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Pastores do Rebanho
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ALANDO de suas ovelhas, Jesus assegurou que elas “conheceriam sua voz” e acrescentou: “De modo algum seguirão a um estranho, mas fugirão dele, porque não conhecem a voz de estranhos.”1 Ao ler as Escrituras, passamos a conhecer a “voz” do verdadeiro Pastor, aprendemos a distingui-la das vozes que não soam verazes. Sua voz se expressa de modo a harmonizar-se plenamente com a descrição que fez de si mesmo quando chamou suas ovelhas:
Vinde a mim, todos os que estais labutando e que estais sobrecarregados, e eu vos reanimarei. Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de mim, pois sou de temperamento brando e humilde de coração, e achareis revigoramento para as vossas almas. Pois o meu jugo é benévolo e minha carga é leve.2
Hoje, como no passado, há pessoas em muitos lugares que estão deixando afiliações religiosas de muitos anos, fazendo-o exatamente por que não escutam a voz do Bom Pastor nas proclamações de suas respectivas religiões, não escutam um chamado para revigoramento e alívio, mas um chamado estridente à submissão total à autoridade humana. A “voz” que escutam não se harmoniza com a instrução que Cristo deu a seus discípulos, ao dizer:
Sabeis que no mundo, os governantes dominam sobre os seus súditos, e seus grandes homens os fazem sentir o peso da autoridade; mas não será assim entre vós.3
Pouco depois que escrevi Crise de Consciência, um amigo emprestou-me o exemplar de um livro anterior, com título incrivelmente parecido: Uma Questão de Consciência.4 Charles Davis, o autor, nascera na Inglaterra, de pais de fé católica romana. Ele diz que, na sua juventude,
. . . a pretensão da Igreja Romana de ser a única Igreja verdadeira era tida em definitivo como um fato seguro. Para mim, a Igreja Católica permanecía como verdadeira na minha vida adulta, como parte inquestionável e imutável da realidade; ela dominava o meu mundo.
Desde os quinze anos ele buscou a vocação eclesiástica como seu alvo na vida. Embora nossas heranças religiosas parecessem mundos distantes, sendo as Testemunhas de Jeová um laguinho em contraste com o vasto oceano do catolicismo, senti um elo de experiência mútua, já que eu sentira a mesma coisa pela religião em que me criei.
Charles Davis passou mais de vinte anos no sacerdócio e tornou-se o principal teólogo católico da Grã-Bretanha. Viajou muito e deu conferências tanto em seu país como no estrangeiro. Então, em 1966, decidiu deixar a religião em que nasceu. Apesar de outros paralelos com minha própria experiência que me impressionaram, foi lendo suas razões para dar este grande passo, de abandonar o sistema de crenças e a carreira religiosa que ocupara toda a sua vida, que percebi a maior afinidade e me comovi mais profundamente Ele escreveu:
Continuo cristão, mas vim a entender que a Igreja, tal como existe e funciona na atualidade, é um obstáculo na vida dos cristãos comprometidos que conheço e admiro. Ela não é a fonte dos valores que eles prezam e promovem. Ao contrário, vivem e trabalham em constante tensão e oposição a isto . . .
Para mim, o compromisso cristão é inseparável do interesse pela verdade e do interesse pelas pessoas. Nenhum destes vejo representado pela Igreja oficial. Existe um interesse pela autoridade às custas da verdade, e sou constantemente afligido por casos de dano causado a pessoas pela atuação de um sistema impessoal e falto de liberdade. Além disso, não creio que a pretensão da Igreja qual instituição tenha base bíblica e histórica adequada.5
De modo paralelo, não foi a conclusão de que havia erros nos ensinos da organização Torre de Vigia que me afetou mais seriamente, pois sabia que não podia esperar perfeição quando eu mesmo era imperfeito. Foi principalmente o espírito que se manifestava que mais seriamente me perturbou, pois eu via um semelhante “interesse pela autoridade às custas da verdade” seguida de “dano causado a pessoas pela atuação de um sistema impessoal e falto de liberdade.” O inte-resse pela autoridade obscurecia claramente o interesse pelas pessoas.
Há entre as Testemunhas de Jeová, tanto neste país como em outros, muita gente por quem tenho genuíno afeto. Também posso dizer sinceramente que existem entre os que continuam associados com essa organização pessoas a quem admiro. Mas eu as admiro pelo que são como pessoas, pois estou convicto de que são o que são, não por causa da organização na qual se encontram, mas, em muitos aspectos, apesar da organização. As qualidades e o espírito que elas têm não refletem aquilo que procede da organização oficial. Tal como disse Charles Davis, “Ela não é a fonte dos valores que eles prezam e promovem” em suas relações com outros. E seu esforço consciencioso de apegar-se a princípios bíblicos e de mostrar qualidades cristãs exemplares, com freqüência lhes trazem tensões íntimas por este exato motivo. Creio que devem sentir uma incômoda sensação de risco sempre que se expressam sobre certos assuntos.
Que espécie de pastoreio?
Na comunidade das Testemunhas, os anciãos e outros em cargos de responsabilidade são exortados a ser como o pastor descrito na ilustra-ção de Jesus citada no início deste capítulo. Essa ilustração transmite um belo quadro, em que o pastor mostra sério interesse por uma única ovelha, não apenas como parte de um rebanho ou um simples número, mas como criatura individual que precisa de sua ajuda, cuidado e proteção. A descrição faz forte contraste com a dos pastores religiosos de tempos anteriores, a quem o profeta Ezequiel dirigiu estas palavras:
A fraca não fortalecestes, a doente não curastes, a quebrada não ligastes, a desgarrada não tornastes a trazer e a perdida não buscastes; mas dominastes sobre elas com rigor e dureza.6
Não duvido que a maioria dos anciãos Testemunhas crêem ser, e deveras desejam, ser como o primeiro pastor descrito. Mas acho que, lamentavelmente, a evidência mostra um alto grau de normas organi-zacionais que geram uma situação como a descrita no segundo relato, situação em que as ovelhas são constantemente pressionadas por seus pastores, e mesmo as fortes são empurradas num ritmo extenuante, no qual resta muito pouco tempo para ajudar as cansadas, doentes, quebradas, desgarradas e perdidas dentre elas. Numa congregação após outra, a triste verdade percebida pelos membros é que os anciãos têm pouco tempo para gastar com eles em períodos de dificuldade, doença, depressão ou desânimo, mas gastam primariamente este tempo em empurrá-los para maior atividade no serviço de campo. Estão “ocupados demais” para prover ajuda revigorante e animadora, mas bem dispostos a agir se houver qualquer suspeita de má conduta, providenciando então muitas horas para investigar e deliberar.7
A organização acumula a cada ano um incrível registro do número de pessoas expulsas, com 36.638 sendo desassociadas apenas no ano de 1985, e outras 37.426 desassociadas em 1986.8 Sem dúvida, um percentual considerável destas pessoas tinha se envolvido em práticas do tipo descrito pelo apóstolo na sua exortação em 1 Coríntios 5: 9-13, práticas tais como fornicação, roubo, bebedice, e atos imorais semelhantes.
Todavia, embora seja alto o registro de expulsão de tais pessoas, o registro de ajuda da organização para recuperar e restabelecer as co-Testemunhas que caem em transgressão ¾ de mostrar disposição, não de gastar algumas horas, mas de prover extensa ajuda pessoal durante semanas ou até meses, se necessário, para edificar-lhes o vigor espiritual e ajudá-las a sarar ¾ é, em contraste, notavelmente fraco.
São inegavelmente freqüentes problemas entre os jovens das Testemunhas de Jeová e, vez após vez, o “remédio” consiste apenas de audiências judicativas, não raro seguidas de desassociação. A organização pode com justiça relatar casos específicos de ajudar pessoas “do mundo” ¾ viciadas em drogas, violentas ou imorais ¾ a deixar o erro. Isto amiúde ocorre em resultado de encontrá-las no “serviço de campo.” Mas, uma vez que a pessoa dá o passo do batismo, o interesse de dedicar mais tempo a ela (tempo que não mais é relatado como “serviço de campo”) se desvanece espantosamente. De modo que o registro de ex-transgressores trazidos de volta à organização (aumentando assim o tamanho numérico do “rebanho”) é consideravelmente melhor que o registro de ajuda aos que já estão dentro para que permaneçam espiritualmente fortes, ou para recuperá-los de uma fase de transgressão.9
Pode-se notar esta preocupação com aumento numérico na declaração do Anuário de 1980 (página 11) de que “se não tivesse havido desassociações, os Estados Unidos teriam tido um aumento de quase 3,5 por cento, em vez de quase 1,5 por cento.” (Isso significa que 2 por cento do total de membros foram desassociados naquele ano.) O que parece incrível é que a organização não se concentre aqui na situação da “ovelha perdida,” mas no percentual menor de aumento relatado! Que diferença gritante do pastor da parábola de Jesus, que se dispunha a deixar as noventa e nove no interesse de resgatar a ovelha extraviada.10
Quando a Comissão do Departamento de Serviço enviou esta carta à Comissão de Serviço do Corpo Governante, incluiu-se o comentário de que “pessoas estão sendo desassociadas por jogos de azar quando há evidência de que não são de fato gananciosas.” E acrescentou-se: “Suscitou-se também a questão de por que só se considera a ganância como motivo para desassociação quando relacionada aos jogos de azar. Há outros que são muito mais gananciosos que um apostador ocasional . . . Todavia, jamais se suscita a questão quanto a serem gananciosos e chamados a uma comissão judicativa.”
Desde essa reunião até a presente data [25 de agosto de 1988], nem sequer um dos anciãos, incluindo W. Parkes [superintendente de circuito] em suas visitas posteriores a Warrenton, veio ver-nos, dar-nos algum apoio, espiritual ou de qualquer outro tipo.
Embora os anciãos não achassem tempo para dar-lhe algum apoio ou encorajamento, após nove meses sendo virtualmente ignorado, ele enfim recebeu deles um telefonema, intimando-o a uma audiência judicativa. Em vez de suportar a tensão emocional desta audiência, ele resolveu entregar uma carta de renúncia à própria organização.
Suas palavras não falam de pessoas que afirmam ser cristãs e que em alguma ocasião foram culpadas de atos imorais, avareza, alcoolismo ou erros semelhantes, mas de pessoas que afirmam ser cristãs e são imorais, são avarentas, são alcoólatras e assim por diante. A pessoa que se embriaga numa única ocasião não se torna “alcoólatra,” assim como um ato de imoralidade não torna alguém automaticamente “fornicador” ou “imoral.” As palavras do apóstolo se relacionam claramente a um proceder contínuo de vida, uma característica e fator distintivo do que a pessoa realmente é. Acatar esta instrução apostólica não deve constituir problema complexo para os cristãos. Não devemos achar difícil determinar se um indivíduo é alguém que, se convidado aos nossos lares, representaria um claro perigo, uma influência corrompedora, para a moralidade e a fé cristã de nossa família, de nossos filhos.
