O Dote das Trevas

Capítulo 12
ENCARANDO AS CONSEQÜÊNCIAS

         Mal saíra da pequena floresta, Catherine já sentira seu braço arder. “A Marca” pensou desanimada, já sabendo o que a esperava. E nem foi preciso esperar muito, apenas alguns passos depois da primeira ardência, sentiu-se sendo aparatada para algum outro lugar, muito longe do castelo de Hogwarts.

         “Aqui estou, pronta para pagar por meus atos” pensou com um brilho sinistro em seu olhar, observando o aposento em que estava. Parecia um hall de uma luxuosa mansão, decorado com os mais belos artefatos da nobreza, e tudo em uma limpeza que parecia surreal. Conhecia aquele lugar. Muito bem. E ao ver aqueles três homens parados à ponta da escada, suas certezas se confirmaram mais ainda.

         - Crucio! – disse uma voz gélida, com a varinha firmemente apontada para o peito de Catherine.

         A dor a atingiu com força, e foi impossível não cair de joelhos. Mesmo treinada uma vida inteira contra a Maldição Imperdoável, não conseguira agüentar o golpe, mais forte do que nunca sentira antes.

         Embora sua vontade fosse gritar e chorar por causa da dor, permaneceu com o rosto mais impassível que pôde, mesmo com toda aquela sensação de milhares de agulhas furando todo o seu corpo.

         - O que pensa que está fazendo, menina estúpida?! – exclamou a mesma voz, possuída de uma raiva inimaginável – Acha que é apenas um jogo que, se falhar alguma vez, pode simplesmente começar novamente? Eu acho que não...

         Com um movimento da varinha, o Comensal aumentou a força do ataque da Maldição, concentrando grande parte da força na cabeça de Catherine. Ela sentia sua cabeça explodir diversas vezes, uma pior do que a outra. Era algo terrível, e ela só podia pedir para que acabasse logo – não que seu pai parasse de lançar a maldição, mas sim que a matasse de uma vez por todas. As seqüelas de ficar exposto em excesso à maldição eram terríveis, e ela preferia morrer a passar por alguma delas.

         - Richard, seja racional, se acabar com ela agora, Milorde irá descontar a raiva em você – ponderava uma outra voz, que estava próxima a do pai de Catherine.

         - Não se intrometa, Severo! – ralhou Richard Stone, um brilho obsessivo em seus olhos castanho-acinzentados.

         O comentário de Snape fez apenas com que a força da maldição aumentasse, e Catherine agradeceria imensamente se da próxima vez ele não tentasse mais um comentário daquele tipo. Agora sentia seu corpo adormecer lentamente, e teve a infelicidade de constatar que começara a perder os sentidos. Já era impossível permanecer de joelhos, deixara-se cair de rosto no chão, pedindo apenas para que tudo parasse e finalmente morresse, tamanho seu desespero.

         - Imperio! – exclamou Snape, apontando a varinha diretamente para o Sr. Stone.

         Bruscamente ele parou de atacar Catherine. Lentamente, sua mão se abaixara, impedindo qualquer novo ataque de sua parte. Snape estava mais mordaz do que de costume, e parecia complicado manter Richard sob o efeito da maldição. Do outro lado de Stone, uma voz dava pequenos risos.

         - Severo Snape! Eu garanto que se me deixar sob efeito dessa maldição por mais um segundo, você será o primeiro a experimentar a minha em sua potência total! – disse Richard com os dentes cerrados; aparentemente parecia muito difícil dizer qualquer palavra.

         - Estou morrendo de medo, Richard – retrucou Snape friamente, sem mover um milímetro sequer sua varinha.

         Catherine estava desnorteada. Quase não podia sentir seu corpo, e foi com muita dificuldade que conseguira virar sua cabeça o suficiente para ver parte da cena. O que não fez muita diferença, pois sua cabeça latejava com tanta força que a concentração nos fatos era quase nula.

         - Ora, vocês dois, parem com isso – disse o terceiro homem do local. Era Lúcio Malfoy. – Se continuarem assim, vou ter de me intrometer nessa briga.

         - Não se meta, Lúcio, se não quiser experimentar minha fúria! – disse Stone em tom perigoso.

         - Sem gracinhas, Lúcio – disse Snape.

         - Estou falando sério, Severo – disse Malfoy em tom de protesto. Richard descontou sua raiva na menina Stone, com a maldição favorita dele; você, quis bancar o bonzinho não sei por que, e também está usando a sua favorita. Eu estou sem fazer nada. Nada mais justo que eu experimente a mina favorita nos dois, assim não há mais discussão.

