhe manda "a famosa carta do Quintinho",  uma
deferência  segundo  o poeta" e o conhece  pessoalmente  numa
visita deste a histórica: Tiradentes;
É  nesta carta que este começa a se fazer uma revisão critica
de  seu  trabalho literário; e na mesma época através  deste,
conhece o poeta intelectual Ivan Junqueira onde este passa  a
ser corresponder através de "cartas criticas".
Em 1995 faz uma exposição de arte conceitual que aconteceu no
Inverno Cultural de 1995 que foi denominada de "26 Dispare do
Olhar"  sendo  uma  realização plástica do  artista  plástico
Johano e Eric Ponty e textos conceituais de Eric , que  foram
expostas  do  dia 09 até 29 de julho de 1995 na  RFFSA.  Esta
exposição  ocupou um enorme galpão e o peso  dos  26  objetos
passava  de  mais  de uma tonelada. O objetivo  da  exposição
tinha  como premissa de não ser algo comercial o que iria  se
produzir  e reproduzir poderiam só ser contemplado ali,  pois
havia  um  sentido criado entre as peças. Esta  premissa  foi
conseguida    com   sucesso,   pois   nada   se    reproduziu
comercialmente dali, ou seja, a exposição teve  a  finalidade
mesma.  Todos 26 objetos dialogavam com a história das  artes
plásticas.
Aos  28 anos de idade funda "A Voz do Lenheiro" com seu livro
"Homo-Imagens" para um amigo local. Depois disso  lançou  por
ela  Livro Sobre Tudo" (Elogiado pelo Poeta Ferreira Gullar),
traduziu "O Cemitério Marinho" de Paul Valéry, e "O  Anjo  de
David"  este  de literatura infanto-juvenil e  os  livros  de
ensaios  "Breviário  do  Tempo" e  "A  Contemplação  do  belo
Adormecido"  todos publicados pela A Voz do Lenheiro  Editora
que  continua  funcionando até hoje, mas sem sua participação
por sérias divergências estéticas.
Eric entra para a Academia de Letras de São João del-Rei  aos
29  anos de idade na cadeira de José Severiano de Resende  de
quem  já havia lido "Mistérios" e na bagagem peças de teatro,
romance,  contos,novelas  e vários livros  de  poesia,  todos
ainda inéditos.
Aos  30  anos de idade e só colaborando para Dimensão-Revista
Internacional  de  Poesia  do  intelectual  e   poeta   Guido
Bilharinho,  por  um acaso no Suplemento literário  de  Minas
Gerais  encontra  o endereço de Assis Brasil  de  quem  havia
terminado de ler o "Ciclo do Terror" e muito mais interessado
em  se  corresponder com este do participar  propriamente  da
"Antologia  Mineira  do Século XX" manda alguns  trabalhos  e
para sua surpresa é convidado para integra-la.
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.Como a poesia surgiu na sua vida e qual o lugar que ocupa?
Bem  primeiro precisa falar de quando eu comecei  a  escrever
para   que   se  possa  perceber  minha  trajetória  enquanto
consciência.  Foi quando criança. Ficava escrevendo  pequenos
contos.  Depois  os  ilustrava  com  desenhos  que  eu  fazia
arranjava  um título na capa e guardava. Tenho uma pasta  com
tudo  isto guardado. Comecei mesmo foi aos 10 anos de  idade.
Se  eu não estava escrevendo eu estava desenhando capas  para
estes contos. Não li livros eu gostava de ler era revista  em
quadrinhos. Li muitas mesmo.       Hoje eu não consigo  pegar
o  ritmo  de  lê-las. Embora eu tentei há algum  tempo  atrás
recuperar   este  hábito  da  infância  lendo  histórias   em
quadrinhos  de  arte,  mas  já  era  algo  alheio   a   minha
perspectiva.  Tinha. De assistir televisão. Acho  que  ficava
vendo  televisão  horas direto pelo menos  umas  seis  horas.
Assistia de tudo. Na época assistia também jornais coisa  que
sempre  gostei  de  fazer até hoje.  Adoro  o  hábito  de  me
informar.  Uma  coisa que eu fazia era assistir  cinema.  Não
tinha o menor critério seletivo sobre cinema. Na época quando
mais  hollyoddiano melhor. Escutava também muita  música  sem
quaisquer  critérios  seletivos.  E  eu  não  tinha  qualquer
consciência desses afazeres, ou seja, e não tinha  ainda  uma
consciência de "estar fazendo". Eu sentia um vazio  tremendo.
