TABACO E SAÚDE

#Prof. Dr. Silvio Saidemberg

Resumo:

A dependência da nicotina é a mais prevalecente, mais mortal, ainda a mais tratável das dependências por substâncias. No passado, médicos, incluindo-se psiquiatras não participavam muito ativamente no diagnóstico e tratamento da dependência de nicotina. Havia a crença de que a maioria dos pacientes portadores de dependência por nicotina não necessitariam de tratamento. Foi então enfatizado erroneamente que dependência por nicotina tratava-se de uma dependência psicológica, produzida por uma escolha individual, de uma certa forma, era uma questão de estilo, até mesmo de requinte, e não necessariamente um problema que deveria ser psiquiatricamente abordado. Havia até alguns membros da profissão médica que julgavam serem benéficos os efeitos "calmantes" do uso do tabaco. De qualquer forma, o tabaco não possui o impacto do álcool, altamente negativo sobre o comportamento. O tabagismo é um mal muito menos visível e consideravelmente menos reprovável.

No entanto, as seguradoras de saúde não incluem programas para o tabagismo, entre os tratamentos remuneráveis,.

Tem havido uma mudança importante na visão derrotista em relação ao tabagismo, a cessação do fumar tem sido nos últimos anos um resultado efetivo para redução de custos com gastos na área de saúde. Existe uma pressão social muito maior, em função do reconhecimento dos malefícios da condição do fumante passivo, isto é todos aqueles que são obrigados a inalar o ar contaminado pela fumaça dos tabagistas. Nos últimos anos, pesquisadores determinaram que ex-fumantes continuam portando ao longo da vida as alterações genéticas desencadeadas pelo hábito de fumar, isto os coloca como um grupo mais propenso ao câncer. A redução progressiva da propensão ao câncer através dos anos de abstinência em ex-fumantes é muito positiva, mas, alguns danos genéticos tenderão a persistir. Estudos epidemiológicos acentuaram o grave problema das crianças de baixo peso e com desenvolvimento retardado, filhos de mães que fumaram durante a gravidez. Infelizmente, a indústria do tabaco constituiu grupos de pressão poderosos que restringiram durante décadas as atividades preventivistas orientadas para a questão das conseqüências do tabagismo. Indivíduos dependentes severos de nicotina, incluindo-se portadores de transtornos mentais, anteriormente eram sistematicamente descartados como se fossem improváveis beneficiários de tratamento para a sua dependência. Hoje em dia estão recebendo ajuda, sabendo-se que a recaída não indica fracasso para a sua recuperação, mas, sim, trata-se de possível ocorrência que não impede a continuação desse tratamento. Os resultados conferem sucesso para a abstinência prolongada, na observação por períodos de pelo menos um ano a partir do início da interrupção do consumo de tabaco.

Summary: The dependence of nicotine is highly prevalent and nicotine is the most important substance related to death causation due to the large dissemination of its use. Nevertheless, it is the most manageable of all chemical dependencies. In the past, doctors, psychiatrists included did not participate actively in the diagnosis and handling of the nicotine addiction. There was a wide spread belief that the majority of the smoking patients would not need professional intervention. The erroneous emphasis on nicotine as a supposedly pure psychological dependence, viewed largely as an individual choice, a glamorous matter of taste and style, and not necessarily a psychiatric problem to be solved. A much less visible problem than alcohol, the latter having a severe impact upon behavior. Yet, there were some members of the medical profession that judged tobacco to be beneficial for its "tranquilizing" effect. Besides, the health insurance agencies do not usually include programs that deal with nicotine addiction, among the medical reimbursable treatments,. In the last several years, there has been an important change in the defeatist vision of this issue: the smoking cessation has been found as an effective component for cost reduction in the health area. There is increasing social pressure, as a result of the recognition of the passive smoker's condition, related to all those obliged to inhale the contaminated air by the pollution from the smokers. In the last few years, researchers have found that genetic changes persist in former smokers, keeping them as a group more prone to develop cancer. The progressively lowered propensity throughout the years of smoking cessation might be somewhat unsatisfactory.

Also, epidemiologic studies have pointed out to the serious problem of low weight newborns from mothers that smoked throughout their pregnancy. Those children will have a difficult and delayed development. Unfortunately, the industry of the tobacco constituted powerful lobbies that have restricted during decades the guided prevention activities towards the tobacco impact upon health. Previously, heavily nicotine dependent individuals, including those with mental health disturbances were plainly discarded as unlikely beneficiaries for dependence treatment. Nowadays, they are being recognised as a group in need of help, it is well known that recidivation does not indicate management failure, it is a possible occurrence that does not rule out treatment continuance. Results should better evaluate long term abstinence success, at the very least, one year of follow up should be considered.

1- História do tabagismo:

A palavra nicotina usada para designar o princípio ativo responsável pela dependência do tabaco, deriva-se do nome do embaixador da França em Portugal, Jean Nicot (século 16). Para Maria Catarina de Médicis, rainha da França, ele enviou folhas de tabaco para inalações de sua fumaça, supostamente, com o objetivo de tratar as enxaquecas da rainha. Aparentemente, as enxaquecas continuaram. De qualquer forma, foi ele homenageado, sendo a planta cientificamente denominada Nicotiana Tabacum, pelo botânico Jacques Daléchamp. O nome complementar Tabacum vem do nome do instrumento para aspirar a fumaça, o "tabacum", utilizado pelos índios do Haití.

