Envolta em espuma, num Convite sadio ao exercício do corpo; ou propondo uma brincadeira de médico, em vez das tradicionais bonecas. Aí está a moleca Rfta Lee Jones, nas letras de seu oitavo Lp. Na longa estrada de 15 anos de carreira, a roqueira predileta de Gil e Caetano guiou com perfeição, a ponto de transformar-se em mania nacional. Debochada, ela conta o que é ser, ao mesmo tempo, mãe, dona de casa, cantora e compositora. Ou, apenas, nossa mais irreverente estrela.


Olá, tudo bem?" Como toda boa moleca, Rita Lee faz desse novo encontro uma surpresa. Chega correndo, sorriso solto, disposição de adolescente. Calça, tênis amarelo com listras, meias roxas, bermuda larga e uma grande camiseta. Senta, massageia as pernas e pergunta com simpatia. "Podemos comerçar?" Cabelos cor de fogo em desalinho, olhos azuis mais brilhantes do que nunca, Rita é a imagem da tranquilidade, de uma alegria incomum. Sem maquilagem, ela ainda carrega alguns traços dos tempos de colegial, embora vá completar 34 anos no último dia de dezembro.
Nem parece mãe, muito menos uma ex-gestante que há dois meses deu à luz Antônio, terceiro filho do casal Rita Lee Jones e Roberto de Carvalho. E foi durante a gravidez, "gestando um disco e um filho", que começou a sair Saúde, o novo Lp. "Ficamos grávidos juntos, eu e Roberto. sabe, a sensibilidade, nesta época, fica à flor da pele", revela. O processo criativo, ela não nega, tem muito a ver com a união dos dois, num casamento que também musicalmente deu certo.
- Como todo mundo, também enfrentamos barras pesadas, problemas existenciais. Temos filhos, compras, essas coisas de dona de casa. Tudo isso. Mas como John e Yoko Ono, que chegaram a trocar as funções dentro de casa, Roberto e eu fazemos de tudo. Nada de isso é serviço de mulher, aquilo, de homem. Por isso passamos a imagem de bem-casados.

RITA, A MODELO


Também no casamento musical, que igualmente dura seis anos, Rita e Roberto não têm funções definidas. Atuam em toias as posições,ele especialmente nas musicas, e ela nas letras. Ambos, porém, já perderam as contas de quantos filhos composições geraram. Rita, aliás, e a própria modelo de suas múticas: "Escrevo baseada em mim mesma", confessa.
O nosso trabalho está cada vez mais popular justamente por isso. A gente é igual a todo mundo, ai está a identificação om o público. Por que as crianças gostam? Porque não esqueci, nas letras, da minha infância. Por que a juventude gosta do rock? Porque há muito do adolescente na música. Roberto e eu não pensamos num público específico quando fazemos música. Simiplesmerite as coisas vão saindo, é um processo da gente.
E foi com espontaneidade que Rita Lee e seu marido compuseram nada menos que 25 músicas. pensando no disco Saúde. Para chegar a oito composições, porém, ela dii que a tarefa "foi um sufoco". Censura e Rita Lee Jones decididamente não se dão. Fila até procura embaixo do sofá, como querendo desobrir onde anda a tal da abertura. "De repente a censura passou a me pedir, além das letras, uma fita cantada", desabafa.
- Desta ver, foram quatro músicas censuradas. Barriga de mamãe, uma letra que fiz quando estava grávida, não passou. E olha que era uma historinha quase infantil, sem segundas intenções. Essa não entendi. Banho de espuma, que era para se chamar Afrodite. também teve problemas. Precisei trocar bolinar por esfregar, e qualquer posição por com toda disposição 1 claro o nome da música. Imagine, a deusa do amor proibida no Brasil'
Rita não se conforma com a insensatez da censura uai uai, outra de suas composições, foi cortada na íntegra. Com Favorita por exemplo, implicaram com a palavra túnel do amor: E Dons Day já falava nisso na época da minha mãe"argumenta. Os problemas com a censura, no entanto não impedem que ela diga o que quer. "E de uma maneira melhor", acredita:
- Acabo brincando mais do que com aquilo que se invocaram. Na letra de Lança perfume, veja, a censura maliciou a Irase "ficar de quatro no ato". Tem duplo sentido, reconheço, mas é uma expressão popular.