Uma  consciência de haver algo que eu desconhecia. De existir
algo  a mais que do aquele estado do qual eu estava inserido.
Era  como estar entregue ao limbo. E o que aconteceu então  é
que  eu fiquei nesta inércia intelectual durante algum  tempo
ou  melhor  alguns anos talvez uns 3 anos nesta alienação  da
minha  consciência. Sempre tive uma inadaptação  ao  colégio.
Como  eu não conseguia atingir certos resultados minha mãe  à
época  procurou  um terapeuta que começou  a  pesquisar  esta
minha  inércia  existencial. Como eu sempre tive  esta  mania
pela  informação  deve ter sido fácil para  ele  captar  esta
minha  faceta  do  qual  eu ignorava. Nós  conversamos  muito
durante a terapia. Lembro-me eu sempre sentia uma sensação de
mal  estar  contínuo.  Isto  passou  depois  eu  descobri   a
literatura.  Desta época lembro-me eu que eu li os Contos  de
Voltaire.  Alucinante.  Sempre  deste  pequeno  interessei-me
sobre o tema "morte", e depois vim descobrir que na verdade a
"a  consciência de existir" que me interessava como um grande
tema.No   fundo  será  mesmo  que  a  literatura  liberta   à
consciência?  Se  não a liberta pelo menos faz  ela  ser  ela
mesma.  Compreende? Por isto que eu não concordo de se  fazer
da literatura um palco para a vaidade. Não há margem para que
isto  aconteça. Quem pensa fazer da literatura um palco  para
sua  ego-trip  é um idiota. Um ignorante que se  ignora  como
ser.  Um  “Homem”  que  pode estar fazendo  outras  trezentas
coisas  que  não a literatura. É como o Ivan Junqueira  falou
comigo:  “É  gente  de  uma  outra  família”.  Ou  seja,  não
interessa o que esta gente tem a dizer. Literatura é  um  ato
radical  da  consciência. Uma "marca  de  Caim"  como  o  Ivo
Barroso gosta de me lembrar. Você nasce fadado! Sinto  muito,
mas  esta  é  a  verdade. Você só escreve  porque  sente  uma
necessidade  vital para faze-lo. É como qualquer  necessidade
orgânica do corpo.
A  poesia  só aconteceu mesmo na minha vida aos  21  anos  de
idade  depois que eu terminei minha vigésima peça  de  teatro
quando  abandonei  a dramaturgia como uma verdade  para  mim.
Minha  primeira  peça de teatro tratava  da  decomposição  da
consciência. Esta peça se chama "Decomposição Friedrich"  que
se  trata  de  uma  peça teatral passada no limbo  onde  três
"consciências" discutem para a sua passagem para o nada o que
eles representaram no mundo.
Nesta  época aos dezoito anos praticamente eu quase  não  lia
nada   de  poesia  pois  estava  interessado  em  ler  apenas
dramaturgia  que  eu  li  todos os  clássicos  de  teatro  de
Sofocles  até  Goethe  e  de Goethe até  Beckett  como  todos
volumes da dramaturgia de Nelson Rodrigues.
Aos  21  anos  a  poesia ainda estava engatinhando  na  minha
sensibilidade,  pois logo que desiludi do  teatro  me  voltei
para  a  filosofia. Na época escrevi um ensaio que aos poucos
estou  passando  para o computador sobre  a  última  obra  de
Friedrich  Nietzsche "Ecce Homo" onde fiz a analise parágrafo
por  parágrafo  dos  quatro capítulos  centrais  para  tentar
captar toda a luminosidade e perspectiva. Este foi um momento
sublime no meu passado, pois cada parágrafo vencido e captado
era  como  subir  o cume de uma montanha e olhar  a  natureza
humana  com  suas  cores claras e escuras  lá  embaixo.  Pode
parecer  egocentrico isto, mas Nietzsche faz se sentir  assim
quando se esta sobre seu verdadeiro efeito.
Depois veio uma forte depressão que durou cinco anos seguidos
que  eu  ficava  olhando para o teto  ou  lendo  algum  livro
enquanto  escrevia poesia que ao meu ver hoje de uma  maneira
bem  medíocre  deixando  a emotividade  fluir  e  travando  a
fluidez da consciência com a emoção.