Nas Américas, o tabaco vem sendo usado pelo menos desde o 7º. século da era atual, mas, foi introduzido na Europa somente no século 16. O seu uso ocorria através de cachimbos, na forma de charutos, ou em porções para serem mascadas. Os cigarros só se tornaram populares a partir do início do século 20, com a invenção de máquinas para a sua produção e o desenvolvimento de técnicas para acidificação do tabaco para que a nicotina pudesse ser liberada no trato respiratório inferior de onde ao ser absorvida segue prontamente para a circulação sangüínea, atingindo rapidamente o cérebro. O uso cresceu muito na primeira metade do século 20, sendo que na década de 50 já havia um consenso sobre a associação do fumo com doenças. Em 1964, um comunicado oficial do Surgeon General apontou para a periculosidade confirmada do hábito de fumar. As primeiras advertências estampadas nos maços de cigarro são impostas em 1967 e são bastante tímidas: "O Surgeon General adverte que fumar cigarros pode ser prejudicial à saúde". No entanto, mesmo que tenha havido uma pequena queda do uso inicialmente, e uma queda maior nos EUA na década de sessenta, desde então praticamente, o índice de fumantes tem tendido a permanecer estável nas décadas de oitenta e noventa. Na década de 90, nos EUA, houve um aumento do uso de tabaco não fumado e do uso de charutos.

Na década de 90, houve também um importante crescimento do uso de cigarros pela população abaixo dos 20 anos. Nos países desenvolvidos em geral há alguma redução do consumo de cigarros, já nos países em desenvolvimento, continua o crescimento do uso. Somente nas classificações diagnósticas psiquiátricas dos últimos vinte e cinco anos, o assunto do tabagismo vem recebendo atenção. Houve grande resistência para se incluir o hábito de fumar entre as dependências químicas, o que só pode ser explicado pela interferência política na área médica a ponto de se ignorar uma causa tão importante para problemas de saúde.

2- Aspectos Econômicos do Tabagismo:

De acordo com o Banco Mundial: a perda total das nações atinge cerca de 200 bilhões de dólares por ano.

Fatores: sobrecarga do sistema de saúde com tratamento das doenças causadas pelo fumo, mortes precoces de cidadãos em idade produtiva, maior índice de aposentadoria precoce, aumento de 33% a 45% no índice de faltas ao trabalho, menor rendimento no trabalho, mais gastos com seguros mais gastos com limpeza, manutenção de equipamentos e reposição de mobiliários, maiores perdas com incêndios e redução da qualidade de vida do fumante e de sua família.

O recolhimento de impostos que incidem sobre o cigarro é muito significativo para a economia do país, mas os prejuízos decorrentes do tabagismo superam qualquer questionamento puramente econômico. Atualmente, o Brasil taxa o maço de cigarro em 74%, enquanto outros países como a Dinamarca o taxam em até 83%.

Outro aspecto importante, que deve ser contabilizado nessas perdas, são as agressões ao meio ambiente e à saúde daqueles que lidam com a cultura do tabaco

3- Definição de dependência do tipo tabagismo:

A dependência e o quadro de abstinência de nicotina são dois transtornos a serem considerados. A característica fundamental da dependência é que o indivíduo continue a fazer uso da substância apesar dos efeitos deletérios da mesma. Devido ao fato que 50% dos tabagistas morrerem de doenças relacionadas ao fumo, esta definição é claramente aplicável à dependência de nicotina. A sintomatologia essencial na abstinência é uma reação de dificuldades no comportamento, que é devida à cessação ou redução de uso prolongado e intenso da substância. A retirada de nicotina acarretará uma reação bem definida e observável em um número acima de 50% dos fumantes.

O abuso de nicotina é um outro quadro com repercussões psicossociais, com alterações fisiológicas mais agudas, é menos identificável entre os quadros relacionados ao uso do tabaco. A intoxicação por nicotina freqüentemente acaba não recebendo atenção médica, por isto, passa a ser considerada uma condição mais rara.

O uso nocivo, caracterizado no CID-10 (Classificação Internacional de Doenças, 10ª revisão), mas, não no DSM IV (Diagnostic and Statistic Manual of Mental Disorders, fourth edition) refere-se ao uso contínuo que causa problemas físicos.

4- Epidemiologia:

O consumo de cigarros é a mais devastadora causa evitável de doenças e mortes prematuras da história da humanidade. A Organização Mundial de Saúde (OMS) estima que 1,2 bilhões de pessoas em todo o mundo são dependentes do cigarro, o equivalente a um terço da população adulta.

O consumo do tabaco atingiu a proporção de uma epidemia global, provocando, a cada ano, a morte de 4 milhões de pessoas em todo o mundo: um quadro preocupante com conseqüências graves sobre a saúde da população, a economia e o meio ambiente. Estima-se que o fumo seja responsável por mais de 100 mil mortes por ano no Brasil. São 11 mortes por hora, três vezes mais que as mortes no trânsito e mais que o dobro dos assassinatos num ano. Nos EUA estima-se que 400.000 mortes por ano são decorrentes do uso de tabaco. Nos EUA, em torno de 50% dos fumantes eventualmente livram-se de sua dependência, após múltiplas tentativas para vencê-la. Lá, a maioria dos fumantes tenta de 5 a 10 vezes a se livrar dos cigarros. Calcula-se nos EUA, que 50% dos fumantes que tentam interromper o hábito apresentam sintomas de abstinência. Nos EUA fumar é tão comum em homens quanto em mulheres, os índices de prevalência são mais elevados na população de nível educacional mais baixo e também de renda mais baixa.

A dependência por nicotina é o mais prevalecente transtorno psiquiátrico do mundo.

A Organização Mundial da Saúde - OMS registra dezenas de milhares de pesquisas publicadas e reproduzidas em diversos lugares do mundo, comprovando-se a alta relação causal entre o consumo do cigarro e doenças graves como câncer de pulmão (90% dos casos), enfisema pulmonar (80%), enfarte do miocárdio (25%), bronquite crônica e derrame cerebral (40%).

