APOSTOLADO
Se a nossa vida interior
for autêntica, mediante o trato íntimo com Deus na oração
e nos sacramentos, traduzir-se-á necessariamente em quatro realidades
concretas:
1- na luta pelo perfeito
cumprimento de nossas obrigações familiares, profissionais
e sociais;
2- em obras de misericórdia
espirituais ou materiais, conforme as circunstâncias de cada um;
3- na colaboração
em tarefas de educação que dão uma visão cristã
da vida;
4- em ações
apostólicas intensas através da amizade e dos vínculos
familiares.
Ouvimos falar em coerência
de vida aplicada às nossas atividades cotidianas. Ouvimos falar
diária e intensamente na importância das obras de misericórdia;
ouvimos insistentes apelos de ajuda nas atividades de formação
em nossas comunidades (catequese, preparação para Crisma,
Curso de Noivos,...); mas quando será que ouvimos falar em apostolado
de uma forma concreta? Digo concreta, porque o termo evangelização,
de que tanto temos ouvido falar, ainda parece um termo genérico
que pode ser aplicado às atividades de formação, simplesmente,
deixando de lado o mais importante significado do termo apostolado: conversão,
reconversão, resgate, chamada.
O termo “apostolado”
era usado pelos apóstolos e pelos primeiros cristãos. Convertiam
seus amigos e parentes à fé em Cristo. Arrastavam as almas
com o exemplo de uma vida reta e consolidada. Atraíam os outros
pelo magnetismo que irradia de uma alma que se transforma, pela Graça,
na imagem do próprio Cristo.
O que se espera hoje
de nós, leigos, quando se fala em evangelização? Será
que o que se espera de nós é que saiamos, dois a dois, de
porta em porta, nas praças, a anunciar em voz alta a boa nova e
o chamado à salvação? Será que o que se espera
é somente o trabalho dentro das paróquias? Precisamos nos
questionar! O que buscamos quando falamos em evangelização?
Que meios empregamos? O que esperar de uma evangelização
que não se fundamenta na chama do amor à Cristo transmitida
pelo Espírito Santo a uma alma em estado de Graça? O que
esperar de uma evangelização que não parte da força
da amizade e da intimidade com Cristo incrementadas na Eucaristia e na
oração, e enraizadas numa forte base doutrinal? O que esperar
de uma evangelização que não busca ajuda através
da oração e da mortificação? O que esperar
de uma ação apostólica que não se fundamenta
no exemplo, na amizade e na confidência?
Nosso apostolado deve
se dirigir primeiro àqueles a quem Deus pôs em nosso caminho:
na família, no trabalho, na escola; nossos parentes e nossos amigos.
Nossa preocupação pelas almas tem que nos levar a procurar
a amizade, a intimidade, com aqueles com quem convivemos. É preciso
procurar fazer o que o amigo faz, estar onde o amigo está, e não
simplesmente arrastá-lo para as nossas atividades. Este é
o primeiro passo: fazer-se presente, ajudar, participar, cativar. E então,
sendo homens e mulheres que dão exemplo de unidade entre vida e
fé, que transmitem força de caráter e alegria de vida,
suscitamos o interesse pelos nossos princípios, provocando na alma
amiga a quebra de suas resistências. Só a verdadeira amizade
faz com que uma alma procure confidenciar seus problemas, suas angústias
e suas dúvidas. É chegada a hora de falar da nossa vida em
Cristo, mostrando a razão da nossa firmeza e do nosso calor. Ë
nessa hora que o coração do amigo se abre e permite que comuniquemos
a ele a chama do amor à Cristo que nos abrasa. À quebra da
resistência inicial segue-se a inclinação da vontade,
que leva à conversão, o desejo de trilhar este mesmo caminho.
Este é um processo lento que deve se consolidar através de
uma amizade sincera, de um verdadeiro apostolado. Só então,
depois da conversão, é chegada a hora da evangelização:
transmitir doutrina. Só assim seremos fermento na massa! Só
assim estaremos ateando o fogo que Cristo veio trazer.
Se alguma vez notarmos
que a salvação das almas não nos preocupa, que as
almas dos outros não nos pesam, que o seu afastamento de Deus nos
deixa indiferentes, que suas necessidades espirituais não provocam
uma reação na nossa alma, isso seria sinal de que a nossa
caridade esfriou.
-
Fogo vim trazer à
terra, e que quero senão que arda?
Temos o dever e o
direito de intervir e influir na vida dos outros, sim, porque em todos
nós circula a mesma vida de Cristo. Se um membro adoece, ou fica
anêmico, ou está aponto de morrer, todo o corpo se ressente.
Não somos todos um em Cristo? Temos que atear o fogo na alma
daqueles que se afastaram de Deus ou ainda não o conhecem plenamente.
Os meios? Exemplo, vida interior (intimidade com Cristo), Graça
que arrasta, amizade, confidência, oração, doutrina.
Quantas vezes, a mando
de Jesus, não teremos de soltar os grilhões das almas, porque
Ele necessitará delas para o seu triunfo! Que sejam de apóstolos
as nossas mãos, e as nossas ações, e a nossa vida...
Então Deus nos dará também graça de apóstolo,
para quebrarmos os ferros agrilhoados de tantos que continuam atados
enquanto Senhor espera. Compete a todos os cristãos a tarefa
de prosseguir no mundo a obra de Cristo. E Jesus apressa-nos, pois “os
homens são chamados à vida eterna. São chamados à
salvação. Tendes consciência disso? Tendes consciência
[...] de que todos os homens são chamados a viver com Deus ...?”
Falar
com Deus, Francisco Fernandez Carvajal, Edit. Quadrante
Comentário ao evangelho de São Lucas, Santo Ambrósio
João Paulo II, pregação em Lisboa |