Neste  período eu dediquei em ouvir música erudita como estou
o  fazendo agora quando eu escuto "Réquiem"de Berlioz  porque
venho  particularmente de uma familia de músicos  onde  todos
sabem cantar como meu pai Vicente ou dançar ballet como minha
mãe  Aline ou dedilhar ao piano como meu irmão Everton e  que
eu  que não sei tocar nada. É uma pena, pois gostaria de  ter
sido compositor de música erudita e pertencer a mesma familia
como  por exemplo a sinfonia de n*3 de Villa Lobos.Tenho  uma
prima Stael que está escrevendo uma tese de mestrado sobre  o
Guerra  Peixe.  Nunca  esquecerei quando  a  grande  pianista
brasileira Magda Tagliaferro se aproximou de mim puxada  pelo
meu irmão na casa de meu tio por causa do meu acanhamento.
.“Sinto mais sensações vindouras/que sinto eu do passado.”  O
poeta ainda é o augure?
Charles  Baudelaire  nos deu um livro fundamental  que  é  as
“Flores do mal”. Bastou este livro é ponto final como poeta e
para  a  poesia feita no século dele. Uma identidade  para  a
poesia  moderna estava formada. Arthur Rimbaund também deixou
um  livro só e influenciou toda a literatura moderna  de  uma
forma  definitiva. Rimbaund estava tentando  resolver  a  sua
identidade  poética  e resolveu a moderna  poesia  ocidental.
Havia  ou  há muitas consciências excepcionais, uma revolução
ainda  não  abrasada ou suprimida dentro dele que  é  preciso
captar.  Lendo  Rimbaund  fico imaginando  lê-lo  num  desses
concursinhos  de  poesia  de colégio.  Tenho  certeza  que  a
pretensa modernidade da garotada termina na hora. Rimbaund  é
mais  moderno  que  o  rock. É uma  idiotice  falar  que  Jim
Morrisson  foi  algo comparado a Rimbaund. Jim  Morrisson  no
máximo  fez  xixi na sala de visitas da classe  média.  Sinto
muito  mas é verdade. Os versos deles estão condicionados  ao
um   tempo  histórico.  Rimbaund  não!  Rimbaund  esfrega   a
consciência  na  sua  cara  e lhe  pergunta  se  você  existe
realmente enquanto toca punheta olhando a sua mãe  e  irmã  e
pergunta se você não irá fazer o mesmo?
Para  Rimbaund o que interessa é este limite da  latitude  da
consciência senão fazer quando se encheu foi vender armas.
Jim Morrisson servia apenas a industria existente na época  e
deixaram  o  cara e a trupe pensarem que estes estavam  sendo
originais.e fizeram que estes passassem exatamente  isso  lhe
dando a censura para se revoltarem; na consciência como meta.
Se Jim Morrison fosse o rebelde nos teria proposto o silêncio
como  um  ato  de  revolta  ou composto  outras  coisas  mais
difíceis ao palatável auditivo da trupe e da industria.
No  cemitério  onde  está enterrado está a  nata  da  cultura
ocidental dizem que é o mais cultuado ali. Quero ver daqui  a
um século.(ri) Será que seus companheiros de mortuário pensam
a mesma coisa em ter aquilo como posteridade ali com eles?
.“As   pedras  repetem  estes  fatos/são  cadências  em  suas
lápides./Do grito que sempre repercute lato /Que neste espaço
cumpre-se em si.”  A busca do poeta é a busca de ETERNIDADE?
A posteridade é uma grande bobagem egotripica. Se analisar no
fundo  o  escritor  que  entrou  para  a  posteridade  estava
procurando  resolver  este  estado  de  consciência.   Proust
estava  tentando  compreender  esta  passagem  do  "estar  no
mundo", ou seja, a filigrana dessa passagem. Captar o momento
que  este se realiza. Por isto “Em Busca do tempo Perdido”  é
uma  literatura árdua. Ali não se admite meio termo  ou  você
aceita  a  condição do escritor ou você está  definitivamente
fora. Você pode até abrir mão deste fato, mas não pode ignorá-
lo.  A  posteridade como eu ia dizendo é uma  bobagem  diante
deste  fato. É uma mentira. Giácomo Rossini sabia que  o  era
pois Beethoveen era o fã de seu Barbeiro de Sevilha. Isto não
impediu  que o mesmo fosse fazer uma outra coisa, e  aqui  no
caso nada. Posteridade para Rossini então foi um belo nada. -
Eu  conheço  pessoas  que tem o mesmo habito  entrando  fazem
outras coisas rotineiras. Conheço várias pessoas que escrevem
da  mesma  forma.  Que  querem deixar registrados  os  mesmos
lugares  comuns.  .São  pessoas de uma outra  família.  Estas
pessoas ficam preocupadas com o teor do que irão dizer para a
posteridade. Uma bobagem! A posteridade se faz no presente no
exame profundo da consciência.
