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HISTÓRIA DA FILOSOFIA MODERNA | ||||||||||||||
Quarta Unidade - SÉCULO XX: | |||||||||||||||
A Escola de Frankfurt surgiu da iniciativa de um grupo de pensadores alemães formarem o Instituto de Pesquisa Social de Frankfurt, em 1923. O objetivo desse instituto era proceder a um exame crítico da sociedade, em geral, e em seus aspectos econômicos, culturais e de produção de conhecimento, a partir de uma perspectiva marxista renovada, isto é sem estar presa, ao historicismo ou ao materialismo. Essa escola foi fundada em uma época de grandes transformações da política germânica, que vinha de uma derrota arrasadora na I Grande Guerra (1914-1918). Durante o período da efêmera experiência liberal da chamada República de Weimar (1919-1933), o Instituto de Pesquisa Social pôde permanecer vinculado à Universidade de Frankfurt, mas depois de Adolf Hitler (1889-1945) ter assumido o posto de chanceler, em 1933, o departamento sofreu várias mudanças, fixando-se primeiro em Genebra (Suíça), depois Paris (França) e finalmente Nova York (EUA), onde permaneceu até o final da II Guerra Mundial (1939-1945). Os principais membros da Escola de Frankfurt foram Walter Benjamin (1892-1940); Max Horkheimer (1895-1973); Herbert Marcuse (1898-1979) e Theodor W. Adorno (1903-1969). Depois da reconstrução da Universidade de Frankfurt e do retorno do Instituto de Pesquisa Social à cidade, formou-se uma segunda geração de teóricos, dos quais se destacam Karl-Otto Apel e Jürgen Habermas. Walter Benjamin foi um crítico de arte que procurou analisar as condições técnicas por detrás da produção artística. Foi um dos primeiros intelectuais de formação acadêmica a tratar do cinema como modelo do novo paradigma de arte reprodutível que veio a dominar a cultura durante todo o século XX. Suicidou-se com 48 anos ao ver fracassada a sua tentativa de atravessar a fronteira da França com a Espanha, quando buscava asilo contra a perseguição política e étnica, promovida pelos nazistas. Por conta disso, sua obra maior ficou toda fragmentada - como Paris, Capital do século XIX, restando apenas alguns artigos e ensaios que pôde concluir - por exemplo, A Obra de Arte na Época de sua Reprodutibilidade (1936). Benjamin detectou com precisão a transformação que o conceito de arte estava passando no início do século XX, com o advento das técnicas de reprodução mais avançadas. Pouco a pouco, a obra de arte veio perdendo a aura de objeto único acessível a uma minoria que exigia um ritual de aproximação próprio, para se tornar em um veículo de propaganda ideológico cuja autenticidade depende agora do meio político ao qual se vincula. A fim de estudar a obra de arte na época das técnicas de reprodução, é preciso levar na maior conta esse conjunto de relações. Elas colocam em evidência um fato verdadeiramente decisivo e o qual vemos aqui aparecer pela primeira vez na história do mundo: a emancipação da obra de arte com relação à existência parasitária que lhe era imposta pelo seu papel ritualístico. Reproduzem-se cada vez mais obras de arte, que foram feitas justamente para serem reproduzidas. (...) Mas, desde que o critério de autenticidade não é mais aplicável à produção artística, toda a função da arte fica subvertida. Em lugar de se basear sobre o ritual, ela se funda, doravante, sobre uma forma de praxis: a política (BENJAMIN, W. A Obra de Arte na Época de suas Técnicas de Reprodução, IV, p. 11). Para atender as exigências do gosto da massa a arte moderna passa a assumir novos valores, como o de quantidade no lugar da qualidade. A importância cada vez mais crescente das massas e do proletariado exigiu dos regimes totalitários à direita e à esquerda a estetização da política e o uso político da obra de arte. Fenômenos observados nas campanhas eleitorais e em estílos artísticos como o futurismo fascista e o realismo social dos comunistas. O conceito de massa desenvolvido por Benjamin foi aplicado por Adorno e Horkheimer em sua crítica à situação paradoxal a qual o Esclarecimento havia chegado. (...) O indivíduo, sobre o qual a sociedade se apoiava, trazia em si mesmo sua mácula; em sua aparente liberdade, ele era o produto de sua aparelhagem econômica e social. O poder recorria às relações de poder dominantes quando solicitava o juízo das pessoas a elas submetidas. Ao mesmo tempo, a sociedade burguesa também desenvolveu, em seu processo, o indivíduo. Contra a vontade de seus senhores, a técnica transformou os homens de crianças em pessoas. Mas cada um desses progressos da individuação se fez à custa da individualidade em cujo nome tinha lugar, e deles nada sobrou senão a decisão de perseguir apenas fins privados. O burguês cuja vida se divide entre o negócio e a vida privada (...), rompido