Sonetos

Camões


Cantor dos desconcertos do mundo

    Camões é o maior poeta lírico do Classicismo português. Dotado de inegável genialidade, coube a ele a melhor performance do soneto em língua portuguesa. Camões segue estritas regras de composição, obedecendo ao princípio da imitação, embebendo-se em fontes italianas como as do poeta Petrarca.

    A brevidade do soneto -- dois quartetos, dois tercetos -- requer grande concentração emocional, geralmente disposta sob a forma de tese-antítese com desfecho conclusivo que busca a síntese ou a unidade. A linguagem é condensada no decassílabo, utilizando a palavra de forma precisa, permeada pelo controle rígido da razão, mesmo quando o tema é uma aparente desordem.

    Assim, Camões é capaz de expressar-se de maneira extremamente concisa em sonetos narrativos como o famoso "Sete anos de pastor Jacó servia" e de lamentar de maneira semi-romântica a ausência da amada em "Alma minha gentil, que te partiste". É nos sonetos de análise que o poeta alcança maior desenvoltura, tecendo reflexões sobre o tempo - "Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades" - buscando uma definição do amor, ilustrada por uma de suas mais famosas produções - "Amor é fogo que arde sem se ver". Ele capta a psicologia feminina através de versos inesquecíveis, cujo exemplo mais significativo está em "Um mover de olhos, brando e piedoso". São muitas as composições lírico-amorosas, em que a mulher e o amor são idealizados como forma de atingir a supremacia do Bem e da Beleza. Camões se deixa levar por um certo sensualismo carnal que se opõe ao ideal petrarquiano do amor, ilustrado por "Transforma-se o amador na coisa amada".

    Além do tema amoroso, Camões se faz cantor dos desconcertos do mundo. Espírito muito atento à sua época, tem plena consciência de que tudo muda, nada é eterno. O homem, embora queira sempre atingir o ideal e a perfeição, depara-se com a terrível restrição imposta pela própria condição humana. O poeta chega à conclusão de que não existe o absoluto ou o eterno, restando a ele divagar sobre o real e o ideal, o eterno e o transitório, a morte e a vida, o pessoal e o universal. Nesses pares, encontram-se as mais profundas tensões que a lírica já deixou transparecer