PERFIL DE CONSUMO

Há relação do poder aquisitivo com o consumo de cigarros: um menor consumo nas classes de maior rendimento familiar per capita (renda de mais de dois salários mínimos per capita por mês). O maior consumo está na classe mais pobre, com 25,4% dos indivíduos fumando. Essa diferença deve ser causada pela maior desinformação das classes sociais economicamente mais humildes e se repete em muitos países do mundo.

População de menor renda: grande parcela dos rendimentos é gasta com cigarros, em detrimento de outros itens prioritários. Este consumo maior, somado a outras condições às quais este grupo está submetido, como desnutrição, doenças infecciosas e do trabalho, leva a um adoecimento mais freqüente. Convém considerar que os ambientes confinados das pequenas moradias favorece, em muito, a inalação passiva das substâncias tóxicas por crianças, gestantes e pessoas doentes.

Distribuição de Fumantes por Idade e Sexo:

(fonte: INCA) Grande parte dos brasileiros fuma, principalmente os homens. Cerca de 1/3 população adulta fuma, sendo 11,2 milhões de mulheres e 16,7 milhões de homens. 90% dos fumantes ficam dependentes da nicotina entre os cinco e os 19 anos de idade. Atualmente, existem no Brasil 2,4 milhões de fumantes nessa faixa etária.

A grande maioria dos fumantes tem entre 20 e 49 anos de idade. Os homens fumam em maior proporção que as mulheres em todas as faixas etárias. Porém, a mulher vem aumentando sua participação no vício de fumar, sobretudo na faixa etária mais nova. Noventa por cento dos fumantes iniciaram seu consumo antes dos 21 anos de idade, faixa em que o indivíduo ainda se encontra na fase de construção de sua personalidade.

De acordo com dados do INCA (Instituto Nacional do Câncer), há 30,6 milhões de fumantes no Brasil. Cerca de 32% da população adulta fuma, sendo aproximadamente 11 milhões de mulheres e 16 milhões de homens. O maior número de fumantes está concentrado na faixa etária dos 20 aos 49 anos. O tabagismo é responsável por 30% de todos os tipos de câncer e por 90% dos casos de câncer no pulmão. Pode causar ainda derrame cerebral, enfisema pulmonar e enfarte.

Os danos causados pelo cigarro também atingem os não fumantes. As pessoas passam 80% do seu tempo em ambientes fechados. Ao fim de um dia em ambiente poluído, os não fumantes podem ter respirado o equivalente a 10 cigarros.

Nicotina aumenta consumo de álcool:
Em fevereiro de 2000, pesquisadores canadenses divulgaram a constatação de que a nicotina induz ao consumo de álcool. A descoberta pode levar ao desenvolvimento de tratamentos conjuntos para os dois tipos de dependência. Os pesquisadores da Universidade de Toronto disseram que ainda é preciso descobrir como as substâncias interagem.
Já se sabe que ambas atuam sobre a liberação de dopamina, substância que dá sensação de prazer. Estudos anteriores haviam mostrado que mais de 70% dos alcoolistas fumam mais de um maço de cigarros por dia. Na população geral este índice gira em torno de 10%.

Tabela 1

Epidemiologia do Tabagismo: (EUA)

Os índices mais elevados de prevalência estão na doença psiquiátrica

e em quadros de outra dependência química:

88% na esquizofrenia

75% na depressão

80% no alcoolismo

29% na população geral

5- Fisiopatologia:

O tabaco é nocivo à saúde por causa de substâncias com impacto tóxico sobre o organismo humano, entre as milhares de substâncias contidas em sua fumaça. Além da nicotina – substância responsável pela dependência do cigarro – já foram identificadas mais de 4700 dessas substâncias. Após uma tragada, a nicotina é absorvida e distribui-se por quase todo o organismo. Ela chega ao cérebro em menos de 15 segundos. Substâncias como por exemplo os nitrosaminas, monóxido de carbono, hidrocarbonetos aromáticos policíclicos, benzopirenos, e polônio emissor de radiação têm um impacto deletério sobre o organismo, são causadores de doenças degenerativas e câncer.

Substâncias carcinogênicas em tabaco aspirado ou mascado: Estes incluem nitrosaminas, hidrocarbonetos aromáticos policíclicos, e polônio emissor de radiação. As nitrosaminas mais específicas do tabaco são nele detectadas em concentrações centenas de vezes mais elevadas do que em qualquer alimento ou bebida que as contenha. Animais expostos a essas nitrosaminas específicas do tabaco em níveis proporcionais aos acumulados durante um período de vida humana pelo uso de tabaco não fumado, tem causado um número elevado e tipos variados de tumores. As nitrosaminas são metabolizadas e transformadas em compostos que modificam o material genético celular.

COMBINAÇÃO DE FATORES DE RISCO: O mesmo fator pode se constituir em risco para diferentes doenças (o tabagismo é fator de risco de diversos tipos de câncer e de doenças cárdio-vasculares e respiratórias). Ainda, vários fatores de risco podem estar envolvidos na gênese de uma mesma doença, constituindo-se em agentes causais múltiplos.

A multicausalidade é ocorrência freqüente na gênese do câncer. Existe, por exemplo, a associação entre álcool, tabaco e residência na zona rural com o câncer de esôfago. Por outro lado existe a associação entre álcool, tabaco, chimarrão, churrasco e o cozimento de alimentos em fogão de lenha com o câncer da cavidade bucal.


