RETRATOS

Um homem atravessou a rua, entrou no edifício. O porteiro falou: doutor, não...ele acenou com a cabeça, pegou o elevador, saiu no oitavo andar, retirou as chaves do bolso, abriu a porta. Parecia não saber onde estava, mão invisível empurrou - o até o baú. Levantou a tampa pesada com esforço, viu os álbuns, apanhou um sem hesitar, o mais envelhecido, capa retorcida, o colocou numa mesa, sentou - se na cadeira, um gemido quase mudo. Abriu...relíquias sagrada, pensou, examinou os retratos...revelam verdades ocultas... olhar intenso observou o menor detalhe, a sombra mais insignificante, não queria perder nada; o pai ,severo, óculos sem aro... uma data, 1920...nem uma única lágrima na morte dele, meses mais tarde desco esforço, viu os álbuns, apanhou um sem hesitar, o mais envelhecido, capa retorcida, o colocou numa mesa, sentou - se na cadeira, um gemido quase mudo. Abriu... olhar intenso observou o menor detalhe, a sombra mais insignificante, não queria perder nada; o pai ,severo, óculos sem aro... uma data, 1920...nem uma únic olhar intenso observou olhar in olhar intenso observou o menor detalhe, a sombra mais i olhar intenso observou o menor detalhe, a sombra mais insignificante, não queria...nada aconteceu, nem no ano seguinte, nem no outro, nem no outro...mas ele sempre se lembrava daquela data, não que esperasse um milagre, se apegara à lembrança, sou mãe uma data. Virou uma pagina, a guarnição do oito da Estrela Solitária, nove remadores e um patrão, cinco já falecidos, as reuniões anuais esquecidas há muito,,, onde estarão os outros?...fato após foto, filhos, netos, misturadas sem cronologia, a desordem do amor descontraído, nada de novo a acrescentar, preenchimento de lacunas da memória, confirmação de tristes saudades...estou suspenso no vazio , revejo minha vida, o que ocorreu ontem acontecerá hoje? amanhã? daqui instantes? prolongará a vida? adiará a morte? Agora apenas um solitário ou um sábio a descobrir o sentido da existência, isolado , sem enxergar - se , não visto por outros...me isolei demais, quando presente repelia carinhos, abusava do jocoso, não soube...não quis exigir carinho dela, dos filhos, dos netos, um senil precoce, eles emitiam sinais...ele não respondia, correspondia, ao tentar sentia - se tolo...tolo ainda agora,,, sentia...impossível penetrar a solidão de alguém, ela, os filhos sabem da minha solidão? estar só diante da morte...retirou do bolso uma carteira, retratos amassados, olhou - os como quando num avião perdido numa tempestade...amor e morte, relação direta ou indireta? Assustou - se com o irracional, caminhava em círculos, deixou - se ficar perdido...caminho para o inferno, inferno é a memória...o retrato dela, de camisola à beira de uma janela, lua de mel, bela como uma potranca selvagem, enganou - a tantas vezes...perdão, perdão! adianta?...quando um homem desposa uma mulher, seus pecados são enterrados pois é dito: quem encontra uma esposa encontra algo precioso e recebe um favor do Senhor... palavras ouvidas, lidas? ela se casaria de novo com ele? a filha quando nasceu ele havia declarado : ela será uma rainha ! os filhos, parecidos demais com ele...orgulho ou medo? guardou a carteira, olhou ao seu redor, tudo mudado...quem fez isso?...vagando em seu próprio interior, perdido...estou à beira do oculto...suspirou, aspirou? Sua vida uma esfera oca , tentou apanhar de novo o álbum, desistiu. Ainda haveria futuro para ele? o passado foi irreal? Qualquer que fosse a resposta, tudo não passaria de uma fuga do presente, fantasmas em demasia . Criara o hábito de contar mortos, talvez sua maneira de render - lhes homenagens já que não ia aos enterros , às missas, escolheria um deles e faria sua prece particular...quem o escolhido? sua risada encheu a sala, ele nem se lembrava da data de nascimento dos seus, como saberia da data do falecimento de outros? estremeceu, levantou - se, caminhou até o quarto ...meu mundo está aqui...olhou as quatro paredes, tentou ver nelas imagens , cada parede pedaço de sua vida...minhas primeiras lembranças aos quatro anos...ocorreu - lhe que embora vivo esteve morto durante seus primeiros quatro anos...mais nove meses...subtraiu, dividiu, não conseguiu um número exato, desistiu. Mas a memória estava lá, voz que fala, zomba dele...brigar com ela, tentar destorcer fatos? mandar ela parar, retornar à desmemoria?...imagens (fotos) surgiram no espaço, rapidez estonteante, continua transformação, sombra uma da outra...o que estou vendo de fato? não estou mais no presente...fechou a porta...meu mundo finda naquela porta...deitou - se na cama, arrepios...se alguém sente arrepios mas não pede socorro, não diz nada, como podem saber que...

Mulher se aproxima, olha:

– É o antigo dono, morou quarenta anos aqui, esqueceu o baú...

Garota saltita:

– ... um morto na cama da mamãe, um morto, um morto, um morto...