NO DIVÃ DO ANALISTA


Saúde, o disco, mostra uma Rita Lee ainda nos caminhos do rock, de onde nunca saiu. Ainda moleca, travessa e sensual, mas acima de tudo uma roqueira. "Tenho prazer em escutar esse tipo de som. E o Brasil não pode ficar condenado eternamente ao pandeiro e ao violão", prevê. De forma caricata, talvez já incorporando um de seus inúmeros personagens (ela os inventa como distração), Rita exclama: "Princesa Isabel, volte imediatamente". Ela não admite preconceito.
- O rock está em mim, livre como eu sempre fui. E na minha cabeça tudo é rock. Uma coisa alegrc, uma música sem preconçeito. É não ter vergonha de nada, de ser moço, de ser velho, de ter sarda. É o divã do analista, no bom sentido.
Saúde, a palavra, é também uma antiga filosofia de Rita Lee, mas que só agora ela conseguiu colocar em música. Não é uma atitude radical, explica, mas apenas um cuidado maior com o próprio eu. E essa sua tese fica evidente na faixa-título (Saúde), onde diz estar cansada de "lero-lero, de solucões impostas. A revolução é partir da gente mesmo", ensina. As corridas em volta da casa, é claro, fazem parte dessa postura. Só que o cigarro, um de seus vícios (adora refrigerantes), não conseguiu largar, em nome da saúde.
- Sei dos perigos do cigarro, mas o prazer também é uma forma dc saúde. Fumo sete cigarros por dia. Eles ado como chupeta. Mas eu faço uma alimentação legal, sem seguir uma linha específica. Olha, faz favor: Continuo uma tábua, apesar de ter amamentado.

MANIA NACIONAL


Outra coisa que Rita Lee continua, não há dúvida, é preferência nacional. E até internacional - Lança perfume, lançado na França em compacto, fez muito sucesso. BaiI& comigo, em versão instrumental, igualmente foi executada nos Estados Unidos. Tanto que ela até pensa em gravar um disco em inglês. Em Nova lorque, onde foi mixar Saúde, confessa ter aprendido muito. "Eu era uma índia, lá na Sigma Síndios. O equipamento é incrivel. Levamos 20 horas para mixar cada música", conta.
Em Nova lorque, Rita ficou quase um mês sem tempo até para as compras. Mas não perdeu a oportunidade de ver os Rolling Stones, na Flórida. "Não só pelo prazer de vê-los tocar ao vivo, mas também para aprender com eles a fazer shows em estádios", explica. E um velho sonho dela cantar em grandes estádios, ao ar livre, num horário que criança possa assistir. "Ao ar livre é melhor. A gente pode levar gato, cachorro, uma verdadeira festa", admite sorrindo.
Caseira por predileção, Rita Lee só tem feito ensair para os shows que fará pelo Brasil. Sem tempo, confessa que os velhos projetos continuam engavetados, como fazer um filme, escrever um livro e bolar um programa de rádio. Está gravando o especial para a Globo, que vai ao ar dia 4 de dezembro, e aproveitando para divulgar o disco, tudo ao mesmo tempo.
Elevada á condição de estrela de primeira grandeza, apos o sucesso dos álbuns Mania de você e Lança perfume, antes mesmo de o novo disco chegar às lojas ela já vendeu 400 mil cópias. Está de casa nova e diz que o dinheiro vem sendo empregado na compra de novos equipamentos de som. Alguns calculam que Saúde, repetido o último índice (700 mil cópias vendidas), poderá render a Rita e Roberto a soma de Cr$ 70 milhões, o que ela espera ser verdade.
Derrubando mais uma vez as previsões dos críticos, que acreditavam que Rita fosse repetir a fórmula anterior, ela mostra no Anhembi, a partir do dia 19 deste mês, porque a fase não épassageira. No show, as oito músicas do Lp, assim como anti-aos sucessos, comprovarão que o deboche, a alegria e a molecagem não escapam à matreira Rita Lee. E só conferir Favorita, Molher nature (cantada em inglês), Banho de espuma, Tititi, Mutante, Atlântida, Tatibítate e Saúde, que antes de lançadas já foram avidamente disputadas pelas rádios. Mania nacional?
- A música, ao contrário da política, que considero uma comédia triste, é o que nos dá alegria. É algo mais leve, mais bonito. E o que eu quero é dar prazer pra moçada. Esse é o meu trabalho.