Os resultados de pesquisas indicam que mesmo que haja uma normalização dos tecidos pulmonares quando um fumante para de fumar, as alterações moleculares no seu DNA não se normalizam. 96 % dos fumantes apresentam importantes alterações cromossômicas, contra 75 % dos que pararam de fumar. As alterações genéticas maiores são a perda de material genético dos braços curtos dos cromossomos 3 e 9, possivelmente relacionável ao desenvolvimento precoce de lesões cancerígenas .As alteraçoes cromossômicas podem persistir pela vida e talvez ao longo dos anos de abstinência haja alguma recuperação molecular. Os tecidos pulmonares de pessoas sem história de tabagismo mostram leves mudanças genéticas em apenas 3% das amostras. A pesquisa foi divulgada pelo Dr. Adi Gazdar professor de patologia da "University of Texas Southwestern Medical Center at Dallas" e "The British Columbia Cancer Agency in Vancouver" e publicada no " Journal of the National Cancer Institute " em setembro de 1997.


Morita e sua equipe expuseram células de pele humana produtoras de colágeno ( tecido conjuntivo que representa quase 80 por cento da pele normal) a uma solução salina e ao fumo de cigarro. Antes do organismo poder fabricar nova pele, deve primeiro romper a pele velha com enzimas especiais chamadas matrix-metaloproteinas, ou MMPs, para destruir as fibras formadoras do colágeno.

Depois das células da pele ficarem expostas à solução de fumo por um dia, os cientistas testaram os níveis de MMP e colágeno novo. As células produziram muito mais MMP que as células normais de pele, mas cerca de 40 por cento a menos de colágeno novo.

A rápida destruição de colágeno e o déficit na formação do novo colágeno é provavelmente o que causa o envelhecimento prematuro dos fumantes. "Isso sugere que a redução de formação de colágeno é importante para o envelhecimento da pele. Parece que menos colágeno significa mais formação de rugas".

Impacto sobre a saúde dos que trabalham com a folha do tabaco:

A nicotina é absorvida pela pele quando se colhe a folha, gerando a doença do tabaco verde ("green tobacco sickness" ou GTS). Esta doença é reportada em 1 a 10% dos trabalhadores que colhem e manipulam folhas de tabaco nos EUA, particularmente, os da faixa etária mais jovem. A prevalência pode ser ainda mais alta em países em desenvolvimento, onde crianças freqüentemente trabalham na colheita e nas fases de processamento da folha. Os sintomas de GTS incluem fraqueza, cefaléias, náusea, vômito, tonturas, cólicas abdominais, respiração dificultosa, temperatura anormal, palidez, diarréia, calafrios, flutuações na pressão sangüínea ou do ritmo cardíaco e aumento da salivação e da perspiração. Esses sintomas são geralmente amenizados com o afastamento da fonte de intoxicação mas, são a causa de freqüente mal estar e afastamento do trabalho e de outras atividades diárias.

6- Etiologia da dependência:

Tanto a nicotina quanto a acetilcolina interagem com os receptores enzimáticos colinérgicos do subtipo nicotínico. Eles estão presentes no sistema nervoso periférico, na junção neuromuscular e em diversas áreas do Sistema Nervoso Central. A nicotina age tanto como um agonista (ativador) quanto um antagonista (inibidor) desses receptores. A tolerância à nicotina é um efeito rapidamente atingido, isto é , assim que se começa a fumar, vai se necessitando de quantias maiores de nicotina para se conseguir o mesmo efeito inicial.

Os efeitos produtores de dependência de nicotina são modulados possivelmente pela dopamina. A nicotina também aumenta a liberação de norepinefrina, epinefrina e serotonina e esses aumentos modulam alguns dos efeitos de estímulo agradável da nicotina. Após atingir o Sistema Nervoso Central em menos de 15 segundos, a nicotina causa um pico de alterações no comportamento e no sistema cardiovascular dentro de poucos minutos. A nicotina é metabolizada pelo fígado e a sua meia vida é de cerca de 2 horas. Os níveis médios de nicotina tipicamente elevam-se pela manhã, atingem um patamar estável e mais elevado ao anoitecer e cai para níveis próximos a zero, durante a noite. Este padrão causa uma tolerância aguda, de tal forma que os primeiros cigarros do dia são mais potentes que os últimos cigarros.

A nicotina melhora o desempenho em tarefas de longa duração, fatigantes e de baixo poder motivador. Reduz raiva e estabiliza o humor. Reduz fome e a ingestão de alimentos e aumenta o ritmo metabólico. Quando um fumante experimenta esses efeitos, fica pouco claro o quanto deles resulta do combate à síndrome de abstinência, trazendo o fumante de volta à normalidade e quanto disto corresponde a um aumento real acima do normal como um efeito da própria nicotina. Alguns dos efeitos da nicotina relacionados ao aumento do desempenho parecem ocorrer independentemente do alívio da abstinência.

Tabela 1

Efeitos Neurofarmacológicos da Nicotina:

à Norepinefrina à Estimulação, Despertar

à Acetilcolina à Memória, Cognição

à Glutamato à Memória, Cognição

à GABA à Relaxamento, Tranqüilização

Nicotinaà Dopaminaà Prazer, Despertar

à Vasopressina à Aumento da Pressão Arterial, ação antidiurética

à ACTH à Aumenta Esteróides Adrenais

à Prolactina à Lactação

O uso da nicotina, como o da maioria das substâncias, começa por causa do reforço social. Mas, no decorrer das repetições das experiências, muitos jovens acreditam ser beneficiados pelo seu uso. Além do mais, assim que o quadro de dependência se instala, os períodos de abstinência parcial ou total passam a ser sentidos como desagradáveis.