Na norma da Torre de Vigia, porém, esta instrução apostólica é aplicada de um modo que a transforma na base de um exercício complicado e formalista de autoridade legal, pelo qual os que deviam servir como pastores espirituais, tornam-se muitas vezes pouco mais que policiais espirituais, e até detetives, promotores, juízes e aplica-dores de sanções. Em muitos aspectos, este sistema parece mais inspirado nos sistemas judicários e agências da lei do mundo, com tribunais de primeira instância e apelação, códigos de processo, autos de sentença e apresentação de provas. Os anciãos até formam um tribunal eclesiástico, a quem cabe julgar aceitáveis as ações de divórcio antes de cogitar-se de novo casamento. As diretrizes da organização, com efeito, instituem um arranjo religioso em que os anciãos atuam como “padres confessores,” a quem se deve confessar todos os pecados graves, e que podem conceder a “absolvição,” se assim decidirem. E, como veremos, tais normas criam um sistema de “informantes,” em que cada membro sente o dever de relatar desvios, por parte de qualquer membro, das normas da organização ¾ a menos que a própria pessoa vá ao “confissionário” do corpo de anciãos. Ao mesmo tempo, isto gera a atitude e o clima em que os que caem em transgressão muitas vezes temem buscar ajuda, receando que a admissão do erro acione imediatamente as engrenagens da máquina judicativa.13
Uma carta da filial britânica da Torre de Vigia para o Corpo Governante menciona a norma da organização de que todos os pecados graves devem ser relatados ao corpo de anciãos e não podem ser tratados por um só ancião ou mantidos em confidência por ele.14 Cita o caso de “uma irmã de caráter irrepreensível, com boa reputação na congregação, esposa de um descrente que mostra pouco amor por ela,” que numa única ocasião cometeu adultério com um homem não-Testemunha. No dia seguinte, muita aflita, foi a um ancião e confessou seu erro. A carta da filial relata:
O ancião, homem compassivo, conhecendo bem a irmã havia muitos anos, deu-se conta de que ela não era uma pecadora empedernida, que já havia repreendido a si mesma, e que simplesmente necessitava de encorajamento e ajuda para para recuperar o equilíbrio espiritual e a boa relação com Jeová. Ele orou com ela, aconselhou-a e fez arranjos para ajudá-la continuamente, a fim de assegurar-se de que não voltaria a cair em pecado nem ser consumida pelo remorso.
O ancião, todavia, sentiu-se na obrigação organizacional de relatar o assunto ao superintendente presidente. O resultado:
Infelizmente, este irmão [o superintendente presidente] não gostou do modo como o ancião tratou do assunto e o levou ao conhecimento do corpo de anciãos, o que gerou entre eles uma contenda quanto a se o ancião estava certo ou errado. Podemos dizer, neste caso específico, que a irmã se recuperou e vai bem no serviço de Jeová.
O importante para estes anciãos não era se a ovelha desgarrada fora ajudada a recuperar-se. Era se a norma organizacional fora seguida. O fato é que não fora, e apesar dos evidentes bons frutos da atitude do ancião, ele sem dúvida agira “à margem da lei” do ponto de vista da organização. Ele percebera que se a irmã fosse levada perante uma comissão sua reputação seria séria e desnecessariamente prejudicada. A norma da organização, porém, não deixa que tais preocupações restrinjam sua ação. O coordenador da filial britânica diz ainda:
Não há duvida de que muitos que passaram pela mesma situação da irmã refrearam-se de confessar seu pecado a um ancião, sabendo que se fossem em seguida a uma comissão judicativa, o assunto iria vazar e se tornaria de conhecimento público, arruinando uma reputação antes impecável. O fato de se refrearem causou-lhes dano espiritual. Não é melhor que estas pessoas boas, culpadas de um único erro, possam saber que seu problema será tratado de modo reservado? Não os encorajaria isso a tomar a iniciativa de confessar sua transgressão e receber a ajuda de que precisam?
Alguns podem dizer que isto encorajaria as pessoas a pecar, crendo que a coisa seria tratada discretamente, como num “confissionário,” e daí pecar novamente. Mas esse argumento não tem base. Se tiverem inclinação para continuar a pecar, sabem que isso será tratado por uma comissão judicativa...
Portanto, nossa pergunta é se cada ancião pode tomar sua própria decisão quanto a como tratar de tais assuntos, inclusive imoralidade, ou deve levá-los ao corpo de anciãos para que o investiguem.
O raciocínio do coordenador de filial era correto, compassivo, bem como revelador dos reais danos causados pela norma restritiva da organização. O Corpo Governante, porém, não alterou a norma. Predominou o conceito tradicional.15
Visto que as normas da organização se infiltraram praticamente em todas as áreas de conduta, os anciãos sentem-se também autorizados, e às vezes, até obrigados, a envolver-se em qualquer aspecto da vida dos outros da congregação, com ou sem convite. Isto gera uma situação em que os direitos dos pais Testemunhas, de disciplinar e restabelecer seus filhos como acharem melhor, ficam muitas vezes sujeitos ao controle e à ação prévios, e até arbitrários, dos anciãos. Os pais não se sentem livres para tomar suas próprias decisões quanto a se querem assistência de outros ou não. Sentem-se na obrigação de comunicar aos anciãos casos de transgressão dentro das próprias famílias. Os anciãos decidem se “os pais estão no controle da situação”; caso contrário, atuam na questão como tribunal de justiça.16 Ocorre também, com freqüência, uma interposição similar da autoridade judicativa dentro da relação conjugal.17
Ademais, a evidência indica que, com preocupante freqüência, sua intervenção não vem da vontade de oferecer ajuda e curar, mas da capacidade das autoridades designadas, por razões quase ilimitadas, de investigar, interrogar e intimar para depor.18 Com excessiva freqüência, a intenção do interrogatório inicial (geralmente feito por dois anciãos) parece ser determinar se a evidência fornece base para acusação, obrigando assim o transgressor a submeter-se a uma audiência judicativa perante um tribunal religioso (“comissão judicativa”) de três anciãos, audiência que é essencialmente secreta, aberta apenas às pessoas admitidas pela “comissão judicativa.”
Embora isto possa parecer uma expressão de interesse compassivo pela privacidade do acusado de transgressão, não é o desejo dele que conta. Mesmo que o acusado deseje e peça que o assunto seja tratado abertamente, de modo que todos possam testemunhar as evidências, isto não é permitido pelas normas da organização.
Como dissemos, os esforços de recuperação ou “reajuste” para “salvar” a pessoa geralmente não vão além de uma ou duas reuniões com ela. Como uma espécie de remédio universal, os anciãos costumam receitar um aumento na participação no “serviço de campo” e a assistência às reuniões, e se a pessoa não segue esta recomendação, isto é visto como demonstração de atitude impenitente. Raramente se oferece ou provê um programa duradouro, a longo prazo, de ajuda pessoal. Se considerada culpada e sem evidência suficiente de arre-pendimento, a decisão da comissão (seja desassociar, ou, numa ação menos drástica, repreender publicamente) é anunciada à congregação sem que esta tenha conhecimento dos reais motivos para a decisão.
Se fôr desassociada, a pessoa passa a ser vista como na “condição de desassociada.” Já não se trata da questão do que ela está realmente fazendo ou da vida que está levando, mas de qual é sua categoria ou posição. Só poderá sair dessa condição por seguir o procedimento prescrito pela organização. A decisão de pôr fim ou não à sua “condição” de desassociada cabe totalmente à comissão judicativa de anciãos.
Portanto, um jovem de 16 anos, pode ser desassociado por algum ato de imoralidade sexual. Ele pode preferir não dar os passos necessários para a “readmissão” e o fim de sua “condição” de desassociado. Contudo, pode não mais praticar a imoralidade sexual, depois casar-se, gerar filhos, mostrar-se marido fiel, bom pai, pessoa honesta e responsável, buscando viver segundo princípios cristãos. No entanto, não importa quantos anos passem ou que tipo de pessoa ele agora mostre ser, ele tem de ser tratado tal como se fosse alguém sexualmente imoral, uma influência corrompedora, uma pessoa com quem outros cristãos, e até seus parentes, não devem se associar. Por quê? Porque ele não deu os passos legais estabelecidos pela organização para pôr fim a sua “condição de desassociado” e ser oficialmente declarado apto para associação. Se o pai da parábola do filho pródigo tivesse vivido segundo tais normas, após ver seu filho rebelde aproximando-se de casa, em vez de correr e abraçá-lo como fez, ele teria insistido primeiro que seu filho fosse escrutinado por uma comissão de três pessoas, para determinar se o pai estava justificado em expressar tal interesse e afeto paternal.19
Deste modo, cristãos adultos e maduros são privados de qualquer direito de exercer seu discernimento quanto a se alguém leva uma vida limpa ou não, se pode ser livremente convidado a seus lares ou não. A autoridade religiosa deve primeiro decidir isto, e se a autoridade não retira o “rótulo” de desassociado, a pessoa permanece como “tabu.”
Na sede de Brooklyn (como também nas filiais de vários países) há arquivos em que se registram todas as desassociações. Ali se guardam não só nomes de desassociados, mas geralmente também a correspondência com detalhes dos fatos. Podem ser mantidos por tempo considerável, por muitos anos, até mesmo após a pessoa ser “readmitida.” Por alguma estranha razão, mesmo quando a pessoa alistada morre, a prática na sede de Brooklyn tem sido manter o registro da desassociação dela!20
Em 1973, uma Testemunha escreveu à sede mundial declarando que, numa visita às dependências de Brooklyn, o guia apontara um arquivo marcado “Confidencial” e explicou que este continha os registros dos desassociados. Este homem fora desassociado dezesseis anos antes e restabelecido apenas sete meses depois da desassociação. O período foi curto devido à natureza insignificante do problema. Na carta, ele dizia que outros anciãos lhe disseram depois que achavam que a medida de desassociação fora tomada só porque “a Sociedade estava enfatizando a ‘lealdade à organização.’” Quatro meses após ser desassociado, e antes de sua readmissão, ele foi convocado para o serviço militar e dispôs-se a enfrentar a prisão por recusá-lo. Na carta, escreveu que achava perturbador imaginar que, além do sofrimento íntimo que passou em resultado da desassociação, ele agora deparava-se com a probabilidade de que seu nome estivesse num “arquivo confidencial.” Disse que, “ter uma ‘marca’ negativa de alguém num arquivo permanente, como o arquivo policial de uma delegacia, me parece altamente irregular.” Em sua Palavra, Deus convida misericordiosamente os que pecam a reconciliar-se com Ele, e lhes assegura que, embora seus pecados sejam como escarlate, “serão tornados brancos como a neve,” e diz: “Perdoarei seu erro e não me lembrarei mais do seu pecado.”21 Como se vê, em contraste, a organização Torre de Vigia mantém cuidadosamente volumosos arquivos, que contêm vasta quantidade de informação embaraçosa.22
Um procedimento sem precedente bíblico
Não há nada que mostre que a atitude e a situação legalística tão fortemenente presentes na organização das Testemunhas foi alguma vez instituída entre o povo de Deus, quer nos tempos pré-cristãos ou cristãos. Elogiando a provisão da constituição dos Estados Unidos que garante ao acusado “o direito de ser julgado pronta e publicamente... ser informado da natureza e razão da acusação; de ser acareado com as testemunhas da acusação,” a revista Despertai! de 22 de dezembro de 1981, página 17, passou a demonstrar que a justiça na nação de Israel empregava estes mesmos princípios, afirmando:
Visto que o tribunal local estava situado nos portões da cidade, não havia dúvida de o julgamento ser público! (Deut. 16:18-20) Sem dúvida, os julgamentos públicos ajudavam os juízes no sentido de exercerem cuidado e justiça, qualidades estas que às vezes faltam nas audiências em tribunais secretos e arbitrários. E o que dizer a respeito de testemunhas?