consigo e com todos, já é virtualmente o nazista que ao mesmo tempo se deixa entusiasmar e se põe a praguejar, ou o habitante das grandes cidades de hoje, que só pode conceber a amizade como social contact, como contato social de pessoas que não se tocam intimamente. É só por isso que a indústria cultural pode maltratar com tanto sucesso a individualidade, porque nela sempre se reproduziu a fragilidade da sociedade (HORKHEIMER, M. & ADORNO, Th. "A Indústria Cultural", in Dialética do Esclarecimento, pp.145-146). A atomização do indivíduo foi o resultado extremado do desenvolvimento da industria cultural, em sua vinculação aos ideais liberais. Esse foi o diagnóstico fornecido por Adorno e Horkheimer tendo em vista a avalanche de bens de consumo oferecidos ao grande público e o condicionamento do comportamento das massas, padronizado pela publicidade, logo após o fim da II Guerra Mundial. Quatro décadas depois, Jürgen Habermas detectou que esse processo de atomização decorria da concepção filosófica, metafísica, que desde Descartes punha o indivíduo como um ente solitário a descobrir o mundo, sem no entanto ter como perceber no outro um semelhante com o qual a sua subjetividade tem de defrontar-se. O choque dos mundos criados por cada um dos indivíduos não encontra solução sob essa tradição solipsista da metafísica. Assim o paradigma tradicional que separa o sujeito do objeto, sendo o outro um objeto para o sujeito, não pode resolver o problema das relações intersubjetivas que caracterizam o convívio social. Por conta disso, o isolamento proverbial do filósofo metafísico transpôs para os indivíduos de uma sociedade moldada dessa forma o afastamento gradativo dos indivíduos, entendidos, agora, ao pé da letra, como átomos, indivisíveis (1).
Marcuse ainda acreditava em obras tais como Eros e Civilização (1955) e O Homem Unidimensional (1964) que uma teoria e uma razão renovada seriam capazes de preparar as gerações para a ação radical. E mesmo depois das consequências frustrantes das Revoltas Estudantis de 1968, esse otimismo repetia-se em Contra-Revolução e Revolta (1973). Dentro do projeto de emancipação do esclarecimento Marcuse insistia: Preparar o terreno para esse desenvolvimento ainda faz da emancipação da consciência a tarefa primordial. Sem isso, toda a emancipação dos sentidos, todo ativismo radical, permanece cego, frustrado em seus intentos. A prática política ainda depende da teoria (só o Establishment [Situação] pode passar sem ela!): da educação, persuasão - e Razão. A Guinada da Segunda Geração Durante a II Guerra Mundial, a Escola de Frankfurt esteve radicada em Nova York. Nesse período, Marcuse trabalhou no Departamento de Serviços Estratégicos, colaborando no esforço de guerra para preparação de uma análise do regime nazista. Em 1950, quando o instituto retornou à Alemanha, Marcuse permaneceu nos Estados Unidos, ocupando cargos acadêmicos em diversas universidades, com em San Diego, em 1965. Contudo, não deixou de fazer palestras na Universidade de Frankfurt, em 1966, contra a Guerra do Vietnã. Sua pregação dos dois lados do Atlântico fez dele o principal filósofo a influenciar diretamente o Movimento Estudantil de 1968. Nessa época, já começava a se formar uma nova geração de pensadores políticos em Frankfurt. Em 1962, Habermas, que fora assistente de Adorno entre 1956 a 1959, obteve seu doutorado com a publicação da tese Mudança Estrutural da Esfera Pública. Até que Apel viesse a ingressar em Frankfurt, como catedrático em filosofia, em 1972, o interesse de Habermas esteve voltado para discussão da relação entre conhecimento científico e interesse, técnica e ideologia. Destacam-se desse período o artigo "Técnica e Ciência como Ideologia" (1968) e o livro Conhecimento e Interesse (1968), obras que, como as anteriores, procuravam resolver o problema do conhecimento em uma teoria crítica da sociedade, através de uma clarificação dos métodos, nos moldes conceituais de uma filosofia da consciência tradicional (2). Karl-Otto Apel tornou-se doutor em filosofia pela Universidade de Bonn, em 1950. Depois de ter alcançado o título de Livre Docente, na Universidade de Mainz, em 1961, foi catedrático em diversos centros acadêmicos alemães, até chegar a Frankfurt. Suas obras iniciais estavam voltadas para uma crítica da hermenêutica e do uso pragmático da linguagem, isto é à compreensão de todos os enunciados da língua como atos de fala que exercem uma ação no mundo. Em 1973, Apel publicou o artigo "O A priori da Comunidade de Comunicação" - incluído na coletânea Transformação da Filosofia -, onde lançou as bases de um novo paradigma pragmático para filosofia. Apel examinou em detalhes os problemas de fundamentação das ciências e das éticas que se baseavam no método solipsista da