As crianças que correm o maior risco de iniciar o uso são aquelas que têm uma grande necessidade de se conformarem, baixo desempenho acadêmico, comportamento rebelde, sintomas depressivos e reduzida auto-estima. Tanto influências de companheiros quanto a de familiares tendem a ser maiores. Déficit de atenção, transtorno de conduta e de uso de álcool e de drogas aumentam o risco de início e manutenção do uso de cigarros.

O uso do tabaco tem sido também associado a propensões genéticas, algumas dessas tendências são compartilhadas com o uso de álcool e outras são específicas do tabaco, mas, ainda falta uma comprovação mais clara desses mecanismos biológicos com impacto sobre o comportamento.

7- Diagnóstico e características clínicas:

Nos critérios diagnósticos norte americanos do DSM-IV, quanto aos transtornos relacionados à nicotina, temos classificados: Transtorno pelo Uso de Nicotina, Dependência de Nicotina, Transtorno Induzido pela Nicotina, quadro de Abstinência de Nicotina e Transtorno Relacionado ao Uso de Nicotina, não especificado de outra forma.

Para o diagnóstico da Dependência de Nicotina temos a constatação dos fenômenos de tolerância, isto é ausência de náusea, tontura etc. Também, confirma-se que a maioria dos fumantes ampliam o seu uso para 1 maço de cigarros por dia ou mais, em torno dos 25 anos de idade.

Em relação aos critérios para o diagnóstico de Síndrome de Abstinência de Nicotina, (A) precisamos de uma história de uso de nicotina pelo menos por diversas semanas, (B) daí sintomas pela cessação abrupta do uso da nicotina ou redução na quantia do uso de nicotina apresentando dentro de 24 horas um mínimo de 4 dos seguintes sinais: (1) humor disfórico (mau humor) ou deprimido, (2) insônia (aumento da freqüência dos despertares e intensa atividade onírica), (3) irritabilidade, frustração ou raiva, (4) ansiedade, (5) dificuldade para se concentrar, (6) inquietação, (7) ritmo cardíaco reduzido (redução de uma média de 8 batimentos por minuto), (8) aumento do apetite ou ganho de peso (em torno de 2 a 3 Kg de peso) (C) Além disto, os sintomas do critério (B) precisam causar perturbação ou prejuízo importante em uma das áreas: social, ocupacional ou outra área importante de desempenho. (D) Os sintomas não são devidos a uma condição médica geral e não são melhor explicados por um outro tipo de transtorno mental. É importante salientar que a maioria dos sintomas de abstinência chegam ao seu pico de intensidade de 1 a 3 dias após o início da interrupção do uso do tabaco, ainda, podendo durar de 3 a 4 semanas. No entanto, 40 % dos fumantes apresentam sintomas de abstinência que podem permanecer por mais de 4 semanas. Além disso, mais avidez (fissura) pela nicotina e ganho de peso podem persistir muitas vezes por 6 ou mais meses.

Há uma outra condição que se deriva da abstinência de outras substâncias químicas do tabaco que interferem com o metabolismo de outras substâncias. Relaciona-se com um aumento de concentração sangüínea de vários medicamentos, não ocorrendo elevação da concentração sangüínea de outros medicamentos ou de álcool. Finalmente, certos medicamentos são afetados em sua concentração sangüínea de forma ainda obscura. A ação de outras substâncias químicas do tabaco ativa as enzimas do citocromo P450 dos hepatócitos e leva à metabolização mais intensa de diversos medicamentos. Após a interrupção do tabaco, muitos desses medicamentos apresentam aumentos na concentração sangüínea entre 30 e 40%. Fumar e dependência por nicotina são 2 a 3 vezes mais prevalecentes em pacientes com transtorno do humor, outros quadros de dependência química e em diversos transtornos psiquiátricos. Os transtornos psiquiátricos por outro lado são 2 a 3 vezes mais comuns em fumantes ativos do que em não fumantes ou do que naqueles que abandonaram o hábito de fumar. As razões aventadas podem ser múltiplas, desde genéticas, ainda, por imitação do comportamento de outros e até devido à busca de compensação para desconforto emocional. No caso de adolescentes, portadores de ansiedade e depressão, existe uma correlação preditiva maior quanto ao se iniciar o uso de cigarros e quanto ao risco de se tornar dependente de nicotina. Há outras substâncias no tabaco que possuem uma ação inibidora sobre as enzimas que metabolizam as monamino oxidases cerebrais, IMAOA e principalmente a IMAOB; resultando em possível efeito antidepressivo. Pacientes psiquiátricos poderiam estar desfrutando de efeitos ansiolíticos, antidepressivos, anorexígenos (de reduzir o apetite) e de melhorar a concentração atribuíveis à nicotina. No entanto, fumantes tendem a aumentar o consumo de álcool e a ficar mais vulneráveis ao alcoolismo. Pacientes com uma história de depressão serão menos propensos a abandonar o cigarro e terão sintomas mais intensos de abstinência.

8- Diagnóstico diferencial:

Os sintomas de abstinência incluem acatisia (inquietação motora), ansiedade, depressão, irritabilidade, insônia e ganho de peso. Esses sintomas podem sugerir início, reinicio ou recrudescimento de transtornos psiquiátricos; é importante que haja acompanhamento especializado nessas situações.