Nos tempos bíblicos, exigia-se que as testemunhas depusessem publicamente. Por esta razão eram alertadas a não se deixarem influenciar no seu depoimento pela pressão da opinião pública ‘de modo a se desviarem com a multidão, para perverter a justiça’.
Embora, quando convém, a organização Torre de Vigia recorra com freqüência à lei mosaica e seus procedimentos em apoio a suas normas, ela age exatamente ao contrário dos princípios ali expostos. Embora enalteça o espírito de “cuidado e justiça” que emana das audiências publicas, a verdade é que todas as audiências de “comissões judicativas” das Testemunhas são, por norma da organização, realizadas precisamente como nos “tribunais secretos e arbitrários,” resultando em que a comissão, de fato, só presta contas a si mesma. A validade das decisões que anunciam tem de ser aceita pela congregação unicamente à base na fé. Ao contrário dos membros da congregação de Corinto, que sabiam claramente da razão e das circunstâncias que fizeram Paulo exortá-los a parar de associar-se com a pessoa em questão, os membros da congregação hoje são deixados no escuro. Suposições, conjecturas e tagarelice amiúde preenchem o vazio criado pelo sigilo das ações da comissão. Como disse alguém: “Tentar parar um boato é como tentar deter o som de uma campainha,” e, uma vez desencadeada, a tagarelice gerada por estas audiências secretas pode trazer dano permanente, bem como injusto, à reputação da pessoa.
Nos tempos pré-cristãos, a evidência bíblica é que os anciãos da cidade ou aldeia serviam basicamente em funções judicativas quando solicitados a fazê-lo por alguém que dizia ter sido lesado, resolvendo, assim, as controvérsias em primeira instância, sendo os casos mais graves e difíceis levados ao sacerdócio do templo ou, mais tarde, ao rei, como representantes de Jeová. (Confira Êxodo 18:13-16; Deuteronômio 17:8, 9; 25:1; 2 Samuel 14:4-7; 15:2-6; 1 Reis 3:16-22; Isaías 10:1, 2; Rute 4:1-13). Há pouco indício de que os anciãos das aldeias iniciassem unilateralmente ação como investigadores e promotores, a não ser em casos de crimes muito graves, como por exemplo, os que envolviam derramamento de sangue ou adoração de deuses falsos. (Deuteronômio 17:2-5; 21:1-9). Amiúde usa-se o texto de Deuteronômio 21:18-21 para justificar a intervenção dos anciãos em casos de transgressões de crianças. Este mostra, na verdade, que a questão era basicamente entregue aos pais, para que a tratassem e decidissem, pois os pais descritos no texto tinham claramente esgotado seus esforços de corrigir e recuperar. Só transferiam a questão aos anciãos da cidade quando forçados a concluir que seu filho (evidentemente já com idade suficiente) era um caso extremo, mostrando-se um rebelde incorrigível, glutão ou beberrão.
Os cristãos, é claro, não estão sujeitos ao sistema legal de Israel, embora seus princípios básicos lhes sirvam de guia. A leitura das Escrituras Cristãs mostra claramente que os apóstolos e outros escritores enfatizavam, não a aplicação rígida e escrupulosa da lei, mas a edificação dos concrentes em amor e fé por meio de ensino, exortação, repreensão, encorajamento, e, acima de tudo, pelo exemplo, como meio de alcançar a pureza moral e ética entre os cristãos. Estes não deixavam de se associar com os praticantes de pecado devido a procedimento e decreto judiciais formalizados. Era uma reação congregacional voluntária, a nível pessoal, não uma ação resultante de decreto judicial imposto aos membros como coletividade. Embora, quando as circunstâncias exigiam, os membros da congregação fossem exortados a evitar associação para o bem da congregação e seu nome, e com a esperança adicional de que o transgressor se envergonhasse e deixasse seu proceder, notamos a declaração de Paulo aos cristãos coríntios, de que a “censura da parte da maioria” da congregação era suficiente e que o homem devia então ser perdoado por eles, não readmitido por uma comissão. (2 Coríntios 2:6-8). Em contraste, a norma da Torre de Vigia leva também à desassociação dos membros que não acatarem a proibição oficial de associar-se com os desassociados. Paulo, porém, nada diz sobre tomar tal medida contra a minoria que optou por não participar da censura ao transgressor citado em sua carta.
Outrossim, se o teu irmão cometer um pecado, vai expor a falta dele entre ti e ele só. Se te escutar, ganhaste o teu irmão. Mas, se não te escutar, toma contigo mais um ou dois, para que, pela boca de duas ou três testemunhas, todo assunto seja estabelecido. Se não os escutar, fala à congregação. Se não escutar nem mesmo a congregação, seja ele para ti apenas como homem das nações e como cobrador de impostos.
A organização Torre de Vigia enfatiza a última frase, “seja ele para ti apenas como homem das nações e como cobrador de impostos,” em apoio à atitude extrema contra os que são oficialmente excomunga-dos.23 A Sentinela de 15 de dezembro de 1981 traz abundante informação histórica sobre a conduta tradicional dos fariseus para com tais pessoas nos dias de Jesus, e então a impõe como modelo para sua norma moderna.
Os judeus tinham, na época, um sistema de exclusão envolvendo etapas de punição, descritas por três termos:
1) Nidduy, para a primeira ofensa. Esta proibia compartilhar o banho, a navalha de barbear, partilhar a mesa, e restringia o contato social e o comparecimento ao templo. Durava 30, 60 ou 90 dias.
2) Se o ofensor continuasse obstinado, a maldição (herem) era formalmente proferida contra ele pelo conselho (dez homens), sendo excluído da vida intelectual, religiosa e social da comunidade, completamente separado da congregação.
3) Shammatha, é provavelmente um termo genérico aplicado tanto à nidduy como à herem. Era evidentemente isso que se aplicava às pessoas “expulsas da sinagoga,” como em João 9:22; 12:42; 16:2.24
Jesus pode ter se referido a estas diferentes etapas, quando disse a seus seguidores que as pessoas “os excluiriam, vituperariam [do grego, oneidizo, equivalente ao hebraico herem (“maldição”)], e lançariam fora o nome deles, como iníquo.”25
Este procedimento dos judeus recorda uma das normas da Torre de Vigia, a qual, embora não seja um paralelo exato, mostra idêntico espírito formalístico, com suas etapas correspondentes, que são:
1) Tomar nota, aplica-se aos que, embora não conhecidos como culpados de pecado grave, são vistos como demonstrando “flagrante desrespeito pela ordem teocrática.” Tal pessoa é primeiro admoestada, e, se persistir em seu proceder, faz-se então um discurso à congregação a respeito de seu tipo de conduta, e os membros são avisados para “tomar nota” de qualquer pessoa que a pratique. Ela não é totalmente expulsa, mas os membros devem ‘limitar sua associação social’ com ela.26
2) Repreensão, ligada a um período probatório. Envolve pecados tidos como mais graves que os casos em que se “toma nota.” (Embora pecados como fornicação, bebedice e roubo sejam sempre suficientes para merecer “repreensão” oficial, em outras áreas a distinção nem sempre é clara e em grande parte depende da opinião dos anciãos dos anciãos que tratam do assunto.) A “repreensão” pode ser “particular” ou perante “todos os expectadores” (os “expectadores” são os que foram testemunhas na audiência do tribunal religioso), ou, se o assunto é de conhecimento geral, “repreensão” perante toda a congregação. Se for oficialmente “repreendido” perante a congregação, faz-se isto na “Reunião de Serviço” semanal, e o anúncio pode ser seguido de um discurso tratando do tipo de pecado envolvido. Pode-se aplicar restrições, tais como não ter parte em dirigir reuniões, não representar a congregação em oração, ler textos bíblicos ou mesmo comentar nas reuniões.27 A pessoa não é oficialmente classificada como expulsa, mas sofre um tratamento frio e a redução da aceitação social e é quase certo que seja alvo de falatório e suposições, embora só os anciãos conheçam os fatos do caso. A duração do período probatório é determinada pelos anciãos que atuaram como juízes.
3) Desassociação, que traz a rejeição total, o completo corte de relações. Os demais não devem sequer falar com os desassociados.
Em comparação com as práticas judaicas em vigor no tempo de Jesus, vemos não apenas ênfase semelhante a procedimentos prescritos, mas, o que é mais incrível, a manifestação de um espírito legalístico semelhante. As Escrituras, em vez de defender o sistema judaico existente, mostram que seus efeitos eram aterrorizantes, inculcando forte medo da autoridade. Em vez de aprimorar o caráter das pessoas mediante a disciplina, tinha sobre elas um efeito corruptor, debilitante. O apóstolo João, que escreveu que “o amor joga fora o temor,” é mais notável ao revelar como este sistema de exclusão exercia um efeito danoso sobre a consciência dos judeus, restringindo sua expressão de fé e levando-os ao ponto de negar o Messias.¾Veja João 7:13; 9:22; 12:42, 43; 19:38; 20:19; 1 João 4:18.
Exemplo da intimidação sentida, Nicodemos, embora cresse que Jesus tinha “vindo de Deus,” assim mesmo esperou até a noite para visitá-lo, incógnito. Jesus lhe disse que “quem faz o que é verdadeiro se chega à luz,” em vez de buscar o manto protetor da escuridão para evitar que se descubra o que ele realmente crê de coração.28 Tenho tido contatos similares, atualmente, com pessoas que até dispõem de caixas postais especiais a fim de corresponder-se, e usam um pseudônimo para proteger sua identidade. Um jovem, cujo pai é um proeminente ancião, telefonou-me, e só tinha falado uma ou duas sentenças quando perguntou: “Você não está gravando esta conversa, está?” Garanti-lhe que não fazia isso. Ele continuou: “Não tem equipamento de computador para rastrear meu número?” Eu ri e disse: “Não, não tenho, e se o tivesse não o teria usado.” Ele disse ter certeza de que eu sabia do risco que corria em telefonar-me, e que se sua esposa entrasse ele teria de desligar imediatamente. Não muito depois, ele encerrou a conversa rapidamente. No dia seguinte, telefonou de novo e disse: “Acho que pareci um pouco paranóico.” Respondi: “Pareceu, sim, mas eu entendo a razão.” Ele manteve contato por vários meses, e até hoje não sei o nome dele (nem me esforcei para descobri-lo). O medo é quase palpável e vem da mesma fonte que o medo de Nicodemos e outros de sua época, o medo de ser descoberto e punido pela autoridade religiosa.
