Centro de Estudos de Psiquiatria e de Medicina Psicossomática
Método Prover
Prevenção Primária do Abuso de Drogas
Um programa direcionado a pais e professores, aprovado pelo CONFEN (Conselho Federal de Entorpecentes) em 1997, para ser usado no treinamento de pais.
Comentários preliminares: em janeiro e fevereiro de 1997, há mais de dois anos, foi composto este manual de discussões sobre abuso de drogas que é acompanhado por um vídeo onde estes princípios são expostos e dramatizados, com a participação especial da estimada e consagrada atriz Irene Ravache, juntamente com jovens atores sensibilizados com o problema. Tivemos inúmeras oportunidades para discutir o método em questão com professores, familiares de dependentes químicos, pediatras, psiquiatras, neurologistas e em situações muito freqüentes com o nosso público alvo: pais que simplesmente desejam desenvolver a melhor atitude possível para que seus filhos não venham a se tornar dependentes químicos. Consideramos esta contribuição essencial para a mudança da resposta casual e de negação; estimulando-se a criação de um compromisso da família e da comunidade no sentido de prestar-se proteção às crianças e adolescentes, quanto à ação contínua da destrutiva cultura pró drogas. Nesta edição foi incluído o anexo 2.
Estamos reeditando um programa bem sucedido.
Campinas, maio de 1999
Dr. Silvio Saidemberg
Introdução:
O "Método Prover" foi desenvolvido com o intuito de estimular reflexões e posicionamento em relação ao grave problema do abuso de drogas. O objetivo principal, dentro de uma visão de prevenção primária, é avaliar as atitudes já existentes e verificar se elas são suficientemente adequadas e consistentes para oferecer uma plataforma mais sólida de apoio e de aprendizado para crianças e adolescentes, não somente no sentido de evitar-se o uso de drogas recreativas, mas, também no rumo para o necessário desenvolvimento de uma personalidade saudável, dentro de uma infinidade de variantes próprias da criatividade e surpresas da vida.
O programa é interativo, isto é, não visa ele dar um modelo acabado e definitivo, mas sim, favorecer uma troca de idéias entre adultos na função de pais ou de educadores. Consta o programa de um texto escrito, para ser lido e comentado em grupo, de uma fita de vídeo que ilustra os dez princípios em prevenção primária, finalmente, de um conjunto de questões formuladas no Anexo 1, com o escopo de estimular um debate entre os integrantes de cada grupo. Um coordenador de dinâmica de grupo com treinamento prévio neste método é desejável, para desinibir uma conversa construtiva e para apontar tendências comodistas de se aceitar, irrefletidamente, a opinião do outro, quando, em realidade, o assunto permanece sem elaboração satisfatória para cada um dos participantes.
Procurem organizar novos grupos de discussão, não atinjam conclusões inflexíveis, a busca da verdade pressupõe o continuar duvidando e a re-estruturação contínua das próprias idéias. No entanto, precisamos manter, com coerência, regras básicas mínimas.
Alertamos para o fato de que este enfoque, certamente, não abrange todos os aspectos da prevenção primária; aborda apenas, aqueles que falem a respeito do desenvolvimento de atitudes que tornem menos provável a drogadição.
Copiem livremente e divulguem este método. Após cada experiência, o questionário final poderá ser respondido individualmente e remetido a um dos endereços do "Método Prover"; isto dará mais impulso à ação comunitária.
As nossas congratulações pela sua participação.
Dr. Albert Zeitouni Dr. Silvio Saidemberg
Prevenção Primária Para o abuso de drogas
MÉTODO PROVER
Tanto pais como educadores têm um papel fundamental nos programas de prevenção do abuso de drogas. Eles, pais e mestres possuem um acesso privilegiado na formação da personalidade e do caráter das crianças e adolescentes. A confiança que filhos e discípulos depositam nesses adultos, torna possível que a preservação da vida e do respeito humano sejam transmitidos, através das gerações na forma de sólidas atitudes e valores.
A pior atitude dos pais a ser vencida na etapa inicial de todo programa de prevenção é a atitude de comodismo e de negação ingênua; "isto não vai acontecer com as minhas crianças; isto só acontece com outras crianças". "Eu não tenho nada a ver com isso, meus filhos não têm e certamente não terão problemas com drogas". "Se nós falarmos sobre drogas, isto só irá despertar o interesse das crianças". "Drogas são problemas que afetam outras crianças e jovens, muito ricos ou muito pobres, não os meus, simplesmente porque assim eu quero crer".