9- Curso e prognóstico:

Eventualmente, em torno de metade dos fumantes cessa o hábito de fumar. Muitas tentativas são como uma regra geral feitas, até que haja o resultado de cessação do hábito. No entanto, devemos considerar que entre os fatores de motivação para a interrupção do hábito encontram-se as doenças causadas pelo tabagismo. O tabaco está sendo relacionado a cerca de 20% de todas as mortes que ocorrem atualmente nos EUA. Ou podemos olhar para o fato de 45% da população fumante desenvolver doenças fatais relacionadas ao tabagismo. Causa 90% de todas as mortes por câncer pulmonar, dobra o risco de mortes por doenças cardiovasculares ( hipertensão arterial e coronariopatia, aterosclerose etc.). Outros quadros graves incluem doença respiratória obstrutiva crônica (bronquite crônica e enfisema pulmonar), recém nascidos de baixo peso, complicações relacionadas ao parto e às primeiras semanas pós nascimento, carcinomas de garganta, mamas e de pâncreas, úlceras gastroduodenais etc. Os fumantes passivos desenvolvem com mais freqüência câncer e doença cardíaca, e no caso de crianças, apresentam elas maior incidência de problemas respiratórios e de ouvido. O alcatrão da fumaça do tabaco é responsável pelos carcinomas.

A intoxicação pela nicotina causa cólicas abdominais, tonturas, dores de cabeça, náusea, palidez, palpitações, suores, vômitos e fraqueza.

Tabagismo vem sendo associado ao dobro de ocorrência de demência pela doença de Alzheimer e está certamente associado a outros tipos de demência, em particular as secundárias aos acidentes vasculares cerebrais ( AVC).

10- Tratamento:

Todos pacientes devem ser avaliados quanto ao presente hábito de fumar, quanto à motivação para parar, também levando-se em consideração fatores motivadores (preocupações com a saúde, efeitos sobre fumantes passivos, pressão social etc.) e barreiras que impedem a interrupção do hábito ( medo de ganho de peso e receio de insucesso e do desconforto da interrupção). Quando o psiquiatra aconselha o paciente a parar, aumenta-se bastante o interesse do paciente em fazer uma tentativa. Calcula-se que o interesse espontâneo para interrupção imediata do uso ocorra em 1% dos usuários, contra 3% dos usuários pós aconselhamento médico.

Para os pacientes mais receptivos, uma data para interrupção abrupta ou para o início da interrupção gradativa poderá ser estabelecida. O paciente precisa ser apoiado durante a fase de retirada, reavaliado alguns dias após a data de interrupção, receber atenção psiquiátrica para possíveis reações indesejáveis.

Terapias psicológicas:

-Terapias comportamentais e terapias motivacionais (derivam-se estas últimas das abordagens existenciais) têm sido utilizadas para orientar pacientes na questão do êxito quanto à abstinência.

- Hipnose: para pacientes sob orientação especializada, este método é particularmente útil como um fator terapêutico em pacientes que encontram uma maior resistência em aceitar uma nova disciplina para vencer a dependência. Técnicas de auto-sugestão podem ser úteis e podem também se derivar da orientação dentro do programa de retirada.

Terapias psicofarmacológicas:

Uso de um ou vários de métodos em associação:

a- Deve-se calcular dose de substituição para minimizar riscos, más reações ocorrem se houver uso da reposição com altas doses de nicotina.

b - Bons efeitos devem compensar possíveis efeitos colaterais das medicações antidepressivas: agitação, sonolência, dirigir automóvel, reações indesejáveis potencializadas pelo uso de álcool, ou problemas especiais como ação sobre o desenvolvimento fetal no caso de gravidez; etc.

c - O tratamento psiquiátrico pode incluir medicação antidepressiva, adesivos de nicotina e sessões de orientação.

d- Há necessidade de retornos ao consultório psiquiátrico para acompanhamento e manutenção.

Terapias de reposição de nicotina:

Nota explicativa: A reposição de nicotina significa que, ao invés de ser inalada através da fumaça do cigarro, a nicotina passa a ser introduzida dentro do organismo por outra via de entrada. O veículo, por sua vez, pode ser goma de mascar, "spray", adesivo ("patch"), comprimido sublingual, etc. Todos os métodos de reposição de nicotina dobram os índices de interrupção do hábito, por reduzirem a intensidade da síndrome de abstinência. Esses métodos devem ser usados em pacientes hospitalizados que apresentariam de outra forma muito desconforto com a retirada do cigarro. A terapia de reposição deve ter uma duração curta; de seis a 12 semanas e é freqüentemente seguida por um período de redução gradual até a interrupção final, período de retirada que dura ainda de 6 a 12 semanas. Através deste método, também, controla-se melhor a dependência psicológica do cigarro, por criar-se comportamentos de substituição. No programa de reposição, os níveis de nicotina no sangue venoso tendem a ser a metade ou um terço dos níveis obtidos no intervalo entre o consumo de dois cigarros. No caso dos "sprays" nasais, os níveis sangüíneos se aproximam dos níveis obtidos pelo fumar cigarros; este é um método reservado para o tratamento inicial do tabagismo severo.

a - ADESIVOS (EMPLASTRO OU PATCH) DE NICOTINA: embora evitam a inalação do alcatrão, introduzem a nicotina diretamente no organismo por absorção epidérmica, podendo acarretar altas doses desta substância na corrente sangüínea.

Efeitos adversos: recomenda-se cautela especial no caso de pacientes fazendo uso de pílula anticoncepcional ou com problemas cardiovasculares, obesidade, hipercolesterolemia, diabetes e hipertensão, além de mulheres grávidas ou lactantes. No entanto, os adesivos são imensamente mais desejáveis do que continuar inalando os milhares de ingredientes da fumaça do cigarro. No caso dos adesivos, limita-se a exposição apenas à nicotina.

Efeitos tóxicos e complicações, incluindo-se dosagem excessiva nos pacientes sem acompanhamento médico, principalmente nos que voltam a fumar juntamente com o uso do adesivo.

