Tempos Românticos
por Fabrício Augusto Souza Gomes
"O Romance foi, a partir do Romantismo, um excelente índice dos interesses da sociedade culta e semi-culta do Ocidente. A sua relevância no Século XIX se compara, hoje, à do Cinema e da Televisão."
Alfredo Bosi
A urbanização da cidade do Rio de Janeiro, agora transformada em Corte, criando uma sociedade consumidora representada pela aristocracia rural, profissionais liberais e jovens estudantes, todos em busca de entretenimento; O espírito nacionalista a exigir uma "cor local" para os romances, e não a mera importação ou tradução de obras estrangeiras; O jornalismo vivendo seu primeiro grande impulso e a divulgação em massa de folhetins; O avanço do teatro nacional Esses são alguns dos fatos que explicam o aparecimento e o desenvolvimento do romance no Brasil.Em 1838, tendo como modelo o Institut Historique fundado em Paris, em 1834, por alguns intelectuais franceses, entre eles, Monglave e Debret -, forma-se o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB), congregando a elite econômica e literária do Rio de Janeiro. Poucos sabiam de imediato, mas era justamente esse mesmo recinto que abrigaria, a partir de 1840, os românticos brasileiros, quando o jovem Imperador D. Pedro II se tornaria assíduo frequentador e incentivador, com a maioridade, dos trabalhos desta instituição.
Uma monarquia encravada bem dentro do continente americano gerava desconfianças. Internamente, era preciso criar uma identidade. Ainda no Primeiro Reinado de D. Pedro I foram fundadas duas faculdades de Direito no país (1827) uma em Olinda e outra em São Paulo. As escolas de medicina reformularam-se em 1830 e era preciso criar um estabelecimento dedicado às letras brasileiras. E cumprindo esse objetivo, foi fundado então o IHGB.
Aos poucos, o Brasil ganhava autonomia cultural.
Em 1838, o Imperador Pedro II recebe o convite para ser "protetor" do IHGB convite logo aceito. No ano seguinte, o jovem monarca retribui a gentileza e cede uma das salas do Paço Imperial para reuniões semanais.
Essas reuniões eram compostas em sua maior parte, pela "boa elite" da Corte e de alguns literatos selecionados, que se encontravam sempre aos domingos e debatiam temas previamente selecionados. Por meio do financiamento direto, do incentivo ou do auxílio a poetas, músicos, pintores e cientistas, Pedro II tomava parte de um grande projeto que implicava, além do fortalecimento da monarquia e do Estado, a própria unificação nacional, que também seria obrigatoriamente cultural.
Em 1849, o Imperador propõe o debate "O Estudo e a Imitação dos Poetas Românticos promove ou impede o Desenvolvimento da Poesia Nacional?". Era preciso criar uma historiografia para um país tão recente como o nosso. A proteção às letras era o mais valioso atributo e a jóia mais preciosa da Coroa dos príncipes. Por ela se fizeram grandes Luís XIV, na França, e os Médici, na Itália, quando acolhiam as Ciências e as Artes que escapavam das ruínas do Império Grego.
Destarte, o Romantismo aparecia como o caminho favorável a expressão própria da nação recém-fundada, pois fornecia concepções que permitiam afirmar a universalidade, mas também o particularismo, e portanto, a identidade, em contraste com a Metrópole, mais associada nesse contexto à Tradição Clássica.
Em 1826, muito antes da criação do IHGB, Ferdinand Denis e Almeida Garret chamam a atenção para a necessidade de substituição dos motivos clássicos e convenções, em favor do aproveitamento das características locais, na concentração da descrição de sua natureza e costumes, realçando o índio, habitante primitivo mais autêntico.
Um grupo de jovens brasileiros residentes em Paris, entre 1832 e 1838, publicam aqui os dois únicos números da revista Niterói, um marco do Romantismo brasileiro. A revista tinha o tema "Tudo pelo Brasil e para o Brasil" e buscava a exaltação das originalidades locais.
O grupo vinculado a Pedro II era formado por Domingos José Gonçalves de Magalhães, Manuel de Araújo Porto Alegre, Joaquim Manuel de Macedo, Gonçalves Dias, Francisco Adolfo Varnhagen e Cândido de Araújo Viana, que posteriormente viria a ser o Marquês de Sapucaí.
Sob influência deste mesmo grupo, Pedro II propôs a criação de gramáticas e dicionários e começou a estudar o tupi e o guarani (que lhe foram muito úteis durante a Guerra do Paraguai, na década de 60).