Os pais têm que se apressar para transmitir os seus valores antes que as crianças passem a se tornar menos influenciáveis pelos mesmos, o que deverá começar a ocorrer entre 12 e 14 anos de idade, coincidindo com o início da adolescência.
Pais que fumam, ou imoderadamente consomem bebidas alcóolicas, precisam admitir que têm um problema e que gostariam que seus filhos não os imitassem, porque é difícil para eles, pais, se livrarem de seus hábitos e das conseqüências dos mesmos. Para se desestimular comportamentos destrutivos, os pais precisam desenvolver atitudes construtivas e respeitosas em relação à sua criança. "O faça como eu digo, mas, não faça como eu faço" produz um efeito avassalador sobre as crianças. Os pais fumam e se alcoolizam, mas, não querem que os filhos venham a apresentar os mesmos comportamentos. E’ possível até que consigam não despertar interesse em álcool, cigarro e outras drogas, mas, o exemplo de descaso com a vida permanece como uma semente plantada no solo fértil de mentes jovens. Além do mais, a imagem destituída de poder dos pais quanto aos vícios, os desacreditam frente aos filhos, que não mais os podem ter como modelos e como conselheiros para a sua busca de vida saudável e plena.
Num programa de prevenção ao abuso de drogas, em primeiro lugar, os pais precisam rever suas atitudes e valores. Têm eles conseguido ser verdadeiros?, têm eles se dedicado aos seu filhos?, os observado atentamente?, diariamente, despendido algum tempo para conversar sobre o que julgam ser o mais desejável para a vida desses filhos?
Princípios básicos para ajudar filhos a não se envolverem com drogas:
princípio primeiro - Começar o mais cedo possível. Quanto à questão das drogas, informações precisam ser compartilhadas precocemente. Incluem: ensinamento básico sobre higiene, histórias a respeito de pessoas que entraram em contato com drogas, que se viciaram em álcool, ou que adoeceram pelo uso de cigarros, também de crianças mais velhas que levam as mais jovens a usar drogas, finalmente, as reações de desaprovação dos pais às tragédias relacionadas ao mundo do tráfico e do abuso de drogas.
O princípio segundo diz respeito à necessidade dos pais de expressarem ativamente suas opiniões, de evitarem ficar passivos diante de influências negativas, que filhos possam estar recebendo de publicações, da mídia, de amigos ou de outros adultos. Mesmo que não tenham o dom da palavra, mesmo que não saibam discursar, o "eu desaprovo drogas" publicamente proferido permanece como uma mensagem de grande impacto na mente jovem. Uma declaração por mais lacônica, por mais breve que seja, mostra o posicionamento dos adultos responsáveis. E o posicionamento é um ato que fala mais alto que milhares de palavras.
O princípio terceiro refere-se aos momentos adequados para a intervenção dos pais no sentido de transmitir um ensinamento sobre drogas - uma narrativa curta na hora de uma refeição, sobre pessoas que se complicaram com drogas, sobre o mundo do tráfico. Os pais contando sobre o seu desejo de ajudar para que a comunidade possa ser menos violenta e menos trágica. Falando até sobre o seu sentimento de que se mais pais, professores e políticos se empenhassem, o problema seria resolvido, como, em boa parte do mundo, resolveram-se problemas referentes às epidemias de varíola e de poliomielite.
O princípio quarto tem a ver com a necessidade de se reforçar esses conceitos anti-droga. Informações e atitudes pró uso de drogas atingem os jovens diariamente, precisam elas ser contrapostas a novas idéias anti-drogas que as neutralizem. Os pais precisam ficar sempre atentos, prontos para opinarem sobre este assunto.
O princípio quinto: "Conheça os amigos de seu filho". Conhecer todos que influenciam e como influenciam seus filhos. Em uma conversa informal, pode-se descobrir muito sobre as atitudes básicas dos mesmos. Convidem os amigos de seus filhos para um almoço, para um lanche e despendam tempo com eles. Escutá-los atentamente, e reparar também no que não dizem é tão importante quanto entretê-los. Preocupações sobre a influência desses amigos devem ser posteriormente, abertamente discutidas com os filhos. A omissão em emitir opiniões não contribui para que os jovens vejam pais e outros adultos como coerentes e consistentes em suas posições.