         Após a especulação de Malfoy, levou apenas uma fração de segundo para Stone se livrar do feitiço de Snape e se virar contra ele, sua varinha empunhada perigosamente.

         - Vamos duelar, Severo. Você conseguiu me deixar muito irritado!

         - Ora, francamente Richard – disse Snape em um sorriso enviesado. – Sabe muito bem que Milorde não aprova duelos entre Comensais. Você receberia uma grave punição.

         Os dois ficaram se encarando por alguns segundos. Começariam a duelar se a porta do saguão principal não se abrisse e por ela entrasse ninguém menos que Lord Voldemort.

         - O que vocês dois pensam que estão fazendo? – perguntou Voldemort de maus modos, encarando as varinhas empunhadas dos dois Comensais.

         Eles instantaneamente abaixaram as varinhas, e Lúcio Malfoy segurou um riso.

         - Agora – disse Voldemort com uma voz cortante -, poderiam me explicar o que significa este ataque?

         - Severo estava me impedindo de castigar esta infratora! – exclamou Stone, apontando com força para a filha, que continuava deitava no chão, se recompondo lentamente da dor.

         Voldemort olhou com severidade para os dois Comensais. Em seguida, exigiu que Snape se defendesse.

         - Achei que Milorde quisesse castigar a menina com suas próprias mãos – respondeu Snape friamente, sua boca crispando levemente.

         - Está certo, Snape. Realmente preciso ter uma conversa muito séria com esta menina – concordou com um pequeno aceno de satisfação. – Malfoy, leve-a até a sala secreta e prenda-a muito bem em uma cadeira, de modo de possa me encarar. Duvido que consiga dar um passo sequer sozinha – completou, dirigindo-se a Malfoy.

         - Sim Milorde – concordou, recolhendo Catherine do chão com maus modos.

         - E quanto a vocês dois – disse, apontando para Snape e Stone. – Se por algum acaso isso se repetir, quero que façam apenas suas obrigações, que é levar o infrator até mim. Nada de surras pessoais nem nada do tipo. Este é meu último aviso.

         Em seguida, Voldemort deixou os dois Comensais no hall, enquanto se dirigia até a sala secreta de modo imponente.

 

         Harry, Rony e Hermione estavam reunidos no salão comunal da Grifinória, em um canto perto da lareira, e conversavam em voz baixa para ninguém ouvi-los. O assunto era o ataque que acontecera há poucas horas.

         - Então a Stone estava realmente certa! – concluiu Rony, um misto de satisfação e terror em seu rosto.

         - Estava – disse Hermione em tom baixo. – O que apenas me intriga é como ela conseguiu essa informação. Sabemos que ela se reúne freqüentemente com Comensais, mas não acho provável ela ser um deles.

         - Pois eu não duvido muito – respondeu Rony sombriamente. – Você precisava conhecer o pai dela, um crápula. Meu pai já se encontrou com ele umas vezes no Ministério. Ele disse que é um Comensal sem sombra de dúvidas. E um dos piores. Só pelo jeito que ele age dá para perceber.

         - Então ele deve ter a posto no círculo dos Comensais bem antes de... – Hermione parecia estar com seu cérebro trabalhando a mil por hora.

         - Ela deve ser bem treinada nas Artes das Trevas – concluiu Rony.

         - Harry, o que você acha? – perguntou Hermione.

         Ele não respondeu imediatamente. Parecia muito preocupado com alguma coisa, pois não prestara atenção em nenhuma palavra que os amigos disseram.

         - Será que Sirius está bem? – perguntou, preocupado com a segurança do padrinho.

         - Não podemos saber – disse Hermione. – Mas ele deve ter tido o mínimo de esperteza e ter ficado bem quietinho em seu esconderijo! – sua voz tinha um certo tom de repreensão.

         - Sirius sabe se cuidar – disse Rony despreocupado. – Nosso assunto agora é a Stone.

         - O que você acha, Harry? – questionou Hermione parecendo ansiosa – Ela é uma... ou não?

         - Uma... uma o quê, Mione? – perguntou Harry abobado.

         - Uma Comensal, oras! – exclamou impaciente, mas em voz baixa.

         - Ah, eu não sei, só sei que ela estava tentando ajudar, só isso – disse impaciente, se levantando em seguida. – Vou dormir um pouco, não estou com humor para suas suposições.

         E, sem esperar resposta dos amigos, saiu marchando até o dormitório masculino. Mas ainda teve tempo de ouvir Rony gritar:

         - Não se esqueça que temos jantar logo! Não vamos te avisar!