Em 1856, Gonçalves de Magalhães publica a Confederação dos Tamoios. A brava nação tamoio luta pela liberdade contra os agressores portugueses (esses sim, selvagens e aventureiros). Tibiriçá, índio converso da tribo Guaianá, tenta convencer seu sobrinho rebelado, Jagoanharo, das vantagens do mundo civilizado. Após a conversa, é Jagoanharo quem tem um sonho divinatório, em que prevê em pleno Século XVI, a chegada da Família Real, a Independência, o Império, a Guerra na região do Prata e, por fim, o reino do justo monarca Pedro II.
Considerado o grande autor romântico brasileiro, Gonçalves Dias trouxe o indianismo para a poesia. Criou uma poética dedicada a formação do país: terra virgem, intocada até os primeiros contatos com a civilização. Em seu romance Juca Pirama I, Gonçalves Dias traz para o Brasil o modelo do canibalismo heróico, expresso nos recintos literários dos institutos cariocas: um bravo guerreiro é feito prisioneiro pelos Timbiras, o qual espera por sua morte, mas teme pela sorte do pai velho, fraco e cego -, a quem servia como guia. Diante do choro do jovem tupi, os Timbiras o soltam não se mata e come um covarde. O encontro com o pai é marcado pela decepção: o velho tupi lamenta a fraqueza do filho e o maldiz. É então com o espírito incorruptível que o jovem guerreiro se afasta do pai e resolve provar sua bravura, enfrentando sozinho os Timbiras. Estes, reconhecendo o valor do tupi, concedem-lhe o sacrifício da morte em terreiro. Então, pai e filho se reconciliam.
Iracema, "a bela virgem dos lábios de mel" aparece retratada em meio a um paraíso mitificado, nesse caso, o cenário intocado do Nordeste do início do Século XVII. Representa o nascimento do Brasil, consequência do sacrifício indígena. Martim e Iracema são os primeiros habitantes do Ceará, e de sua união resultará uma nova e predestinada raça. Mas Iracema morre para que seu rebento Moacir (o "filho do sofrimento") viva. Martim deixa as praias do Ceará para fundar centros cristãos. A partir de então, todos deveriam Ter um só Deus, um só coração.
O indianismo enobreceu os indígenas, não só de títulos, mas de gestos e ações.
O Guarani, de José de Alencar, se passa em pleno Século XVII, às margens do rio Paraíba. Peri é a própria representação do bom selvagem Rousseauniano: forte, livre como o vento, fiel e correto em suas ações. Ele proteje a família do fidalgo português D. Antônio de Mariz (pai de Ceci) do ataque dos bravos Aimorés. Ajuda a desvendar as artimanhas do malvado Loredano, aventureiro que só queria as riquezas da família e a beleza de Ceci. Por fim, em meio a seus amores platônicos, Peri e Ceci são levados pela torrente de um rio.
Em 1870, já transformado em ópera, O Guarani estréia no Scala de Milão, sob a regência do maestro Antônio Carlos Gomes, com cenários que misturavam a clássica Europa com as curvas do Pão de Açúcar.
Alguns anos antes, em 1853, a figura indígena já era amplamente divulgada: índios apareciam em propagandas de produtos da Corte.
Muito tempo antes, em 1816, uma missão francesa chega ao Brasil, com o intuito de aqui fundar uma Academia de Artes. Somente dez anos depois a escola funciona, mesmo assim, com muitas dificuldades econômicas. Somente no Segundo Reinado é que a Academia se estabiliza, graças aos auxílios públicos e privados do monarca. O Imperador distribui prêmios, medalhas, bolsas de estudos para o exterior e financiamentos.
A Academia Imperial de Belas Artes foi a grande responsável pela transformação que vai se evidenciando: o Barroco é relegado a segundo plano e o neoclassicismo passa a imperar, sobretudo na Corte e em algumas capitais. Durante o período colonial, o Barroco se impôs como gênero, e teve nas corporações e nos escravos artistas relevantes. Ao mesmo tempo, mudou padrões, estilos e técnicas.
Na literatura e na pintura, os índios idealizados "nunca foram tão brancos", assim como o monarca e a literatura brasileira se tornaram mais e mais tropicais.
O indianismo saltou dos romances e das telas, ganhou a iconografia política e até os anúncios de jornais para se tornar um modismo que atacou muitas famílias "patrióticas" brasileiras, levando-as a trocar seus nomes lusitanos tradicionais Sousa, Pereira, Almeida e Oliveira por outros de clara inspiração indígena: Caramuru, Acaiaba, Tibiriçá, Periassu, entre outros.
As o Romantismo brasileiro não apenas exaltou o amor à pátria: foi "romântico" pela própria concepção da palavra.
