Assunto: Roseana Sarney
Algumas informações
interessantes, sobre o fenômeno das pesquisas.
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Os Sarneys e o charme da miséria -
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MAURO CHAVES
Muitos podem estar se perguntando,
com certa perplexidade: se, de todos os Estados brasileiros, o Maranhão é o
que apresenta a situação social mais calamitosa, mantendo (desde 1985) o pior
PIB per capita do Pais; se o Maranhão tem hoje a maior parcela da população
(62,37%) vivendo abaixo da
linha de miséria (menos de R$ 80
por pessoa, por mês), de acordo com o Mapa da Fome da Fundação Getúlio
Vargas (FGV); se, nas duas gestões da governadora Roseana Sarney, a pobreza só
cresceu no Maranhão, pois, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE), o número de famílias que lá vivem com até meio salário mínimo
aumentou 37% - enquanto no resto do País diminuiu 22%; se, nas duas gestões da
governadora Roseana Sarney, cresceram tanto a mortalidade infantil quanto a evasão
escolar -segundo dados da mesma respeitada instituição, contidos no Censo
2000; se, segundo a última medição do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH)
da ONU, o Maranhão está no mesmo patamar de miséria de nações africanas
como Gana e Congo- e basta lembrar que 39,8% das casas maranhenses não têm
sequer banheiro ou sanitário; como se explica, então, o fato de a governadora
Roseana Sarney alcançar um bom índice de aprovação em seu Estado?
E como se explica o fato de, nos últimos
36 anos - isto é, desde 1965, quando José Sarney se elegeu governador do
Maranhão -, o eleitorado maranhense ter escolhido, para o governo do Estado,
uma seqüência ininterrupta de correligionários e amigos diletos de José
Sarney (João Castelo Ribeiro Gonçalves, Oswaldo Nunes Freyre, Luiz Rocha, Epitácio
Cafeteira, João Alberto, Édison Lobão e a filha Roseana Sarney), se nesse
tempo todo o Maranhão, que no passado fora um marco cultural e histórico do País,
entrou em franca decadência econômica, social e cultural?
Decifremos o enigma. Antes de mais
nada, a família Sarney exerce domínio absoluto sobre todo o sistema de
comunicação do Maranhão. É dona do principal jornal - O Estado do Maranhão
- e do principal sistema de rádio e tellevisão - o Sistema Mirante e o Mirante
Sat, que recebem o sinal da Rede Globo. Os outros dois sistemas de TV mais
importantes do Estado pertencem
a correligionários e/ou diletíssimos
aliados da família, como é o caso do dono da Difusora (que recebe o sinal do
SBT), senador Édison Lobão, e do dono da TV Praia Grande (que recebe o sinal
da Bandeirantes), deputado estadual Manuel Ribeiro, há oito anos presidente da
Assembléia Legislativa do Maranhão (onde a governadora tem 36 dos 42 membros).
Interagindo com o governo, num processo de publicidade institucional
massificada, intensa e constante, os sistemas de comunicação social maranhense
exercem, com perfeição, um duplo papel. Primeiro é o de manter um clima
permanentemente festivo, com a divulgação diuturna das promoções
governamentais, dentro da estratégia de programação político-espetacular
denominada "Viva". Trata-se do seguinte: o governo maranhense
organiza, permanentemente, festejos públicos em diferentes locais, com ampla
concentração popular, tendo como pólo de atração artistas famosos, danças,
farta venda de bebidas, etc. Batiza-se a grande festa de acordo com o nome
do bairro ou da região escolhida: por exemplo, "Viva Renascença!",
ou "Viva
Maiobão!", ou "Viva Liberdade", ou "Viva Bairro de Fátima",
ou "Viva Madre Deus", ou "Viva Anjo da Guarda". Certamente
é uma iniciativa inspirada na velha prática dos imperadores romanos,
denominada panem et circenses(embora
sem panem, pelo que talvez mais apropriado fosse denominar cachaçorum et
circenses).
O segundo papel fundamental do integradíssimo sistema de comunicação
controlado pela família Sarney consiste em abafar tanto fracassos
administrativos quanto irregularidades apontadas ou investigadas – seja pelos
Tribunais de Contas, pela Polícia Federal ou pelo Ministério Público -, que
acabam deixando de se tornar, pela absoluta desinformação popular, objeto de
pressão por parte da opinião pública maranhense.
Dentre os inúmeros exemplos de atuação dessa mordaça comunicológica, poderíamos
mencionar o caso do Pólo de Confecções de Rosário, um ambicioso projeto de
U$ 20 milhões - a cerca de 100 km de São Luís -, inaugurado pomposamente (com
a presença de FHC), para gerar 4 mil empregos. Na
verdade, tratava-se do conto-do-vigário de um chinês de Taiwan interessado em
vender máquinas de costura - e que acabou preso em Manaus, por estelionato. E o
que era para ser uma moderna cooperativa, alardeada pela governadora, se tornou
uma minguada produção artesanal, que só emprega cerca de 400 pessoas,
ganhando em torno de R$ 100 por mês (por falta de coisa melhor). Ou o caso da
Usimar, projeto orçado em R$ 1,3 bilhão, que teve aprovação recorde(com o
empenho total da governadora e de seu marido) na Sudam, levantou com rapidez inédita
R$ 44 milhões e evaporou (pelo que o Ministério Público
entrou com ação civil contra Roseana e Jorge Murad). Ou o caso Salangô,
projeto de irrigação destinado à produção de arroz e cítricos, que recebeu
cerca de R$ 60 milhões há anos, não produz nada e está eivado de graves
irregularidades (inclusive superfaturamento), segundo o TCU. Ou o caso do
projeto
de despoluição da Lagoa de Jansen (centro de São Luís), que também gastou
R$ 60 milhões (federais) para não despoluir nada, além das graves
irregularidades (inclusive superfaturamento) apontadas pelo TCU. Ou o caso
da "estrada fantasma" Paulo Ramos-Arame, onde foram gastos U$ 33 milhões
em obras inexistentes. Ou o caso da duplicação do Projeto Italuis - R$300 milhões
-, obra de saneamento também com gravess irregularidades (inclusive
superfaturamento) apontadas pelo TCU.
Nada disso é trazido à discussão pública pelos veículos de comunicação
maranhenses. E, convenhamos, uma população em que 39,8% de seus integrantes não
podem nem dispor de chuveiros e privadas na própria residência, e para a qual
não foram construídas novas salas de aula nos últimos sete anos, que tipo de
espírito crítico poderá ter desenvolvido - nas últimas três décadas e nos
últimos sete anos - dentro da anestesiante festividade com que tem sido
embromada a sua sensação de real (mesmo que charmosa) miséria?
Mauro Chaves é jornalista,
advogado, escritor e produtor cultural E- mail:
mauro.chaves@attglobal.net