O que se observa é que o avanço tecnológico
tem resultado no aprofundamento do conhecimento de poucos e aumento da
ignorância de muitos.
Aproximam-se as eleições. Começa a surgir o desfile
dos candidatos. Todos estão concentrando o discurso nos temas emprego
e segurança. Dizem o que vão fazer, mas, não falam
como vão fazer, e se podem fazer. Até acredito que, equacionado
o problema do emprego, muito do que se cobra da segurança estaria
resolvido. A grave questão social da concentração
de renda ameaça famílias que, hoje, ainda lutam pelo direito
à vida animal. E surge o homem animal. Esse homem revoltado, analfabeto
e desempregado torna-se uma ameaça. Certamente existem os marginais
por índole, mas, em menor número. Para esses, temos polícia
suficiente e competente para combatê-los.
Como resolver o problema do emprego? Em 1994, na Câmara dos Deputados,
participei da CPI que procurou identificar as causas e dimensões
do atraso tecnológico do País. Foi apontada como causa principal
a degradação da base educacional. À época tínhamos
30 milhões de analfabetos e 22 milhões de desqualificados
profissionalmente.
Diminuímos o número de analfabetos strictu sensu, mas
aumentamos os analfabetos tecnológicos, isto é, aqueles que
sabem ler e escrever, mas, que não têm qualificação
profissional. Arrisco até a dizer que existe muita gente procurando
emprego e na contra mão, trabalho procurando profissional.
O que se observa é que o avanço tecnológico tem
resultado no aprofundamento do conhecimento de poucos e aumento da ignorância
de muitos. Então, estamos diante da seguinte situação:
1) grande parte da população é analfabeta tecnologicamente.
2) temos um modelo de desenvolvimento alicerçado na lógica
do mercado, globalizado, concentrador, que aprofunda, no estágio
atual, a pobreza. 3) setores da economia, como a indústria e a agricultura,
do ponto de vista de massa, não são mais empregadores.
A indústria está se automatizando cada vez mais. Os robôs
estão chegando. A mecanização agrícola está
expulsando os trabalhadores do meio rural. Pergunto: MST é Movimento
dos Sem Terra ou dos Sem Trabalho? Coloco, então, como desafio para
os candidatos: ''como gerar trabalho e distribuir renda num meio onde boa
parte da população é analfabeta e sem qualificação?
O que fazer com milhões de trabalhadores cuja força de trabalho
é cada vez menos exigida ou nem mais o é? A fim de minimizar
os efeitos da concentração de renda e da falta de oportunidade
de trabalho foi institucionalizada a política do VALE: vale merenda
escolar, vale bolsa escola, vale refeição, vale transporte,
vale isso, vale aquilo, como se o povo não valesse nada.
Certamente, a geração de trabalho e a distribuição
de renda só acontecerão quando investirmos no capital humano
com educação de qualidade, e procedermos a uma profunda transformação
na lógica do atual modelo de desenvolvimento. A nova lógica
deve ter como premissas: 1) pensar numa economia que leve em conta as pessoas.
2) sair do modelo do crescimento com base no mercado, para o da social
democracia, onde o Estado deve exercer o papel regulador do processo. 3)
massificar as ações da capacitação tecnológica
da população via universidades e instituições
como CVT, Centec e Infovias. 4) abrir reserva de mercado, na área
de serviços e de produtos, para as micro e pequenas empresas tipo
compra e serviços governamentais.Finalmente, o que se exige do novo
governo é que suas ações estejam voltadas para resolver
os problemas da população.
Ariosto Holanda é secretário da Ciência
e Tecnologia do Estado do Ceará.
Graça Gadelha é socióloga e coordenadora
do Pommar/Usaid-CE
O POVO - 09 de fevereiro de 2002
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