Apesar da corrente antilusitana ganhar novos adeptos, afirmando um conteúdo literário mais brasileiro, o nacionalismo já não era característico da Segunda Geração dos poetas românticos. Influenciados sobretudos por Lorde Byron e Musset, os poetas românticos brasileiros enfatizam o subjetivismo, o pessimismo, a morbidez, a melancolia, o saudosismo e a temática da morte, contagiados pelo "mal-do-século" o Amor.
Um gênio, muito a frente de seu tempo não teve o público que merecia: Joaquim de Sousa Andrade ou Sousândrade. Com uma aguçada visão crítica, fugiu dos lacrimatórios e dos estereótipos dos seus contemporâneos. Revolucionou a linguagem poética, adiantando-se em alguns aspectos ao Simbolismo, ao Modernismo e a alguns movimentos de vanguarda do nosso século, numa época em que a crítica não tinha instrumentos para compreender a sua obra.
A partir de 1860 processa-se uma profunda renovação da poesia romântica, como consequência de uma nova agitação político-social, proveniente do declínio da monarquia e do conflito entre os interesses dos proprietários de terras e do resto da população.
Acentua-se o espírito nacionalista, difundem-se idéias liberais, aspirações democráticas e antiescravagistas. Castro Alves foi o maior exponente da Fase Condoreira do Romantismo. Distanciando-se do extremado individualismo dos ultra-românticos, deu à sua poesia um sentido social e revolucionário, deixando-nos também uma obra lírica em que ora realiza excepcionais descrições da natureza brasileira, ora nos apresenta as relações amorosas de maneira viril, sensual e objetiva.
Temas abolicionistas e de libertação dos povos; Apresentação e incorporação do negro na literatura como herói, um ser profundamente dignificado e humanizado, amoroso, ativo, sofredor, esperançoso, oprimido e lutador: é a poesia condoreira influenciada por Victor Hugo e Lamartine, que tem como símbolo o Condor dos Andes, o albatroz e a águia. O Condoreirismo fecha com chave de ouro uma Era Romântica, que muito pode-se orgulhar nosso país.
Se um dia já existiram Tempos Românticos, como será além do ano 2000? Onde estará o Romantismo, não só literário, mas artístico, musical, e pessoal? Que os Tempos Românticos nunca nos abandone, porque a lembrança deles nos resgata a um passado bonito e que sempre estará presente em nossas memórias.
DESENVOLVIMENTO DO ENREDO:
COMISSÃO-DE-FRENTE "Valsa da Coroação"
Nobres da Corte saúdam e festejam a Coroação do Imperador Pedro II. Sete Casais mascarados valsam românticamente, vestindo trajes do Século XIX. Fantasia com CORES LILÁS, BRANCO e VERDE, com detalhes em DOURADO.
PRIMEIRO CARRO: ABRE-ALAS "Liberteé, Fraterniteé, Igualiteé"
O Romantismo chega ao Brasil, baseado nos ideais de Liberdade, Igualdade e Fraternidade. O carro lembra as batalhas da Reviolução Francesa. Os componentes do carro fazem coreografia ensaiada, com motivos de luta entre camponeses, militares e nobres da Corte. PREDOMÍNIO DE CORES: ROSA, LILÁS e DOURADO.
Ala 1 "Baianas" Anunciação do Brasil Romântico COR: ROSA CLARO (Obs: as baianas seguram clarins que anunciam a chegada do novo estilo);
Ala 2 "Crianças" A pátria engatinha num novo estilo COR : AZUL CLARO (BEBÊ);
Ala 3 "Damas" Coragem e fertilidade Românticas COR VERMELHO E OURO.
SEGUNDO CARRO: "Criação do IGHB"
Em 1838, sob inspiração do Institut Historique fundado em Paris, em 1834, por alguns intelectuais franceses, entre eles, Monglave e Debret -, forma-se o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB), formado pela Elite Intelectual brasileira.
Ala 4 "A Corte é intelectualizada" Interesse por invenções, estudos e projetos culturais. COR: VERDE E AMARELO OURO;
Ala 5 "Revista Niterói" A Elite Intelectual COR: VERDE E BRANCO
Ala de Passistas: "De Colônia a Metrópole Romântica"
TERCEIRO CARRO: "Pensionistas do Imperador"
D. Pedro II estrutura e financia um grupo de intelectuais que têm por objetivo implantar um grande projeto nacional romântico em nosso país.
Ala 6 "Leituras no Paço Imperial" Grupos literários se reúnem todos os domingos COR: VERDE ÁGUA E AZUL;
Ala 7 "Mecenato Artístico" O Imperador financia as Artes no Brasil COR: VERMELHO E OURO;
Ala 8 "Academia Imperial de Belas-Artes" Pintores e Escultores do Segundo Reinado COR: VERMELHO, VERDE, AMARELO E AZUL.
