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                     O Modelo Recorrente


 

 

Pois quem é que te faz sobressair? E que tens tu que não tenhas recebido? E, se o recebeste, por que te vanglorias, como se não o tivesses recebido? ¾ 1 Coríntios 4:7, Almeida Revista e Atualizada.

 

O

 FUNDADOR e primeiro editor da revista A Sentinela, Charles Taze Russell, não ignorava a história do desvio da primitiva congregação cristã, de uma fraternidade original simples para uma religião institucionalizada, com estrutura centralizada de autoridade.

Os adeptos de sua revista não eram então conhecidos como “Testemunhas de Jeová” mas apenas como “Estudantes da Bíblia.” As congregações (então chamadas “eclésias”) eram autônomas, e a congregação que Russell presidia, primeiro em Pittsburgh e depois em Brooklyn, era vista como simples modelo que podia ser seguido ou não, conforme a opção.1

Logo no início de sua publicação, de fato só dois anos após o primeiro número, A Sentinela apresentou um conceito da congregação cristã conforme estabelecido por Jesus Cristo. Com o título “A Ekklesia” (“congregação” em grego) um artigo de 1881 mostrava que Russell não temia usar o termo “organização.” Em certo ponto ele diz que os primeiros cristãos “eram organizados e vinculados entre si como membros de uma sociedade, e como tal tinham leis e governo, e portanto, um chefe ou autoridade dirigente reconhecida.” Isto pode se assemelhar muito ao conceito de organização hoje defendido pela Torre de Vigia. O que ele realmente disse, porém, foi bem diferente.

Em parte alguma ele indica que os cristãos devem estar sob direção e controle de uma administração ou autoridade centralizada terrestre, que exige sua submissão. Os vínculos que uniam seus membros não eram laços organizacionais. Sua unidade não se baseava numa forma de lealdade e submissão a uma organização. A lei que os governava não incluía regulamentos organizacionais. Era uma organização que não mantinha nenhuma lista terrestre de nomes. Nota-se o tempo todo a ausência do conceito de uma estrutura de autoridade terrestre. Isto é o que dizia o presidente da Torre de Vigia em 1881:

 

Eles eram organizados e vinculados entre si como membros de uma sociedade, e como tal tinham leis e governo, e portanto um chefe ou autoridade dirigente reconhecida. Os vínculos eram os vínculos do amor e do interesse comum. Visto estarem todos alistados sob a capitania de Jesus, as esperanças e temores, alegrias e sofrimentos, e os anseios de um eram os do outro; e assim tinham uma união de coração bem mais perfeita do que possivelmente teriam com base em algum credo elaborado pelo homem. Assim, sua organização era do Espírito; sua lei que governava cada um era o amor, e todos como um só se punham sob a obediência à “lei do Espírito,” conforme era expressada pela vida, pelos atos e pelas palavras de seu Senhor. Seu governo era a vontade daquele que disse: “Se me amais, guardai os meus mandamentos.”

Assim, vemos a primitiva igreja organizada, governada e em perfeita unidade e harmonia com a regência ou chefia de Jesus. Contraste esta igreja organizada com aquilo que agora pretende ser uma continuação da mesma, a saber: as diversas organizações denominacionais, cada uma delas prendendo seus membros numa união mental à base de um credo ou dogma de sua própria autoria (muitas delas sendo tudo, menos amorosas), cada uma tendo suas próprias leis.

Estas leis emanam de seus próprios chefes ou dirigentes e legisladores; de modo que vê-se claramente que estas igrejas da época atual têm e reconhecem, como seus chefes ou autoridades dirigentes, os antigos fundadores de seus vários credos, enquanto seus clérigos, em conferências, concílios, sínodos e presbitérios, interpretam e impõem as “bênçãos dos anciãos,” que “anulam a Palavra de Deus.” Estes tomam o lugar do verdadeiro chefe da igreja, Jesus, e do verdadeiro instrutor e guia de toda a verdade, o Espírito Santo. Ouvi o profeta Isaías expressá-lo (cap. 9:15).

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Isto nos leva à nossa segunda proposição, a saber, que todos os cristãos devem juntar-se a esta organização. À luz do que acabamos de dizer sobre a classe que constitui a igreja que Jesus organizou, é evidente que se doastes toda a vossa vontade, talento, tempo, etc, sois reconhecidos por Jesus como seus seguidores e membros da Ekklesia ou corpo, do qual ele é a cabeça, e cujos nomes estão escritos no céu. De modo que nos juntamos à igreja de Jesus e temos os nomes registrados como membros, por meio de uma consagração. Mas alguém diz: não preciso juntar-me a alguma organização na terra, aceitar algum credo e ter meu nome escrito na terra? Não, lembrai-vos de que Jesus é vosso modelo e instrutor, e nem nas palavras nem nos atos dele encontrareis autorização para prender-vos a credos e tradições de anciãos, os quais tendem todos a anular a palavra de Deus (Marcos, 7:13) e pôr-vos debaixo de uma escravidão que estorvará vosso crescimento na graça e no conhecimento, contra o que Paulo vos advertiu: “Perseverai, portanto, na liberdade para a qual Cristo vos libertou, e não estejais sujeitos ao jugo da escravidão.” (Gal. 5:1)

Mas dizem alguns: se não é apropriado unir-se a uma das igrejas nominais atuais, não seria bom formar nossa própria organização visível? Sim, isto é o que nós temos ¾ uma organização modelada segundo a igreja primitiva. Cremos que voltamos à primitiva simplicidade: apenas o Senhor Jesus é nosso cabeça ou legislador, o Espírito Santo é nosso intérprete e guia para a verdade; nossos nomes estão todos escritos no céu; estamos vinculados entre si pelo amor e pelo interesse comum.

Indagais: como nos conheceremos uns aos outros? Respondemos: não po                   demos contribuir para o conhecimento mútuo se manifestarmos o Espírito de nosso Amo em palavras e ações, maneiras e aparência? Sim, a fé viva, o amor sem fingimento, a brandura longânime, a simplicidade como a das crianças junto com a constância e o zelo da maturidade, tornam manifestos os filhos de Deus, e não precisamos de nenhum registro terrestre, pois os nomes de todos estes estão escritos no livro da vida do Cordeiro.

 

Segundo a Sentinela, a verdadeira congregação de Cristo diferia de todas as organizações religiosas existentes, cada uma com seu conjunto distinto de ensinos, que todos devem adotar para serem aceitos com membros; cada uma com seus líderes, que se reúnem em conferência para instituir leis peculiares à sua organização específica, e que impõem estes regulamentos a todos os adeptos, de tal modo que “tomam o lugar do verdadeiro chefe da igreja, Jesus, e do verdadeiro instrutor e guia de toda a verdade, o Espírito Santo.” Os editores da Sentinela anunciaram seu retorno à “primitiva simplicidade” da congregação do primeiro século, cuja organização era a do Espírito, cuja lei era o amor, cujo governo era unicamente a vontade daquele que disse: “Se me amais, guardai os meus mandamentos.” Estavam unidos, dizia A Sentinela, não por laços organizacionais e padrões de origem humana, mas “pelo amor e pelo interesse comum.” No ano seguinte, em abril de 1882, voltaram a afirmar que não tinham uma “cerca” de credos, dentro da qual os membros fossem obrigados a ficar e que excluísse do convívio os que não aprovassem uma série de ensinos prescritos. Não tendo na época um nome distintivo, referiam-se a si próprios simplesmente como “estudantes da Bíblia.” Eis o que pregavam:

 

Perg.   Permiti-me, por favor, saber por que nome vos chamais. Qual é a denominação?

Resp. Somos estritamente não-sectários, e conseqüentemente não reconhecemos nenhum nome sectário, crendo como Paulo, (lede 1 Cor.3:1-4) que alguém dizer eu sou de Paulo, e eu de Apolo, ou eu sou Batista, ou eu sou Metodista, etc., é evidência de carnalidade, e conseqüentemente está em oposição ao Espírito de Cristo. Será que Paulo e Apolo morreram por nós? Se foi assim, chamemo-nos como sendo deles. Fomos nós batizados na igreja Metodista, Presbiteriana, Batista ou alguma outra denominação? Se fomos, somos membros dela, e podemos ser corretamente reconhecidos por esses nomes. Mas se fomos batizados no único corpo ou igreja da qual Jesus é a única e exclusiva Cabeça, então somos membros especialmente do corpo dele, e o único nome apropriado seria o dele, biblicamente chamados de “Igreja de Cristo,” “Cristãos,” “Igreja dos primogênitos” e nomes genéricos como estes. Mais uma vez, ressaltamos que nossa união cristã é a única com base bíblica, a saber: não temos nenhum credo (cerca) para nos conservar juntos ou para manter outros longe de nossa companhia. A Bíblia é o nosso único padrão e seus ensinos o nosso único credo, e, reconhecendo o caráter progressivo da revelação das verdades bíblicas, estamos prontos e preparados para acréscimos ou modificações ao nosso credo (fé-crença) à medida que recebemos mais luz de nosso Padrão.

Estamos em associação com todos os cristãos em quem reconhecemos o Espírito de Cristo, e de modo especial com aqueles que reconhecem a Bíblia como o único padrão. Não exigimos, portanto, que todos a entendam exatamente como nós, a fim de ser chamados de Cristãos, tendo em vista que crescer tanto na graça como no conhecimento é um processo gradual. Tampouco vemos motivo para esperar que apenas os vigias de Sião “verão olho a olho” (Isa. 52:8) até que venha aquele que é perfeito [completo], quando “o que é parcial será eliminado.” (1 Cor. 13:10.) Se todos os cristãos se libertassem dos credos prescritos e estudassem a Palavra de Deus sem idéias pré-concebidas denominacionais o resultado seria a verdade, o conhecimento e as verdadeiras associação e unidade cristãs. O Espírito da Cabeça permearia os desimpedidos membros do corpo e o orgulho sectário se desvaneceria.

