Teus olhos entristecem
     Teus olhos entristecem.
     Nem ouves o que digo.
     Dormem, sonham esquecem...
     Não me ouves, e prossigo.

     Digo o que já, de triste,
     Te disse tanta vez...
     Creio que nunca o ouviste
     De tão tua que és.

     Olhas-me de repente
     De um distante impreciso
     Com um olhar ausente.
     Começas um sorriso.

     Continuo a falar.
     Continuas ouvindo
     O que estás a pensar,
     Já quase não sorrindo.

     Até que neste ocioso
     Sumir da tarde fútil,
     Se esfolha silencioso
     O teu sorriso inútil.


         Fernando Pessoa, 19-10-1935