Nas palavras em Mateus 18:15-18, Jesus não deixou prescrição de uma excomunhão organizacional. O fraseado indica uma ofensa e um castigo de natureza puramente pessoal.29 Mesmo após referir-se à “congregação” (falando evidentemente da congregação judaica existente, pois ainda não existia a congregação cristã), Jesus disse: “seja ele para ti [singular] como um gentio ou cobrador de impostos.”30 Em vez de uma ação eclesiástica, imposta a toda uma congregação, trata-se de simples princípio que permite ao ofendido evitar, de modo digno e pessoal, o ofensor obstinado. O contexto anterior e posterior a estes versículos também apontam para isto.
Ao passo que os versículos 17 e 18 deste trecho são interpretados como ação da autoridade eclesiástica, os seguintes indicam o oposto. Até mesmo duas pessoas podem chegar a uma decisão sobre assuntos religiosos e ter a bênção de Deus ao fazê-lo. (Veja o versículo 19). Essa bênção não depende de eles serem pessoas com um cargo oficial, nem de que sua decisão seja submetida a uma autoridade centralizada. O motivo é que Jesus promete estar “no meio deles,” guiando seus pensamentos, tal como faz em todos os outros casos de verdadeiro esforço cristão. Isto é que produz acordo e unidade genuína, a despeito de números. Seu Pai está “sobre todos e por intermédio de todos,” não apenas por alguns, cultivando a “unidade do espírito.”31 Cristo orou pela unidade deles, sabendo que, apesar do poder de sua influência pessoal na terra, isso em si não a manteria, e que a paz deles só poderia vir como fruto do Espírito de Deus.32 Não era uma paz a ser imposta por um controle autoritário.
No versículo 6 do capítulo 18 de Mateus, Jesus advertiu contra ‘pôr uma pedra de tropeço diante de um destes pequenos que crêem em mim.’ A crença nele é o critério, não a aceitação do pacote doutrinal e eclesiástico de uma organização. Enfatiza-se a relação pessoal com o Pai (versículo 10) e relaciona-se isto com a parábola da ovelha perdida e a profunda preocupação do pastor (versículos 12-14). A evidência é que por seu dogmatismo, sua exigência de autoridade e seu incansável controle sobre o pensamento, as crenças e a consciência das Testemunhas, a organização deveras faz muitas pessoas tropeçar O pior é que, após fazer isso, ela as abandona depois de apenas algum esforço simbólico para remediar o problema. No entanto, elas estão entre os “pequenos” de quem Cristo disse: “crêem em mim.”
Um exemplo dentre muitos que ilustram como o espírito existente motiva os anciãos, ou, no mínimo, permite que se sintam justificados a tomar medidas duras contra os “pequenos,” é o caso de um casal de jovens que moravam num estado do meio-oeste e estavam noivos. O rapaz morava só num apartamento; a moça morava com a mãe e o padrasto. As mães de ambos tinham se tornado Testemunhas e convenceram o casal a estudar com as Testemunhas de Jeová, pois isto daria um bom início a seu casamento. Iniciaram o estudo com um casal de “pioneiros” da região, o marido estudando com o rapaz, a esposa com a moça. Os jovens mostravam desejo genuíno de obter conhecimento da vontade de Deus, e em poucos meses começaram a assistir a algumas das reuniões das Testemunhas. A esposa do casal de “pioneiros” que estudava com eles relata o que aconteceu então:
Numa sexta-feira, meu marido recebeu uma ligação do rapaz, dizendo que tinha um problema e pedindo, por favor, que fôssemos lá. Quando chegamos a seu apartamento, a moça também estava lá. Ela explicou que na noite anterior seu padrasto a expulsara de casa. Não tendo para onde ir tão tarde da noite, fora para o apartamento de seu noivo e este, preocupado em fazer a “coisa certa,” cedeu a ela seu quarto e dormiu no sofá. Haviam telefonado porque queriam encontrar imediatamente um lugar para ela ficar. Meu marido e eu oferecemos para que ela ficasse conosco até poder resolver as coisas com o padrasto ou achar outro lugar para ficar. Ela viria para nossa casa naquela noite.
Enquanto regressávamos, meu marido disse que embora concordasse com o arranjo, queria de qualquer modo “esclarecer a situação” antes com os anciãos da congregação. Eu disse que não entendia por que precisávamos do “carimbo” dos anciãos para receber alguém em casa ¾ principalmente por que meu marido, como chefe da casa precisava disto. Assim mesmo, ele estava decidido a falar com os anciãos antes de levar a moça para nossa casa, dizendo que queria que os anciãos soubessem que ele era “submisso à organização.”
Naquela noite ele reuniu-se com dois anciãos e, após uma longa conversa particular, disseram-lhe que em nenhuma circunstância devíamos admitir a jovem em nossa casa. Fiquei chocada e meu marido pareceu também muito surpreso. Chegamos em casa após as 9.30 da noite e soubemos que a jovem tinha nos esperado durante horas mas fora embora. Meu marido ligou para ela e a informou que os anciãos não queriam que ela ficasse conosco e que nossa oferta ficava, assim, cancelada. O jovem casal não sabia o que fazer e decidiu que ela teria de passar mais uma noite no apartamento.
Às 9 da manhã seguinte, dois anciãos bateram à porta do apartamento e foram convidados a entrar. O jovem casal disse que, de início, se alegrou por alguém ter vindo ajudá-los. Os anciãos, porém, perguntaram simplesmente se era verdade que a moça tinha passado duas noites no apartamento. O casal confirmou e tentou explicar o motivo. Os anciãos responderam que isso era tudo o que precisavam saber e disseram que em vista do que tinha acontecido eles não tinham escolha a não ser “dissociar” formalmente o casal no dia seguinte, na reunião de domingo. Apesar do que tinham dito aos anciãos, foram presumidos como culpados.
Chegamos pouco depois da saída dos anciãos e encontramos o casal deprimido e desiludido. Eu não podia crer que tal medida fosse necessária em vista das circunstâncias, especialmente com pessoas que estudavam havia apenas três meses e só tinham assistido a algumas reuniões. Quando meu marido contatou os anciãos, estes o informaram de que podiam corretamente “dissociar” qualquer pessoa, desde que esta tivesse assistido pelo menos a “uma única reunião.” No domingo, na presença das mães e de duas irmãs do casal, foi lido o anúncio formal da “dissociação” deles, bem como foi dito aos da assistência que não deviam associar-se com eles. O jovem casal estava agora separado também de suas famílias.
Meu marido combinou, alguns dias depois, conversar com o superinten-dente de circuito. Aparentemente muito compreensivo, este homem nos disse, contudo, que embora quisesse ter sabido disso antes de ser dado o anúncio, agora que isso acontecera nada podia ser feito, e que a Sociedade não queria desautorizar publicamente os anciãos locais.
Os dois jovens disseram que achavam que fosse o que fosse que fizessem. estariam condenados de qualquer modo. Passaram a viver juntos, alguns meses depois casaram-se, tiveram filhos e eventualmente se divorciaram. Não posso deixar de pensar que, se não tivessem sido expostos à vergonha pública e alienados de suas famílias tão cedo na vida deles, a estrada da vida teria sido mais suave. Independentemente de suas vidas terem sido diferentes ou não, o modo como foram tratados certamente mostrou pouco amor, miseri-córdia ou compaixão.
Isto ocorreu antes de A Sentinela de 15 de novembro de 1988 determinar que os não-batizados que se envolvem em transgressão não devem ser oficialmente declarados ou tratados como desassociados. Com a nova regra, os anciãos talvez tivessem agido de modo diferente. Isto, contudo, simplesmente ressalta o erro de se impor regras criadas por uma organização, regras que prevalecem sobre a consciência individual e restringem os homens de mostrar compaixão e misericórdia, bem como de julgar com sensibilidade, algo que normalmente fariam. O dano causado por tais regras é, muitas vezes, irreversível. Pode-se também notar que A Sentinela mencionada afirma que se os anciãos que investigam decidirem que um não-batizado transgressor se desqualificou como “publicador,” dar-se-á então “um anúncio simples, nestes termos: ‘. . . não é mais publicador(a) das boas novas.’” Isto não é um anúncio formal de desassociação. O resultado, porém, seria muito provavelmente o mesmo. Embora digam que, mesmo neste caso, não se ‘exige que as Testemunhas evitem falar’ com tal pessoa, A Sentimela inclui a advertência de que, apesar deste “ajuste,” “o conselho em 1 Corín-tios 15:33 ainda deve ser observado.”33 A referência a este texto, a respeito de “más associações [que] estragam hábitos úteis,” faz certamente com que a maioria das Testemunhas se sintam obrigadas a conceder pouco mais que uma fria troca de palavras com este não-batizado. Praticamente ninguém acharia que a norma “reajustada” da organização permite visitar a pessoa ou com ela gastar tempo para edificá-la espiritualmente. Se o fizessem, seriam sem dúvida reprovados pelos anciãos. Tais “ajustes” de norma, expressos em termos legalísticos e distinções técnicas, raramente causam mudanças no espírito manifestado pela organização, e é esse espírito e mentalidade que estão na base de tanta rigidez e falta de compaixão demonstradas.
O exemplo de quem?
As palavras de Jesus quanto a pessoa considerar o transgressor renitente como “homem das nações e cobrador de impostos,” não justificam a atitude de frio desdém e extrema repulsa que a organização Torre de Vigia alimenta contra aqueles a quem ela desassocia. As Escrituras nos dão dois exemplos dentre os quais podemos escolher. A Sentinela (tanto no número de 15 de dezembro de 1981, já citado, como no mais recente de 15 de abril de 1991) destaca o exemplo dos líderes religiosos judeus do tempo de Jesus, que viam os gentios e os cobradores de impostos com forte preconceito e desprezo. Os artigos falam destes como sendo “desprezados” e até “odiados.”
Em grande contraste, as Escrituras Hebraicas tinham por séculos incentivado uma atitude bem diferente. Os israelitas tinham de amar os estrangeiros, pois eles mesmos tinham outrora sido estrangeiros.34 Os gentios tinham direito de asilo, e ás vezes tinham até servos israelitas, podiam fazer orações no templo, e relata-se que os israelitas faziam orações a favor de governantes gentios.35
A atitude dos judeus passou por uma mudança negativa ao longo dos séculos, e a razão foi, sem dúvida, o terrível tratamento que sofreram às mãos de seus captores gentios durante o exílio. Aparentemente se apoiavam nos textos relativos à entrada de Israel em Canaã e nas ordens para evitar a contaminação idólatra como base para classificar todos os gentios, por natureza, como inimigos de Deus e de seu povo.36 Na época do Novo Testamento, os gentios eram vistos com extrema aversão, quase ódio, e eram contados como impuros, sendo então considerado “ilícito” ter relações amigáveis com eles. Mesmo quando tornavam-se prosélitos, não eram admitidos, como nos velhos tempos, numa associação plena. Estes preconceitos que vigoravam se refletem nos relatos de João 18:28; Atos 10:28; 11:3; Gálatas 2:12.
