SINFONIETTA
A
dança das notas musicais.
Minha
alma de corpo presente na mesma sinfonia, no mesmo delírio.
A
acústica do teatro fazia passear os sons... a sonoridade atenta
à batuta que regia as possibilidades dos detalhes.
A
platéia absorvida. Uns paralisados, outros acompanhavam com
discrição mexendo os dedos. Não eram mais dedos, sim batutas
frenéticas. Interagiam.
O
diálogo entre os instrumentos era fascinante.
Como
leigo, tive toda a liberdade para imaginar a construção dos
argumentos musicais.
Em dado momento, os Violinos Spalla, Primeiros-violinos, em
notas alongadas, crescentes, contrapunham-se aos
Segundos-violinos, Violas e
Violoncelos com suas notas rítmicas, curtas, curtíssimas,
como se fossem, na natureza, gases de elementos diferentes,
que se condensavam num duelo vibrante, anunciando uma
tempestade impiedosa. Quando na escuridão mórbida, ameaçadora,
no ápice, o dilúvio era esperado em queda livre,
inesperadamente, ao fundo, um único som metálico, delicado,
como de um pássaro distraído pelo fascínio do próprio
canto, vai ao encontro das trevas eletrificadas, mas para surpresa
minha, ao pensar que era o fim do frágil, ele se agiganta,
torna-se maior e inibe a fúria da tempestade que o deixa
passar incólume. Cria-se uma trégua para o lírico. A
soprano louva a cena com estrondosa e divina inspiração. Ah!
a soprano, deusa erudita, não se comportava como uma mortal
no palco. Voava pela acústica. E não era só sua voz, era
seu suor, seu calor vital. Transmutar o prazer visual e audível
que eu sentia emocionado ao assistir a peça lírica, em
chamas de apelo sexual foi uma conseqüência. Sonhei mil
maneiras de entregar um ramalhete de rosas vermelhas, de
ardente paixão pela soprano. Imaginei-me fazendo amor com
ela, no palco, ali, enquanto ela vencia seus limites humanos.
Queria sentir também o êxtase de sua interpretação, do
divino. Suas cordas vocais me amarraram de tal maneira que não
mais seria homem livre. Agora um “schiavo”.
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