.No  seu poema DESTROÇOS DA CIVILIZAÇÃO você escreve: “Quando
eu  me sentia no passado/eu era mais inteiro e conciso/estava
ali perene como o sol./
No futuro sou apenas a projeção/Do que eu era há minutos.”  O
passado  é  o espaço onde podemos ficcionar, criar?  O  poeta
está sempre em busca do tempo perdido?
A  literatura deve pesquisar a consciência compreende. Quando
um escritor recria o mundo num livro está na verdade tentando
compreender  esta realidade que é o mundo.  Este  mundo  está
neste  hiato entre o passado e o presente e o escritor  entra
aí neste espaço entre estas duas coisas projetando  algo como
nos deixa entrever Platão.
É  muito  diferente de um cientista que busca a mesma  origem
mais  tem outros fatores e outras curiosidades. A contestação
por contestação é bobagem deve estar ligado com este algo que
eu  disse anteriormente. A arte é uma profunda analista de si
mesma.
Uma  coisa  que eu não concordo muito é com analise acadêmica
da  obra,  pois se fica dissecando a obra como  se  fosse  um
pedaço  de carne. Parece-se com a mesma postura do cientista,
mas  só  que  equivocado.  Uma vez  que  está  não  pode  ser
analisada  apenas  por sua sintaxe e morfologia  sociológica.
Por  exemplo  vou  dar uma demonstração para  você  com  dois
primeiros  versos de um poema de Murilo Mendes chamado  “pré-
história”  que  começa com dois belos versos  que  dariam  de
orgulho  qualquer literatura que é assim: "Minha mãe  vestida
de  rendas/ tocava piano no caos." Isto tem uma beleza e  uma
consistência poética absoluta. Como vai dissecar isto tudo?
A informação pessoal que você tira disso é a saudade do poeta
que nunca conheceu a mãe a não ser como um álbum de retratos.
O  sentindo  de uma amputação latente fica registrada.  Basta
sabermos  tudo  ou  se nada sabermos isto  não  fará  nenhuma
diferença  que "minha mãe vestida de rendas tocava  piano  no
caos."  como material informativo. O que o verso transmite  é
particular  a  leitura de cada um. Não vejo que  uma  analise
possa  dissecar e trazer alguma outra novidade a não ser  uma
novidade  periférica  em relação ao  poema.  O  bom  poema  é
latente a consciência e cumpre o movimento deste espaço entre
passado e presente, vide os poemas de T.S. Eliot.
.“Quando o ciclo  do século se finda/que pára onde terminara;
um  século.//Tudo  se fecha na duração deste  tempo,/como  um
livro  de um escriba recém vindo”. O que será do poeta  e  da
poesia no novo milênio?
Tenho  sérias reservas quanto ao slogan do progresso  e  acho
que  é uma utopia pensar em progresso. Penso que progresso  é
tornar uma coisa especifica em outra possibilidade, mas o que
acaba  me parecendo que os ciclos da história se mascaram  em
outros  rótulos,  criando  aí esta ilusão  de  progresso  tão
questionável. Quanto a nós sermos uma realidade de  massas  é
um  fato  inquestionável,  mas isto  se  deve  a  demanda  da
população  que é muito alta. Li não sei onde que a informação
de  um camponês eqüivaleria em toda sua vida a leitura de  um
jornal de hoje, mas aí eu me pergunto será necessários termos
tanta informação? O que se passa no Zaire é fundamental tanto
o  que  se  passa dentro da Casa Branca para um homem  comum?
T.W.  Adorno entra nesta questão para mim. Não só gosto  como
eu o admiro T.W. Adorno. Acho o ensaio  sobre jazz admirável.
Um  ensaio  antológico para se compreender o movimento  e  os
mecanismos  da  mídia. Sou uma pessoa que adora  ouvir  jazz.