* * * * *

         Voldemort caminhava de um lado para outro da pequena sala, escondida provavelmente em uma das masmorras daquela enorme mansão. Encarava Catherine com aqueles olhos vermelhos, de modo que a garota sentia calafrios. Seu corpo ainda doía muito da maldição que levara de seu pai, e teve de concordar com o que o Lord dissera para Lúcio Malfoy: não conseguiria sequer dar um passo sozinha. Suas pernas pareciam protestar imensamente à menção de qualquer movimento, e sua cabeça estaria caída se não estivesse amarrada firmemente à uma cadeira. Aliás, as cordas que imprensavam praticamente seu corpo todo, não ajudavam nada em fazer a dor diminuir, pelo contrário, apenas fazia aquela tortura silenciosa aumentar.

         - Então, senhorita Stone, já sente-se pronta para narrar o que aconteceu com a senhorita? – perguntou Voldemort com a voz perigosa, mas em um tom estranhamente calmo.

         Vendo o silêncio da garota, ele perguntou novamente.

         - Já está pronta para me contar o que aconteceu no povoado de Hogsmeade?

         Outra vez silêncio da parte dela. Ele começara a ficar impaciente, e decidiu ameaçá-la.

         - Não está vendo como estou sendo caridoso. Pense bem, srta. Estou lhe propondo falar abertamente sobre o que aconteceu, até o momento em que eu chamar Snape nessa sala e pedir para que ele lhe dê um pouco de Veritaserum. Sabe o que é isso? Pois eu te explico. É uma poção da verdade, que faz com que quem a beba não diga nada além da verdade, de TODA a verdade.

         Catherine arregalou os olhos, assustada. Voldemort deu um sorrisinho de prazer.

         - Então não perca a oportunidade, estou dando a chance de inventar uma mentira bem bolada, mas será que prefere a poção?

         - Eu... – ela hesitou um momento antes de responder – Não... obedeci... às suas ordens... Milord – disse displicentemente, não achando algo inteligente esconder a verdade do Lord das Trevas.

         - Não obedeceu minhas ordens? – repetiu em tom leve – Sim, disto eu sei perfeitamente, o que me intriga é o que a fez mudar de idéia tão repentinamente – sua voz tornara-se instantaneamente ultra-perigosa.

         - Achei que seria muita petulância capturar Potter em um passeio a Hogsmeade, Dumbledore certamente desconfiaria que há um espião entre eles – sua voz soava levemente desafiadora. – Como Milorde escolheria, por um mero acaso, que o dia de atacar Hogsmeade fosse justamente o dia em que Potter estaria visitando o povoado?

         - Não fale comigo assim, sua atrevida! – berrou Voldemort, visivelmente afetado com as palavras da garota.

         Ela se permitiu dar um pequeno sorriso de prazer. Estava conseguindo o que queria, estava provocando o Lord das Trevas. Para ela já não mais importava o que a esperava, só sabia que desafiaria Voldemort até tirá-lo do sério. E parecia estar conseguindo.

         - Crucio! – disse ele quase em um grito, sua varinha apontada para Catherine.

         Quando foi atingida pela Maldição, se arrependeu vagamente de ter desafiado o Lord, pois a dor que sentia estava insuportável. Era como se sua pele estivesse queimando a uma velocidade assustadora, e essa sensação aumentava por causa das cordas presas em seu corpo.

         A tortura durou alguns minutos e, quando acabou, Catherine, em uma tentativa desesperada, jogou a cabeça para trás, o que só fez a corda a apertar mais ainda.

         - Vejo que gostou da pequena amostra de meus poderes, senhorita. Deseja mais? – perguntou Voldemort ironicamente.

         - Não, obrigada Milord, mas acho que já tive o suficiente por hoje – respondeu Catherine, falando com total despeito.

         - PARE DE FALAR COM ESTE DESPEITO DESCARADO! – exclamou furioso, lançando novamente o feitiço na garota, desta vez com mais intensidade.

         A dor aumentava cada vez mais, e seu corpo já não estava mais agüentando. Novamente estava sentindo seus sentidos desaparecerem, desta vez mais lenta e dolorosamente. Quando ele achou que estava suficiente, deixou de apontar a varinha para a garota.

         - Milorde não acha mais fácil me matar de vez? – perguntou zombeteiramente – Assim poupa seu esforço, a Maldição Cruciatos consome energia, sabia?

