Nossa vida sexual num boteco do Leblon

(João Ubaldo Ribeiro)

— Tu lembra que falou na prótese, que era a revolução do futuro?

— Lembro. Ainda acho que é a revolução do futuro.

— Tu fez?

— Não, não, ainda não. Ainda estou esperando um certo avanço na tecnologia. Você sabe como são essas coisas, tu compra um computador de última geração e, na semana seguinte, ele só serve para ser aproveitado como radiador de Chevette, a tecnologia vem andando muito rápido, tem de maneirar e esperar um pouco.

— Tu tá é apavorado! Tu tem medo de dar uma bronca na cirurgia! Vamos dizer, otimisticamente: vamos dizer que dê bronca, tipo amputação compulsória, em 1 caso em 10 milhões. E se você for o sorteado?

— Não tem nada disso, cara. Quando a coisa ficar generalizada, eu faço, é só uma questão de tempo.

— Chute teu. Meu cunhado paulista continua me telefonando pra dizer que é uma maravilha, que ele agora faz coisas que nem aos 19 anos ele fazia, mas eu também não tenho coragem. Tu permite uma confidência?

— Mas é claro, nossa amizade não é de hoje nem de ontem.

— Eu sei, mas essas coisas são sempre delicadas. Eu conversei com a Etelvira, você conhece, minha senhora, e ela não ficou nesse entusiasmo todo. Aliás, ela ficou sem entusiasmo nenhum. Ela falou que tudo bem, mas não ia ser cobaia de experiência nenhuma, tudo é pela minha conta e risco, e também falou que, na volta do boteco, sábado de tardinha, não estava disponível, não tava a fim de abandonar a roda de biriba dela pra eu fazer uma experiência científica. E, se tiver de amputar, ela fica muito da satisfeita com a roda de biriba — cê sabe o que ela disse? Ela disse que valete de espadas só antes ou depois da dama, sacou a ironia cruel?

— Mas isso eu já sei, as mulheres são contra a prótese, tem umas que pensam que a gente vai aparecer no quarto detrás de um bloco de gesso. Elas querem continuar a fazer a mágica, só que o dia delas está pra chegar.

— Mas como, você mesmo falou que a prótese...

— Uma coisa que eu sempre critiquei é a sua falta de atualização. Tu tá sabendo que a prótese já está sendo superada?

— O quê? Milagre, milagre? Homeopatia japonesa?

— Não, meu caro amigo. Novidades científicas.

— E você tá me escondendo? São 30 e tantos anos de amizade, nunca imaginei...

— Não tou escondendo nada, você é que não me deixa falar. Outro dia, eu estive num urologista — olhe aqui, não conta isso pra ninguém, digamos assim que isso é segredo de Estado.

— Segredo, segredo.

— Aí eu falei pra ele desses problemas, coisa e tal, e ele me desaconselhou a prótese.

— Desaconselhou a prótese? Então estamos novamente condenados? Não tem mais jeito? Meu cunhado vai dançar?

— Não é nada disso, são os progressos tecnológicos. Estão chegando coisas que você não pode imaginar. Ele me mostrou uma ampolinha que você esconde em qualquer lugar da roupa e, 15 minutos antes do momento da verdade, é só aplicar, ali no principal. Duas horas de funcionamento contínuo, não tem erro.

— Como é o nome, como é o nome?

— Ainda não tem no Brasil, mas vai chegar. Aliás, como ainda não tem nome a perolazinha.

— A pérola? Engolir pérola resolve? Pode sair caro, mas, em muitos casos, vale a pena!

— Não, não é esse tipo de pérola. É uma bolinha brilhosa como uma pérola, que você injeta e depois massageia um pouco. Uma hora e meia garantida.

— Mas que maravilhas tu tá me contando! Quem é esse urologista, quem é esse santo homem?

— Eu lhe dou o nome dele, está aqui na carteira. Mas o melhor você ainda está por ouvir.

— Melhor do que isso, impossível. Tu conhece o Paulo Casé, o arquiteto? Ele anda cheio de canetas por todos os bolsos da camisa, vai ver que o safado já sabe dessa injeção há muito tempo. Claro, afina o bigode, dá um sorriso, tira a caneta e crau. Canalha, nunca me contou! Canetinha, injeçãozinha, crau! Canalha!

— Espere, o médico me recomendou calma. Num caso de emergência, a gente pode até conseguir uma injeção especial ou então uma dessas perolazinhas. Mas ele me aconselhou esperar a pílula.

— Vem pílula, vem pílula?

— Vem. Pau, casca. Tomou, funciona.

— E ele não te deu nem uma caixa de amostra grátis dessa pílula? Esse médico é meio sádico, não é, não?

— Não, ele não pode, tem que esperar o final dos testes, coisa de ano, ano e meio.

— Aaaai! Mas quem já esperou esse tempo todo pode esperar mais um bocadinho.

— Só tem um problema com a pílula. Ela não é automática como as outras coisas, tu tem que ter interesse na mulher.

— Ih, sujou. A Etelvira, tu sabe, tá meio despencadinha, é minha mulher, mas a verdade é a verdade, ela tá meio despencadinha.

— Tá falando você, eu não tou dizendo nada. Mas aí o problema é dela, é ou não é?

— É! É mesmo! Hu-hu-hu-hu! Ha-ha-ha-ha! Ho-ho-ho-ho! É mesmo! Me dá logo o nome desse médico, hu-ha-ha-ho!