 

Não tardou muito, porém, para que a razão humana sugerisse algo mais “prático.” A questão suscitada foi: não seria bom ter uma “organização enérgica, agressiva” (edificada, é claro, em “linhas bíblicas”!) para cumprir de modo mais eficaz a pregação das boas novas? A Sentinela de março de 1883, apresenta a pergunta e a resposta:

 

P. “Não seria uma organização (ou seita) enérgica, agressiva, edificada em linhas bíblicas, o melhor modo de espalhar e proclamar a verdadeira Boa-Nova? Precisamos de companheirismo e apoio. União é força. Não são as escaramuças que vencem a batalha, e sim os batalhões disciplinados e sólidos.”

R. Acreditamos que uma organização visível e a adoção de um nome específico tenderiam a aumentar nosso número e a dar-nos uma aparência mais respeitável na avaliação do mundo. O homem natural pode ver que um corpo visivelmente organizado, com propósito definido, é algo que tem certo poder; portanto, eles prezam as diversas organizações das quais nós saímos em obediência ao chamado do Amo. Mas o homem natural não consegue entender como um grupo de pessoas, sem nenhuma organização que possa ver, venha um dia a realizar alguma coisa. Quando olham para nós, nos consideram como um punhado de lutadores dispersos, um “povo peculiar,” com idéias e esperanças bem peculiares, mas não dignos de atenção especial.

Mas, embora seja impossível que o homem natural veja nossa organização, porque não pode entender as coisas do Espírito de Deus, confiamos em que possais ver que a verdadeira Igreja é a mais eficazmente organizada e que trabalha da melhor forma possível. (Vede o plano de nossa organização, conforme declarado na edição de outubro, sob a legenda “A Ekklesia.”) O Apóstolo Paulo exorta todos à unidade de fé e propósito (Fil. 3:15, 16-Diaglott.) Todos, conduzidos pelo mesmo Espírito, podem e conseguem chegar ao conhecimento da mesma verdade. Sob o comando de nosso Capitão, todos os verazmente santificados, embora poucos ou separados fisicamente, estão intimamente unidos pelo Espírito de Cristo em fé, esperança e amor; e, ao seguirem as ordens do Amo, avançam em sólidos batalhões para o cumprimento de seus propósitos. Mas, tende em mente, Deus não leva em conta os números (Vede Juízes 7, como ilustração).

Por reconhecermos esta organização, que é do Espírito, e por não desejarmos assimilação com os do mundo, que não podem vê-la nem entender, estamos bem dispostos a suportar o vitupério lançado sobre um povo peculiar. Sempre nos recusamos a ser chamados por qualquer outro nome que não o de nosso Chefe ¾ cristãos ¾ afirmando continuamente que não pode haver divisões entre os que são continuamente guiados pelo Espírito e exemplo dele, conforme expressos por meio da Palavra dele.

 

A idéia de que era desejável uma forte organização visível foi assim retratada como fruto do pensamento carnal, típico do “homem natural” que busca crescimento numérico, que admira o poder que uma organização visível com nome distintivo pode gerar. Também típico do homem não-espiritual, era que ele “não consegue entender como um grupo de pessoas, sem nenhuma organização que possa ver, venha um dia a realizar alguma coisa.” A única organização a que pertenciam, afirmavam de novo estes estudantes da Bíblia, era espiritual, “invisível para o mundo.” Não havia nada de “venha ver” para impressionar as pessoas, como o tamanho, a eficiência e a força de uma organização e suas propriedades de terrenos e edifícios. Em lugar da unidade organizacional o alvo proclamado era a unidade do espírito. Encorajavam as pessoas a libertar-se das denominações religiosas com suas organizações visíveis. Como então, perguntavam, poderiam convidar outros a fazer isto se eles mesmos não o fizessem?

Foi desconcertante, portanto, quando a revista A Sentinela de 1o de setembro de 1979, sob o título “A Hodierna Organização Teocrática,” citou sua própria edição de fevereiro de 1884 como se esta apoiasse o atual conceito sobre organização que prevalece entre as Testemunhas de Jeová. Observe como a matéria (página 16) introduz a citação de forma a dar margem a esta idéia:

                                             [SCAN DA SENTINELA 1/9/79, PÁGINA 16]

 

16 Esta já mencionada congregação pro-curou seriamente mostrar-se digna de ser a organização visível de Jeová e Seu ins-trumento. Por isso, manteve-se livre de quaisquer alianças com as organizações sectárias da cristandade, bem como das organizações políticas deste mundo. Ex-pressando-se neste sentido, esta congrega-ção cristã disse, no número de fevereiro de 1884, em inglês, de sua revista oficial A Sentinela:

 

“Novos leitores, em todas as partes do país, constantemente indagam: Que nomes dão a si mesmos? São ‘Primitivos Batistas’? São ‘Batistas Missionários’? São ‘Universalistas’? São ‘Adventistas’? São ‘Primitivos Metodistas’? etc., etc. Já tentamos diversas vezes esclarecer nossa posição, e agora nos empenhamos em fazer isso mais uma vez, em poucas palavras.

 

“Não pertencemos a NENHUMA organi-zação terrena; portanto, se se mencionas-se toda a lista de seitas, responderíamos: Não, a cada uma e a todas. Aderimos apenas àquela organização celestial ‘cujos nomes estão escritos no céu’. (Heb. 12:23; Luc. 10:20.) Todos os santos que agora vivem ou que já viveram durante esta era pertencem à ORGANIZAÇÃO DE NOSSA IGREJA: todos constituem UMA só Igreja, e não há NENHUMA OUTRA reconhecida pelo Senhor. Portanto, qualquer organização terrena, que interfira, por pouco que seja, nesta união de santos é contrária aos ensinos das Escrituras e oposta à vontade do Senhor — ‘para que sejam UM’. (João 17:11.)”

 

Tentando explicar de antemão a afirmação “Não pertencemos a NENHUMA organização terrena,” o redator da Sentinela de 1º de setembro de 1979 apresenta isto como se se referisse apenas a manter-se separados das “organizações sectárias da cristandade, bem como das organizações políticas.” Eles estavam separados destas, embora a idéia de “organizações políticas” sequer estivesse em discussão; a inserção feita por este último redator de A Sentinela visa simplesmente “despistar,” desviando a atenção do real significado das afirmações. Na declaração taxativa, “Não pertencemos a NENHUMA organização terrena,” a palavra “NENHUMA” significa claramente nenhuma de todas, não apenas nenhuma das sectárias, mas nenhuma que eles mesmos tivessem instituído. Ensinavam claramente que se eles próprios instituíssem uma organização com estrutura de autoridade e nome distintivo próprios, estariam criando mais um sistema sectário. A única organização a que pertenciam era a “organização celestial” cujos membros têm os nomes escritos no céu.

O contexto evidencia isto. Nos parágrafos que seguem, não citados pelo redator de 1979, o artigo de 1884 continha estes tópicos:

 

Por que nome pode-se chamar esta Igreja? Respondemos: pelo nome de seu fundador e instituidor ¾ Cristo. De modo que ela é a “Igreja de Cristo” ou “Igreja de Deus,” pois Deus a fundou sobre a Rocha Cristo Jesus; ou “cristãos,” como eram conhecidos nos primeiros tempos. (Atos 11:26, 26:28; e 1 Pe. 4:16.) Mas, como Paulo e os outros discípulos não eram seguidores dos ensinos de Calvino, eles não foram, portanto, chamados de calvinistas; como não eram seguidores dos ensinos e do exemplo de Lutero, eles não foram, portanto, chamados de luteranos; mas como seguiam a CRISTO como ÚNICO exemplo e a seus ensinos apenas, aceitaram alegremente, portanto, quando foram chamados de “cristãos.”

O que achais? Não ocupamos a única base para a união? Ou supondes que se todos os credos de fabricação humana, formulários, livros de oração, liturgias e nomes fossem postos de lado, ou que se todos os cristãos se reunissem no exclusivo nome de Cristo e em frugal simplicidade estudassem Suas palavras sob a direção do Espírito de Deus, ainda existiriam na Igreja diferenças sérias, mesmo que de opinião?

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De modo que não importam os nomes pelos quais os homens venham a chamar-nos; não reconhecemos nenhum outro nome senão o “único nome dado debaixo dos céus e entre os homens” ¾ Jesus Cristo. Chamamo-nos simplesmente de CRISTÃOS e não levantamos nenhuma cerca que nos separe daqueles que acreditam na pedra de alicerce de nosso edifício mencionada por Paulo: “Que Cristo morreu por nossos pecados segundo as Escrituras;” e aqueles para quem isto não é bastante não têm direito a serem chamados de cristãos.

 

Isto deixa bem claro que Russell e seus associados não tinham, na época, um conceito exclusivista, como se se considerassem os únicos cristãos. Rejeitavam o ponto de vista estreito que negava a condição cristã a outras pessoas religiosas pelo motivo de não estarem dentro de uma “cerca” organizacional. Não se negavam a chamar de “cristão” todo aquele que aceitasse a verdade fundamental de que “Cristo morreu por nossos pecados segundo as Escrituras.”

Que este é o significado das afirmações deles, é óbvio em edições mais antigas das revistas, várias das quais já citadas. Faz-se a admissão de que outros, além deles, sejam “concristãos,” pois haviam dito: “Estamos em associação com todos os cristãos em quem reconhecemos o Espírito de Cristo, e de modo especial com aqueles que reconhecem a Bíblia como único padrão. Não exigimos, portanto, que todos a entendam exatamente como nós, a fim de ser chamados de cristãos, tendo em vista que crescer tanto na graça como no conhecimento é um processo gradual..”2 O redator da Sentinela de 1979 que pesquisou as citações de 1884 deve, naturalmente, ter visto estas outras declarações. Se o fez, ele deve saber que o uso destas citações foi enganador, contrário aos fatos.