         - Para sua informação, Stone, você é mais útil para mim viva do que morta – retrucou Voldemort. – E quero que prometa que nunca mais irá me desafiar, muito menos desobedecer uma ordem direta.

         - E qual é o meu prêmio por isso?

         - Seu prêmio? Talvez sua vida, não sei. Ou a da pessoa que a srta. mais estima neste mundo – cogitou Voldemort, sua voz ironicamente pensativa.

         - Não há ninguém que eu estimo neste mundo – respondeu dando de ombros.

         Voldemort encarou o rosto displicente de Catherine Stone. Aquela atitude lhe lembrava muito a uma outra pessoa. Que também não tinha medo de morrer. Que se juntara aos Comensais apenas por causa de uma grande chantagem. Sim... Severo Snape apenas sucumbira ao lado das Trevas por Voldemort ter o que ele sempre desejara a vida toda. E não era poder e dinheiro, era algo maior do que isso...

         - E sua mãe, garota? Nunca sonhou em conhecê-la? Saber se ela era realmente parecida com você? – perguntou maliciosamente.

         Catherine arregalou os olhos, assustada. Como ele sabia sobre sua mãe? Será que chegara a conhecê-la? Voldemort percebeu que ganhara a batalha, já sorria horrivelmente em sua boca sem dentes.

         - Se provar ser uma serva fiel, posso lhe mostrar sua mãe... Não uma simples lembrança, ela, de verdade, como se ainda estivesse viva.

         - Não, não pode! – disse de repente, parecendo cair em si – Ela morreu, não há como fazer comunicação com alguém que já morreu! Não dá! – uma pequena lágrima escorreu por seu rosto, enquanto tentava de soltar das cordas.

         - Se você não acredita... Não posso fazer nada... A não ser... Que tal fazermos uma troca? Sua lealdade em troca da srta. Sabrine?

         - Você também tem poder sobre Sabrine? – perguntou incrédula, chocada.

         - Tenho poder sobre qualquer pessoa que eu quiser, garota, será que nunca vai entender? – disse Voldemort com um sorriso enviesado – Então, temos um trato?

         Catherine não viu escolha. Teve de concordar com Voldemort, sabia que ele poderia machucar Sabrine se ela não cooperasse. No momento em que afirmou que tinham um trato, uma luz roxa a atingiu em cheio, fazendo-a desmaiar. A única coisa que lembrara depois disso foi a vaga sensação de estar levando uma grande surra de seu pai.

* * * * *

         Harry descera de seu dormitório algum tempo depois de ter subido, não conseguindo dormir nem fazer nada de interessante lá em cima.

         - Que bom que voltou, Harry – exclamou Rony contente. – Estávamos nos preparando para irmos para o salão principal, para o jantar, entende?

         - Ótimo, já estava começando a ficar com fome – disse Harry. – Achei que iam me deixar sozinho no dormitório.

         - Você sabe que não faríamos isso – disse Hermione como se fosse algo óbvio.

         - Então vamos, também estou com fome! – apressou Rony.

         Os três foram caminhando até o salão principal, ao mesmo tempo em que conversavam sobre os mais diversos assuntos, evitando ao máximo de falarem sobre Catherine.

         Sentaram-se em uma das extremidades da mesa, pois queriam o máximo de privacidade. O jantar já estava sendo servido, e eles logo atacaram. Tudo corria bem até que, quase no finzinho do jantar, Harry percebeu algo muito estranho.

         - Vocês repararam que Snape não apareceu o jantar todo? – perguntou ele, olhando intrigado para a mesa dos professores.

         - A Stone também não – constatou Hermione, observando Draco Malfoy sentado praticamente sozinho na mesa da Sonserina.

         - Será que eles estão em reunião com você-sabe-quem? – perguntou Rony.

         - Não, aposto que Malfoy estaria junto se fosse algo assim – descartou Harry.

         - Ou então Malfoy ainda não é... – disse Hermione astutamente. Os dois a olharam confusos – O pai dele talvez não ache que ele esteja preparado para ser um Comensal, talvez haja uma gota de sentimento entre eles, não sei.

         - Ou então é uma reunião secreta com apenas alguns membros especiais – cogitou Rony, adentrando no caso.

         - Será? – perguntou Harry, incerto.

         - Não sabemos – concluiu Hermione, cansada. – São apenas suposições, mas não é assim o tempo todo?

         - Tem razão – concordaram os rapazes.

         O assunto morreu por ali, mas nenhum dos três parou de pensar no que poderia ter acontecido para Stone e Snape estarem ausentes.

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