O Filho de Deus não se prendeu a estas e outras normas sociais similares, e foi criticado pelas autoridades religiosas exatamente por não sujeitar-se a elas.37 Jesus conhecia a vontade de seu Pai e Seu amor por toda a humanidade, de todas as raças, e deixou um elevado padrão para seguirmos.38 Mostrou isso por sua atitude para com gentios e cobradores de impostos (tidos como agentes desprezíveis do governo gentio), samaritanos e pecadores.39 Com suas normas de exclusão, a organização Torre de Vigia esquece este exemplo, alegando que Jesus só se associava com tais pessoas por terem antes dado evidência de receptividade às boas novas, dizendo que isto “não era modelo de como se devia tratar os pecadores impenitentes.”40 Ignora o fato de que foi, não antes, mas depois de receberem a ajuda de Jesus, que se arrependeram. Muitos eram pecadores, até prostitutas, na ocasião em que Jesus se associava e conversava com eles. Como ele disse: “Pois não vim chamar justos, e sim, pecadores.”41 Estes não eram “membros aprovados” da congregação judaica. Tampouco eram prospectivos prosélitos da congregação judaica, como aqueles a quem as Testemunhas de Jeová chamam de “recém-interessados,” cuja conduta imperfeita podem tolerar por algum tempo. A maioria deles já fazia parte da comunidade judaica, o povo pactuado de Deus (provavelmente desde o berço), mas sua conduta os classificava como pessoas “anotadas,” às vezes, virtuais proscritos. E quem tomava nota deles eram os “anciãos” da comunidade judaica. Para uma Testemunha de Jeová, falar ou associar-se com pessoas em situação comparável dentro da sua comunidade, significa arriscar-se a ser desassociada por violar as normas de exclusão da organização. Para alguém da comunidade das Testemunhas, imitar a conduta de Jesus significaria gastar tempo contatando e conversando, não só com os que se afastam das normas e da associação da organização, mas até com alguns que estão proscritos e caíram em práticas pecaminosas, e buscar exercer uma influência positiva e saudável sobre eles. As normas da organização proíbem tal procedimento. Uma vez rotulada como “desassociada,” até os parentes têm de cortar qualquer contato espiritual com a pessoa.42
Por muitas décadas, nem os anciãos podiam falar com os desassociados, a menos que a pessoa os abordasse pedindo o fim de seu estado de desassociada.43 Explicou-se aos anciãos que jamais devem iniciar o diálogo, que isto deve sempre partir do desassociado. Tudo isto apesar da farta evidência bíblica de que, por meio de seus profetas designados, o próprio Deus regularmente tomava a iniciativa do contato com os israelitas que haviam assumido um proceder extremamente pecaminoso, obstinadamente rebelde, apelando para que retornassem do mau caminho que haviam tomado, não por um momento, mas durante anos.44 A maioria das profecias hebraicas eram dirigidas a uma nação imersa na condição pecaminosa. Além disso, há o fato de que Deus “recomenda a nós o seu próprio amor, por Cristo ter morrido por nós enquanto éramos ainda pecadores... quando éramos inimigos.”45
Após quase meio século, A Sentinela de 15 de abril de 1991 enfim reconheceu isto, e que é apropriado iniciar contato com os desassociados. Infelizmente, passou logo em seguida a regulamentar o assunto, limitando toda iniciativa de contato aos anciãos e delineando minuciosamente as regras pelas quais se deve expressar qualquer ‘imitação da misericórdia de Deus.’
O primeiro artigo da revista apresenta muitos bons exemplos e princípios bíblicos que demonstram misericórdia. O segundo passa a dizer aos membros exatamente como devem aplicar estes exemplos e princípios, reconhecidamente o fator crucial. É quase visível a influência da autoridade organizacional sobre o autor do artigo, quando faz a transição das Escrituras para a norma da organização. O segundo artigo rapidamente começa a lançar o alicerce que restringe aos anciãos designados pela organização esta misericordiosa iniciativa de contato. Antes de citar Mateus 18:15-17, diz que estas palavras foram dirigidas aos apóstolos de Jesus “que mais tarde seriam superintendentes cristãos,” apesar de a questão da superintendência nada ter a ver com o conselho dado por Jesus, conselho este que é claramente dirigido a todos os cristãos. Após vários parágrafos voltados para os anciãos, A Sentinela de 15 de abril de 1991 (página 22) diz então:
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10 A enciclopédia anteriormente citada diz: ‘A base racio-nal para excomunhão era proteger as normas do grupo: “Um pouco de fermento faz levedar toda a massa.” (1 Cor. 5:6). Este motivo é claro na maioria das passagens bíblicas e extracanônicas, mas a preocupação com o indivíduo, mesmo depois da expulsão, era a base do apelo de Paulo em 2 Cor. 2:7-10.’ (O grifo é nosso.) Portanto, uma preocupação desse tipo deve logicamente ser demonstrada hoje pelos pastores do rebanho. (Atos 20:28; 1 Pedro 5:2) Os ex-amigos e os parentes talvez esperem que um desassociado retorne; todavia, por respeito à ordem em 1 Coríntios 5:11, eles não se associam com uma pessoa expulsa. Eles deixam a cargo dos pastores designados tomarem a iniciativa de ver se tal pessoa está interessada em retornar.
Em parte alguma as Escrituras colocam os anciãos numa posição privilegiada, atribuindo-lhes exclusividade em coisas como encorajar, repreender ou tentar restabelecer pessoas que caíram em erro. O fato de poderem tomar a iniciativa de fazer isso de modo algum significa que outros estejam proibidos de fazer o mesmo. A elaboração destas regras revela uma mentalidade do tipo clero e leigos, não de uma fraternidade cristã; estabelece dois padrões de conduta, um para os anciãos e outro diferente para todos os demais. A exortação “sede imitadores de Deus, como filhos amados” é dirigida a todos os cristãos, não apenas a um número seleto destes.46 De todas as coisas, com certeza, o exemplo de compaixão e misericórdia que Deus nos mostrou é que deve ser livremente seguido por todos os cristãos, desconsiderando restrições de uma organização que visa promover sua autoridade eclesiástica.47 A matéria vai ainda mais longe e sistematiza até as expressões de misericórdia dos anciãos para com desassociados e dissociados. Determina que “No máximo uma vez por ano, o corpo de anciãos deve verificar se há tais pessoas [consideradas dignas de serem contatadas] morando em seu território. Os anciãos considerariam os que foram expulsos há mais de um ano.”48 É típica da organização Torre de Vigia esta abordagem mecânica sendo aplicada a algo que, por sua própria natureza, deveria ser feito livre e espontaneamente, a saber, a expressão de misericórdia. Pode-se imaginar um pastor seguindo tais regras, considerando uma vez por ano se deve procurar uma ovelha perdida, e limitando a busca só às ovelhas que estão fora do rebanho há mais de um ano? Que diferença gritante da notável expressão de misericórdia e longanimidade de seu Pai celestial. Aos transgressores e até aos idólatras de Judá ele disse:
Eu vos tenho falado incansavelmente [incessantemente, BJ], sem que me escutásseis. Enviei-vos, sem cessar, meus servos os profetas para vos dizer: “Converta-se cada um de sua má conduta, sim, melhorai vossa maneira de agir, não andeis atrás de outros deuses para lhes prestar culto, e continuareis morando na terra que dei a vós e a vossos pais!”49
O artigo passa então a especificar como devem ser feitas as visitas dos anciãos a estas pessoas, os passos a serem seguidos e o que devem fazer aqueles “dentre nós que não são superintendentes e não estarão tomando tais iniciativas com relação aos desassociados.” Entra em consideráveis detalhes sobre como as Testemunhas devem encarar e se relacionar com famílias que têm um membro desassociado morando na casa, que elas não devem ser como os antigos judeus, cujo “ódio se estendia até mesmo à família do cobrador de impostos,” como reagir caso essa pessoa “talvez não tenha a cortesia de manter-se afastada dos visitantes,” o que dizer se tal pessoa atende quando uma Testemunha visita a casa ou telefona.50 Todo o excelente conselho bíblico dado no início dos artigos é assim sobreposto pela norma da organização que sistematiza, codifica e, na prática, resseca e vicia os generosos princípios e exemplos de misericórdia dados por Deus.
Para eles, nem “Bom dia”
Fora quaisquer contatos anuais que os anciãos possam fazer com certos desassociados e dissociados, o tratamento destas pessoas permanece o mesmo. Toda Testemunha que não é da classe dos anciãos têm de evitar toda associação ou contato com os que estão na condição de “desassociado.” Embora haja alguma concessão quanto ao parente desassociado que reside no lar da família, só se deve entrar em contato com quaisquer parentes que morem fora quando houver um assunto familiar que o exija ou uma necessidade urgente. A extrema rigidez das normas segue o modelo da dura posição assumida pelos líderes religiosos da época de Jesus. Em apoio, A Sentinela de 15 de dezembro de 1981, página 17, citava este relato sobre o tratamento dado aos que eram expulsos das sinagogas:
Daí em diante ele era como um morto. Não se lhe permitia estudar junto com os outros, nem se devia manter com ele contato [social], nem mesmo se devia mostrar-lhe o caminho. Ele podia, é verdade, comprar as necessidades da vida, mas era proibido comer ou beber com tal.51
Observe que isto não era, como no caso da exortação de Paulo aos cristãos coríntios, questão de decisão pessoal, pois os membros da sinagoga estavam “proibidos” pela autoridade religiosa de mostrar outra atitude para com os que dela eram expulsos. Esta prática judaica tem um paralelo exato no tratamento dado a qualquer pessoa a quem a organização Torre de Vigia, por meio de seus anciãos designados, aplique o rótulo de “desassociado.” A pessoa é vista como “um morto.” O motivo específico da medida é totalmente irrelevante. Pode ter sido por matar baratas num quartel do exército, aparar a grama de uma igreja ou simplesmente comemorar um aniversário. Ou pode ter sido por não aceitar 1914 como data marcada pela Bíblia, ou que só certas pessoas devem participar da comemoração da morte de Cristo. No meu caso, foi por ter feito uma refeição num restaurante com meu empregador, que tinha formalmente saído da organização.52 Não é o motivo que determina o tratamento, mas o rótulo.
A Sentinela de 15 de dezembro de 1981 (que por sinal forneceu os meios para minha desassociação) faz a pergunta (página 20):
Significaria a defesa da justiça de Deus e do seu arranjo de desassociação que o cristão não deve falar nada com alguém expulso, nem mesmo dizendo: “Bom dia”?
Daí, o artigo refere-se ao texto de 2 João 9 a 11, que reza:
Todo aquele que se adianta e não permanece no ensino do Cristo não tem Deus. Quem permanece neste ensino é quem tem tanto o Pai como o Filho. Se alguém se chegar a vós e não trouxer este ensino, nunca o recebais nos vossos lares, nem o cumprimenteis. Pois, quem o cumprimenta é partícipe das suas obras iníquas.
Entendem que as palavras de João proíbem toda comunicação com os expulsos da organização, não permitindo sequer um simples “Bom dia.” Essas palavras, todavia, de modo algum apoiam a afirmação.