Palpitações, tonturas ou problemas de alergia cutânea no local da colocação, (rigoroso acompanhamento médico para monitorar a redução progressiva da porcentagem de nicotina do adesivo). Freqüentemente, ocorre síndrome de abstinência após a retirada do adesivo.

b - COMPRIMIDOS SUBLINGUAIS: comprimidos contendo nicotina para uso sublingual, sendo esta absorvida pelas mucosas orais. Este método enfrenta os mesmos inconvenientes de qualquer tipo de reposição de nicotina, seja através de goma de mascar, adesivo, etc.

c- - Gomas de mascar, pastilhas, e "spray" nasal: são outras apresentações contendo nicotina: evitam a inalação do alcatrão, o fumante pode aos poucos controlar a sua dependência da nicotina.

Maneiras de Interromper ( Fumantes podem escolher uma das maneiras abaixo):

Interrupção Súbita: Caracteriza-se pela suspensão total do cigarro em uma data pré determinada . Elimina-se então nesta data todo o consumo de cigarros. O uso de adesivos ou de outras apresentações de reposição de nicotina poderá ser introduzido imediatamente após a interrupção dos cigarros..
Interrupção Progressiva: Este programa de redução pode durar em torno de uma semana . Reposição de nicotina só deve ser iniciada após a interrupção total dos cigarros.

Medicamentos que ajudam na abstinência:

ANTI-DEPRESSIVOS:

O tratamento com medicamentos antidepressivos tem se mostrado bastante útil na experiência clínica ao longo dos anos, a ação tem sido no sentido de se reduzir a avidez (fissura) pela nicotina.

No entanto, seria interessante se ter mais confirmações em estudos mais amplos, usando-se metodologia de comparar a especificidade das várias opções farmacológicas.

O FDA aprovou o "primeiro agente de cessação do hábito de fumar sem nicotina". — uma apresentação de liberação lenta do Zyban (bupropion). O estudo incluiu 615 fumantes que tomaram ou um placebo ou uma de três diferentes doses de Zyban diariamente. Após 7 semanas, somente, 19 por cento daqueles no grupo placebo estavam abstinentes, comparados com 44 por cento daqueles que tomaram 300 mg de Zyban, 39 por cento dos que tomaram 150 mg e 29 por cento do grupo de 100 mg

Com o uso de bupropion durante 7 semanas, associado a um programa de orientação e de apoio básico padronizado, pode-se conseguir até 23% dos pacientes em abstinência decorridos um ano, contra cerca de 10% de abstinência decorridos 1 ano do grupo controle que só teve o programa de orientação e apoio básico.

 

O bupropion, apesar de relativamente seguro quando bem usado, tem efeitos adversos importantes quando o uso é mal controlado (crises convulsivas dose-dependentes, exacerbação de quadros psicóticos, aumento da ansiedade, agitação e disforia, náusea, insônia, risco aumentado de convulsões para portadores de comorbidades como anorexia nervosa e bulimia, etc.), sendo aconselhado que o manejo do tratamento seja feito por profissional experiente e competente, para minimizar a possibilidade da ocorrência de iatrogenias.

O Bupropion tem como nomes comerciais nos EUA: "Zyban" ou "Welbutrim". Os anti-depressivos já foram às vezes administrados durante ou após o tratamento anti-tabágico, por seus efeitos atenuantes sobre alguns dos sintomas da síndrome de abstinência da nicotina ou de outros tipos de drogas. Recentemente renomeada Zyban com o objetivo de tratar fumantes, está sendo receitado, no início, ou antes do tratamento, associando-se posteriormente ao uso do adesivo (patch) de nicotina e seções psiquiátricas de apoio. Limitações do uso: evita-se usar o bupropion em portadores de história de convulsões, anorexia ou bulimia.

b - Nortriptilina: nome genérico de "Pamelor" ou "Aventil": este medicamento tem sido usado nos últimos trinta anos no tratamento de quadros depressivos ou de certos transtornos neurovegetativos. Com a nova geração de substâncias anti-depressivas, esses medicamentos antigos estão sendo resgatados para o tratamento do tabagismo.

Abordagem terapêutica biopsicossocial ( dimensões psicológicas, sociais, bioquímicas e farmacológicas)

TRATAMENTO COMBINADO:

a) O controle da síndrome de abstinência com a substituição do cigarro pelos adesivos dérmicos e gomas de nicotina para mascar; b) o uso do bupropion ou de um outro anti-depressivo para reduzir o impulso de fumar, via interferência com o estímulo da nicotina nos tratos dopamínicos projetados da área tegumentar ventral para o sistema límbico e o córtex cerebral; e c) um programa afetivo-cognitivo associado, que usa uma combinação de instrução para se identificar e evitar as situações desencadeadoras da vontade de fumar, mantendo-se em mente o desconforto de falhar em controlar a abstinência, e também o reconhecimento que a decisão de voltar a fumar é mediada por múltiplas decisões intermediárias. Além disto há necessidade de ter um sistema de avaliação contínua do sucesso para se manter sempre encorajado. (Nos últimos anos, apoio de conselheiros ex-fumantes tem se tornado uma experiência que deve ser melhor avaliada quanto ao impacto sobre a decisão de parar)

Há os que defendem que o sucesso da combinação dos três métodos chegue a 60 por cento de fumantes recuperados e que se sustêm recuperados, e que esta taxa de sucesso só seja atingida pela combinação de todos os três métodos (itens: a, b, c). Estudos longitudinais precisam ser realizados para conferir a validade da recuperação ao longo do tempo.

Do ponto de vista pragmático, todos os fumantes deveriam continuar fazendo tentativas para interromper o uso de cigarros, sejam elas por conta própria, ingressando em grupos de auto ajuda, seja com orientação psiquiátrica, seguindo um programa de apoio especializado. O importante é continuar tentando, apesar de fracassos repetitivos. Uma aparente derrota em tentativas de abstinência sempre acrescenta um entendimento maior sobre como finalmente triunfar sobre a dependência química.