Esta atitude continuava uma década depois, quando a edição de 15 de setembro de 1895 da Sentinela afirmou em termos bem severos sua postura para com as organizações humanas. Em resposta às perguntas dos que buscavam conselho quanto ao meio mais eficaz de dirigir reuniões de grupo, ela apresentou este como um dos pontos iniciais:

 

 (2) Cuidado com as “organizações.” São totalmente desnecessárias. As normas da Bíblia são as únicas de que precisareis. Não tenteis prender as consciências dos outros, e não permitais que outros prendam as vossas. Crede e odedecei até o ponto em que puderdes entender a Palavra de Deus hoje, e assim, continuai a crescer na graça, no conhecimento e no amor dia após dia.

 

Estas foram afirmações primitivas, posições primitivas. Como, então, ocorreu tão notável metamorfose, causando a reversão quase completa da posição, que prevalece até o dia de hoje? Nos anos 80, Ron Frye, ex-superintendente de circuito e Testemunha por 33 anos, tendo passado “anos de angústia” por conta dos ensinos da Torre de Vigia com relação à autoridade, fez extensa pesquisa quanto à validade deles. Contrastando o passado com o presente, escreveu:

 

Hoje, mais de cem anos depois do início com Russell, as Testemunhas estão notavelmente voltadas para uma organização. A organização sempre vem primeiro. Na Sentinela de 1° de setembro de 1979,  no artigo “Fé na Organização Vitoriosa de Jeová” a expressão “organização teocrática” aparece quinze vezes apenas nos primeiros onze parágrafos.4 Este tipo de repetição hipnótica é constantemente usado pela Sociedade para condicionar as Testemunhas de Jeová a pensar que é errado questionar qualquer coisa que ela publique como verdade. Em contradição com esta atitude relacionada com uma organização, Russell e seus primeiros associados eram francamente contra uma organização terrena.

 

Quanto ao que pode ter motivado esta atitude “contra uma organização terrena” naquele estágio inicial, Frye prossegue:

 

Pode-se agora compreder o antagonismo que Russell sentia para com as igrejas que tinham história. Ele era, afinal de contas, um desgarrado religioso. Seu pequeno grupo de seguidores não tinha história como organização. Buscavam minimizar essa falta de história argumentando que Deus não tinha uma organização terrena permanente ¾ uma congregação cristã, monolítica ¾ que esse não era o modo de Deus fazer as coisas. Desta forma, os adeptos de Russell podiam depreciar aquelas religiões que tinham história terrena e explicar de algum modo sua própria falta de uma.

E, em relação ao assunto em pauta, fica abundantemente claro que Russell não acreditava que Deus tivesse, na terra e naquela época, uma ‘organização do escravo fiel e discreto com 1800 anos de existência’ ¾ o canal terreno de comunicação com Deus. Ele não a encontrou e nem foi encontrado por ela. Ele e seus companheiros não tinham associação com qualquer organização existente, e mostravam, de fato, desdém por todas as outras associações. Repudiavam firmemente a idéia de que existisse na terra uma organização visível, terrena, de Pentecostes em diante, a qual as pessoas teriam de identificar a fim de servir a Deus.

Mas hoje, cem anos depois, os descendentes dos Estudantes da Bíblia do movimento de Russell argumentam no sentido contrário, que é necessário procurar uma organização visível terrena, a saber, [a associada com] a Sociedade Torre de Vigia de Bíblias e Tratados. Esta não era a postura do início. À medida que a situação mudava, também as Testemunhas de Jeová mudavam seus argumentos. Tão firmemente quanto argumentavam outrora contra uma organização, elas hoje argumentam a favor de uma organização.

Do mesmo modo que sua compreensão a respeito de uma organização era, há cem anos, muito diferente do que é hoje, também seu conceito sobre Russell é hoje bem diferente do que era no começo. A não ser por breves referências ocasionais, Russell é desconhecido da maior parte das Testemunhas da atualidade. Seus escritos não são recomendados para leitura, e seus muitos livros não são mais publicados pela própria editora que ele fundou e aparelhou com seu próprio dinheiro.

No entanto, argumentam ainda as Testemunhas de Jeová, ele foi um homem a quem Deus usou para restaurar os grandes ensinos de Jesus e seus apóstolos. Por que não se estudam hoje os livros dele nas congregações das Testemunhas de Jeová, pelo menos numa perspectiva histórica? Porque muitos deles, se não a maior parte, seriam hoje considerados como heresia.

 

Que há base para esta conclusão pode ser visto naquilo que de fato acontecia enquanto Russell ainda vivia. Se fizermos um retrospecto das várias citações já apresentadas neste capítulo, pode parecer difícil crer que o homem que era a fonte de todas elas foi o mesmo que em 1910 — quando se tornara conhecido internacionalmente por milhares de pessoas como o “Pastor” delas, quando a revista A Sentinela que ele fundara já contava três décadas de história, e quando suas obras em circulação já atingiam milhares de exemplares em vários países ¾ disse que a pessoa que lesse apenas a Bíblia sem usar os Estudos das Escrituras que ele escrevera, iria, de acordo com a experiência, ‘ficar em trevas dentro de dois anos,’ enquanto que aquele que lesse os Estudos das Escrituras, sem ler nada da própria Bíblia, estaria, assim mesmo, ‘na luz’ ao final desse mesmo período. Ainda que passasse “semanas e anos” no estudo pessoal da Bíblia, sem usar os escritos de Russell, “mesmo então, as chances são de que, ao lançar luz sobre algo, ele venha a entendê-lo totalmente errado.”5

Houve comentários acauteladores em relação a essas afirmações. Não obstante, permanece o fato de terem desaprovado a capacidade do cristão individual compreender a Palavra de Deus por meio do estudo pessoal, e fez-se todo esforço no sentido de apresentar as publicações da Torre de Vigia como o exclusivo canal de luz e verdade de Deus. É difícil conceber atitude mais imodesta e sectária, é difícil conceber um desvio mais lamentável dos elevados princípios antes defendidos.

Tampouco foi essa atitude algo isolado, momentâneo. Que ela já vinha se desenvolvendo torna-se evidente pela matéria publicada em A Sentinela do ano anterior, 1909. No número de 1º de outubro, Russell, fundador e editor da revista, único “Pastor” reconhecido pelos Estudantes da Bíblia, analisou Mateus capítulo 24, versículo 45, e sua referência a “aquele servo” e seus “conservos.” Utilizando, como de costume, o literário “nós” em vez do “eu,” ele admitiu que quatorze anos antes o termo “aquele servo” (referindo-se ao servo fiel e prudente da parábola) fora aplicado a ele por outra pessoa associada à Torre de Vigia e que ele não participara do debate que se seguira a esta aplicação.6  Mas ele afirma que a primeira pessoa que lhe aplicou essa designação asseverava agora que “embora nós ocupássemos mesmo tal posição esta nos foi confiscada, perdida para um sucessor.” Daí ele apresenta uma consideração do tema, mas fazendo-o de modo indireto, pelo método de primeiro apresentar o que seus “amigos” dizem e depois o que dizem seus “opositores,” deixando seus próprios comentários para o final.

Ele apresenta seus “amigos” dizendo:

 

Nossos amigos insistem em que essa Escritura indica que, no fim desta era do Evangelho, o Senhor não usaria muitos instrumentos para a divulgação da Verdade, mas apenas um instrumento, e que seria privilégio de outros dos fiéis do Senhor serem “conservos” (co-trabalhadores). Eles insistem em que os fatos ligados a este tempo de colheita reforçam abundantemente esta interpretação. Afirmam que todos eles receberam seu conhecimento da Verdade Atual diretamente das publicações da  Sociedade Torre de Vigia de Bíblias e Tratados, ou indiretamente através daqueles que obtiveram seu esclarecimento por meio deste instrumento. Por conseguinte, têm prazer em cooperar como “conservos” na obra da Sociedade, crendo que assim seguem a liderança da Providência Divina, bem como as instruções da Palavra Divina. Crêem que, agindo de outro modo, estarão se opondo à Palavra Divina, e antagonizando a obra da colheita, trazendo dano para si mesmos.

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Eles declaram que, no seu modo de ver, não existe nenhuma outra interpretação dos fatos diante de nós senão a que se apresenta na promessa de nosso Senhor; que no tempo apropriado do fim das eras, no tempo de sua presença, ele traria dos celeiros da Graça, Sabedoria e Verdade, coisas “novas e velhas,” e que ele selecionaria nesse tempo um instrumento especial através do qual essas bênçãos seriam trazidas à atenção da família da fé — indicando também que a outros seria concedido o privilégio de entrar para o serviço como “conservos.” Eles salientam que assim como estes se tornaram “conservos” e foram abençoados e usados na obra da colheita, outros que se opuseram foram para as “trevas exteriores” do nominalismo, no que diz respeito à verdade da “colheita” e seu serviço.