Primeiro, deve-se notar que a questão tem a ver com o “ensino do Cristo,” não o ensino de um movimento religioso. A primeira carta de João mostra que, para ele, este ensino estava centralizado na confissão cristã fundamental de que Jesus era o Cristo de Deus, que o tinha enviado à terra em carne.53 O resto das Escrituras mostra claramente que o requisito para o batismo era a crença sincera de que Jesus, o Nazareno, era deveras o Cristo, que ele deu sua vida pela humanidade, foi ressuscitado, e pôr em prática seu ensino e princípios morais.54 Não era a crença num esquema complexo de “ensinos singulares” desenvolvido séculos depois por um movimento religioso como a organização Torre de Vigia, nem a observância de um esquema igualmente complexo de normas decretadas por uma organização. Diferenças de opinião em outros ensinos de menor importância não seriam motivo de divisões e separações, uns excluindo outros, separando-os da comunidade. Portanto, o apóstolo insta:
Aceitem entre vocês quem é fraco na fé, mas não discutam com ele as suas opiniões pessoais [assuntos controvertidos, NVI].55
A Sentinela empenha-se em encobrir isto por relegar os assuntos polêmicos a “questões irrelevantes de opinião, de gostos ou de variações de consciência.”56 Isto simplesmente ignora o contexto que mostra que o apóstolo especificou temas tais como comer certos alimentos e observar certos dias como sagrados (Romanos 14:2-23). Estes de modo algum eram assuntos “irrelevantes,” especialmente para os crentes judeus. A crença em “comer de tudo” (versículo 2) incluiria comer carne oferecida a ídolos, ou carne de porco, e estas eram questões muito sérias para os cristãos de origem judaica. Vê-se isto no fato de que alguns estavam julgando a posição de outros perante Deus com base nisto, algo muito improvável, se, como sugere A Sentinela, isto tinha a ver com meras questões de “gosto,” iguais às ocasionais opções dietéticas encontradas na sociedade moderna que nada têm a ver com escrúpulos religiosos.57 A observância de certos dias (versículos 5 e 6), como o sábado, era um aspecto vital da adoração dos judeus, e a violação do descanso sabático era considerado um dos maiores pecados. Para os judeus convertidos ao cristianismo não era fácil adaptar-se a considerar “um dia como todos os outros.” Todavia, apesar das diferenças de ponto de vista em algumas questões sérias, a exortação era de não usá-las para julgar as posições de outros e não permitir que se tornassem motivo de divisão. As normas da Torre de Vigia não seguem o conselho apostólico. Elas pretendem, de fato, fazer o oposto do que se diz quanto a “decisões sobre questões subjetivas” (NM), “discutir assuntos controvertidos” (NVI), e usar estes assuntos discutíveis para condenar aqueles a quem não lhes cabe condenar, já que cada uma das pessoas é “servo alheio. Que ele fique em pé ou caia, isso é com seu patrão.”58
Nenhuma destas diferenças de ponto de vista ou entendimento, pois, estão envolvidas na descrição que o apóstolo João faz de quem “não permanece no ensino do Cristo.” Tampouco ajusta-se aos fatos a explicação da Sentinela sobre o restante da exortação de João. Observe esta explicação da palavra “cumprimento,” conforme aparece em A Sentinela de 15 de julho de 1985, página 32:
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João acrescentou: “Pois, quem o cumprimenta é partícipe das suas obras iníquas.” (2 João 11) João usou aqui a palavra grega de saudação, khaí.ro em lugar da palavra aspá.zo.mai, encontrada no versículo 13.
Khaí.ro significa alegrar-se (Lucas 10:20; Filipenses 3:1; 4:4). (Mateus 28:9; Atos 15:23; 23:26). A.spa.zo.mai significar “envolver nos braços, por conseguinte saudar, dar boas-vindas”. (Lucas 11:43; Atos 20:1, 37; 21:7, 19). Qualquer das duas palavras pode ser uma saudação, mas a.spa.zo.mai talvez denotasse mais do que um cortês “olá” ou “bom dia”. Jesus disse aos 70 discípulos para não a.spá.se.sthe a ninguém. Indicou assim que sua obra urgente não lhes permitia tempo para o cumprimento à moda oriental, com beijos, abraços e longa palestra. (Lucas 10:4). Pedro e Paulo exortaram: ‘Cumprimentai-vos [a.spá.sa.sthe] uns aos outros com beijo de amor, ou beijo santo.’ (1 Pedro 5:14; 2 Coríntios 13:12, 13; 1 Tessalonicenses 5:26.)
Portanto, João pode ter usado deliberadamente khaí.ro em 2 João 10, 11 en vez de a.spá.zo.mai (versículo 13). Se assim for, João não estava exortando os cristãos daquele tempo a evitar meramente saudar calorosamente (com abraço, beijo e conversa) uma pessoa que renunciasse à congregação (apostatasse). Em vez disso, disse que não deviam nem mesmo cumprimentar tal pessoa com khaí.ro, um comum “bom dia’.
Quem escreveu esta matéria (repetida na Sentinela de 15 de abril de 1988), evidentemente passou por alto ou ignorou o relato de Lucas 1:28, 29. A Sentinela busca atribuir ao termo aspazomai o sentido de um cumprimento especialmente caloroso que ultrapassa em muito o da palavra usada na segunda carta de João, khairo. Isso possibilitaria dizer que khairo, sendo muito menos “caloroso” que aspazomai, se referiria ao cumprimento mais cotidiano, mais superficial, inclusive um simples “olá.” Com base nisso, poderiam proibir toda espécie de comunicação verbal com aqueles que desassociam. No relato de Lucas sobre a visita do anjo de Deus a Maria, porém, lemos o seguinte:
E entrando o anjo aonde ela estava, disse: “Alegra-te [em grego, khaire], muito favorecida! O Senhor é contigo.” Ela, porém, ao ouvir esta palavra, perturbou-se muito e pôs-se a pensar no que significaria esta saudação [em grego, aspasmos].59
As duas palavras são usadas aqui de modo intercambiável. Maria aplica o termo aspasmos à palavra khaire proferida pelo anjo. Não fez isso porque o anjo a tivesse, na definição da Sentinela, “envolvido” em seus braços ou beijado, nem travado uma “longa palestra” com ela. Ela não se refere a um abraço ou beijo, mas a “esta palavra” dele.60
Assim, A Sentinela não só incorre em erro como também deixa de reconhecer que a palavra grega khairein usada por João não se refere a um simples cumprimento como um “Bom dia.” Não é menos “caloroso” que o outro termo grego considerado. Ao contrário, o termo khairein significa literalmente “estar regozijando-se” e corresponde ao termo hebraico shalom, que significa “a paz seja contigo.”61 Era usado para expressar, não mero cumprimento rotineiro, mas favor e aceitação pessoal ou social, e até reconhecimento de autoridade.62 Reconhecendo isto, algumas traduções, em vez de simplesmente vertê-la como “cumprimento,” vertem-na por “dar boas-vindas.”63 Expressando bem o sentido das palavras de João, uma tradução reza:
Não o recebam em suas casas nem lhe digam: “Que a paz esteja com você [Não o encoraje de modo algum, Living Bible] Pois quem deseja paz a essa pessoa é seu companheiro no mal que ela faz.64
Claramente, pois, o que o cristão nega a um anticristo não é um simples cumprimento como “bom dia” ou “como vai,” e sim a saudação que implica em aceitar sua pessoa e concordar com sua causa, desejando-lhe favor e êxito. “Dar-lhe boas vindas” deste modo sem dúvida tornaria a pessoa “partícipe das suas obras iniquas.” Por outro lado, simplesmente falar com alguém não implica, em si, em aceitação, concordância ou favor. É o que a pessoa diz que determina isto. Certamente alguém não se torna parceiro de outrem nas coisas más que faz quando se empenha em refutá-lo ou convencê-lo de que está errado. Pelo contrário, as Escrituras mostram que isto pode ser um dever cristão.65
Em seu último “reajuste” na norma, que faculta aos anciãos iniciar contato com desassociados ou dissociados, A Sentinela especifica que “Não se visitará alguém que manifeste uma atitude crítica, perigosa.”66 Por meio da norma que proíbe falar com aqueles a quem ela arbitrariamente classifica como ‘apóstatas,’ a organização Torre de Vigia não só mantém um ambiente esterilizado entre seus membros, assegurando-se de que estes não serão confrontados com qualquer evidência convincente dos erros da organização, como também a organização se livra de ter, ela mesma, de responder a tais evidências. Ela pode simplesmente minimizar tais coisas como vindas “de fonte apóstata.” Pessoas que leram Crise de Consciência e escreveram ou telefonaram para a sede de Brooklyn fizeram perguntas que foram sistematicamente ignoradas com esta alegação. Indagações por telefone recebem a resposta: “Sem comentários.” Justificam esta “cortina de segredo” dizendo que seria errado discutir qualquer coisa vinda “de fonte apóstata.”
Ainda que verdadeira a acusação de apostasia, o que não ocorre na maioria dos casos, isto é uma desculpa artificial, um pretexto também sem base bíblica. O primeiro capítulo do livro de Jó descreve Jeová falando e travando uma controvérsia com Satanás, o primeiro e maior dos apóstatas. Quando as publicações da Torre de Vigia explicam isto, dizem que Jeová aceitou o desafio de Satanás e que isto produziu efeitos benéficos, embora por algum tempo trouxesse muito sofrimento a Jó.67 Apesar disso, eles próprios se recusam a aceitar qualquer desafio resultante de evidências que contrariem suas afirmações, e que exigiriam não mais que um debate simples e aberto, sem necessidade de sofrimento. Jeová enviou persistentemente seus profetas àqueles a quem ele mesmo considerava uma “nação apóstata,” “filhos renegados.”68 Ele não aprovou suas transgressões, não minimizou seus pecados, mas estava disposto a “resolver as questões” com eles, a “contender” com eles, e até a “entrar numa controvérsia” com eles a fim de manifestar os erros deles e levá-los à redenção.69
O Filho de Deus não hesitou em responder a Satanás, o grande apóstata, até citando as Escrituras ao refutar suas tentações.70 Descreveu os líderes religiosos do povo pactuado de Jeová de seus dias como filhos da Geena, descendência de víboras, assassinos dos mensageiros de Deus e filhos do Diabo. Ainda assim, dirigia-se a eles continuamente, respondia a suas perguntas e expunha suas alegações e argumentos.71 Os apóstolos seguiram seu exemplo, não só com esta classe de homens, mas com pesssoas que professavam o cristianismo e promoviam ensinos falsos ou tentavam desencaminhar outros cristãos. Basta ler as cartas apostólicas para ver que eles não se esquivavam de responder aos argumentos vindos destas fontes, mas, de modo franco, eles os enfrentavam e refutavam
Uma das perguntas de potencial mais perturbador que se pode fazer a um líder religioso é: “Com que autoridade fazes estas coisas?72 Em vez de lidar francamente com a evidência sóbria apresentada por pessoas sinceras que questionam sua pretensa autoridade, a organização Torre de Vigia desassocia os que se expressam deste modo. Quando o apostolado de Paulo foi desafiado, ele não recuou do desafio, mas forneceu a seus desafiadores ampla evidência em favor de seu apostolado, enfrentando as dúvidas, queixas ou acusações dos opositores.73 E, como ele mesmo disse, não fez isso apelando para a autoridade ou por ‘apavorar-vos’ quer por carta quer por ação.74 Não agiu presunçosamente “ousando... recomendar a si mesmo,” nem usou as “armas carnais” do fustigamento, do engodo e do sofisma, como fizeram seus opositores; não usou a ameaça da excomunhão contra os que questionavam sua posição.75
Em seu conselho a Timóteo, Paulo admoestou-o a permanecer livre da influência do erro e evitar o debate contencioso. Ao mesmo tempo, não instruiu Timóteo a combater tais coisas com exibições de autoridade ou ameaças de represálias organizacionais, mas, em vez disso, exortou-o a esforçar-se em instruir com brandura os que eram culpados e que precisavam arrepender-se e sair “do laço do Diabo.”76
Os genuínos cristãos atualmente devem seguir o exemplo de Deus, de seu Filho e dos apóstolos de seu Filho, não o de uma organização autoritária.
