ANTEPROJECTO DE DECRETO-LEI SOBRE EDUCAÇÃO ESPECIAL E APOIO SÓCIO-EDUCATIVO: contributo na discussão pública.

 

Por: Eduardo Ribeiro Alves*

                                                                                                                

Um dos pontos mais importantes da Declaração de Salamanca, (proclamada em Junho de 1994 por mais de 300 participantes, representando 92 governos e 25 organizações internacionais) expressa-se no seguinte ponto:

« 29. Los niños y niñas con necesidades educativas especiales deben recibir un apoyo adicional en el programa regular de estudios, en vez de seguir un programa de estudios diferente. El principio rector será el de dar a todos los niños la misma educación, con la ayuda adicional necesaria para aquéllos que la requieran. »

Portugal, um dos 92 subscritores, tinha então em funcionamento o Dec-Lei 319/91, que não soube ou não foi capaz de rever e configurar à Declaração de Salamanca, sobretudo nestes dois primordiais princípios:

- Um só currículo (regular), a que “los niños e niñas” com Necessidades Educativas Especiais (NEE) acederiam conforme as suas necessidades, disponibilizando-lhes para o efeito “un apoyo adicional” eficaz e sem restrições a fim de atingirem os objectivos desse “programa regular de estúdios”. E vai daí passámos os anos a brincar aos currículos adaptados, próprios, alternativos e até funcionais, fazendo exactamente o contrário do que Salamanca proclamava: “…en vez de seguir un programa de estudios diferente.”

- Transformação gradual das escolas segregadoras, em inclusivas. Também aqui se fez exactamente ao contrário: os sucessivos governos continuaram a enviar os investimentos para as instituições segregadoras, abandonando as escolas regulares e os alunos com NEE, não lhes disponibilizando os recursos técnicos, humanos, materiais, o que fez desembocar numa inclusão-vergonha-colectiva e desacreditada por todos, alunos, professores, pais e comunidade.

   O estado a que chegámos é caótico! Urge tomarem-se medidas urgentes, de forma a encontrar-se finalmente o rumo de Salamanca, por todos ainda hoje reconhecido como o melhor para os alunos com NEE.

 Este anteprojecto (disponível na página oficial do Ministério da Educação em http://www.min-edu.pt) deve merecer uma discussão pública por parte de todos: alunos, instituições, pais, serviços de saúde e de psicologia e sobretudo pela comunicação social, falada e escrita. É neste entendimento, que deixamos aqui algumas questões pertinentes para a mesma discussão:

1- “Educação Especial” e “apoio sócio-educativo”: serão assim dois conceitos tão estanques, que possam tão facilmente ser separados e distinguidos?

2- Conceito de necessidades educativas especiais: será que fica agora resolvido por recurso ao CIF 2001 coadjuvado pelo CID-10? E o DSM.IV já não vale de nada? Afinal que pretendemos, medicar a escola e arranjar um código aos alunos com NEE, para os classificarmos (catalogarmos) na sua doença, incapacidade ou funcionalidade? Será que estarão mesmo cientificamente desactualizados e a necessitarem de revogação o Artº 10 do DL 6/2001 e Artº 8º do DL 7/2001?

3-Implementação dum Sistema Nacional de Educação Especial e Apoio Sócio-Educativo dentro do próprio Sistema Nacional de Ensino: será que não estaremos em risco de desintegração total da escola inclusiva?

4-Competências, atribuições e responsabilidades dos CASE (Centros de Apoio Sócio-educativo): porque não as atribuir aos Órgãos de Gestão e Administração das Escolas ou Agrupamento, coadjuvados pelos Conselhos de Docentes e pelos Serviços Especializados de Apoio Educativo (SEAE), que englobam o SPO (Serviços de Psicologia e Orientação), o Núcleo de Apoio Educativo (NAE) , bem como os SASE (Serviços de Acção Social Escolar)?  Algumas das atribuições dos CASE não entrarão mesmo em conflito com as dos Órgãos de Gestão e Administração e com as dessas estruturas educativas?

Mais importante que uma nova legislação era “un apoyo adicional” eficaz e sem restrições às escolas e aos alunos com NEE, que teima a chegar!

INCLUSÃO é sobretudo um processo lento e antropológico que pode demorar séculos ou mesmo milénios a consumar-se…temos fé que para lá estejamos a caminhar!

 

* Professor especializado em Educação Especial ( eduardo-alves@mail.telepac.pt)

VOLTAR À PÁGINA ANTERIOR