O princípio sexto diz: "Conheça as idéias dos formadores de opinião que convivem com o teu filho". São eles favoráveis a uma certa droga? defendem eles uma atitude casual frente à disseminação das drogas? você tem, como pai ou mãe, o direito e a obrigação de se contrapor a isso, seu filho não será cobaia de nenhum experimento com seres humanos, usualmente patrocinados por pessoas sem escrúpulos e por traficantes sedentos de lucro fácil.
O princípio sétimo requer firmeza e coerência. Se o seu filho participar de alguma experimentação de drogas e isto chegar ao seu conhecimento, posicione-se imediatamente sobre o assunto. Se precisar de ajuda profissional, não deve haver demora, cuidado com profissionais que se colocam de uma forma leniente e omissa em relação ao episódio. Todo indivíduo que se iniciou no uso de drogas e se arruinou no vício, teve uma primeira experiência.
O princípio oitavo diz respeito à necessidade de se conhecer os indícios de abuso de substâncias. O que está acontecendo com o jovem?, uma queda no desempenho escolar?, um desleixo com os próprios objetos e aparência pessoal?, às vezes parece confuso?, tem apresentado olhos avermelhados?, tem sido displicente com horários e deveres?, tem apresentado desinteresse por esportes?, parece desmotivado?, passou a evitar a convivência com familiares?, é suspeito em furtos de valores ?, aparenta estar dissimulando ou faltando com a verdade? tem deixado os seus antigos amigos e adquirido novos companheiros?, são esses novos companheiros indivíduos de conduta irregular?
O princípio nono coloca a questão da necessidade dos pais abordarem o filho e francamente mencionarem a preocupação com a possibilidade dele, filho, estar usando alguma substância que altera o comportamento. Essa intervenção tem que ser amistosa, mas, firme; a idéia não é de punir, mas, sim de apoiar e ajudar. As mudanças indesejáveis de comportamento, se mais persistentes, devem ser averiguadas através de uma avaliação psiquiátrica.
O princípio décimo enfatiza a necessidade de se conhecer e de se manter contato freqüente com os pais dos amigos de seu filho. Pode-se, desta forma, desenvolver uma maior cooperação entre famílias para medidas de segurança a serem estabelecidas. Por exemplo, reuniões de jovens discretamente supervisionadas pelos pais, tornam a utilização de bebidas alcoólicas ou de drogas menos provável.
Alguns pontos para reflexão:
Naturalmente, algumas mudanças são esperadas no processo de amadurecimento da personalidade, mas, mudanças suspeitas devem ser no mínimo investigadas com amizade e respeito. Nos consultórios é freqüente na história clínica, mudanças de comportamento sugestivas de abuso de droga que precederam em anos os distúrbios psiquiátricos do paciente, recentemente, identificados por familiares.
Com todas as medidas preventivas tomadas, ainda teremos a situação de ocorrência de abuso de drogas nos filhos de pais que se empenharam muito em prepará-los para vencerem e viverem saudavelmente. Apesar das imperfeições de todo programa que visa desenvolver as melhores atitudes nos seres humanos, diante das influências pró abuso de drogas, a ausência de um contraponto legará às gerações vindouras apenas a influência daqueles que têm um interesse em expô-las ao vício.
Em resumo:
01. Comece cedo a falar sobre drogas.
02. Seja ativo contra as drogas.
03. Aproveite toda a chance para conversar sobre o assunto.
04. Repita e reforce opiniões; esteja atento a todas as possibilidades para
desenvolver idéias sobre o assunto.
05. Conheça todos os amigos de seus filhos. Conhecer implica em saber
como eles pensam sobre valores e atitudes.
06. Conheça a opinião sobre drogas dos professores e de todos aqueles
que possam exercer alguma influência.
07. Seja firme e coerente na sua posição contra drogas.
08. Aprenda a conhecer indícios de abuso de drogas.
09. Investigue amistosamente e respeitosamente - todo jovem está no
grupo de risco.
10. Conheça os pais de amigos dos seus filhos.
E’ o desejo de todos que contribuem para o programa de prevenção primária a obtenção de sucesso no ajudar a criar um mundo mais seguro, saudável e livre do flagelo das drogas. A tarefa é árdua e pelos esforços despendidos, dificilmente, a recompensa é visível, constatável e reconhecida.
Anexo 1
Como se utilizar do "método prover"?