Mais distinções errôneas
Visto que a organização Torre de Vigia exclui toda conversa de natureza espiritual com desassociados, ela enfrenta um problema ao explicar a exortação de Paulo em 2 Tessalonicenses 3:14, 15. Na Tradução do Novo Mundo lê-se:
Mas, se alguém não for obediente à nossa palavra por intermédio desta carta, tomai nota de tal, parai de associar-vos com ele, para que fique envergonhado. Contudo, não o considereis como inimigo, mas continuai a admoestá-lo como irmão.
Visto que seguir este conselho não estaria em harmonia com sua norma de total exclusão, a Torre de Vigia classifica isto como um caso menos grave do que os que requerem desassociação, e assim o põe em outra categoria chamada “tomar nota,” que requer medidas e atitudes menos drásticas para com os “anotados.” Deste modo, faz-se parecer que o tratamento em questão é diferente do de 1 Corintios 5:9-11. Mas, é mesmo assim?
O contexto mostra que a ofensa é desobedecer à palavra escrita de um apóstolo enviado por Cristo. Com certeza, isto não é algo sem importância. A organização Torre de Vigia certamente não o veria sob essa luz se fosse o caso de Testemunhas desconsiderarem as próprias normas ou ensinos dela.
Explicando o texto, A Sentinela de 15 de setembro de 1985, página 31, cita as palavras de Paulo, “parai de associar-vos com ele,” e então diz:
Os irmãos não o evitariam completamente, pois Paulo aconselhou-os a ‘continuar a admoestá-lo como irmão’. Contudo, por limitarem [observe, não por deixarem] sua associação social com ele, poderiam induzi-lo a sentir-se envergonhado...
O que A Sentinela deixa de reconhecer ou aceitar é que a expressão grega (synanamignysthai) que Paulo usou quando disse “parai de associar-vos com” é idêntica à que usou em 1 Coríntios 5:11, onde a Tradução do Novo Mundo a verte por “cesseis de ter convivência com.” Pode-se ver isto na leitura interlinear da Kingdom Interlinear Translation:
1 Coríntios 5:11:
[FOTOCOPIA da p. 742 da Kingdom Interlinear]
XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX
Tradução:
do mundo sair. 11 Agora mas escrevi a vós não vos mistureis com alguma vez qualquer irmão sendo chamado possa ser fornicador ou cobiçoso ou idólatra ou injuriador ou beberrão ou extorsor, a tal pessoa nem mas comer com. 12 O que a mim tais pessoas |
do mundo. 11 Mas, eu vos escrevo agora para que cesseis de ter convivência com qualquer que se chame irmão, que for fornicador, ou ganancioso, ou idólatra, ou injuriador, ou beberrão, ou extorsor, nem sequer comendo com tal homem. 12 Pois, |
2 Tessalonicenses 3:14:
[FOTOCOPIA da p. 910 da Kingdom Interlinear]
XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX
Tradução:
deveis comportar-vos mal fazer bem. 14 Se mas alguém não está obedecen-do à palavra de nós por meio da carta, este estejais pondo um sinal sobre, não vos mistureis com ele, a fim de que ele possa ser virado para dentro; e não como inimigo estejais conside-rando, mas estejais pondo a mente como irmão. |
13 Da vossa parte, irmãos, não desistais de fazer o que é direito. 14 Mas, se alguém não for obediente à nossa palavra por intermédio desta carta, tomai nota de tal, parai de associar-vos com ele, para que fique envergonhado. 15 Contudo, não o considereis como inimigo, mas continuai |
Não há diferença no vigor do termo em ambos os textos. Nos dois casos, exorta-se os cristãos a evitar companheirismo íntimo a nível pessoal com as pessoas que cometem os erros descritos tanto em 1 Coríntios, capítulo 5, como em 2 Tessalonicenses, capítulo 3, fazendo isso para que o transgressor possa sentir-se envergonhado. O conselho não vai além disso.77
Na associação cristã, havia ampla margem para diferenças pessoais. Os ensinos relativos ao papel messiânico de Cristo, sua morte sacrificial, ressurreição e glorificação, os benefícios daí resultantes, a salvação pela fé, a operação do Espírito santo, os ensinos de Cristo e a boa moralidade eram firmemente defendidos e tidos como essenciais para fazer parte do seu Corpo.78 Mas mesmo em assuntos como a descrença na ressurreição, o ponto de vista errado era tratado como fraqueza espiritual dos irmãos, e tomavam-se medidas para ajudar, fornecendo as provas necessárias, em vez de partir para acusações sumárias de apostasia ou ações punitivas por parte de um judiciário eclesiástico.79
Talvez interesse saber que vários dos temas aqui discutidos foram trazidos à atenção do Corpo Governante cerca de trinta anos atrás. Quando se elaborava um novo manual da organização, preparado por Karl Adams, Edward Dunlap e eu mesmo, redigi a seção que tratava da desassociação e temas relacionados. Conforme mencionado no capítulo 6, Karl Adams, então superintendente do Departamento de Redação, submeteu um memorando ao presidente Knorr explicando por que certos ajustes eram recomendáveis.80 O próprio Karl reconhecia claramente a validade dos pontos aqui considerados, como vemos nas páginas 17 e 18 de seu memorando:
Temos considerado que Mateus 18:17 refere-se a desassociar. Jesus disse que quando o homem envolvido se recusa a “escutar à congregação,” devemos considerá-lo “apenas como homem das nações e cobrador de impostos.” O que significa isto exatamente quanto à ação que devemos tomar para com tal pessoa desassociada? Os judeus não recusavam totalmente tratar com tais pessoas, nem recusavam falar com elas.
Em relação a Mateus 18:17, seria útil considerar 2 Tessalonicenses 3:6, 14, 15, bem como 2 Timóteo 2:25, 26 e Tiago 5:19, 20. Nesses textos, especialmente os dois últimos, usam-se expressões fortes. Fala dos que estiveram no “laço do Diabo,” foram “apanhados vivos por ele para a vontade deste,” “desencaminhados da verdade,” talvez tendo “uma multidão de pecados,” e no entanto, parece implícito que havia liberdade de fazer o que pudesse ser feito para admoestar e recuperar estas pessoas. Não deveríamos estar fazendo o mesmo hoje? Não é preciso ter com elas associação íntima ou amigável que implique em aprovação de suas transgressões. O verbo grego usado em 2 Tessalonicenses 3:14 na expressão “parai de associar-vos” é a mesma palavra usada em 1 Corintios 5:11 (“cesseis de ter convivência com”). Este último texto é o que temos aplicado a pessoas que desassociamos ou com quem ‘cessamos de ter convivência.’ Mas 2 Tessalonicenses mostra que cessar de ter convivência com alguém não exclui admoestá-lo, e portanto, falar com ele. Se dissermos que, por dar admoestação bíblica ou repreensão a eles, somos culpados de companheirismo espiritual com eles, não significaria isto também que quando testemunhamos às pessoas de diferentes credos (até clérigos) estamos tendo companheirismo espiritual com eles? É o nosso conceito realmente determinado por estes textos, ou estaremos lendo neles uma rigidez maior do que eles dizem?
Como em outros casos, as razões bíblicas apresentadas não só eram sólidas como induziam à reflexão. Contudo, como era típico dos debates do Corpo Governante na ocasião e daí em diante, estas receberam apenas uma breve consideração. A matéria proposta foi lida e depois deram-se opiniões quanto à conveniência ou inconveniência dos ajustes ¾ não mediante consideração com oração das evidências bíblicas, mas simplesmente com base no que era “aconselhável” para as normas da organização. A posição tradicional foi mantida. Trinta anos depois, se ela mudou, foi para tornar-se mais rígida.
1 João 10:4, 5.
2 Mateus 11:28-30.
3 Mateus 20:25, 26, New English Bible.
4 Eu ignorva a existência deste livro na época em que escrevia o meu, mas tinha cogitado seriamente usar o mesmo título.
5 Charles Davis, A Question of Conscience (Londres: Hodder e Stoughton, 1967), página 16.
6 Ezequiel 34:4, ARA.
7 Confira as exortações em 2 Timóteo 2:24-26; 1 Tessalonicenses 5:14, 15; 2 Tessalonicenses 3:13-15; Tiago 5:16, 19, 20.
8 A Sentinela, 1º de janeiro de 1986, página 13, e 15 de setembro de 1987, página 13.
9 A “taxa de rotatividade” dos membros é incomumente alta, com um grande número saindo anualmente. Veja os dados em Crise de Consciência, páginas __, __.
10 Numa “consideração matinal do texto” da família de Betel de Brooklyn, John Booth, membro do Corpo Governante, comentando sobre o grande número de pessoas que anualmente deixam a organização (não necessariamente por desassociação), disse: “Mas isso não importa, pois há sempre novos que os substituem a cada ano.” John Booth, em si, é uma pessoa bondosa. Conhecendo-o bem, creio que sua declaração simplesmente reflete o ponto de vista da organização, um ponto de vista que décadas de associação impregnaram em seu pensamento: o importante é o aumento, o aumento numérico.
11 Os sentimentos expressos pelo ancião cuja carta acaba de citar se, ilustram que pode-se encontrar compaixão entre os anciãos das Testemunhas.
12 1 Coríntios 5:9-11, 13, NVI.
13 Contraste isto com Tiago 5:16, onde o discípulo não limita as confissões a serem feitas a homens de autoridade, mas diz: “Confessai os vossos pecados uns aos outros e orai uns pelos outros, para que sejais sarados.”
14 Carta de 3 de maio de 1979, assinada por W. Gooch, coordenador da filial.
15 O manual da organização, de 1983, Organizados Para Efetuar o Nosso Ministério, página 143, diz, “os anciãos talvez sejam contatados por aqueles que confessam os seus próprios pecados, ou então relatam o que sabem sobre a transgressão de outros. (Tia. 5:16; Lev. 5:1) Mas, não importa de que maneira os anciãos ficam sabendo duma transgressão séria da parte dum membro batizado da congregação, far-se-á uma investigação inicial.”