 

Recordemos que A Sentinela era a revista do próprio Russell. Ele a iniciou, ele a controlava, e como único editor determinava seu conteúdo.7 Ela era, em essência, o veículo dos escritos dele. Antes de morrer, num testamento, ele declarou que embora tendo doado a revista à Sociedade Torre de Vigia de Bíblias e Tratados (sociedade jurídica que também controlava como acionista majoritário), isto foi feito “com o entendimento explícito de que manteria o controle de todos os interesses destas publicações durante minha existência, e que, após a minha morte, estes seriam conduzidos de acordo com meus desejos.”8 Assim, quando fala das atitudes para com a revista ou para com a Sociedade, ou aplica o termo “instrumento” à Sociedade ou à revista, ele está, de fato, com tais termos, referindo-se a si mesmo no sentido mais pessoal. Todo o contexto do artigo confirma isto. Isto é reforçado pelo fato de que ele era o único reconhecido como “Pastor.” Antes já se referira a si próprio como “porta-voz de Deus” e “instrumento” para revelação da verdade.9 Portanto, quando menciona “apenas um instrumento” por meio do qual as pessoas (seus “amigos”) haviam recebido esclarecimento, ele se refere claramente aos escritos de Charles Taze Russell. Mostra isso também ao dizer que “seria privilégio de outros dos fiéis do Senhor serem ‘conservos’ (co-trabalhadores) com este “instrumento especial” escolhido pelo Senhor.10

Isto é claramente comprovado por repetidas declarações publicadas na revista A Sentinela nos anos que se seguiram à morte de Russell. Mostrando um quadro totalmente diferente da versão moderna apresentada em A Sentinela, a edição de 1o de março de 1923 (em inglês) cita Russell dizendo que alguns falavam dele como o “servo fiel e prudente,” e outros falavam da Sociedade como tal. A revista acrescenta, então:

 

Ambas as declarações são verdadeiras; pois o irmão Russell era, de fato, a Sociedade no sentido mais absoluto, pelo seguinte, por ele determinar as diretrizes e o rumo da Sociedade sem prestar contas a ninguém mais na terra.

 

De fato, uma edição biográfica de A Sentinela publicada após a morte dele em 16 de outubro de 1916, afirmava:

 

Milhares de leitores dos escritos do Pastor Russell acreditam que ele preencheu o cargo “daquele servo fiel e prudente” e que sua grande obra foi prover à família da fé o alimento na época devida. Sua modéstia e humildade o impediam de reivindicar este título abertamente, mas ele admitia isso em conversa particular.11

 

Sobre aqueles que classificava como “opositores” a que ele fosse “aquele servo,” usado como “instrumento” de Deus na Sentinela de 1o de outubro de 1909 já citada, Russell os descreve, dizendo:

 

Nossos opositores tornam-se muitas vezes amargos e sarcásticos depois que tomam uma posição antagonista. Retrucam que a expressão “aquele servo” deve ser entendida como que se aplicando a todos os membros da igreja de Cristo, e que a expressão “seus conservos” não faz sentido, pois se refere à mesma classe. Declaram que embora seja verdade que eles obtiveram seu primeiro esclarecimento a respeito do valor da morte de Cristo como um “resgate por todos,” seu primeiro conhecimento dos tempos da “restituição de todas as coisas,” sua primeira apreciação da “chamada para o alto,” seu primeiro conhecimento da parousia e do tempo da colheita nesta época, seu primeiro conhecimento do tempo das profecias em conexão com este tempo de colheita e seu primeiro entendimento da natureza do homem e da obra de redenção, expiação e regeneração das publicações da Sociedade, não obstante são de opinião de que todas estas coisas foram anteriormente publicadas por outros, e que estão tentando encontrar os livros. E vão mais além afirmando que aplicar esta Escritura a nós significaria que somos infalíveis.                                          

                                        ¾¾¾¾¾¾

Mas, retrucam os opositores, embora não neguemos o serviço prestado, ainda que aceitemos como correta a afirmação de Mateus 24:45, seremos sempre forçados a aplicar à outra parte, o contexto que diz: “Em verdade vos digo, ele o constituirá sobre todos os seus bens.” Isso significaria que os “conservos” e a “família da fé” em geral não poderiam esperar receber o alimento espiritual de qualquer outra fonte que não “aquele servo.” Opomo-nos a esta idéia, e portanto opomo-nos à matéria inteira.

 

Note que os que ele chama de “opositores” tomavam a mesma posição hoje mantida pela Sociedade Torre de Vigia, a saber, que o “servo fiel e prudente” se aplica a “todos os membros da igreja de Cristo,” não a um só homem. Considerar Russell como “aquele servo” e chamar todos os outros de seus “conservos,” portanto, “não faz sentido,” já que todos eles eram parte “daquele servo.” Eles viam um claro perigo em olhar para qualquer fonte humana como instrumento por meio do qual se recebe a verdade e o entendimento. Aos olhos de Russell, questionar desse modo a relação especial com o Senhor, que resultava de ele ocupar o posto “daquele servo” e ser o “instrumento” escolhido, significaria ser “antagonista” e fazer declarações “amargas e sarcásticas.” Tudo isto soa de modo bem familiar.

Vinte e três anos antes, em 1886, em seu livro O Plano Divino das Eras (página 23), Russell dissera que o desenvolvimento de uma organização hierárquica teve suas raízes no “respeito indevido pelos ensinos de homens falíveis.”

 

Então, paulatinamente, veio à existência uma classe especial chamada “o clero,” cujos membros tinham a si mesmos, e eram tidos pelos outros, como os guias apropriados da fé e da prática, à parte da Palavra de Deus. Assim, com o tempo, o grande sistema do Papado foi desenvolvido em função do respeito indevido pelos ensinos de homens falíveis e da negligência pela Palavra do Deus infalível.

Sérios, sem dúvida, têm sido os péssimos resultados da negligência para com a verdade. Como todos sabem, tanto a igreja como o mundo civilizado foram quase que totalmente escravizados por esse sistema, e levados a adorar as tradições e os credos de homens.

 

Daí, porém, quando alguns deixaram de expressar pleno apoio aos escritos dele como “único instrumento especial” escolhido pelo Senhor, ele empenhou-se em atribuir uma importância enorme, até vital, a esses escritos. Deste modo foi que ele apresentou o que seus “amigos” diziam de suas publicações:

 

Eles destacam que eles próprios e seus antepassados tiveram, durante gerações, classes bíblicas e estudos bíblicos, todos sem nenhum proveito até que o Senhor, no tempo devido, enviou-lhes as “Chaves Bíblicas,” por meio da Sociedade. Destacam que ignorar esta condução do Senhor e excluir do seu estudo da Bíblia o instrutor enviado pelo Senhor seria desonrar o Senhor que o enviou, e rejeitar Sua mão ajudadora; e que o único resultado que se poderia esperar de tal proceder seria a perda gradual da luz ¾ a perda proporcional do Espírito santo, o espírito da verdade, e eventualmente cair nas “trevas exteriores” do mundo e da igreja nominal, da qual eles tinham sido resgatados pela verdade. Declaram que isto corresponderia à porca que volta a revolver-se no lamaçal e o cão ao seu vômito, como afirma o Apóstolo. Declaram que tomar tal proceder seria falta de apreço da parte deles por terem sido chamados da escuridão para esta maravilhosa luz, uma falta de apreço pela “estrela da alva” que o Senhor prometeu como precursora da gloriosa aurora da nova dispensação. ¾ 2 Pe. 1:19-21.

Eles destacam ainda que os Volumes de “Estudos das Escrituras-Aurora são praticamente a própria Bíblia numa forma sistematizada, organizada; e que foi exatamente esta sistematização da Bíblia que os trouxe a seu atual conhecimento e alegria no Espírito santo. Declaram que as disputas, as conjecturas e as especulações a respeito de coisas não reveladas no Livro de Deus são muitas vezes rotuladas de “estudo bíblico,” e que têm receio destas coisas, e desejam manter-se achegados ao Senhor e à mensagem que eles crêem que lhes enviou, e que, portanto, preferem estudar a Bíblia à luz e sob a orientação dos “Estudos Bereanos” e dos “Estudos das Escrituras,” e buscar mais luz nessa mesma direção sem esperar revelações especiais para seus próprios cérebros ou provenientes de várias direções.12

 

Note que os “amigos” são apresentados dizendo que todo o estudo bíblico feito por eles e seus antepassados tinha sido totalmente inútil até que chegaram as publicações da Torre de Vigia. Evidentemente, o Espírito santo de Deus era inativo ou simplesmente incapaz de prover a eles e aos antepassados a ajuda necessária. Todas as orações que fizeram a Deus pedindo entendimento, durante essas “gerações,” parecem ter ficado simplesmente sem resposta, pois ainda não havia chegado o tempo para Ele prover Seu “instrumento.”13  Note também que após afirmar o papel vital dessa Sociedade, Russell apresenta seus “amigos” dizendo que “ignorar esta condução e excluir de seu estudo da Bíblia o instrutor enviado pelo Senhor seria desonrar o Senhor que o enviou e rejeitar Sua mão ajudadora,” que tudo isto leva à “gradual perda da luz,” perda do Espírito santo e por fim à queda nas “trevas exteriores.” Tudo isto saiu da caneta do homem que anteriormente dissera que “o respeito indevido pelos ensinos de homens falíveis” tinha levado à hierarquia e à escravização.