01. Assista à fita de vídeo junto com outros pais ou adultos interessados.
02. Cada item comentado no texto gravado visa, unicamente, a estimular um debate. Cada participante poderá imaginar uma maneira melhor, mais adaptada ao seu estilo de comunicação, que consiga transmitir o seu interesse, o seu apoio e também as regras básicas que desejaria assimiladas pelas crianças e adolescentes. ( naturalmente a comunicação precisa ser apropriada e ajustada à idade e ao nível de compreensão.)
03. Tente encontrar razões que impeçam o funcionamento dos princípios básicos sugeridos para que os seus filhos não venham a se envolver com drogas. Explore a possibilidade de existirem diversos outros princípios básicos que não foram comentados pelos expositores do "método prover".
04. Discuta a sua resistência em ser mais ativo contra drogas, é importante que os motivos dessa resistência sejam comparados aos motivos dos demais participantes.
05. O que você faria se uma pessoa que lhe fosse cara viesse a se envolver em algum tipo de dependência química?
06. Que regras de comportamento você estabeleceria para crianças e adolescentes? Como elas seriam ensinadas?
07. O que de concreto poderia ser feito em relação às opiniões favoráveis às drogas de pessoas influentes sobre o seu filho?
08. Como você ensinaria seu filho a se defender da pressão do grupo?
09. Lá no fundo, você prefere um filho conformista que evite desenvolver idéias próprias e que evite seguir a consciência de certo e errado? Ou você o prefere mais corajoso a ponto de se arriscar a ficar do lado da honestidade e da justiça mesmo que reprovado pelos outros?
10. Você ensinaria o seu filho a se proteger contra a influência inadequada de amigos ou de pessoas que ele admira? Como?
11. Se você achou esta experiência importante, o que o impede de tentar divulgá-la, de estimular outros pais ou futuros pais a conhecerem o "método prover"?
12. Após completar a sua experiência de assistir à gravação em vídeo e de organizar cada grupo de discussão, responda ao questionário abaixo e o envie para o endereço de correspondência.
13. Se precisar de ajuda ou quiser obter aconselhamento para implantar programa na área de prevenção de abuso de substâncias, entre em contato através do telefone: (19) 32555534.
Endereço para correspondência:
Dr. Silvio Saidemberg //"Método Prover"
Rua Antônio Serafim n. 151- Jd. Sta. Marcelina
CEP. 13095.510, Campinas, S.P
RETORNAR À PÁGINA PRINCIPAL: SÍLVIO SAIDEMBERG, M.D.
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questionário individual:
( responda dando uma graduação de 0 a 100 se solicitada)
Idade ( ) ; sexo m ( ) f ( ) ; programa discutido em grupo? sim ( ) - não ( )
1- Gostou do programa apresentado pelo "método prover"? sim ( ); não ( ) / graduar ( )
2- Achou útil debater este assunto com outros adultos? sim ( ); não ( ) / graduar ( )
3- Suas atitudes foram modificadas para melhor? sim ( ); não ( )
/ graduar ( )
4- Pretende organizar grupos de adultos para este tema? sim ( ); não ( )
5- Comente sobre as suas idéias e sugestões:
(destaque e envie as suas respostas para o endereço postal do "Método Prover") ( gostaria que o seu nome e endereço fossem registrados em nossos arquivos para correspondência? ). nome:..............................................................................................................
endereço:............................................................cidade...............Estado:......CEP..............Fone:...........................e-mail:...................................................
Anexo 2
A LIBERAÇÃO DA MACONHA
por : Dr. Sílvio Saidemberg
Estamos diante de dois princípios: o primeiro diz respeito à liberdade individual de escolha; o segundo discerne sobre a utilização de substâncias que formam hábito e têm um potencial para figurar como um dos fatores causadores de doença.
Pelo primeiro princípio poderíamos discordar da escolha feita, mas, basicamente respeitar o direito individual em fazê-la, salvaguardados os direitos individuais de outros que não deveriam ser induzidos a seguir os passos de quem busca qualquer coisa que possa por em risco a saúde ou a vida. Bebidas alcoólicas e tabaco têm se beneficiado de tolerância social e existe uma forte pressão de setores da população para que outras substâncias venham a desfrutar de semelhante tolerância; em particular a maconha.
