Como a nossa guria chegou lá Moisés Mendes - Parte 4 - Gisele estava com Deus A decisão foi tomada nas férias de 1995. Queria ir para São Paulo. Valdir, ex-corretor de imóveis, hoje consultor de recursos humanos, resistiu mas acabou cedendo porque Vânia, bancária aposentada do Banco do Brasil, fortalecia a cumplicidade com a filha. O pai foi na frente, conversou com o pessoal da Elite, conheceu o apartamento onde a filha ficaria com mais cinco meninas. Em fevereiro, Gisele, com 14 anos, faria 15 no dia 20 de julho, juntou as roupas em duas malas, pegou uma mochila e viajou de ônibus para São Paulo. Nesse gesto são potencializadas outras particularidades da menina-taquara, a capacidade de se autodeterminar, desde criança, em casa e nas aulas da professora Nair, e uma auto-estima do tamanho das sua estatura, apesar dos apelidos e de ser esnobada pelos guris. - Sempre foi uma leoa. É teimosa, impulsiva, fala sem parar, é pura ação. É uma sonhadora bárbara, mas extremamente disciplinada, diz Valdir, que admite: - Eu não queria roubar o sonho dela, mas hoje acho que fui irresponsável. Nas nossas brigas em casa, quem intervinha para defender quem estava perdendo sempre foi ela, diz Raquel. - Eu não me assustei quando ela decidiu ir embora. Tenho a lembrança de uma menina muito segura, confirma Adilson Frank, professor de música e regente da soprano Gisele no coral do colégio. Orientada para que descesse no terminal rodoviário do Tietê e pegasse um táxi, Gisele decide arriscar, arrasta as malas e pega o metrô. Saíra de Horizontina, na Região das Missões, a 489 quilômetros de Porto Alegre, onde as lavouras de soja são vizinhas da cidade e os moradores se reúnem à noite nas calçadas, certa de que enfrentaria São Paulo. Levaria um dos maiores sustos da vida. Desceu do metrô na Estação das Clínicas e enfiou a mão na mochila para pegar a carteira com o dinheiro e finalmente tomar o táxi que a levaria ao apartamento da Rua João Moura, no bairro de Pinheiros. A bolsa estava cortada.Haviam sumido a carteira, o talão de cheques e o cartão de crédito dados pela mãe. - Dei uma de metida ao pegar o metrô. Tinha R$ 50, queria economizar. Comecei a chorar. Não tinha uma moeda, uma ficha de telefone, não conhecia nada. Perguntei a uma mulher e ela me disse que a rua do apartamento ficava a umas sete quadras. Saí arrastando aquelas malas pesadas pela rua. Chorava e suava. As pessoas olhavam com pena de mim, mas ninguém me ajudava. Quando cheguei ao apartamento, a moça que me recebeu me olhava como quem perguntasse: mas quem é essa guria louca que não para de chorar? Mônica Monteiro, sua agente no Brasil e uma da melhores amigas, acha que Gisele foi testada pela cidade grande logo no desembarque. Mônica acompanha a trajetória da modelo desde o início e sabia que surgiriam outros testes. Num deles, Gisele acordou e descobriu que estava encerrada em casa, sem chaves. Ligou para Horizontina, aos prantos, pedindo colo, e ouviu da mãe e do pai que não deveria desistir porque "estava com Deus". Em 1997, logo depois de chegar a Nova York, levou um tombo no metrô e bateu a cabeça no chão. Pediu socorro da família, que interpretou a queda como um sinal de que algo não ia bem. Lá se foi dona Vânia. |