João da Cruz e Sousa
(Florianópolis, 1861 - Sítio, 1898)
O mais importante poeta brasileiro e um dos expoentes do simbolismo mundial era negro. Cruz e Sousa soube como nenhum outro de seu país por em versos os sentimentos universais que perturbam a alma humana. Beleza, dor, miséria, esperança, vida e morte foram cantados em tons pálidos que contrastavam ao lado obscuro do entendimento. Enquanto, ao longo de sua curta existência, marchou pelo Brasil contra a escravidão, em seguida tendo enfrentado a loucura da esposa, a fome e a doença, desenvolveu um estilo único de transcender a pobreza crônica, sem esquecer a condição material perescível de que se é feito. Sua obra literária explorou criativamente os recursos da repetição de sons, a fim de obter uma maior harmonia e efeito cristalino das imagens que compunha. Inaugurou o simbolismo brasileiro com a coletânea de poemas Broquéis e a prosa poética Missal, ambos de 1893. Publicou ainda em vida, Tropos e Fantasias (1885), seu primeiro livro. Evocações (1898), Faróis (1900) e Últimos Sonetos (1905) são edições póstumas.
Ninguém sentiu o teu espasmo obscuro,
Ó ser humilde entre os humildes seres.
Embriagado, tonto dos prazeres,
O mundo para ti foi negro e duro.
Atravessaste no silêncio escuro
A vida presa a trágicos deveres
E chegaste ao saber de altos saberes
Tornando-se mais simples e mais puro.
Ninguém te viu o sentimento inquieto,
Magoado, oculto e aterrador, secreto.
Que o coração te apunhalou no mundo.
Mas eu, que sempre te segui os passos,
Sei que cruz infernal prendeu-te os braços
E o teu suspiro como foi profundo!
(CRUZ E SOUSA, J. da. "Vida Obscura", in Últimos Sonetos).
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Imagem: Cruz e Sousa. Fonte: Editora Tecnoprint. |