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GONZAGUINHA História Brasileira
"A obra de Gonzaguinha era, ao mesmo tempo, seu ato de fé, sua sublimação e sua expiação. Para ele tudo virava música. Era um compositor que andava pelas ruas, via pelo que as pessoas passavam, se revoltava e queria gritar. Mas também era o artista que vagava pelo mais íntimo de seu próprio ser, desvendando os becos escuros que outros preferiam ignorar. Não tinha medo de sentir. Quando compunha, traduzia no papel sentimentos que muitas vezes estava fora de sua compreensão. Suas canções clamavam, riam, choravam. Sangravam. Mergulhava fundo nas sensações. Queria compreender o sentido da vida. Era o coletivo e ao mesmo tempo o individual." Elifas Andreato- Biógrafo e jornalista Nascido em 22 de setembro de 1945 no morro carioca de São Carlos, no Estácio, Luiz Gonzaga do Nascimento Junior sempre havia sido rebelde e bagunceiro. Fora, ao mesmo tempo, o desespero e a alegria de seus pais de criação, Xavier e Dina. A vida, nesta época era dura, e o dinheiro, curto. Quando tinha cinco anos, a família foi despejada do barraco em que vivia e foi morar no Estácio, num quarto na casa de um parente. Para conseguir algum dinheiro, Gonzaguinha carregava as sacolas das madames na feira. No carnaval, fugia de casa para brincar na avenida. Com Pafúncio, um vendedor de caranguejos, que morava nas redondezas e era membro da ala dos compositores da Unidos de São Carlos, o samba entraria definitivamente em sua vida. Com ele, o menino de São Carlos aprendeu cedo a fazer música. Nas ruas do Estácio, o menino ia crescendo. Entre a malandragem dos moleques de rua, o carinho da madrinha e as primeiras aulas de violão com o padrinho. Do pai, Luiz Gonzaga, não recebia muita coisa: o nome, na certidão de nascimento, algum dinheiro para pagar os estudos e umas visitas esporádicas. Imerso no dia-a-dia atribulado da população do morro, Gonzaguinha ia aprendendo a dureza da vida marginal, a injustiça diária vivida por uma parcela da sociedade que não tinha acesso a nada. Moleque, Luizinho – seu apelido de infância – ia aprontando das suas. Pipas, peladas, bolinha de gude, pião. E os acidentes da infância. Como nas três vezes em que furou o olho esquerdo. Na primeira, com uma pedrada; depois com um estilingue e, finalmente, na quina da cama. Com isso, perdeu 80% da visão desse olho, o que o obrigava a olhar as pessoas meio de lado. Um olhar duro, que paralisava, incomodava. À medida que crescia, se amargurava com os fatos de sua vida. Tornava-se seco. Pirracento. Mas, também atencioso, detalhista, veemente, firme, ético e, principalmente, solidário. Solidário com os sofrimentos e com os problemas das parcelas mais pobres da população. Mais tarde, sairia do morro, ganharia fama por todo o país, mas nunca esqueceria suas origens, o abandono, as dificuldades de ser marginal e rejeitado. Aos 16 anos, decidiu ir morar com o pai, para continuar os estudos. Passou por maus momentos. Não que fosse maltratado por Luiz Gonzaga, o Lua, que no fundo até gostava do filho. O problema maior era Helena, esposa do rei do baião, uma pernambucana mandona que dominava a vida da casa. E ela nunca aceitou o garoto, a quem chamava de "bastardo". Como o pai passava a maior parte do tempo viajando, Gonzaguinha tinha de se virar sozinho com Helena. Não deu certo. Sem muita opção, o menino aceitou completar os estudos como interno em um colégio. |