No final do artigo Russell abandona o recurso literário “amigos versus opositores” e se expressa diretamente. De modo elogiável, pede que se evitem rixas ou xingamentos. Apela para a importância da “brandura” e da “humildade.” Ao mesmo tempo, no artigo, descreve os que não achavam bíblico ver nele e na sua revista o exclusivo instrumento de Deus, como “‘conservos’ desleais,” “ardilosos,” “de espírito contencioso,” que parecem estar “inoculados de loucura, hidrofobia satânica.” Os que não continuam filiados à sua Sociedade Torre de Vigia são descritos como ‘rejeitados.’ Mesmo dizendo que não se devia ser descortês com os que ficaram ‘cegos,’ ele passa a falar desses dissidentes como pessoas “que nesta hora de tentação estão sendo derrubadas pelas flechas do adversário pois, do ponto de vista do Senhor, não são consideradas dignas do necessário socorro.” Sua clara opinião é que, para classificar-se entre os que mostram ‘brandura, humildade e capacidade de aprender’ devia-se reconhecer humildemente que Cristo tinha escolhido apenas um “servo especial,” “um instrumento especial,” e mostrar mansa receptividade aos escritos desse “servo” como algo inquestionavelmente superior a todas as outras fontes de conhecimento da Palavra de Deus. Lendo o artigo não pude deixar de espantar-me com o raciocínio incrivelmente deturpado que pode se desenvolver na mente humana, não importa quão religiosamente orientada ela seja. Como pode uma pessoa escrever sobre si mesma e seus escritos com tanta exaltação, argumentar que é um agente especial de Deus, num caso único jamais visto e que jamais se repetirá, e em seguida imputar falta de mansidão, humildade e capacidade de aprender aos que duvidam disso? Vejo nisso uma forma de doença mental, uma infecção pelos germes do egocentrismo, capazes de se reproduzir onde quer que se desenvolva uma atmosfera de poder e importância pessoais. Nenhum de nós possui imunidade natural a isso. Nossa proteção provém do reconhecimento claro e constante da liderança que cabe exclusivamente a Cristo, lembrando que, se temos uma relação pessoal com Deus, também a têm todas as outras pessoas que partilham uma fé comum, e do profundo respeito pelo fato de que diante de Deus somos todos iguais.

 

Compare todo o histórico e as afirmações precedentes com as declarações de Inácio, Cipriano e outros líderes dos primeiros séculos. Eles insistiam em maior lealdade e apego ao bispo como instrutor religioso escolhido por Deus, consideravam qualquer falta de submissão ou receptividade como ‘desonrar o Senhor,’ e advertiam das terríveis conseqüências que viriam sobre os que questionassem a privilegiada posição de alguém supostamente escolhido pelo Senhor. Nas palavras de Lightfoot, o bispo passou a ser o “canal indispensável da graça divina.” Neste caso, temos um homem que se apresenta como “instrumento especial” de Deus, por meio do qual se recebe a compreensão de Sua mensagem e Sua direção. O paralelo é claro.

O padrão existente há séculos, que realça a importância humana e, por extensão, a autoridade humana, estava emergindo mais uma vez. Logo receberia um renovado e poderoso impulso.

 

Intensifica-se o processo centralizador

 

Com a morte de Russell em 1916, seguiu-se um período de incerteza. Na época, o colapso total do seu complexo sistema de datas proféticas (que tinha seu ponto de partida em 1874 e sua data de encerramento em 1914) trouxe grande confusão e resultou numa explosão de questionamentos.14

O sucessor de Russell, Joseph F. Rutherford, teve de lidar com isto. Qualquer devoção que ele tivesse aos altos princípios enunciados em números anteriores da Sentinela seria então posta à prova.

O livro Crise de Consciência já documentou os meios que ele resolveu empregar para pôr ordem nas fileiras. Esses meios incluíam a defesa estridente e dogmática dos ensinos tradicionais da Sociedade Torre de Vigia, as insinuações intimidatórias aplicadas a quem questionasse a certeza absoluta das profecias de datas passadas e das novas em elaboração, o farto uso de expressões como “indisputáveis,” “certeza comprovada,” “correta além da possibilidade de erro,” “de origem divina e divinamente corroborada,” e “sublime demais para ser resultado do acaso ou de invenção humana,” afirmações aplicadas a cálculos cronológicos que hoje estão totalmente descartados.15 Como demonstra o grande número dos que deixaram a associação durante a primeira metade dos anos 20, o sucesso destes métodos foi limitado.

Rutherford aumentou a turbulência do período devido a sua clara preocupação e determinação de que, como presidente da Sociedade Torre de Vigia, tinha de exercer o mesmo grau de autoridade que Russell tivera. A diferença era que ele não era o fundador da Sociedade nem seu acionista majoritário, como Russell fora. Travou-se uma luta pelo poder dentro da diretoria. Por meio da demissão de quatro diretores que não concordavam com seus desejos de controle total e, depois, da dissolução da comissão editora que Russell estabelecera, Rutherford eliminou toda a resistência e exerceu, daí em diante, uma autoridade monárquica na sede da Sociedade.

Embora isto lhe desse o completo controle da Sociedade e do que ela publicava, sua autoridade não ia além disso. No tempo em que Russell presidia a sociedade civil, a Sociedade Torre de Vigia de Tratados de Sião era vista apenas como instrumento para proclamar a mensagem. Ela e seus dirigentes não exerciam autoridade administrativa sobre as congregações ou “eclésias” que surgiam. Todo o controle exercido era principal e basicamente por meio da persuasão. Agora, porém, a atitude persuasiva parecia demasiado fraca para lidar com as circunstâncias existentes. Métodos coercitivos paulatinamente a substituíram. Repetindo o que acontecera nos primeiros séculos, recorreu-se à centralização da autoridade e do controle, como recurso para manter e de fato impor a unidade.

Em 1919, conforme o livro As Testemunhas de Jeová no Propósito Divino (em inglês), apenas dois anos após o Juiz Rutherford ter assumido a presidência, pediu-se às congregações que “se registrassem como organizações de serviço junto à Sociedade,” entendendo-se que a partir daí a sede de Brooklyn designaria um irmão da congregação para servir como representante da Sociedade, chamado “diretor.” O livro mencionado acrescenta (na página 95):

 

Isto significava que, pela primeira vez, a autoridade era retirada das congregações controladas democraticamente por seus “anciãos eletivos,” e a direção passava a ficar então, especificamente, sob a supervisão internacional da Sociedade. É verdade que isto era limitado, mas com este arranjo deu-se início à organização teocrática visível.

 

O afiado gume da lâmina fora inserido.

Logo depois, portanto, Rutherford começou a afastar-se do que fora a posição da Sociedade nos anos anteriores. Passou a trabalhar para o objetivo que Russell tinha censurado como fruto do “pensamento carnal”: o desenvolvimento duma ‘organização visível, agressiva, firmemente unida, centralizada.” Um ano após dar o primeiro passo (já descrito), seguiu-se outro. A própria história da Sociedade relata:

 

A acentuação da responsabilidade de pregar começou em 1920, quando pediu-se a todos da congregação que participavam na obra de testemunho que entregassem um relatório semanal.16

 

Deste modo, uma obrigação implícita de submissão ao controle da sede em Brooklyn foi implantada nas mentes de todos os associados. As pessoas normalmente prestam relatório a um superior, ou pelo menos, a alguém para com quem se tem uma certa obrigação.

No primeiro século, as boas novas foram pregadas por todo o mundo romano e aceitas por milhares de pessoas. O apóstolo Paulo, que levou as boas novas a muitas nações, jamais atribuiu a propagação da mensagem à organização humana. Ao contrário, admitiu que ‘nem o que planta é alguma coisa, nem o que rega, mas Deus que o faz crescer.’17 Em tom similar, o primeiro presidente da Torre de Vigia, Russell, dissera que era pensamento carnal crer que uma organização humana visível fosse essencial “para realizar alguma coisa.”

Em contraste, o destaque dado à organização durante a presidência de Rutherford tornou-se quase obsessão. Em 1922, A Sentinela dizia:

 

A eficiência com que o testemunho deve ser dado depende necessaria-mente em grande parte dos esforços organizados feitos no campo.18

 

Isto ressoou seis décadas mais tarde na Sentinela de 1º de junho de 1986 (página 25), que fala da obra realizada pelas Testemunhas de Jeová em 1985:

 

Esta obra nunca poderia ser feita sem haver uma organização. . . Puderam fazer isso apenas porque estavam bem organizadas em umas 50.000 congregações, todas sob a direção visível de seu único Corpo Governante.

 

O poder do Espírito santo de Deus parece muito esquecido, substituído pela ‘organização eficiente’ (e os homens que a dirigem), sem a qual o êxito seria impossível. Os cristãos do primeiro século evidentemente não acharam ‘impossível’ dar testemunho por todo o império romano sem tais arranjos organizacionais. Em nenhum relato das Escrituras atribui-se à eficiência organizacional qualquer papel na disseminação da mensagem e na sua aceitação por milhares de pessoas. Conforme vimos nos capítulos 6 e 7 deste livro, o fator notável em todos os relatos é o grau espantoso de espontaneidade evidente, a informalidade manifesta e a ausência de qualquer tipo de atividade altamente programada ou intensamente supervisionada.

 

A Teocracia — governo de Deus do alto para baixo

 

Durante a década que se seguiu, Rutherford continuou a fortalecer a posição da Sociedade (e obviamente a dele próprio, como presidente). Em 1931 ele escolheu pessoalmente o nome “Testemunhas de Jeová para a organização.” Em 1932 ele aboliu os corpos de anciãos (então eleitos pelas congregações), declarando que o arranjo “não estava de acordo com os princípios do Grande Teocrata, que governava em seu santuário do alto para baixo.” Agora as congregações recomendariam um diretor de serviço, a ser “confirmado pelo  executivo ou gerente da Sociedade.”19

Daí, em 1938, as congregações de todo o mundo foram convidadas a entrar num arranjo autorizando a sede de Brooklyn a designar todos que viessem a servir em cargos de responsabilidade nas congregações. Com isto, tudo passou a ser aclamado como plenamente “Teocrático,” “governado por Deus.” A centralização da autoridade fora conseguida. Deus agora governava “do alto para baixo” — e, na parte de baixo, tudo passava através de Brooklyn. Aquilo que os primitivos religiosos do passado levaram dois séculos para conseguir, a organização Torre de Vigia conseguiu em apenas meio século.