QUARTO CARRO: "Orgulho Indígena"
O Brasil é indianista e o índio Rousseauniano encarna a figura dos heróis e cavaleiros medievais europeus: o mito do bom selvagem é onipresente.
Ala 9 "Confederação dos Tamoios" O índio luta por sua terra e seus direitos COR: MARROM, VERDE E DOURADO;
Ala 10 "Juca Pirama I" A coragem e dignidade tupi COR: MARROM, VERDE E DOURADO;
Ala 11 "Iracema" Iracema, Martim e a Lenda da Povoação do Ceará COR: DOURADO
QUINTO CARRO: "O Guarani" (Ópera no Scala de Milão);
A obra do maestro Carlos Gomes é encenada no Scala de Milão (Itália) numa ópera de sucesso arrebatador, num cenário que mistura, ao fundo, as paisagens européias com a beleza do Pão de Açúcar do Rio de Janeiro Simboliza o encontro do Novo e Velho Mundo.
Ala 12 - "Peri e Ceci" Os personagens da obra de José de Alencar - COR: MARROM, VERMELHO E AMARELO;
Ala 13 "Notas Musicais" A música rômantica orquestrada por Carlos Gomes - COR: PRETO E BRANCO;
MESTRE-SALA E PORTA-BANDEIRA FANTASIA: "PERI E CECI" COR: VERDE, BRANCO E AZUL;
BATERIA: "Orquestra do Maestro" (fantasiados com a imensa cabeleira e bigode do maestro Carlos Gomes) COR: PRETO, BRANCO E CINZA (terno e gravata da época)
Carro de Som Com intérpretes, ritmistas e compositores da escola, fantasiados de Carlos Gomes (a sua imagem e semelhança terno e gravata da epoca)
Ala 14 "Laços Românticos Brasil e Itália" Carlos Gomes casa-se com uma italiana e vai morar na Itália, vindo esporadicamente visitar o Brasil COR: VERMELHO, VERDE E BRANCO
SEXTO CARRO: "Mal-do-Século"
Inspirados em Byron e Musset, a Segunda Fase Romântica tem como características o lamento pelos amores perdidos e impossíveis, a morbidez e a tristeza de suas obras leva à boemia e dor-de-cotovelo dos autores românticos.
Ala 15 "Inspiração em Byron e Musset" Lorde Byron e Musset: A influência européia COR: AZUL, VERMELHO E BRANCO;
Ala 16 "Boemia e Dor-de-Cotovelo" Bares e Botequins acolhem os escritores românticos - COR : VERMELHO E LILÁS;
Ala 17 "Desespero e Morte" A saída para as decepções amorosas - COR: PRETO
SÉTIMO CARRO: "Condoreirismo"
Deixando para trás o nacionalismo e a tristeza, a Terceira Fase romântica traz à tona a luta pelos ideais de liberdade, cujo autor principal foi o baiano Castro Alves.
Ala 18 "Albatrozes Andinos" O Albatroz é a ave que simboliza a Terceira Fase Romântica COR: BRANCO;
Ala 19 "Sublime Pergaminho" José do Patrocínio representou como ninguém o ideal pelo fim da escravatura COR: AZUL E BRANCO;
Ala 20 "Libertação dos Escravos" O Negro é Livre COR: BRANCO;
OITAVO CARRO: "Brasil Romântico: Utopia ou Realidade?" Destaques: Baluartes de diversas escolas de samba: D. Zica, D. Neuma, Delegado, Monarco, Carlos Cachaça, Jamelão, João Nogueira, Paulinho da Viola, Jorginho do Império, Moreira da Silva, Dona Ivonne Lara, Beth Carvalho, Alcione, Zé Keti, Velha Guarda de todas as escolas de samba e todos aqueles que representam os tempos românticos do Carnaval.
Os baluartes do samba convidam a Marquês de Sapucaí a uma reflexão: para onde foram os tempos românticos? Será que ainda existe Romantismo no Brasil? Venha relembrar o Romantismo do samba com a gente.
Ala 21 "O Romantismo do Século XX" Cartas de Amor para corações inflamados COR: VERMELHO EM TONS PASTÉIS;
Ala 22 "Morte ou Renascimento" A Velha-Guarda questiona se os tempos românticos acabaram COR: VERMELHO E BRANCO e LILÁS, EM TONS PASTÉIS Momento Celestial;
Ala 23 "Do pergaminho ao E-mail" O Século XXI anuncia o romantismo eletrônico fim dos tempos ou início de uma nova era? Crianças com computadores na cabeça e coração pulsante no peito COR: VERMELHO, BRANCO E OURO.
FIM DO DESFILE