Acho  Ornette  Coleman  e  Charles Parker  admiráveis.  Diane
Whasgiton  é uma cantora esplêndida. Mas voltando ao  Adorno.
Acho  fundamental quando diz que a mídia cria uma  farsa  que
seus  ídolos são falsos. Os mitos de uma Rádio nacional ontem
são os mesmos de hoje. O que diferencia apenas é o estilo  da
época  no  mais  é a mesma coisa. Na cultura  literária  está
acontecendo algo parecido com alguns poetas que eu  desconfio
um pouco.
Poetas  que  são  de  uma outra família que  escrevem  poemas
descartáveis para vender agora e serem esquecidos na  próxima
temporada cuja sintaxe flui como numa conversa de botequim.
Quando  ao  Adorno  é  um clássico na qualidade  dos  maiores
pensadores  como  um  Heidegger que é fundamental  quando  ao
questionamento  da palavra. O estudo dele sobre  Trakl  é  um
negócio sério.
Georg  Lukaks  tem também uma contribuição estética  com  sua
crítica  marxista  assim  como  Walter  Benjamin.  Se  formos
críticos temos muito a tirar destes tratados estéticos, basta
sabermos  lê-los no ponto certo. Inclusive o elitismo  de  um
Eliot pode contribuir muito para um conceito de cultura ou de
poesia. Penso até que não é função da poesia a retificação da
realidade  como  quer T.W. Adorno em seu famoso  ensaio,  mas
para compreensão e o desvelamento de sua preposição.
A  verdadeira poesia será a mesma que se pratica deste  Dante
ou Homero e é uma ilusão acreditar que esta fará um movimento
de 360* graus e passará a ter um outro écran.
É  mais fácil o homem mudar, mas isto neste não o faz deste a
história  pré-histórica.  Se antes tínhamos  reis  conferidos
pelas divindades, amanha teremos estes mesmos reis através de
outros critérios, porém a bobagem será a mesma.
.“Existir  é  bem  mais  que  padecer/Deste  tolo  narcisismo
póstumo.”  O que é o não ser em vida?
O não ser em vida é a escravidão e a massificação. É passar a
vida  inteira  como um bossal na mesa de bar  e  se  orgulhar
disso.  É ser uma Vera Loyola e emergentes da Barra da Tijuca
que  se  legitimam pela sociedade "pensa de" e não  se-lo  em
essência.  É mandar construir enormes memoriais de  pedra  em
seu  nome e cinqüenta anos depois alguém pergunta:"Quem era?"
O  pior tipo de escravo é aquele que se tornou patrão sem se-
lo. É aquele que parado na esquina tem uma loja em NY, mas se
preocupa  com  status que ele tem na sua cidade  onde  niguém
sabe onde fica.
.As   pedras  repetem  estes  fatos/são  cadências  em   suas
lápides./Do grito que sempre repercute lato /Que neste espaço
cumpre-se em si.”  A busca do poeta é a busca de ETERNIDADE?
(Repetindo  aqui o que eu disse anteriormente)  A  literatura
deve  pesquisar a consciência compreende. Quando um  escritor
recria o mundo num livro está na verdade tentando compreender
esta  realidade  que é o mundo. Este mundo está  neste  hiato
entre  o  passado e o presente e o escritor  entra  aí  neste
espaço  entre  estas duas coisas projetando   algo  como  nos
deixa entrever Platão.
.Há idade própria para ser ensaísta e ficcionista?
Meu  primeiro ensaio foi aos vinte anos quando  eu  já  tinha
escrito  várias  peças de teatro e foi sobre  "Morte  e  vida
Severina"  do  João Cabral de Mello Neto e  embora  haja  ali
alguma  coisa  de  essencial não  considero  que  o  fiz  com
segurança.
Não  existe idade para nada, e deste que se faça bem feito  é
valido. Veja o caso da poetisa Mariana Ianelli de São  Paulo.
Ela  tem dezenove anos na bagagem e uma maturidade que eu não
encontrei em mulheres que se metem a escrever poesia com  60,
por  exemplo o poema dela " Três vezes Cristo" pode estar  no
meio  de  uma obra poética como Henriqueta Lisboa  ou  Adélia
Prado.  Além  de  escrever  poesia  como  se  deve,  esta   é
extremante elegante e bonita.
A  entrevista dela que está na UOL  é uma entrevista  de  uma
pessoa  madura e segura que sabe o que está fazendo e  o  que
quer.
