Os caras do Charlie Brown Jr. Invadiram a cidade e o vocal, Chorão, armou sua barraca em um flat em São Paulo, de pé engessado e casa zoada, ele mostrou à reporte Paola Pelosini que sabe levar uma barulheira na guitarra e que
HOMEM TAMBÉM CHORA


Um amigo atende a porta do flat no descolado bairro de Cerqueira César, em São Paulo. Chorão, o vocalista do Charlie Brown Jr, está em casa, esparramado no sofá, com o pé quebrado pra cima. O apartamento –quarto, banheiro e sala que é cozinha- também está de pernas pro alto. Pilhas de CDs na mesa de jantar e a louça se acotovelando na pia.

No quarto, a cama está do avesso, as roupas também. Num canto, no chão, roupas de mulher, da namorada Graziela, com quem Chorão namora desde a época em que morava em Santos. "Essa tava comigo desde quando eu não tinha nada", sorri. No outro canto, caixas de remédios de tarja preta para cuidar do pé, que ficou imobilizado mais de um mês, depois de uma vaca de skate. Muitos shows cancelados. Tocar de pé quebrado é complicado para quem é movido a adrenalina aditivada. Ainda sobra no quarto espaço para um miniamplificador Marshall e uma guitarra. Chorão se empolga e manda bala num hardcore, a única coisa que sabe tocar em seis cordas. "O vizinho de lá já reclamou, o dali também", diz com cara de "tô nem aí".

Formalmente conhecido como Alexandre Magno Abrão, Chorão domina as palhetadas rápidas, dignas de seus 14 anos de skate, e diz que ainda quer tocar guitarra nos shows da banda. Sem novidades. Ele compôs letra e música da maioria dos sons do primeiro CD, Transpiração Contínua Prolongada – entre eles O côro vai comê! e Tudo que ela gosta de escutar. Sobre esta letra, a resposta é direta: Qual a Patrícia (inha) que nunca se apaixonou por um malandro?

Tudo o que ela quer, o pai dela dá.

Mas, com Chorão não foi assim. O pai não pôde dar o que ele quis. E quase nem é preciso perguntar. De cara, ele desaba num monólogo intenso, sem ponto final. Fala alto, gesticula. Transpiração contínua e prolongada. Fala dos 10 anos que morou em Santos e diz que "já foram suficientes para ter o pé no mangue". Conta de seus inúmeros despejos e das não poucas vezes que passou fome. Da mudança do pai para SãoPaulo, quando teve de se ajeitar numa pensão na bocada. "Nunca imaginei que fosse ficar num lugar daqueles." Barra pesada. Dois irmãos, duas irmãs, pais separados, a mãe com problemas de saúde. "Não sei se isso vale de aprendizado pra alguém, mas no meu caso valeu muito." Dureza.

Mas ele não quer falar disso. Quer falar de som, skate, brodagem. Mundo Livre, Beastie Boys, Chico Science, Rage Against The Machine e mais skate. Quer contar sobre o surgimento do nome, quando atropelou uma barraca de coco chamada "Charlie Brown". Sobre o tempo em que faziam jingles publicitários pra descolar uma grana. "Se você consegue passar uma idéia com um som legal em 30 segundos de comercial, em três minutos de música dá pra fazer miséria", arrepia.

Sem largar a guitarra, Chorão conta que, no começo de 1996, os cinco integrantes decidiram que queria viver da banda e pela banda. Gravaram 35 músicas num porta-estúdio Tascam, de quatro canais, e a demo foi para o amigo Tadeu Patola, do Lagoa. Pouco depois caía nos ouvidos do produtor Rick Bonadio, "dos" Mamonas Assassinas. Em menos de 100 horas de gravação, estava pronto o primeiro CD.

Antes eles cantavam em inglês e a mudança foi extrema. "A gente já tinha duas demos e aí, um dia, lá em Santos, trombamos o Planet Hemp e eles disseram ‘acorda, filho da puta!’. No dia seguinte, eu já estava cantando em português."

E o Charlie Brown Jr. Ainda tem vários minutos guardados para o próximo álbum. "Escreve aí o que eu vou te falar: Confisco é uma música que vai arrebentar". O som é sobre um oficial de justiça que baixa em uma casa e elva tudo embora. Situação que Chorão já sentiu na pele mais de uma vez. A grana é dividida igualmente em cinco: o baixista Champignon, que beira os 20 anos e toca com Chorão desde os 12, as guitarras pesadas de Marcão e Thiago e a classe do batera Pelado, surfista das antigas, único da banda com mais de 30. Fala dos caras da banda com paixão e baba de ódio quando lembra da crítica de um jornalista que compara seu discurso ao de um office boy desempregado. "Ofendeu a banda e os office-boys." Indignação e tesão estão sempre pulando dos olhos claros e chapados. Aliás, destes olhos chapados que pintou o apelido, dado por um brother skatista.

E Chorão é mesmo chorão.

Chora quando fica nervoso, quando vê um mendigo. "Vejo uma tiazinha carregando um pacote, ajudo e depois choro." Litros e litros de lágrimas quando o som da banda tocou na rádio pela primeira vez, quando vê a galera cantando suas músicas ou quando jogou um skate pro crowd, no show do T.S.O.L em São Paulo, e o carrinho foi parar na cabeça de um fotógrafo.

Ele se emociona quando fala do filho, de 7 anos, que mora em São Paulo com a mãe. "O moleque anda de skate dos dois lados e já ganhou medalha de ouro no show de talentos da escola. "E, para orgulho do pai, cantando um som do Charlie Brown Jr. O único ano de casamento não deu certo, faltou grana e experiência. Na época, com 20 anos, trabalhou de corretor, cableman, iluminador.

Hoje Chorão tem 27 anos e vice do que gosta. E a moçada também gosta. Surfistas, skatistas e malucos. As mulheres, nem se fala. Concorda que o assédio é grande, mas descarta o tipo sex symbol. Não é vaidoso, vive barbado, acha-se gordo. "Almoço pensando na janta". Mas o apetite está em fazer a coisa acontecer.

Tipo o CD da banda virando no exterior e a organização do "Hollywoodizinho Rockinho em Santinho", um show, de preferência na Vila Belmiro, reunindo Charlie Brown Jr, Planet Hemp, O Rappa, entre outras, e mais de 10 bandas novas abrindo. Depois, doar a grana para istituições de caridade. Desejo vitaminado. Vitaminado como essa nova geração da música, com skate na veia, doce na boca e algumas lágrimas nos olhos vermelhos.