O processo de recepção da Gnose pelo Livro de Thoth.
O Livro de Thoth ou Livro M (Livro Mundi), é também uma forma de recepção de conhecimento e propiciador para a manifestação da Gnose. Esse processo de recebimento da Gnose através pode ser Zotheriana ou Voduísta, dependendo do enfoque ou da busca que temos com as cartas.
Diferente da Astrologia, o Livro de Thoth é uma espécie de instrumento que foca determinado local. Uma espécie de luneta para outras regiões além da racionalização. É também uma espécie de espelho, que reflete com imagens difusas manifestações não muito bem inteligíveis. Assim podemos chegar a conclusão de que o processo do Livro de Thoth não é algo racional ou lógico, pois passa uma sensação que pode ser bem ou mal interpretada à luz consciente ou racional. Essas sempre ligadas a conceitos que podem limitar sua percepção, por estarem vinculadas a crenças e sistemas muitas vezes errôneos.
O Livro de Thoth é um instrumento além de fé, crenças e sentimentos. Trabalhar com ele é lentamente começar a perceber o mundo de onde ele provém e abandonar percepções errôneas da estrutura do Universo. Isso se deve ao fato de que o operador se vê frente a frente com essa estrutura e pode percebê-la diretamente. Entretanto, as crenças formuladas podem impedir essa manifestação de Gnose. Enquanto ainda temos racionalizações baseadas em religiões ou outros métodos de negação da intuição quanto a verdadeira natureza daquilo que é Absoluto.
Para justificar essas afirmações, basta exemplificar que o Livro de Thoth pode manifestar sensações ou visões das estruturas daquilo que os processos religiosos tocam. O processo religioso busca dar uma explicação metafísica e enquadrar todo conhecimento e percepção humanas dentro de uma determinada teogonia. Ou seja, a religião acaba por tolher qualquer nova manifestação, ao tentar explicá-la com seus termos e se manter. Esse é um cuidado que devemos ter ao tentar compreender qualquer revelação do tipo gnóstica.
A postura de tratamento das informações vindas do Livro de Thoth é semelhante ao processo de trabalho do Zos Kia Cultus. Devemos deixar de lado toda a crença, toda a religião, toda a fé, para que ressurja o conteúdo oculto atrás das lâminas. A melhor forma de receber a mensagem de um oráculo é não impor interpretações àquilo que ele manifesta. A revelação de um oráculo deve ser percebida pelo próprio estado que o oráculo cria. Qualquer forma de bloqueio deve ser retirada.
Para melhor conceituar o processo do Livro de Thoth, temos de tentar compreender o que é um Tarot. Um Tarot é uma Zona de Poder. Cada página do livro reflete uma ou mais Zonas de Poder, das quais existem três tipos. O primeiro tipo é a cósmica, que compreende objetos como os planetas da Astrologia. O segundo tipo são a Zonas corporais, como os Chakras. O terceiro tipo são as manifestações sefiróticas cabalísticas. Um homem pode ser conceituado como uma Zona de Poder, assim como um grupo que se cerca de determinada prática ou energia também.
As Zonas de Poder são, por fim, condensações das energias do Caos. Através do contato com as Zonas de Poder, temos contato com o Caos. A manifestação do Caos é a manifestação energia pura do Universo. Nesse sentido, o processo se torna voduísta.
Mas como entrar em contato com as Zonas de Poder ? Existem várias formas. No caso em estudo, isso pode ser feito através do Livro de Thoth. Essa manifestação do contato com as Zonas de Poder se dá devido ao fato de suas páginas serem sigilos. Como sigilos, as lâminas apontam para algum local onde estão expressas emanações de Zonas de Poder.
Sendo sigilos, para cada operador as lâminas podem ter diferentes desenhos. Pois cada operador tem suas Zonas de Poder individuais, que são acessadas de forma pessoal. Um sigilo pode funcionar para um operador e não funcionar para outro. Portanto, o único baralho eficiente é aquele criado por ele mesmo.
Um sigilo é uma figura que aponta para determinado local no inconsciente. O sigilo funciona como um catalisador, fazendo que esse local se manifeste no consciente. E é dessa forma que o Livro de Thoth funciona.
