Se
você é o tipo de turista que só se hospeda em
resorts, gosta de luxo e conforto e não quer ter
nenhum trabalho, então Mangue Seco decididamente não
é o lugar para você. Mas quem sente a mão do
Criador ao admirar a perfeição da Natureza deveria
fazer um esforço e conhecer essa minúscula vila de
pescadores no extremo norte do litoral baiano.
Mangue
Seco é oficialmente uma vila do município de
Jandaíra, mas se tornou mais famosa que a cidade a que
pertence graças ao escritor Jorge Amado, que situou ali a
história de uma jovem de comportamento, digamos, avançado
demais para o lugarejo e que, surrada e expulsa de casa pelo pai
severo, retorna 30 anos depois para acertar as contas com seu
passado. Tieta do Agreste virou novela global, depois filme e
tirou a vila do anonimato. E o turismo passou a ser a principal
fonte de recursos do vilarejo de cerca de 300 moradores,
superando a pesca e a captura do aratu, um crustáceo
semelhante ao caranguejo e principal ingrediente de uma famosa
moqueca local.
Mangue
Seco fica na extremidade de uma península espremida entre
o oceano e a foz de um estuário formado por 5 rios que
desaguam juntos (um dos poucos lugares do nosso litoral onde
ainda se encontra o raríssimo peixe-boi marinho). Chegar
lá já é uma aventura. A vila é tão
isolada que não tem acesso por terra, a não ser
pelas praias, na maré baixa, em veículos de tração
nas 4 rodas. Fora isso, a única forma de chegar é
pela água. O acesso se faz pelo vizinho estado do Sergipe:
segue-se até o município de Estância, e dali
até o vilarejo de Porto do Mato, onde se freta um barco ou
lancha para descer o rio até Mangue Seco. Há
empresas especializadas que fazem o passeio partindo de Salvador
ou de Aracaju. O isolamento preservou a vila, impedindo a
especulação imobiliária e a invasão
de grandes empreendimentos hoteleiros.
Ali
a natureza dá as cartas e joga de mão: o homem é
mero coadjuvante. O vento levanta sem cessar a areia finíssima
da praia, formando dunas de beleza ímpar – que vão
avançando sobre as poucas casas da vila e engolindo as
plantações de coqueiros do lugar. O próprio
nome do povoado decorre desse fenômeno natural, pois o
avanço das dunas assoreou e secou o riacho que existia
ali, deixando apenas um gramado ralo onde antes havia um
manguezal. Enquanto isso, o mar vai se apoderando do espaço
da praia antes ocupado pela areia levada pelo vento. O resultado
é que a península está se estreitando e
poderá desaparecer em mais algumas décadas.
Lembram-se da cena de abertura da novela Tieta, em que um
coqueiro torto se desenrolava e se transformava na atriz Isadora
Ribeiro? Pois o tal coqueiro, e toda a área em que se
situava, já foram engolidos pelo Oceano Atlântico há
muito tempo.
A
vila fica à margem do rio, e para se chegar à praia
do outro lado é preciso cruzar as dunas em bugues, num
passeio obrigatório (afinal, quem teve o trabalho de ir
até lá não vai querer ficar parado no
vilarejo). As dunas podem não ser tão altas e
extensas quanto as de Jenipabu (RN), mas o cenário não
tem comparação. A visão da vila e do
estuário do alto da duna é estonteante, impossível
de se captar em simples fotos (mesmo assim, fizemos uma
tentativa).
Entre
as dunas e o mar, nos deparamos com a visão insólita
de um agrupamento de cabanas. Fomos até lá e
encontramos a pousada mais rústica que se possa imaginar!
Nada mais que precários bangalôs de madeira, sem
banheiros, água ou eletricidade, mas com placas
bilíngües... Parecia um lugar destinado a
“bichos-grilos” no último grau de piração.
Infelizmente estava fechada, o que nos impediu de conhecer o
maluco ou malucos responsáveis pelo “empreendimento”.
Mas
quem quiser se hospedar na vila terá opções
bem melhores que a tal pousada de madeira. Nada de luxo ou
sofisticação, mas ninguém vai precisar
dormir no meio da areia. E ainda será premiado com a visão
que os turistas de um dia, como eu, não tiveram: o pôr
do sol no alto da duna.
Enfim,
Mangue Seco deve ser um dos últimos lugares do litoral
brasileiro a ainda manter as mesmas características de
décadas atrás, sem ter sido desfigurado pela
voracidade imobiliária. Mas, paradoxalmente, é um
local em constante transformação. Quem o visitar
daqui a um ano provavelmente verá paisagens um pouco
diferentes das de hoje. Boa razão para ir lá o
quanto antes e, quem sabe, voltar um dia.
Seguem
algumas fotos que, repito, não fazem jus à beleza
do lugar.
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