.Com a morte de João Cabral de Melo Neto quem ocupará o lugar
de maior poeta brasileiro vivo?
Já  está  ocupado.  Ferreira Gullar. Se  houver  algum  outro
pretende pode limpar a área. Ferreira Gullar conseguiu  andar
com  o  movimento do mundo. Sabe porque? Percebe-se na poesia
dele  ao meu ver este estar no mundo esta consciência latente
tanto  que  a  poesia dele é tão lírica e áspera  e  muda  de
formas, porque este está intimamente ligado a este movimento.
.Poesia é letra de música? Poema é poesia?
Para  o  Bruno  Toletino e para mim poesia  não  é  letra  de
música. Mesmo que se comece que a falar dos trovadores e  sua
música  eu faço duas seguintes perguntas: "Qual foi a  última
vez  que você ouviu a música dos trovadores e me cite o  nome
de  dois músicos tovadores que ficaram deste a idade média  e
modificaram a história da música? Se aquela canção cuja letra
acha genial pode ser colocada pau a pau com o melhor poema? "
Geralmente uma outra coisa sai perdendo e não é qualquer  ser
mané que pode a se meter a ser Richard Wagner.
No  começo eu começei a estudar a poesia através da letra  de
música  e  foi  um dos maiores equivocos de minha  vida  este
fato.Lastimável!! Tanto que eu gostei a captar  a  nuança  do
poema.
Se  o  poema é poesia; eu afirmo claramente que não! O  poema
aceita tudo e a poesia o desmascara o poema.
.Com  quantas metáforas se faz um poema? O que é a poesia e  o
poema?
Com  todas metáforas disponiveis do mercado. No fundo acho  a
questão  da metáfora de um novelo que não termina  nunca  que
mais  se parece com daqueles contos do Jorge Luiz Borges como
"Pierre Menard".
Fundamental na questão da arte. Uma idéia brilhante de porque
a  literatura é uma representação mimetica da  realidade.  Se
Borges   só   tivesse  escrito  este  conto  já  teria   sido
fundamental  e  justamente  o  brilho  esta  na  condição  da
metáfora.
A  poesia  citarei um trecho de T.S. Eliot  onde  fala  sobre
poesia e tradição: "Todavia, se a única forma de tradição, de
legado à geração seguinte, consiste em seguir os caminhos  da
geração  imediatamente anterior à nossa graça a uma tímida  e
cega   aderência  a  seus  êxitos,  a  “tradição”  deve   ser
positivamente   desestimulada.  Já  vimos   muitas   gerações
semelhantes se perderem nas areias; e a novidade é melhor que
a  repetição.  A tradição implica um significado  muito  mais
amplo.  Ela não pode ser herdada, e se alguém a deseja,  deve
consquistá-la   através  um grande esforço.  Ela  envolve  em
primeiro  lugar, o sentido histórico, que podemos  considerar
quase  indispensável  a alguém que pretenda  continuar  poeta
depois  dos vinte e cinco anos; e o sentido histórico implica
a percepção, não apenas a cacuidade do  passado,  mas  de sua
presença;  o  sentido histórico leva um homem a escrever  não
com   sua própria geração a que pertence em seus  ossos,  mas
com  um  sentimento que toda literatura européia desde Homero
e, nela incluída, toda literatura de seu próprio país têm uma
existência simultânea e constituem uma ordem simultânea. (...
)  E  é  isto que ao mesmo tempo, faz com que um escritor  se
torne  mais agudamente consciente de seu lugar no  tempo,  de
sua  própria contemporaneidade. ”, ou seja, o que  Eliot  nos
quer  dizer que cultura não é um mero acontecimento do acaso,
mas  uma somatória de uma civilização,  e para que uma pessoa
venha  a  dar  continuidade  a  este  movimento  tem  de  ter
consciência  absoluta  de  sua  confecção  nos  meandros  das
bifurcações, que este mesmo cria e que este se dá através  do
fenomeno da poesia.
Quando  o poema é  uma obra em verso cuja composição  poética
de  certa extensão, com enredo ou sem, distribuído no  espaço
etc.. de acordo com o gosto ou algo que se convencionou a  se
chamar de poema e que pode ter infinitas variações.
.O que é necessário para a poesia ser mais divulgada?
