É preciso ir galgando degraus e melhorando-se aos poucos pelo trabalho e
pelo amor.
A felicidade total é o encontro com Deus.
Extraído de 'Sementes de Felicidade'
F E L I C I D A D E
Era uma vez uma senhora que desde menina tinha uma vontade enorme de
possuir um desses copos antigos, todos trabalhados a ouro e salpicados
de florinhas multicores que trazem desenhada em letras finas a palavra
"Felicidade". Outrora era muito comum, depois passaram de moda, deixaram
de ser fabricados e foram-se tornando cada vez mais raros e preciosos,
tão difíceis de obeter quanto a própria felicidade.
A senhora de minha história procurou durante anos um copo assim. Não
encontrava, mas não desistia, continuava procurando, às vezes esquecia,
mas logo lembrava e recomeçava a busca. Mas, quando entrava nas lojas ou
antiquários e perguntava: "Os senhores por acaso terão um copo com
"Felicidade" escrito em dourado?", os vendedores ou não sabiam do que se
tratava, ou respondiam com indiferença caçoista: "Minha senhora, copos
desse tipo, não se usam mais!"
Um dia indo à Casa Rola comprar não sei o quê, descobriu junto a uma
porção de outros cristais, um copo como o que sempre sonhara... Um copo
de cristal com flores verdes e rosadas, desenhos finíssimos e a palavra
"Felicidade" em letras de ouro. Ficou radiante e surpresa: o seu copo!
Logo ali, na Casa Rola, naquela desordem, naquele belchior escuro, entre
uma disparatada de coisas, jamais pudera pensar!
Quem diria" Lá estava o copo !Felicidade"... Encontrou o copo mas não pode levá-lo. Era uma preciosidade, uma raridade, caríssimo, inteiramente fora de suas posses. Saiu com o coração triste e as mãos vazias, sem o copo com a inscrição "Felicidade", que finalmente achara, mas não seria seu, pois o preço era demasiadamente alto.
Nunca teve coragem de voltar, parou de procurar e parou de pensar no copo, mas acontece que tempos depois pegou fogo na Casa Rola, e passando acidentalmente na Rua Senador Dantas, a tal senhora viu uma vitrina com "salvos do incêndio"... Objetos variados, vasos, estatuetas, xícaras, talheres, abajures, vestidos, etc., tudo sujo, empoeirado, coberto de cinza e ainda com o cheiro acre do fogo, e, bem no fundo, meio escondido, o copo... Um copo de cristal antigo, florido de verde e rosa, com uma simples palavra pintada em ouro: "Felicidade"!
Daquela vez saiu da Casa Rola com o copo! Salvo do incêndio, mera coisa sem valor entre centenas de outras, pusera-se a seu alcance e afinal era seu. Parecia milagre! Felicidade... Mas, chegando em casa verificou que o copo estava rachado, uma racha fininha, feia e implacável, que cortava ao meio a palavra risonha, a inscrição dourada: "Felicidade"...
A senhora guardou o copo assim mesmo, conserva-o com carinho e teme que possa quebrar-se de vez. Mas sempre que perto dela se fala em felicidade, se existe ou não, se é questão de sorte ou luta, recompensa ou acaso, se dura ou é efêmera, e se qualquer um pode obte-la, a senhora de minha hisória não diz nada, e suspira pensando no copo.
[Maluh de Ouro Preto]
[Antologia organizada por
HERBERTO SALES]