Como nos primeiros séculos do cristianismo, certas condições inquietantes e a resultante ênfase na necessidade de “unidade” e “ordem” forneceram a justificativa para essa intensa centralização de autoridade e para a subordinação individual à mesma. Todos foram exortados, repetidamente, a submeter-se à “ordem Teocrática,” o que significava, de fato, aceitar o que viesse da sede mundial como se viesse de Deus. A decisão do presidente da Torre de Vigia de abolir os corpos de anciãos e instituir um “governo teocrático” foi descrita depois como o cumprimento da profecia de Daniel acerca da ‘limpeza do santuário’ após os 2.300 dias. Quanto aos novos ensinos e interpretações criados pela organização, dizia-se que eram “lampejos dos relâmpagos” procedentes do templo de Deus, conforme descritos no livro de Revelação.20  Chamados de “classe do santuário,” eles se apresentavam claramente como que ‘sentados no templo de Deus.’

Em vista de todos estes fatores, parece evidente que as características do “homem que é contra a lei” estavam emergindo nesta organização religiosa relativamente nova, tal como em outras religiões, grandes e pequenas.

 

Essencial para a vida

 

Os primeiros números da Sentinela reconheciam que os adeptos dessa revista não eram os únicos cristãos da terra, não estavam confinados numa organização humana de contornos definidos. A salvação humana não dependia de ser membro de uma organização, mas da fé. Em contraste, os últimos anos da presidência de Rutherford viram a ênfase cada vez maior à “organização” visível” e sua importância. O mundo inteiro estava dividido em dois lados, sob o controle de duas organizações principais, abrangentes. O livro Inimigos, publicado em 1939 (o primeiro que estudei pessoalmente) afirma (página 63):

 

Existem duas grandes organizações, a saber: a organização do Deus Todo-Poderoso, que é inteiramente justa, pura e verdadeira, e a organização do Diabo, o deus mímico, que é impura, iníqua e inteiramente falsa. O povo da terra está sujeito a uma ou a outra dessas organizações.

 

Não era tanto o conceito em si, mas era a aplicação desse conceito que exercia um efeito tão coercivo sobre todos os membros da congregação. Incentivava-se a atitude de que o único meio de estar sob orientação de Deus era submeter-se às instruções que vinham da organização visível (sediada em Brooklyn), pois tudo que estivesse fora dos limites dessa organização era da organização de Satanás. Era isso que as Testemunhas de Jeová sentiam, era o que eu sentia.

Os de fora da organização, apesar da evidência de fé, esperança e vida cristãs que dessem, eram condenados como resistentes à palavra do próprio Deus se não aceitassem as idéias publicadas pela organização sobre a “presença invisível” de Cristo em 1914 e outros ensinos e afirmações ligados a essa data. Por não aceitarem tais opiniões, foram criticados como insubordinados a Deus.21 Numa série de sete congressos das Testemunhas, de 1922 a 1928, aprovaram-se resoluções que se dizia serem cumprimento das ‘sete trombetas’ de Revelação capítulos 8 e 9. Estas continham repetidas condenações à Liga das Nações, ao “Grande Comércio,” aos líderes religiosos e coisas parecidas. Mas o que podemos chamar de “linha de fundo” de todas elas era a questão da aceitação das afirmações ligadas a data de 1914.22 Declarações no folheto Divisão do Povo, de 1933, são típicas da visão que se tinha da população de não-Testemunhas da terra:

 

No lugar secreto do Altíssimo têm sido reveladas aos que amam a Jeová certas grandes verdades, as quais se lhes ordena que proclamem às nações. (Mateus 10:27) Entre estas verdades reveladas estão: que Jeová é o verdadeiro Deus; que Cristo Jesus é seu Rei ungido, que é o legítimo governante da terra; que assumiu seu cargo em 1914 e sua primeira obra foi lançar Satanás dos céus; que em 1918 ele começou a ajuntar os fiéis em uma companhia compacta e a fazê-los saber que Satanás erigiu na terra uma poderosa organização, que consiste de religião, política e comércio; que dentro de um curto prazo será travada a batalha do Armagedom; que, sabendo que não há para ele mais que um curto prazo, Satanás agora põe maiores fardos sobre o povo; que a fim de vindicar Seu santo nome e salvar o povo, a batalha do Armagedom resultará na destruição completa da organização de Satanás, incluindo todas as nações da terra; que o povo deve agora ser avisado, e que tal aviso em testemunho será dado em meio a grande oposição, mas será dado mesmo assim; e que tal aviso não é uma ameaça, mas uma advertência solene, e os que a escutarem poderão acolhê-la ou rejeitá-la; é pegar ou largar.

                                ¾¾¾¾¾¾

Os que tomam o lado de Satanás e se opõem à verdade de Jeová morrerão; os que servem a Jeová viverão para sempre e obedecerão e honrarão seu santo nome.

 

Aceitar os ensinos, dos quais destacavam-se os relacionados com 1914, equivaleria logicamente a aceitar a organização que fala em nome de Deus, a organização Torre de Vigia sediada em Brooklyn, e a submissão à sua “ordem Teocrática.” Para avaliar esta realidade, deve-se ter em mente a visão do mundo das Testemunhas de Jeová, a saber, que havia apenas dois lados e que todas as pessoas da terra estavam divididas em duas organizações: a de Satanás e a de Deus. Havia apenas um meio de escapar à destruição, e este consistia em separar-se da organização de Satanás (contendo 99,99 % da população da terra) e alinhar-se com a organização de Deus (então composta de cerca de 100.000 Testemunhas de Jeová ou cerca de 0,006 % das pessoas). Era essa a única opção, “pegar ou largar,” e a advertência era que largá-la significaria a morte.

 

Embora escrito no ano seguinte à morte de Rutherford, um artigo intitulado “Requisitos Justos,” publicado na Sentinela (em inglês) de 1º de julho de 1943, páginas 204-206, ilustra a atitude de submissão total à organização que fora inculcada nas Testemunhas de Jeová durante a presidência dele. Mostra, também, como uma organização pode clara e ousadamente pedir às pessoas para pôr no mesmo nível o que ela diz e que o próprio Deus diz. Examine estas citações do artigo:

 

Toda organização requer instruções específicas para todos que nela servem. No passado o Senhor lançou suas “instruções de organização” para seus servos por meio de sua agência central ou canal. Cada um aceitou alegremente sua respectiva parte e fielmente a cumpriu.

Agora, diz o apóstolo, Jeová nos fala por meio de seu Filho. (Heb. 1:1, 2) O Filho retornou como Rei; veio ao seu templo. Ele designou seu “servo fiel e prudente,” que é seu porta-voz visível, e diz aos que têm o privilégio de representá-lo na terra: “Este evangelho do reino será pregado em todo o mundo num testemunho a todas as nações” (Mateus 24:14);

                                        ¾¾¾¾¾¾

Estas expressões da vontade de Deus por seu Rei e através de sua agência estabelecida constituem sua lei ou norma de ação para o “servo fiel e prudente” e para seus companheiros de boa vontade hoje, que residirão sobre a terra para sempre, no Novo Mundo. O Senhor leva adiante nossas instruções de organização e as torna mais práticas por dar-nos mais instruções mediante seu “servo fiel e prudente.” Ele diz: ‘Designemos o campo, o mundo, a pioneiros especiais, pioneiros regulares e companhias de testemunhas de Jeová, de modo ordeiro, suficiente para que todos, de modo cabal, dêem testemunho no mesmo, e coloquemos sobre cada um a responsabilidade de cuidar dos interesses do Novo Mundo em suas respectivas designações.’ Ele diz que o requisito para os pioneiros especiais será de 175 horas e 50 revisitas por mês, as quais devem evoluir para um número considerável de estudos; e para os pioneiros regulares, 150 horas e tantas revisitas e estudos quantos possam ser desenvolvidos durante esse tempo. E aos publicadores de companhia [congregação] ele diz: ‘Estabeleçamos uma quota de 60 horas e 12 revisitas, e pelo menos um estudo por semana para cada publicador.’ Estas diretrizes nos chegam do Senhor por meio de sua agência estabelecida, orientando-nos quanto ao que se requer de nós; e para os que realmente amam o Senhor e são dirigidos por seu conselho, isto é um requisito de serviço razoável. Esta declaração da vontade do Senhor deve pôr fim a toda controvérsia. É para seu próprio bem que se estabelecem estes requisitos, pois deste modo vocês serão habilitados a provar sua integridade e a magnificar o nome do Senhor.

Estas diretrizes do Senhor chegam a nós como indivíduos e como unidades coletivas chamadas “companhias.” Quase todos os que são consagrados ao Senhor reconhecem que uma companhia precisa de organização a fim de funcionar corretamente, mas nem todos estes irmãos apreciam o fato de que, como indivíduos, precisam de organização tão completa quanto a duma companhia para desincumbir-se de suas responsabilidades individuais. Para ilustrar: todos entendem que cada companhia deve ter uma designação definida de território no qual dar testemunho, mas nem todos apreciam que cada indivíduo dessa companhia tenha sua própria designação pessoal de território no qual testemunhar. Seria tolice um publicador concluir que pode servir ao Senhor de modo correto sem uma designação pessoal, tal como seria uma companhia decidir que pode funcionar de modo aceitável perante o Senhor sem uma designação de território. Uma companhia precisa ter uma designação, e nela trabalhar sistematicamente de casa em casa, fazer revisitas, dirigir estudos e ajudar as pessoas de boa vontade de modo geral. Devem levar a cabo todas as formas de trabalho com revistas nessa designação. Logicamente eles ficarão com sua própria cidade e todo o território adjacente de que possam cuidar. Seria o cúmulo da tolice que deixassem sua própria cidade e fossem a uma cidade a 20 milhas [mais de 30 km] de distância, já designada a outros, e tentassem sistematicamente testemunhar ali. Qualquer pessoa inteligente admitirá que isso seria não só tolice, mas infidelidade em massa ao Senhor. O mesmo princípio aplica-se ao publicador que se recusa a aceitar a responsabilidade de uma designação pessoal de território e ficar com a designação mais próxima possível de sua casa. Quanto mais longe de casa for a designação, menos tempo ele terá para se dedicar a ela e mais difícil será dar atenção apropriada aos interesses do território. Conseqüentemente, há certo grau de infidelidade ao Senhor em desperdiçar, desse modo, o tempo e a energia que a ele pertencem.

