Nagel e a Subjetividade
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Existem dois sentidos para o termo subjetividade, o termo
corrente, do senso comum, se refere ao gosto, preferências,
crenças individuais, nesse sentido é comum ouvir coisas do
tipo "gosto não se discute", "tudo é subjetivo" ou "gosto e
rosto cada um tem o seu". Mas há um outro sentido que é o
sentido filosófico, onde subjetividade é a característica
particular da experiência, é a característica do sujeito que
pensa. |
O sujeito para alguns se referem apenas a seres
humanos pois é este que tem consciência, mas para outros
autores qualquer organismo que interage com o mundo, que
significa e age no mundo tem subjetividade ou é um sujeito.
Para determinar quem tem ou não subjetividade deve-se antes
pontuar alguns outros termos como crenças, crenças de
segunda ordem, percepção, signo, significado, experiência e
ponto de vista. Estudos recentes da biologia, da etologia e
vários da filosofia compreendem que outros animais não só
têm crenças, como também têm crenças de segunda ordem, ou
seja, crenças sobre crenças, que todo organismo vivo tem
experiências e que estas têm papel fundamental nas ações do
organismo e que os seres vivos se relacionam com o mundo em
um processo biossemiótico.
Thomas Nagel escreveu um famoso e importante artigo: What is it like to be a bat, publicado em 1974, o
autor trouxe de volta à filosofia os debates a cerca da
subjetividade, das experiências de mundo e da
irredutibilidade de pontos de vista. Este artigo se tornou
fundamental para os estudos contemporâneos em filosofia da
mente e epistemologia. Segundo Nagel, a subjetividade é o
ponto em comum entre as diferentes experiências de mundo,
sem um ponto de vista ou subjetividade, o mundo não
significa. Só se pode entender um objeto a partir do que se
pensa sobre ele, em um mundo sem subjetividade o objeto
seria só uma coisa sem significação. A subjetividade é,
portanto, necessária para o conhecimento do mundo e para as
relações do sujeito com o mundo. Essas experiências de mundo
têm um ponto de vista não eliminável, ou seja, não se pode
reduzir um ponto de vista a outro ponto de vista. Um ser
humano só pode ter uma relação com um objeto a partir de seu
próprio ponto de vista, ou seja, a partir do ponto de vista
humano. Da mesma forma um morcego só pode dar significado a
algo a partir de seu ponto de vista como morcego. Os pontos
de vistas ou experiência de mundo de homens e morcegos são
irredutíveis entre si. No entanto, Nagel admite que seja
possível compreender um ponto de vista diferente, pois é
possível criar uma representação de um ponto de vista no
outro. “Por exemplo, podemos atribuir tipos gerais de
experiência com base na estrutura do animal e do seu
comportamento.” Compreender um ponto de vista não é
reduzi-lo ao seu próprio ponto de vista. A teoria de Nagel
trouxe importantes conseqüências como: a impossibilidade da
redução de um ponto de vista a outro; as visões de mundo ou
experiências de mundo são sempre associados a um ponto de
vista particular; essas visões de mundo ou experiências de
mundo têm um ponto de vista não eliminável, têm uma
característica subjetiva. É nesse último ponto que está um
dos maiores debates da filosofia da mente contemporânea, a
característica subjetiva presente nas diferentes
experiências de mundo chamada atualmente de Qualia.
No livro "A última palavra", Nagel dedica um capítulo para
defender a subjetividade a partir da existência do
pensamento. O pensamento, entre outros, é um item mental, só
podemos entende-lo a partir de suas próprias características
e nunca a partir de características externas a ele. Essas
características são subjetivas, intrínsecas ao pensamento.
Para pensar a nós mesmo só podemos fazê-lo a partir de nós
mesmo, de nossos próprios pensamentos. Entender o pensamento
a partir de outra coisa exterior já não é mais entender o
pensamento, mas uma descrição exterior. Ora, se há
pensamento este deve ser de alguma coisa e de alguém, mas
independente do objeto pensado há algo que não pode ser
eliminado: a subjetividade. Eu não posso tirar o sujeito que
está pensando, pois pensamento é sempre de alguém, se
elimina o sujeito que sustenta o pensamento então já não há
pensamento. Pensamentos ou conhecimento de alguma coisa,
inclusive descrições objetivas, supõem uma subjetividade que
o sustente. A razão nunca é absoluta, é sempre relativo ou
em função de uma subjetividade. Mas não se pode entender o
ponto de vista de Nagel como um subjetivismo extremado, o
autor defende que o conceito de subjetividade exige uma
moldura objetiva, pois não se pode abandonar o ponto de
vista da justificativa, o que nos obriga a buscar
fundamentação objetiva, aceitando sempre que as coisas são
como são no nosso ponto de vista a partir de nossa
estrutura. Nagel, portanto, procura defender um ponto de
vista cético em relação à redução de uma subjetividade a
outra, mas isso não nega nem a existência da subjetividade,
nem da objetividade, mas antes afirma a existência das duas
em uma relação vital para o conhecimento do mundo.
E para quem é da máxima "Tudo é subjetivo" Nagel responde:
"...só pode ser um disparate, pois ela própria precisaria
ser ou subjetiva ou objetiva. Mas ela não pode ser objetiva,
já que, nesse caso, se verdadeira, seria falsa: e não pode
ser subjetiva, porque então não poderia promover nenhuma
reivindicação objetiva incluindo a reivindicação de que ela
é objetivamente falsa." (Thomas Nagel, A última palavra)
Alucinação de Elaine Cristina às 20:22
* Imagem: Das Gewitter,
1929, de Edgar Ende
Sexta-feira, 25 de Janeiro de 2008