Que  os maus poetas saiam correndo e procurem entender o  que
seja  poesia,  e  nos  deixem  impunes  de  suas  misérias  e
atentados.   Se  algum  deles  diante  desta   poesia   ficar
profundamente calado é porque achou a poesia; senão este  vai
continuar  escrevendo aquela leréia chata até  que  a  língua
portuguesa de enfarte ou renegue Camões por tê-la salvado  do
mar.
.O que faz na hora de lazer?
Leio  sobre  informática,  tanto  que  sei  limpar  um  HD  e
reinstalar  Windows entre outras coisinhas  e  tanto  que  eu
consegui instalar o temível "Linux" e faze-lo rodar, mas como
ainda   está  muito  pouco  desenvolvido  para  a   área   de
processador  de  texto, continuo no Ruindows mesmo  com  seus
bugs especiais!
.O que mudaria na internet?
Respondo a isto na minha Home Page quando sofro para  atingir
um  padrão  que não se pareça com aquelas Home Pages  cafonas
americanas.  Que o homogêneo possa ser uma opção  e  não  uma
massificação.
Antes  de  mudar a internet eu mudaria os Estados Unidos  que
podem   se   sentir  melhor  em  tudo,  mas   são   realmente
insuperáveis  na  jequice. E tem muito  brasileiro  que  acha
aquela bosta o máximo. Se eu tivesse que ir lá eu iria só nos
museus e algumas obras de Franz Loyd Wringht(?).
.Tem algum mote?
"O  papa  é  pop  mas não liga pra pobre" A  variação  é  não
publicável.
.Qual o papel do escritor na sociedade?
Enquanto houver papel deve existir. Brincadeira.O mesmo de um
Samuel  Beckett foi o dramaturgo que mais me disse  respeito.
Beckett é fundamental. Todos deveriam ler beckett pelo  menos
uma vez na vida. Nem que seja “O Primeiro Amor” um texto mais
ameno  do escritor. Beckett é um daqueles  autores que  falam
tudo  sem falar nada. Nos entretém e nos entedia. É uma  pena
que  o  projeto  de publicar toda a sua obra não  tenha  sido
levado  a cabo. Espero que apareça algum tradutor que faça  o
resto   do   projeto.  Infelizmente  eu  faço  um   exercício
compulsório  de esquecer Beckett. A escritura dele  me  inibe
profundamente.   Tanto  que  parei  com   este   negócio   de
dramaturgia.  Acho que foi por respeito.  Tem  um  ensaio  de
Beckett sobre Proust que é memorável e o livro de Osmar  Lins
que  são duas belas lições sobre o mestre francês. Tenho  uma
coisa comigo. Até aceito uma pessoa ter o autor preferido  ou
livros  de  cabeceira. Mas se dizer leitor de um só  livro  é
inadmissível. Não foi Bernad Shaw que disse que se pode viver
sem escrever? Pois a maioria da humanidade esta sem escrever,
mas  o  problema  é:  Esta existe e deixa  testemunhos  desta
passagem e esta pode evoluir enquanto sociedade justa  sem  a
escrita?
Quando  eu  li  Bertold  Brecht  eu  me  apaixonei  por   sua
dramaturgia  que foi totalmente publicada pela Paz  e  Terra.
Foi fundamental no meu início de leitura, gosto de Baal e  do
Galileo, da Mãe coragem etc..
Não consigo distinguir hoje um Chico Buarque independente  de
Brecht.  Há uma influência descarada de Brecht na  poesia  de
Chico Buarque. Acho sinceramente Brecht como um poeta voltado
a  dramaturgia, acho que foi a Brasiliense que  publicou  uma
coletânea com seus poemas embora destes poemas há um  que  eu
gosto  muito  que ironiza o exílio dizendo que a  sorte  é  a
mesma  do  homem que parte e do que fica. O problema  que  eu
acho que a discussão é mais embaixo. O fundamental é o homem.
Não  ficar discutindo projetos utópicos ao infinito. Isto  me
dá  tédio aí eu penso em Camus ou no Sartre com sua Náusea ou
Calígula; compreende? ( pausa) Os textos libertinos  de  Sade
são muito mais políticos e fundamentais que um discurzinho de
cena  de  algum político de hoje. Se for para ficar entediado
eu prefiro a música popular ao cinema popular americano. Acho
importante que existam escritos políticos mas sem alienação e
que  sejam  verdadeiramente dialéticos até na medula  na  sua
possibilidade de autocrítica.

A página do poeta:

http//users.mgconecta.com.br/~eric

 

 

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