16 Veja A Sentinela de 15 de novembro de 1988, página 20.
17 Veja Crise de Consciência, página __ a __; também A Sentinela de 15 de setembro de 1983, páginas 30 e 31.
18 Nos casos em que a pessoa é suspeita de discordar da organização, ela pode ser interrogada sobre as coisas que lê, as pessoas com quem fala, as cartas que recebe, não havendo praticamente nada fora dos limites para seus interrogadores. Se não responder a todas as perguntas a pessoa corre risco.
19 Lucas 15:11-24. Por muitos anos considerava-se impróprio orar pelos desassociados. A comissão de filial da Grã-Bretanha (carta de 3 de maio de 1979) referiu-se à parábola do filho pródigo ao perguntar ao Corpo Governante sobre esta norma, citando o caso de uma “irmã fiel cujo filho, desassociado por fornicação 14 anos atrás, está agora casado, com dois filhos, e não é mais fornicador,” e afirmando quão difícil era dizer à irmã que era errado orar pelo filho dela, orar para que “retorne à organização.” Essa norma mudou (veja A Sentinela de 15 de abril de 1980, página 32) e a mulher podia agora orar por seu filho ¾ ainda que continue na “condição de desassociado” e com o rótulo que a acompanha. Números mais recentes de A Sentinela enfatizaram a necessidade dos familiares evitarem associação com os desassociados ¾ não porque agora sejam transgressores, mas por não seguirem os procedimentos da organização para a readmissão.
20 Usam-se cartões de “Desassociado” cor laranja nos arquivos de desassociados. Jon Mitchell, que trabalhou no Departamento de Serviço, bem como na secretaria dos Escritórios Executivos, conta que os cartões, após serem carimbados com a palavra “Falecido”, eram novamente postos no arquivo. Ele cita um companheiro de trabalho, Lee Waters, que disse: “Devemos ser a única organização que mantém um registro como este de pessoas mortas.”
21 Isaías 1:18; Jeremias 31:34.
22 Em sua carta de 18 de novembro de 1971 ao presidente Knorr, o superintendente do Departamento de Redação da sede mundial, Karl Adams, questionava que se mantivessem estes arquivos depois que o indivíduo era readmitido. Comentava: “Atualmente, são mantidos no arquivo até os nomes dos que foram readmitidos, junto com volumosos registros de seus casos, com a etiqueta ‘Não destruir.’ É como se disséssemos: ‘Acreditamos que vocês estão perdoados, mas conservaremos o registro dos seus pecados.’ Ou então: ‘Seus pecados foram lavados, mas armazenamos a sujeira num frasco rotulado com seu nome.’”
23 Neste, como também em vários dos trechos seguintes, estou em débito para com George Christoulas, de Atenas, Grécia, por ter provido tanto a pesquisa como os argumentos para os pontos em questão.
24 The International Standard Bible Encyclopedia, Vol. 2, página 1050.
25 Lucas 6:22.
26 Veja Organizados Para Efetuar o Nosso Ministério, páginas 150, 151, e A Sentinela de 15 de setembro de 1985, páginas 30, 31. Creio não haver dúvida de que para a maioria das Testemunhas não há uma clara diferença entre isto a expulsão total, e a explicação da Sentinela pouco faz para acabar com a confusão. Como depois consideraremos, sua explicação do texto-chave de 2 Tessalonicenses 3:14, 15 tem um sério erro.
27 Veja Organizados Para Efetuar o Nosso Ministério, páginas 143, 144; A Sentinela de 1o de dezembro de 1981, páginas 23-27. Isto pode aplicar-se não só às Testemunhas batizadas, mas também a outros que, após analisados pelos anciãos, foram anunciados à congregação como “publicadores não-batizados” aceitos (anteriormente chamados “associados aprovados”), habilitados a entregar relatórios de serviço de campo. Veja A Sentinela de 15 de novembro de 1988, páginas 16-19, onde os procedimentos organizacionais envolvidos são abordados de modo bem detalhado.
28 João 3:1, 2, 21.
29 Algumas traduções, baseadas em certos manuscritos antigos, rezam no versículo 15: “Se o seu irmão pecar contra você [ou contra ti].” (Veja NVI; ARA; BLH.)
30 Embora esteja no singular pode aplicar-se a várias pessoas.
31 Efésios 4:3-6.
32 João 17:16-21; Gálatas 5:22.
33 A Sentinela, 15 de novembro de 1988, página 19 e nota de rodapé.
34 Veja Deuteronômio 10:19; 24:14, 15; Êxodo 23:9. Os queneus eram considerados quase irmãos dos israelitas, e os recabitas, os jebuseus, os hititas e outras raças estrangeiras foram aceitos de modo favorável. (Juízes 1:16; 5:24; 2 Samuel 11:6-11; 15:19-22; 18:2; 24:15-25; Jeremias 35:1-19.)
35 Números 35:15; Levítico 25:47; 1 Reis 8:41-43; Jeremias 29:1, 7; compare com Esdras 6:10.
36 Veja, por exemplo, Levítico 18:24-30; Deuteronômio 7:3-12; Esdras 9:11, 12.
37 Mateus 9:10, 11; 11:19.
38 João 3:16; Atos 10:28, 34.
39 Mateus 5:43-48; 8:8-13 (confira Lucas 7:2-9); Mateus 9:10-13; 11:19; 15:21-28 (confira Marcos 7:24-30); Lucas 5:29, 30; 15:1, 2; João 4:7-42.
40 A Sentinela, 15 de dezembro de 1981, página 15; 15 de abril de 1991, páginas 20, 21.
41 Mateus 9:11-13, ARA.
42 A única exceção aqui é o menor desassociado que mora na casa, em cujo caso a organização concede aos pais o direito de continuar dando instrução espiritual à criança. (A Sentinela, 15 de novembro de 1988, páginas 19, 20). Permite-se que um parente maior desassociado esteja “presente quando matéria espiritual é considerada em família.” (A Sentinela, 15 de abril de 1991, página 22, nota de rodapé). Isto supostamente incluiria até uma esposa ou avós que morem na casa, ficando implícito que podem estar presentes mas não participar da consideração.
43 Numa carta ao presidente Knorr, em 1971, Karl Adams recordou-lhe que relatara um incidente envolvendo Pryce Hughes, que tinha sido superintendente de filial nas Ilhas Britânicas. Karl escreveu: “Você contou que ele encontrara por acaso um desassociado e ele lhe disse que tinha falado de modo bem franco com este homem, dizendo-lhe o que tinha de fazer para ser readmitido. Segundo me lembro, ele disse que o fez porque ‘parecia a coisa certa a fazer,’ embora tenha descrito o fato como se pedisse desculpas, pois sabia que não tinha seguido a norma da Sociedade.”
44 Confira Isaías 1:2-6, 14-20; 44:21, 22; Jeremias 3:12-14; 5:20-25; Ezequiel 18:30-32.
45 Romanos 5:8-10.
46 Efésios 5:1.
47 Confira Gálatas 5:22-23.
48 A Sentinela, 15 de abril de 1991, página 23. Uma nota de rodapé recorda aos que não são anciãos que se souberem que um desassociado mora no território. devem “dar esta informação aos anciãos.”
49 Jeremias 35:14, 15, TEB. Confira Jeremias 7:24, 25.
50 A Sentinela, 15 de abril de 1991, páginas 23 e 24.
51 Citado pela Sentinela de The Life and Times of Jesus the Messiah, de A. Edersheim, Vol. II, página 184.
52 Veja Crise de Consciência, páginas ___-___.
53 1 João 2:22, 23; 29; 3:23; 4:2, 3; 5:1-5.
54 Romanos 10:6-9; 1 Coríntios 12:3; confira 1 Coríntios 1:2 e Mateus 16:16, 17.
55 Romanos 14:1, BLH.
56 A Sentinela, 1º de dezembro de 1981, página 20.
57 Confira Levítico 11:7, 8; Isaías 66:17; 1 Coríntios 8:7-13. A Sentinela de 1º de julho de 1978 trazia um artigo sobre Romanos, capítulo 14 (escrito por Edward Dunlap) que apresenta corretamente a seriedade das questões envolvidas. Artigos posteriores ignoraram a evidência ali apresentada.
58 Romanos 14:1, 4 (BJ). The Living Bible aqui reza: “Eles são servos de Deus, não seus. Prestam contas a ele, não a vocês.”
59 Lucas 1:28, 29, ARA.
60 No versículo 40 usa-se de novo uma forma de aspazomai, referindo-se à Maria “cumprimentar” ou “saudar” Elisabete (Isabel), mas, novamente, é algo meramente verbal. O versículo 41 fala de Elisabete “ouvir” o cumprimento, sem receber algum abraço caloroso ou beijo.
61 Veja a leitura interlinear de 2 João 10, 11 na Kingdom Interlinear Translation of the Greek Scriptures.
62 A saudação oficial romana “Salve César,” é traduzida em grego por khaire kaisar, e os soldados usaram o termo em tom de mofa, ao dirigir-se a Jesus como o “rei dos judeus” em Mateus 27:29.
63 Veja 2 João 10 na Almeida Revista e Atualizada e na Tradução Ecumênica.
64 2 João 10, 11, BLH.
65 Confira Tiago 5:19, 20; 2 Timóteo 2:24-26; Tito 1:10-13.
66 A Sentinela, 15 de abril de 1991, página 23.
67 Veja Poderá Viver Para Sempre no Paraíso na Terra, páginas 105 a 111, também A Sentinela de 1º de novembro de 1986, página 31.
68 Isaías 10:6; Jeremias 3:12-14.
69 Isaías 1:18; Jeremias 2:9, 35; confira Isaías 50:7, 8.
70 Mateus 4:1-11.
71 Mateus 23:15, 33; João 8:44.
72 Mateus 21:23.
73 Confira 1 Coríntios 1:10-17; 3:4-10; 4:1-16; 9:1-18; 15:9-11; 2 Corintios 6:3-13; 7:2, 3, 8-13; 10:7-13; 11:5-27; 12:11-13, 16-19.
74 Confira 2 Coríntios 1:24; 10:1, 8, 9.
75 2 Coríntios 3:1; 10:3, 4, 12, 18; 12:16; compare com 2 Pedro 1:16.
76 2 Timóteo 2:14-26.
77 Pode-se notar que mesmo quando o apóstolo fala do homem que tende a discutir a ponto de causar divisões, e que recebeu repetidas advertências a respeito, seu conselho não proíbe absolutamente que se fale com ele. Em Tito 3:10, a palavra grega às vezes traduzida como “rejeita” tem, na verdade, o significado de “escusar-se” ou “pedir licença.” (Compare o uso do mesmo termo em Hebreus 12:25; Lucas 14:18, 19). A New English Bible o traduz por “não tens nada a fazer com ele.” Portanto, mesmo neste caso ainda há margem para a cortesia habitual ao tratar com tais pessoas, de modo gentil mas firme escusando-se de entrar em debates estéreis com elas.
78 Confira Gálatas 2:4, 5.
79 1 Coríntios 15:12-57.
80 Veja as páginas ___, ___ do Capítulo 6.