DATA |
PUBLICAÇÃO |
AUTOR |
08.06.2005 |
Capa
do Segundo Caderno - Jornal O Globo |
Bernardo
Araújo |
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ARTIGO |
A
imprensa carioca já aponta "Mezmerize" como um
dos grandes discos de 2005. Antes, o craque Arthur Dapieve já
tinha se rasgado em elogios. Agora, outros críticos de música
entrevistaram a banda tiraram o chapéu para o novo CD.
Nada como a interpretação de quem está analisando uma questão
do lado de fora. A questão em questão é nada menos do que os
Estados Unidos da América e sua cultura, sua paixão pela guerra,
pelo imperialismo, a profunda superficialidade da Califórnia,
etc. Quem interpreta tudo isso é um quarteto de rapazes
esquisitos com nomes idem: Serj Tankian, Daron Malakian,
Shavo Odadjian e John Dolmayan, o System Of A
Down, uma das bandas de rock pesado mais interessantes e
bem-sucedidas do atual milênio. Descendentes de armênios - o que
dá um sabor oriental a seu som - e ao mesmo tempo californianos
da gema, eles lançaram recentemente seu quarto disco, "Mesmerize",
que foi direto ao primeiro lugar da parada americana.
Disco segue a linha dos antecessores:
Nas 11 músicas de "Mezmerize" - que ganharão
uma continuação em "Hypnotize", com lançamento
marcado para novembro - o quarteto continua a revolução
deflagrada em "Toxicity" (2001) e "Steal
This Album!" (2003).
— "Temos consciência política, mas não sei se essa é
nossa característica mais marcante. Também somos uma banda de
rock formada por armênios, é mais um elemento presente no nosso
som. Mas é claro que queremos marcar a nossa posição contra
Bush, por exemplo. Até porque são raras as bandas que fazem
isso" - analisa o tranqüilo baterista Dolmayan,
por telefone, horas antes de um show na Filadélfia.
— "Ninguém mais tem essa coragem! Mas também não
estamos nem aí para o que outras bandas fazem" berra o
baixista Odadjian, com a voz um pouco pastosa.
De fato, é difícil uma mensagem tão cristalina quanto a
de "B.Y.O.B.", primeiro sucesso de "Mezmerize".
Aos berros, Tankian (os vocais são divididos entre ele e o
guitarrista Malakian) pergunta: "Por que os
presidentes não vão para a guerra?/ Por que eles sempre mandam
os pobres?". No refrão, o instrumental ultrapesado e
agressivo cai para uma levada dançante (que, no clipe, é
acompanhada por uma troca no visual dos músicos, que ficam
mauricinhos), e a dupla canta: "Todos vamos para festa/ Nos
divertir a valer/ Dançando no deserto/ Explodindo o brilho do
sol". O nome da música, aliás, é um trocadilho com a
expressão "Bring your own bottle", ou "Traga sua
própria garrafa", trocando "bottle" por "bomb".
— "Votamos em John Kerry e ficamos decepcionados com a
reeleição de Bush, mas não sei se a situação hoje estaria
melhor se ele tivesse perdido" - pondera o baterista. É
o mal da democracia. Os EUA só mudariam de verdade com uma revolução.
Hoje em dia tudo é comandado por lobby, através das grandes
corporações".
O discurso político é afiado, o que não significa que a banda não
planeje sua carreira meticulosamente, de olho nas regras do jogo
da indústria fonográfica, nem que seja para desrespeitá-las.
Depois de um ano no estúdio, os músicos saíram com tantas músicas
que resolveram lançar dois discos, com seis meses de intervalo.
— "Achamos que seria um desperdício não permitir que
os nossos fãs ouvissem as músicas que trabalhamos tanto para
gravar. E como um disco duplo seria caro demais, além de conter
um excesso de informações, resolvemos lançar a segunda parte, 'Hypnotize',
em novembro." - diz Dolmayan.
E o que será que a gravadora achou de uma estratégia de
marketing inusitada como essa?
— "Eles só reclamam se você não lança discos. Que
companhia se queixaria de ter produtos demais? Além do mais, nós
não somos uma banda típica do rádio americano, então temos que
tentar mostrar nossas músicas de outras formas" -
ironiza o músico.
Disco lançado, os armênios esquisitos já estão na estrada, com
mais uma carta na manga: em vez de shows em grandes espaços, para
15 ou 20 mil pessoas, eles começaram em pequenos palcos.
— "É muito mais divertido tocar para mil pessoas que te
vêem bem, olhar nos olhos deles e ouvi-los cantar. Mas sabemos
que a demanda pelos nossos shows é grande. Essa primeira série
de shows, em lugares menores, foi apenas um aquecimento. Os próximos,
com a abertura do Mars Volta, já serão em grandes arenas"
- diz Dolmayan.
Banda faz questão de vir ao Brasil
Ele garante que a América do Sul e o Brasil — que já tem
até uma campanha na comunidade virtual Orkut pedindo a vinda da
banda - estão nos planos.
— "Desta vez fazemos questão de ir até aí. Não
importa se receberemos menos, mas impusemos isso ao nosso empresário.
Além disso, temos brasileiros na equipe, que sempre nos dizem
como o público daí é apaixonado - diz.
Ele não esquece a afinidade entre países do Terceiro
Mundo.
— "Estive duas vezes na Armênia. Gostei muito de ver a
terra de meus antepassados, inclusive a parte ocupada ilegalmente
pelos turcos. Também temos que tocar por lá. Devemos à Armênia
grande parte do que nos torna uma banda diferente de todas as
outras do rock atual - conta. |
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