Evangélicos ganham versão popular dos textos sagrados

Nova tradução utiliza termos da linguagem de hoje, para facilitar compreensão

À medida que a ciência avança - e isso ocorre num ritmo cada vez mais acelerado - se acentua o caráter simbólico das histórias bíblicas. Afinal, como se poderia confrontar a história da criação do céu e da terra em sete dias, narrada no livro Gênesis, com a teoria científica do big-bang, pela qual a construção do universo começou há 15 bilhões de anos e ainda não terminou? A ascensão de Jesus Cristo ao céu, contada pelos evangelistas Lucas e Marcos, deixou de ter sentido literal desde que Nicolau Copérnico retirou a Terra do centro do universo, no século 15. Com as viagens espaciais, qualquer pessoa medianamente informada sabe que objetos lançados ao céu entram em órbita ou mergulham no infinito.

 

Isso significa o fim da Bíblia? Não. O livro sagrado dos cristãos continua exercendo fascínio sobre milhões de pessoas. Entre as provas disso podem ser citadas as renovadas traduções e versões dessa obra, escrita originalmente em hebraico, aramaico e grego. No Brasil, uma das versões mais curiosas está chegando agora às livrarias. É a Bíblia Sagrada - Nova Tradução na Linguagem de Hoje.

 

Destina-se ao grande público, pessoas com pouca escolaridade, que têm dificuldades para entender o vocabulário do texto original. Nela não se diz, por exemplo, que Adão "conheceu" Eva. Na nova tradução, essa palavra ganha o sentido exato que os hebreus davam a ela, de relacionamento sexual. O texto diz: "Adão teve relações com Eva, sua mulher, e ela ficou grávida." Outros eufemismos para o ato sexual, como "deitar" com alguém, também foram suprimidos.

 

Enquanto as versões mais conhecidas da Bíblia contam com cerca de 12 mil vocábulos diferentes, a que está chegando às livrarias possui 4.393. Para obter esse resultado, uma equipe de seis especialistas da Sociedade Bíblica do Brasil, vinculada à comunidade evangélica, trabalhou durante oito anos.

 

 

Dinâmica - Seu ponto de partida foi uma outra versão popular, lançada 12 anos atrás, chamada Revisão da Bíblia na Linguagem de Hoje. Na opinião do coordenador da equipe, o pastor luterano Rudi Zimmer, especialista em hebraico e aramaico e doutor em teologia, o ideal seria fazer uma revisão do texto popular a cada dez anos. "A língua é dinâmica e se renova", explica ele.

 

Uma das preocupações dos especialistas, segundo Zimmer, foi eliminar os chamados hebraísmos. Eles observaram, entre outras coisas, que o livro contém freqüentes referências às vísceras das pessoas, porque os hebreus acreditavam que era nelas que residiam os sentimentos. Assim como se acredita hoje que o coração é o centro.

 

Por causa disso, várias trocas foram feitas. Na passagem chamada Lamentação de Moabe, afirma-se: "Minhas entranhas soam por Moabe como uma harpa". Na versão atual, ficou: "Como as cordas de uma lira, o meu coração treme de tristeza pelo povo de Moabe."

 

Os tradutores também procuraram metáforas mais claras. Num trecho do Novo Testamento, Jesus diz aos seus discípulos: "Se alguém quer vir após mim, a si mesmo se negue, tome a sua cruz e siga-me." Na opinião dos tradutores, não ficou claro o sentido da "cruz". Quer dizer doença? Dor?

 

Na nova versão o texto diz: "Se alguém quer ser meu seguidor, esqueça os seus próprios interesses, esteja pronto para morrer como eu vou morrer e me acompanhe."

 

Segundo Zimmer, a nova tradução deve ser vista como mais uma ferramenta de evangelização. "Não substitui a Bíblia tradicional", diz ele.