Chegou o tempo para cada um levar plenamente seu próprio fardo diante do Senhor. Com as provisões que o Senhor agora fez de suprir-nos com novos livros, folhetos de perguntas que contêm instruções completas para dirigir estudos, etc., não há absolutamente desculpa para ninguém, homem ou mulher, alegar que não é capaz de aceitar uma designação individual de território e assumir plena responsabilidade por ela. Os que realmente amam o Senhor e lutam pelo Novo Mundo não tentarão excusar-se por este ou aquele motivo, mas escutarão a Palavra do Senhor quando ele diz, “Que nós façamos assim e assim,” e terão sempre em mente que nós inclui o Senhor, que estará com vocês em todo empreendimento.— Mateus 18:20.

O Senhor, mediante seu “servo fiel e prudente” agora nos diz: “Cubramos nosso território quatro vezes em seis meses.” Isso se torna instrução da nossa organização e tem para nós a mesma força compulsiva da declaração de Deus quando disse ao Logos: “Façamos o homem à nossa imagem.” É nosso dever aceitar esta instrução adicional e obedecê-la. Mas alguém pode dizer: “As condições são diferentes. No caso do Logos, ele podia realizar o que Jeová lhe ordenou, mas cobrir nosso território quatro vezes em seis meses não é de modo algum razoável. Nunca o cobrimos mais de uma vez, ou, no máximo, duas vezes em seis meses. Isso simplesmente não pode ser feito.” Todos nós ouvimos este argumento antes. E se fosse verdadeiro isto pareceria muito ruim, e implicaria em que o Senhor está nos pedindo para fazer algo impossível. Os filhos de Israel caminharam ao redor de Jericó sete vezes no último dia.

O território que agora é coberto uma a duas vezes em seis meses pode ser facilmente coberto quatro a seis vezes no mesmo período, se todos levarem à sério suas responsabilidades do Reino. Isto não é teoria, mas fato concreto baseado em números obtidos de várias companhias durante os últimos seis meses.

                                          ¾¾¾¾¾¾

Fazer isto pode significar tirar tempo e esforço que agora são dedicados aos interesses do “velho mundo” e transferi-los para os interesses do Novo Mundo, que são os de Deus e permanecerão para sempre. As palavras do apóstolo Pedro são diretas neste respeito: “Vendo então que todas estas coisas serão dissolvidas, que sorte de pessoas deveis ser em toda santa conversação e piedade?” (2 Pedro 3:11) Antes de haver verdadeiro progresso no aumento de nossa atividade, devemos reconhecer, cada um, que essas chamadas à ação vêm do Senhor e aplicam-se pessoalmente a nós, e responder a elas de todo o coração.

O governo do Novo Mundo está com 29 anos. Conseqüentemente, deve- se trazer isto constantemente à atenção das pessoas, visitando-as em suas casas e falando-lhes sobre isso, fazendo revisitas e dirigindo estudos com elas, trabalhando em territórios comerciais e visitando-as em seus escritórios. Deve-se dar testemunho a elas nas ruas com nossas revistas, com os publicadores apresentando a mensagem do Novo Mundo. Não importa onde estejam, as pessoas devem ter sempre diante delas a evidência de que o Governo do Novo Mundo começou a funcionar.

 

Eu tinha apenas 21 anos quando saiu essa matéria. Assim mesmo, revendo-a agora, pergunto-me como foi que que eu e a vasta maioria das Testemunhas de Jeová pudemos ler afirmações tão ostensivamente arrogantes sem sentir repulsa ou ao menos motivação de pensar seriamente na atitude incutida em nós. Pelo menos uma pessoa o fez. O volume encadernado dos números de 1943 da Sentinela que hoje tenho, pertenceram outrora a um homem que começou a associar-se com a organização em 1910 e continuou nela por setenta anos até 1981. Quando procurava o artigo citado acima, achei uma folhinha de papel que ele tinha inserido no artigo. Esta é a fotocópia:

                                           [FOTOCÓPIA DA PÁGINA 93 DO ORIGINAL] 

TRADUÇÃO:

 Quotas de

  60 horas.

                                                                        A ORGANIZAÇÃO

    É DEUS

                                                                     SENT. 43-205 23

 

Todo o espírito do artigo desta Sentinela de 1943 reflete ponto de vista idêntico ao expresso séculos atrás nas Homilias Clementinas, já citadas, na afirmação “quem desobedecer a tuas ordens desobedece a Cristo, e quem desobedece a Cristo ofende a Deus.

É por isso que o artigo de A Sentinela já mencionado (no capítulo 2), escrito em 1946, quatro anos depois da morte do Juiz Rutherford, intitulado “Seja Deus Mostrado Verdadeiro,” foi tão revigorante. Representava uma mudança radical do pensamento e da ação quase militares, regimentais, a que eu me acostumara durante os anos da presidência de Rutherford.

Visto que as afirmações desse artigo de A Sentinela de 1946 e as feitas pelos representantes da Torre de Vigia no caso da Escócia em 1954 estão em claro conflito umas com as outras, qual delas representa a verdadeira posição da organização hoje?

A evidência, lamentavelmente, mostra que a animadora posição moderada tomada pela Sentinela de 1946 com relação à Biblia e ao direito e responsabilidade de cada pessoa lê-la, e mediante este estudo chegar à própria conclusão quanto aos ensinos dela, sem os ditames de uma organização que exerça “poder de ensino” ou “cargo de ensino” logo começou a ser restringida. E não só restringida, mas eventualmente rejeitada, e combatida com argumentos completamente opostos. Por quê?

Creio que após a morte do Juiz Rutherford tanto Nathan Knorr como Fred Franz desejaram de início afastar-se do dogmatismo estridente dos escritos dele. Não havia, no início da nova presidência de Nathan Knorr, as situações específicas de crise interna, grande oposição ou ameaças de deserção que Rutherford enfrentou. A estas, como mostram as publicações da Sociedade, ele reagiu com mão de ferro e língua afiada. Lyman Swingle, membro do Corpo Governante, referindo-se, um dia, à mudança efetuada pela reorganização do Corpo Governante em 1975-76, me disse: “Se você acha que isso foi uma grande mudança, devia ter estado aqui depois que Rutherford morreu e Knorr assumiu.” A presidência de Knorr assinalou notável melhoria em relação à virtual tirania do controle de Rutherford.

Qualquer que fosse a intenção inicial de Knorr e Franz, porém, com o tempo o antigo padrão passou mais uma vez a impor-se. A tendência de grande ênfase à autoridade centralizada tornou-se cada vez mais pronunciada. A estrutura de autoridade existente era, de fato, a que se construíra durante a presidência de Rutherford. Era um legado dele. Para permanecer intacto e firme esse legado tinha de ser defendido e a autoridade centralizada tinha de ser ressaltada, do contrário poderia perder o controle sobre os membros individuais, seu pensamento, sua capacidade de tomar decisões, o uso do seu tempo, suas consciências.

Note que o julgamento de 1954 na Escócia, o “caso Walsh,” foi sobre se Douglas Walsh, superintendente presidente duma congregação de Testemunhas de Jeová, preenchia os requisitos de ministro ordenado segundo a lei britânica de recrutamento. Para conseguir tal objetivo, os representantes da Torre de Vigia fizeram exatamente o oposto do que afirmavam as edições anteriores de A Sentinela. Essas revistas diziam que as Testemunhas de Jeová eram muito diferentes das religiões instituídas da cristandade, que tinham suas estruturas de autoridade e seus credos oficiais. Agora os representantes da Torre de Vigia tentavam mostrar que as Testemunhas de Jeová, como religião, eram basicamente muito semelhantes, que de fato tinham um credo que todos têm de acatar, e portanto, os superintendentes presidentes das Testemunhas de Jeová tinham direito à mesma classificação que os clérigos das igrejas estabelecidas.

Essa parece ser a principal razão de os porta-vozes da Torre de Vigia, Franz, Covington e Suiter, terem sido tão taxativos, até inflexíveis, ao afirmarem que era obrigação de todos os membros da organização aceitar e sujeitar-se a TODOS os ensinos dela, sob pena de expulsão por desobediência. Tinham de fazê-lo mesmo que, com razão, acreditassem que alguns desses ensinos eram contrários às Escrituras. Para obter os benefícios legais almejados, parece que precisavam, ou achavam que precisavam ¾ estabelecer esse tipo de credo obrigatório sobre os membros, a fim de Walsh poder ser classificado como ministro “ordenado” de uma religião estabelecida, reconhecida, autêntica.24

Como pode recordar, quando perguntaram a Fred Franz acerca da autoridade das declarações doutrinárias da Sociedade Torre de Vigia, “É a aceitação delas questão de opção ou é obrigatória para todos os que são e desejam continuar a ser membros da Sociedade?,” a resposta dele foi: “É obrigatória.” Quando lhe perguntaram acerca do ensino errôneo sobre 1874, se “tornou-se obrigação das Testemunhas de Jeová aceitar este cálculo errado?,” o vice-presidente respondeu: “Sim.” Quando lhe fizeram a colocação, “Uma Testemunha não tem alternativa senão aceitar como compulsórias e obedecer as instruções publicadas em A Sentinela ou no Informante ou na Despertai!?” sua resposta foi: “Ele tem de aceitá-las.” Quando lhe perguntaram se, à parte das informações contidas nas publicações da sociedade, um homem seria capaz de interpretar as Escrituras corretamente, ele respondeu: “Não.”                    