modernidade que esbarrava no princípio de Hume que impede a postulação de normas ou leis da natureza a partir da observação da regularidade de um fato. Ou seja, o fato de um acontecimento ser assim, não quer dizer que este deva ser assim, a famosa falácia naturalista. De modo que, da descrição, não seria possível propor nenhuma norma prescritiva. Para evitar tais dificuldades, Apel procurou adotar uma estratégia que evitasse os problemas do isolamento de sujeito e objeto, colocando o fato da comunicação estar na base de todo discurso científico e que para uma norma ser considerada válida, seria necessário, além da livre aceitação de um acordo, mas os esclarecimentos que devem atendem às exigências de justificação dos ouvintes que participam da conversação. Desde então, procedeu a segunda geração de Frankfurt a uma guinada pragmática da argumentação, que contou com o apoio de Habermas. Ambos, Habermas e Apel trataram de delinear um novo conceito de racionalidade que tinha agora a comunicação como sua forma de sustentação. O discurso teórico, não mais dependeria apenas de pressupostos sintáticos e semânticos - se uma proposição bem formulada tinha um valor de verdade -, mas sobretudo de uma compreensão intersubjetiva que precisa atender às condições pragmáticas do discurso prático, onde para ser bem sucedido a mensagem tem de ser compreendida pelo seu receptor. Uma nova concepção de verdade surgiu daí com o conceito de consenso argumentado que esteve no centro de uma promissora Ética do Discurso. Contudo, mesmo a nova racionalidade comunicativa, embora estivesse livre dos problemas de objetivação e de valores intersubjetivos que não podiam ser satisfeitos pelo paradigma anterior de sujeito e objeto, por estar ligada viceralmente a uma comunidade de falantes, a teoria do agir comunicativo permaneceu originariamente presa a formulações idealizantes. Por conta disso, tem problemas de aplicação de suas hipóteses em contextos concretos de conflito permanente de interesses, onde raramente se aplicam os pressupostos pragmáticos da comunicação. Apel teve consciência disto, já no início dessa guinada. A fundamentação de uma ética da comunicação que foi desenvolvida até aqui, parte de pressupostos idealizados. Ela considera, em princípio, não tanto a circunstância de que, na institucionalização da discussão moral, não são consideradas apenas dificuldades intelectuais, mas o fato de que esta institucionalização deve ser concretizada numa situação historicamente concreta, que já está sempre condicionada por conflitos de interesses. Ela não considera, por exemplo, a circunstância que, mesmo aqueles que adquiriram a plena compreensão do princípio moral, ainda não podem, sem mais, tornar-se membros de uma ilimitada comunidade de parceiros de comunicação com iguais membros, mas permanecem vinculados à sua real posição e situação social. Por este vínculo real eles são condenados a assumirem uma responsabilidade moral específica, que não pode ser definida pelo princípio formal da "trans-subjetividade", no sentido da comunidade de argumentação (...) (APEL, K-O. O A Priori da Comunidade de Comunicação, in Estudos de Moral Moderna, seção 2, § 2.3.5, p. 152). O problema de como aplicar as normas do discurso argumentativo ao contexto concreto do mundo da vida impediu que a Ética do Discurso não passasse de mais uma teoria contemporânea promissora. O fato de não considerar a situação moral específica de cada participante que tem de tomar suas decisões sob as pressões do tempo e assumirem as suas consequências trouxe de volta o cetismo irracionalista que atingiu o existencialismo e colocou a Ética do Discurso como, entre tantas, mais uma proposta de princípios reguladores para questões ligadas ao cotidiano de cada um. Notas 1. Veja HABERMAS, J. Pensamento Pós-Metafísico, I, 3, seção III, pp. 48- 53. | |||||||||||||||
Bibliografia | |||||||||||||||
APEL, K-O. Estudos de Moral Moderna; trad. Benno Dischinger. - Petrópolis: Vozes, 1994. BENJAMIN, W., et al. Textos Escolhidos; trad. José L. Grünnewald et al. - São Paulo: Abril Cultural, 1983. (Os Pensadores) BLACKBURN, S. Dicionário Oxford de Filosofia; trad. Desidério Murcho et al.. - Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1997. HABERMAS, J. Pensamento Pós-Metafísico; trad. Flávio B. Siebeneichler. - Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1990. _________. A Constelação Pós-Nacional; trad. Márcio Seligmann-Silva. - São Paulo: Littera Mundi, 2001. HORKHEIMER, M. & ADORNO, Th. W. Dialética do Esclarecimento; trad. Guido A. de Almeida. - Rio de Janeiro: Zahar, 1985. MACINTYRE, A. As Idéias de Marcuse; trad. Jamir Martins. - São Paulo: Cultrix, 1973. MARCUSE, H. Contra-Revolução e Revolta; trad. Álvaro Cabral. - Rio de Janeiro: Zahar, 1973. |