As páginas do Livro de Thoth refletem a estrutura da Árvore da Vida cabalística. A estrutura da Árvore corresponde no microcosmo à níveis de consciência e não apenas a locais físicos. Alcançando certo nível de consciência, o operador é capaz de resgatar e dominar uma Zona de Poder. Portanto, os símbolos utilizados no Livro de Thoth apenas demonstram o grau de consciência daquele que desenhou as lâminas. Os símbolos tradicionais do Livro de Thoth podem também atrapalhar a manifestação da Gnose vinda das Zonas de Poder, por serem tentativas de racionalização da energia caótica por elas condensada.
Portanto, o Livro de Thoth não é simbólico, mas um veiculo de manifestação de Zonas de Poder, uma expressão pictórica do domínio do Caos. A função do Livro de Thoth é promover um canal de comunicação do operador com a Zona de Poder e ativar sua energia. Isso pode ser feito de várias formas. Cada lâmina deve ser uma chave ou portal. Os Livros de Thoth com propriedades hipnóticas tem mais sucesso nesse processo. Através do portal aberto pela lâmina, o Tarot (ou Zona de Poder) pode atuar no consciente.
A relação das Zonas de Poder com o Livro de Thoth é provado pelos Sidhis que causa no operador, como por exemplo a adivinhação, vidência e outros processos de recebimento de informações. O Livro de Thoth é uma forma de recepção e procura de conhecimento, portanto é também um elemento para a manifestação da Gnose. Nessa caso, o processo se torna zotheriano. E por vezes pode se tornar sem controle.
O resultado da adivinhação pelas páginas do Livro de Thoth é condicionado pela compreensão que o adivinho tem do processo oculto de revelação. Quanto mais ligado a assuntos mundanos, mais afastado ele está do verdadeiro significado da ferramenta que ele manipula.
O processo adivinhatório do Livro de Thoth gera um estado conhecido na bruxaria como estar "entre mundos". No momento da adivinhação, o cartomante é geralmente jogado em um mundo intermediário daquilo que chamamos de realidade, ou o estar aqui nesse mundo e no mundo invisível, próximo das Zonas de Poder. E lá ele pode receber a revelação do que está sendo sondado pelo baralho. Evidentemente, esse processo não é exclusividade do Livro de Thoth, mas de todos os oráculos. Nessa região "entre mundos" passam informações de um lado para outro simultaneamente. Nesse mundo é onde podemos entrar no campo energético de outra pessoa (ou melhor, penetrar em uma outra Zona de Poder) e lá recolher as informações às quais procuramos. Essa região "entre mundos" pode ser identificada como um possível acesso para a conhecida Zona Malva (Mouve Zone).
Deve ficar claro que do Livro de Thoth não tem finalidade adivinhatória. Isso é um uso incorreto dos Atus. Atu é uma palavra que significa Casa, um termo mais preciso que Arcano. Ele serve para a procura de respostas, pois é o caminho para chegarmos a locais onde podemos perceber a possível realidade. Se as cartas são utilizadas para adivinhar, é uma habilidade a ser explorada, mas não é o objetivo do estudante. Os significados empregados na adivinhação escapam geralmente do sentido oculto do Atu, ou da manifestação da Zona de Poder a que ele aponta.
Com o baralho podemos explorar outras Zonas de Poder, aquelas já citadas, como as cósmicas, corporais ou sefiróticas. Esse é o real processo divinatório. Quanto mais desenvolvida a percepção com o Livro de Thoth, mais hábil nesse procedimento, mais apto para sondar a estrutura do cosmos com a energia do Tarot está o operador. Evidentemente, o inverso dessa afirmação também é verdadeira, quanto mais preparado está o operador para sondar a estrutura do universo, mais apto está para adivinhar.
É importante o trabalho e a proximidade com as Zonas de Poder, por serem elas condensação da energia do Caos. Foi em uma operação com o Caos, para exemplificar, que o grupo onde que trabalhava Soror Nema conseguiu fazer contato com o Aeon de Maat, o que talvez tenha faltado a Frater Achad, que apenas percebeu a existência daquilo que ele chamava de Aeon de Ma-Ion, sem ter conseguido um contato efetivo.
Essa visão do Livro de Thoth é devida a novas e modernas formas de magia e ocultismo. Principalmente da assim chamada Tradição tifoniana ou Draconiana de Kenneth Grant.