Todas as sociedades humanas definem os limites entre o aceitável e o inaceitável, seja a produção e venda de alimentos, seja a qualidade de água ingerida pela população, seja a responsabilidade na utilização de medicamentos. Algumas sociedades proíbem o que é aceito por outras, por exemplo: o caso de bebidas alcoólicas interditadas nas sociedades islâmicas e apenas restringidas nas sociedades ocidentais. Nós temos a confirmação tanto de levantamentos estatísticos quanto da experiência clínica que o início da utilização de bebidas alcoólicas e do tabaco ocorre em grande freqüência na infância e na adolescência. Restrições nas sociedades ocidentais, apenas, em certos grupos da população conseguem ser mais efetivas. Se for liberado o uso para cidadãos acima de 18 anos, nada impedirá que os mesmos cedam parcela de sua maconha a seus amigos abaixo da idade limite. Teremos apenas mais substâncias oficialmente disponíveis para causar doença na população, sem que haja a pecha de transgressão adicionada a elas. Naturalmente, quem "precisa transgredir", então, poderá buscar outras opções potencialmente até bem mais perigosas do que a maconha. Na atualidade, crianças e adolescentes também vêm tendo na abundantemente disponível maconha a sua terceira droga de uso mais freqüente. Infelizmente, o princípio de liberdade invocado na defesa do direito de se usar maconha não inclui salvaguarda dos direitos individuais de outros, da mesma forma que as bebidas alcoólicas e o tabaco não puderam salvaguardar.
O segundo princípio versa sobre o julgamento do risco à saúde pelo uso de substâncias. Sabemos que até mesmo fantásticas medicações precisam de supervisão médica para a sua utilização apropriada. A talidomida que, hoje em dia, vem sendo adequadamente utilizada no tratamento do mal de Hansen, causou sérias malformações fetais na década de sessenta, quando fora utilizada como tranqüilizante em mulheres nos primeiros meses de gravidez. Sabemos que tanto as bebidas alcoólicas quanto o tabaco estão também associados a sérios problemas do desenvolvimento fetal. Se até alimentos ingeridos em excesso podem representar sério risco para a saúde, porque precisamos nós ser cautelosos com algumas substâncias e não com outras? No caso específico da maconha, para poder ela ser considerada segura para o consumo humano, necessitará passar por rigorosos testes que confirmem a sua não periculosidade. As pesquisas existentes, muitas delas feitas na década de setenta e oitenta, não indicam que a maconha tenha características aconselháveis para o consumo humano. A vida média extremamente longa do princípio ativo, o delta-9 tetraidrocanabinol, agentes cancerígenos na fumaça da maconha, os distúrbios sensoperceptuais, as dificuldades geradas em tarefas de precisão quanto a relações de tempo e de espaço, as possibilidades reais de ser mais uma causa importante de acidentes no trabalho, também na operação de veículos terrestres ou aéreos, os achados sugestivos de degeneração neuronal em animais de laboratório, sendo ainda: fator desencadeante de distúrbios psicóticos, causa de síndromas amotivacionais e de agravamento de problemas de aprendizagem; todos esses fatos tornam a utilização do produto desaconselháveis. Um efeito anti-emético no caso de pacientes em tratamento com quimioterápicos e um efeito redutor de pressão intra-ocular tornam algumas substâncias contidas na maconha passíveis de verificação científica. Isoladas essas substâncias, poderão ser elas testadas de forma apropriada, medindo-se riscos e benefícios comparados aos de outras inúmeras substâncias já presentes na farmacopéia. Nenhum desses possíveis efeitos desejáveis na clínica podem se constituir em álibi para se expor parte considerável da população ao uso recreativo de maconha.
Como conclusão, considero: não há respaldo científico para aprovação da maconha para consumo humano, o entusiasmo e o partidarismo favorável à liberação do uso da maconha não podem estar acima das medidas de segurança para a saúde pública. A indústria do tabaco está hoje sitiada pela pressão dos processos daqueles que direta ou indiretamente foram prejudicados pelo hábito de fumar. Quem paga a conta dos custos para a saúde e outras conseqüências econômicas e sociais no caso de qualquer droga cujo uso propõe-se liberar?
No entanto, há necessidade de se ter respeito pelos dependentes químicos, de apoiá-los e de ajudá-los. Dependência química é uma doença que precisa ser tratada como tal e ter sua ocorrência controlada, excluindo-se punição como forma de tratamento. As atitudes médicas não devem e nem podem ser confundidas por preferências sociais ou por fantasias de estilo, o exemplo mais clamoroso é o do alcoolismo que teima em ser tratado como um problema moral e não como efetivamente é: uma doença de curso mais ou menos longo e fatal e de altíssimo custo econômico e social. #
E-mail: saidemberg@uol.com.br
http://www.oocities.org/Athens/Agora/9308/