Terapias de interesse histórico ou que necessitam ser melhor confirmadas, citações:

- Auriculoterapia: especialidade da acupuntura que se utiliza dos pontos de acupuntura localizados no pavilhão da orelha (cerca de 200). Alguns programas clamam que o método é bastante eficiente e necessita de poucas aplicações.

- Piteiras: limitam a aspiração do alcatrão do cigarro, não evitando a entrada da nicotina.

- Bochechos de uma diluição fraca de "nitrato de prata": alteram o paladar e sua reação à fumaça do cigarro.

- Cigarros de baixos teores ou gadgets (utensílios para o uso de cigarros de comprimento reduzido ou se utiliza micro-furos para aumentar a entrada de ar): diminui-se a quantia aspirada de nicotina e alcatrão, no entanto alguns pacientes podem vir a fumar um número maior de cigarros por dia, para compensar a redução do produto aspirado.

- Outros métodos auxiliares (alarme que soa após um período de tempo limite entre dois cigarros)

- Acupuntura tradicional através de repetidas aplicações semanais de agulhas, durante 4 a 6 semanas.

- Raio laser ou infravermelho: necessitando freqüentemente de aplicações de reforço.

DEPOIMENTO DE UM EX-FUMANTE:

"Como eu finalmente abandonei o hábito? Aprendi algumas lições de minhas primeiras 2 tentativas. Uma foi que não deveria beber bebidas alcoólicas enquanto tentava parar, nem despender tempo com fumantes que não me concediam apoio para o meu esforço. Também encontrei outras maneiras de reduzir estresse. Então me 1965, o Surgeon General emitiu sua advertência a respeito dos perigos do fumar. Logo após, minha mãe e um tio, ambos fumantes, sofreram ataque cardíaco. Aí, eu concluí que já era tempo. Embora tenha parado sozinho, como fazem as pessoas de um modo geral, recomendo que fumantes entrem para um grupo de apoio ( o que se oferece em centros médicos e em clínicas comunitárias), enquanto continuem a usar condutas para cessar o hábito de fumar. Apoio profissional e dicas de um coordenador de grupo de apoio, juntamente com contato regular e reforço positivo dado por outras pessoas que estão se esforçando para interromper o hábito, tudo isto pode aumentar sua chance de sucesso. Harry Greene, MD (EUA)"

Tratamento no caso de populações especiais:

No caso de pacientes gravidas é preferível usar-se apenas método psicoterápico e de orientação nesta fase. Neste caso, a motivação da paciente para o tratamento tende a estar mais vivamente presente. Adesivos de nicotina são preferíveis à continuação do consumo de cigarros durante a gravidez.

Pacientes psiquiátricos devem ser encorajados e assistidos no período de abstinência. Espera-se deles mais desconforto no período de retirada.

11- Prevenção, novas atitudes do Ministério da Saúde (Brasil):

ADVERTÊNCIA MAIS DIRETA E COMUNICANDO VERDADES SEM DUPLICIDADE:

Com frases mais fortes e incisivas, o Ministério da Saúde está intensificando a campanha contra o tabagismo. Recente portaria institui novas advertências, que dispensam o tom condicional (implícito na palavra pode) das anteriores. Agora, o Ministério adverte:

- Fumar causa impotência sexual;
- Fumar causa câncer de pulm&atildde;o;
- Fumar provoca infarto do coraç&ão;
- A nicotina é droga e causa depeendência;
- Crianças começam a fumarr ao verem os adultos fumando.

MÉTODOS DE PREVENÇÃO PRIMÁRIA de uso inadequado ou abuso de substâncias precisam ter como meta sempre incluir o tabagismo como uma das dependências químicas a serem enfocadas principalmente entre crianças e adolescentes. Isto deve ocorrer tanto em programas dirigidos para mudar atitudes dos pais (Método Prover, 1997) quanto em programas escolares de prevenção orientados para crianças e adolescentes (visa-se reduzir a demanda). Do ponto de vista governamental, o impedimento de propaganda favorável ao consumo de produtos do tabaco (redução da demanda) e a restrição da venda para crianças e adolescentes poderão ter um efeito importante como medidas preventivas (redução do suprimento).

Tabela 3-

O dilema da Prevenção quanto ao tabagismo:

Reduzindo-se o acesso de jovens ao tabaco, previne-se ou atrasa-se o início do uso ?

Redução do suprimento versus redução da demanda.

Confirmam-se programas de prevenção primária* como sendo realmente bem efetivos.

No entanto, precisa-se da vontade desperta da comunidade para implementá-los.

*Estudo de Longo Termo mostra que prevenção funciona:

O acompanhamento de resultados por seis anos (1992 a 1997) pelo " Institute for Prevention Research at Cornell University Medical College" provê importante nova evidencia que funcionam bem os programas de prevenção de abuso de drogas conduzidos nas salas de aula. Em estudo de larga escala envolvendo cerca de 6,000 estudantes de 58 escolas no estado de New York , estudantes que receberam um programa de prevenção baseado em habilidades para a vida (Life skills) em "junior high school" apresentaram chances significativamente menores (em torno de 60% mais baixas em comparação com os resultados do grupo controle) de fumar, beber e de usar maconha ao final da " high school"**.

** ensino de 2º grau (início e conclusão).

Dr. Silvio Saidemberg é professor de psiquiatria da FCM da PUC Campinas.

E-mail: ssaidemb@yahoo.com

Algumas Referências Bibliográficas:

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