Uma das formas mais simples de utilizar o Livro de Thoth como processo iniciático é nos concentrarmos em determinado Atu até momento em que o temos fixo na mente. Aí devemos saltar para dentro da figura, ou sigilo, para acessar ou ir diretamente à Zona de Poder que ele indica. Cada Atu acaba servindo realmente como um portal. Apenas com métodos como esse podemos conceber nosso próprio Livro de Thoth, com a ida até a região expressa, recolhendo suas experiências, suas imagens e sua realidade. Então iremos usar símbolos para criar um sigilo semelhante, que nos aproxime rapidamente da Zona de Poder, ou ajude a outros a lá chegarem. Apenas copiar símbolos de outros baralhos anteriores é improdutivo, não chegamos a compreensão do que realmente são, pois não navegamos naquilo que inspira seu simbolismo.
Técnicas mais complexas podem ser utilizadas, através da magia enochiana, práticas sexuais auto-eróticas ou não, meditação nos sigilos e outros elementos mais complexos, entrando-se ou não em estados alterados da consciência. Essas práticas são comuns a vários sistemas de magia. O Livro de Thoth é realmente uma combinação de oráculo com ferramenta mágica, o que torna evidentemente seu estudo mais complexo e fascinante.
Para pessoas mais sensíveis, certos baralhos acabam por iniciar esse processo sem controle. É esse o motivo pelo qual esses Livro de Thoth não são aconselháveis em um jogo. Quanto mais voltado para a exploração, mais "hipnótico" é o baralho.
Existem várias teorias a respeito da origem do Livro de Thoth. A mais comumente aceita pelos ocultistas é que teria sua origem no antigo Egito, com seus segredos guardados através do povo cigano. Há uma versão muito divulgada, na qual o Livro de Thoth seria a condensação dos conhecimentos dos sacerdotes egípcios. Segundo essa versão, os sacerdotes estariam preocupados com a degeneração da humanidade e com a preservação do conhecimento que tinham nesse terrível mundo vindouro. Então, reza a versão, um sacerdote resolveu por esconder os segredos em um baralho, para que através do vício o conhecimento fosse preservado. Esta fábula não é só bela, como irreal. Os Tarots são poderes internos do homem e não exclusividade de sacerdotes antigos. Os egípcios podem ter criado uma forma para decodificá-los e não criado uma forma para assegurar algum conhecimento que poderia ser perdido, algum segredo que deveria ser preservado.
Devido ao seu fundamento cabalístico, e da época do surgimento dos primeiros baralhos conhecidos, alguns acreditam que as cartas tiveram sua origem entre os judeus medievais. Podemos até estender esse raciocínio e ir mais longe, até os judeus da antigüidade. A origem da Cabala é pré-judaica, provavelmente caldéia ou assíria e as civilizações mesopotâmicas são pré-egípcias. Devido a isso, talvez o Livro de Thoth seja mais antigo do que já tenhamos concebido.
Existem várias outras teorias tentando explicar as origens das cartas. Hoje é acentuada a versão de que teriam vindo do terrível demônio medieval cristão. Muitos poderão discordar do fato de que essa afirmação tem fundamento. O Livro de Thoth mexe com regiões internas de onde provém também a sombra do homem. Portanto, é muito fácil relacionar o medo com as manifestações que as cartas provocam. O demônio cristão, o Livro de Thoth, a divindade, o Criador (pelo conceito gnóstico, claro), a Astrologia, a magia e outras expressões tem a mesma origem. Todas provêem do Caos. A verdade é que o Livro de Thoth não tem origem, pois ele é um reflexo de algo que é real. Querer descobrir quem inventou as cartas é reduzir os seus significados, ou até mesmo invalidá-los. É algo como querer descobrir quem inventou a Astrologia, quem inventou a influência astrológica, quem inventou o simbolismo dos planetas. As lâminas apenas apontam para objetos pré-existentes, são sua manifestação na esfera da consciência humana de algo que não pode ser expresso racionalmente. Nesse raciocínio, ninguém inventou página alguma do Livro de Thoth, uma vez que cada uma dessas cartas são portais para os locais onde poderemos sondar as realidades do Universo, e creio eu que esses portais já existiam muito antes de qualquer representação pictórica que possa ter existido deles.