Data: Ter 30 set 2008 5:40 pm

Título: Ramalhão Tur: Mangue Seco















Se você é o tipo de turista que só se hospeda em resorts, gosta de luxo e conforto e não quer ter nenhum trabalho, então Mangue Seco decididamente não é o lugar para você. Mas quem sente a mão do Criador ao admirar a perfeição da Natureza deveria fazer um esforço e conhecer essa minúscula vila de pescadores no extremo norte do litoral baiano.

  • Mangue Seco é oficialmente uma vila do município de Jandaíra, mas se tornou mais famosa que a cidade a que pertence graças ao escritor Jorge Amado, que situou ali a história de uma jovem de comportamento, digamos, avançado demais para o lugarejo e que, surrada e expulsa de casa pelo pai severo, retorna 30 anos depois para acertar as contas com seu passado. Tieta do Agreste virou novela global, depois filme e tirou a vila do anonimato. E o turismo passou a ser a principal fonte de recursos do vilarejo de cerca de 300 moradores, superando a pesca e a captura do aratu, um crustáceo semelhante ao caranguejo e principal ingrediente de uma famosa moqueca local.

  • Mangue Seco fica na extremidade de uma península espremida entre o oceano e a foz de um estuário formado por 5 rios que desaguam juntos (um dos poucos lugares do nosso litoral onde ainda se encontra o raríssimo peixe-boi marinho). Chegar lá já é uma aventura. A vila é tão isolada que não tem acesso por terra, a não ser pelas praias, na maré baixa, em veículos de tração nas 4 rodas. Fora isso, a única forma de chegar é pela água. O acesso se faz pelo vizinho estado do Sergipe: segue-se até o município de Estância, e dali até o vilarejo de Porto do Mato, onde se freta um barco ou lancha para descer o rio até Mangue Seco. Há empresas especializadas que fazem o passeio partindo de Salvador ou de Aracaju. O isolamento preservou a vila, impedindo a especulação imobiliária e a invasão de grandes empreendimentos hoteleiros.

  • Ali a natureza dá as cartas e joga de mão: o homem é mero coadjuvante. O vento levanta sem cessar a areia finíssima da praia, formando dunas de beleza ímpar – que vão avançando sobre as poucas casas da vila e engolindo as plantações de coqueiros do lugar. O próprio nome do povoado decorre desse fenômeno natural, pois o avanço das dunas assoreou e secou o riacho que existia ali, deixando apenas um gramado ralo onde antes havia um manguezal. Enquanto isso, o mar vai se apoderando do espaço da praia antes ocupado pela areia levada pelo vento. O resultado é que a península está se estreitando e poderá desaparecer em mais algumas décadas. Lembram-se da cena de abertura da novela Tieta, em que um coqueiro torto se desenrolava e se transformava na atriz Isadora Ribeiro? Pois o tal coqueiro, e toda a área em que se situava, já foram engolidos pelo Oceano Atlântico há muito tempo.

  • A vila fica à margem do rio, e para se chegar à praia do outro lado é preciso cruzar as dunas em bugues, num passeio obrigatório (afinal, quem teve o trabalho de ir até lá não vai querer ficar parado no vilarejo). As dunas podem não ser tão altas e extensas quanto as de Jenipabu (RN), mas o cenário não tem comparação. A visão da vila e do estuário do alto da duna é estonteante, impossível de se captar em simples fotos (mesmo assim, fizemos uma tentativa).

  • Entre as dunas e o mar, nos deparamos com a visão insólita de um agrupamento de cabanas. Fomos até lá e encontramos a pousada mais rústica que se possa imaginar! Nada mais que precários bangalôs de madeira, sem banheiros, água ou eletricidade, mas com placas bilíngües... Parecia um lugar destinado a “bichos-grilos” no último grau de piração. Infelizmente estava fechada, o que nos impediu de conhecer o maluco ou malucos responsáveis pelo “empreendimento”.

  • Mas quem quiser se hospedar na vila terá opções bem melhores que a tal pousada de madeira. Nada de luxo ou sofisticação, mas ninguém vai precisar dormir no meio da areia. E ainda será premiado com a visão que os turistas de um dia, como eu, não tiveram: o pôr do sol no alto da duna.

  • Enfim, Mangue Seco deve ser um dos últimos lugares do litoral brasileiro a ainda manter as mesmas características de décadas atrás, sem ter sido desfigurado pela voracidade imobiliária. Mas, paradoxalmente, é um local em constante transformação. Quem o visitar daqui a um ano provavelmente verá paisagens um pouco diferentes das de hoje. Boa razão para ir lá o quanto antes e, quem sabe, voltar um dia.

  • Seguem algumas fotos que, repito, não fazem jus à beleza do lugar.




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