Quando perguntaram a Hayden Covington se a unidade era imposta mesmo que “baseada na aceitação obrigatória de falsas profecias” ele disse: “Admite-se que isso é verdade.” Quando lhe perguntaram se a recusa de alguém a aceitar tais coisas o levaria à desassociação, e portanto a uma situação em que “mereceria a morte,” ele reagiu, “Digo sim, sem hesitar.”

Grant Suiter, do mesmo modo, ao lhe perguntarem se alguém pode ter um entendimento correto das Escrituras sem as publicações das Testemunhas de Jeová, respondeu: “Não.” Com relação aos ensinos errôneos sobre 1874 e 1925, quando lhe perguntaram “foi a aceitação, a aceitação absoluta como Verdade, imposta a todas as Testemunhas de Jeová da época?,” ele disse: “Isso mesmo.”

Na realidade, isto deturpava muito os fatos. Nem no tempo de Russell nem no de Rutherford (durante cujas gestões foram ensinadas as predições falsas específicas) existira a prática de desassociar pessoas que conscienciosamente objetassem a certos ensinos. No tempo de Russell havia críticas sutis ou insinuações de falta de fé aos que expressavam dúvida ou discordância; no tempo de Rutherford estes podiam ser removidos do cargo e até repreendidos verbalmente, mas raramente se aplicava a excomunhão como instrumento para impor a unidade. Os três representantes da Sociedade evidentemente sentiram-se justificados, todavia, em dizer o que disseram a fim de atingir o objetivo que buscavam. Disfarçaram o passado de modo a adaptá-lo à posição da organização então em vigor, na qual a aceitação dos ensinos da organização tinha se tornado compulsória para quem quisesse evitar a expulsão.25

Alguém pode pensar que as declarações deles foram proferidas nestes termos abolutos e inflexíveis só por causa das circunstâncias, sob a pressão momentânea do interrogatório no tribunal, e que, portanto, não representavam o verdadeiro ponto de vista e prática da organização, especialmente a posição tão eloqüentemente apresentada em 1946. Seria bom pensar assim se ao menos as evidências permitissem. Mas não é o caso. Considere o que disseram números subseqüentes da revista.

 

Um padrão secular prevalece até hoje

 

Nos anos 40 as Testemunhas de Jeová haviam se unido firmemente diante da perseguição: violência das turbas em algumas regiões,  questão da saudação à bandeira, proscrição totalitária e perseguição na Alemanha nazista e outros países beligerantes e a tensão global da Segunda Guerra Mundial. Nos anos 50 tudo isto passara. As Testemunhas que, como adolescentes e crianças, tinham ouvido o Juiz Ruherford dizer no congresso de Saint Louis em 1941 que ‘em breve os príncipes dos tempos bíblicos estariam com eles,’ e que adiassem o casamento até essa época, já tinham passado dos 20 anos.26 A era pós-guerra de crescente prosperidade e ampla tolerância avançava. As terríveis condições que tinham estimulado as empolgantes especulações sobre a iminência do Armagedom ficaram em segundo plano. Como muitas outras religiões que aplicam profecias a certas datas e períodos de tempo modernos, toda a história da Torre de Vigia mostrava que se apoiava nas condições desfavoráveis do mundo como confirmação de suas afirmações. As más notícias do mundo servem como meio de estimular as expectativas entre os adeptos, incutindo-lhes senso de urgência. O período de paz que se seguiu à Segunda Guerra Mundial não contribuiu para isto tanto quanto as dramáticas circunstâncias dos anos de guerra.

Em meio ao clima de certo desvanecimento entre as Testemunhas de Jeová, A Sentinela passou então a lidar com a tendência que alguns tinham de questionar a certeza de seus ensinos e declarações. Ainda em 1946, A Sentinela havia rejeitado francamente a idéia de uma “Mãe Igreja” autorizada por Deus a ensinar seus “filhos.” A idéia de uma organização visível encarregada do “magisterium” ou autoridade de ensinar foi também rejeitada. E então, apenas seis anos depois, as seguintes afirmações apareceram em A Sentinela de 1º de fevereiro de 1952 (em inglês), páginas 79 e 80:

                                   [SUBSTITUIR PELA REVISTA EM PORTUGUÊS]

 

11 Temos de demonstrar nosso entendimento nestes assuntos, apreciando nossa relação à organização teocrática visível e lembrando-nos da sorte dos semelhantes a Corá e Acã, Saul e Uzias e dos demais que se esqueceram da ordem teocrática. Fomos nós designados individualmente a produzir o sustento para a mesa espiritual? Não? Por isso não tratemos de assumir os deveres do escravo. Devemos comer, digerir e assimilar o que se coloca diante de nós, sem rejeitar certas partes do alimento porque talvez não convenha ao capricho do nosso gosto mental. As verdades que havemos de publicar são aquelas que a organização do escravo discreto fornece, não algumas opiniões pessoais contrárias ao que o escravo providenciou como sendo sustento conveniente. Jeová e Cristo dirigem e corrigem o escravo conforme a necessidade, não nós como indivíduos. Se não entendemos um ponto no princípio, devemos tratar de apreendê-lo, em vez de nos opor a ele, rejeitando-o e assumindo a posição presunçosa de que provavelmente tenhamos mais razão do que o escravo discreto. Devemos prosseguir mansamente com a organização teocrática do Senhor e aguardando esclarecimento adicional, ao invés de levantar objeções quando primeiro se menciona um pensamento que não nos apetece e começar a sofismar e resmungar nossas críticas e opiniões como se fossem de mais valor do que a provisão de alimento espiritual pelo escravo. As pessoas teocráticas apreciarão a organização visível do Senhor e não serão tão insensatas que oporão ao canal de Jeová seu próprio arrazoamento humano e sentimentos pessoais.

12 Ora, alguns poderão perguntar: Devemos aceitar como provindo do Senhor e verdadeiro o alimento provido através do escravo discreto, ou devemos sustar a aceitação até que nós mesmos o ponhamos à prova? Se obtivemos nosso atual entendimento da Bíblia por nos alimentarmos na mesa posta pelo escravo, se foi por este meio que nos libertamos das doutrinas falsas e fomos edificados na adoração pura e imaculada de Deus e recebemos a esperança de um novo mundo, devemos ter alguma confiança nas provisões do escravo. Depois de termos sido nutridos até a presente força e maturidade espirituais, tornamo-nos, de repente, mais espertos do que nosso provedor anterior e abandonamos a orientação esclarecedora da organização que nos serviu de mãe? “Não abandones a lei de tua mãe.” (Pro. 6:20-23). E se o Pai Celestial não daria uma pedra, serpente ou escorpião a um filho que lhe pedisse pão, ou peixe ou um ovo, vamos tomar em nossas mãos o alimento espiritual que ele provê mediante o escravo como se pudéssemos ser feridos por uma pedra, mordidos por uma cobra ou ferroados por um escorpião? (Mat. 7:7-11; Lucas 11:9-13, NM) Ficaremos com dúvidas e suspeitas por causa de cada nova provisão? “Quem duvida é semelhante a uma onda do mar, impelida pelo vento e agitada. De fato, não suponha tal homem que há de receber algo de Jeová.” (Tia. 1:6, 7, NM) Até os bereanos primeiro receberam a pregação de Paulo “com o maior anelo mental,” e então passaram a examinar “cuidadosamente as Escrituras, cada dia, quanto a se estas coisas eram assim.” (Atos 17:11, NM) Este foi o primeiro contato real que os bereanos tiveram com a pregação de Paulo, e assim mesmo a receberam prontamente e então estudaram a base bíblica por eles próprios. Muito mais prontamente podemos receber com segurança as provisões do escravo, já que, diferente dos bereanos, temos muito mais experiência passada com as preciosas provisões do escravo. Após recebermos estes suprimentos de alimento, provamos o apoio bíblico por nós mesmos por tomar a mensagem como nossa, num espírito de mansidão e confiança e não de hostilidade.

 

Para os leitores da Sentinela, a organização é de fato descrita como algo acima e além de correção por parte de outra fonte que não seja Deus e Cristo. Se alguém tenta apontar-lhe os erros, isso mostra que se acha “mais esperto” que a “mãe” organização, sendo assim falto de humildade. Incrível como pareça, considerando o longo histórico de especulações, predições fracassadas, marcações erradas de datas e inúmeras mudanças de interpretação das Escrituras, o artigo diz aos leitores que eles podem receber os ensinos da mãe organização muito mais prontamentedo que os bereanos podiam receber o que o apóstolo Paulo dizia, porque “temos muita experiência passada com as preciosas provisões do escravo [a organização]”! Na realidade, quão maior a experiência passada com as publicações da organização, maior razão para ter extrema cautela, como mostra claramente a história de erros cometidos pela organização.27

O processo de enfatizar a autoridade humana e fortalecer o controle humano mediante a autoridade centralizada, que Rutherford tão habilmente desenvolveu por quase três décadas, foi prosseguido com habilidade ainda maior por seus sucessores. Seu linguajar progrediu além das expressões ásperas e até francamente ditatoriais, típicas da presidência de Rutherford. Adotou argumentação mais sofisticada e uma fala mais suave, mais atraente. Todavia, atingia o mesmo grau de intimidação intelectual e buscava impor a mesma espécie de complexo de culpa a quem prontamente não acatasse todos os ensinos, diretrizes ou programas que procediam da sede central em Brooklyn.

O efeito final me recorda o que o historiador Paul Johnson escreve como resumo do conceito de igreja defendido por Cipriano no terceiro século. Ele afirma:

 

Seu raciocínio [de Cipriano] era o seguinte. A Igreja era uma instituição divina; a noiva de Cristo; Mãe Igreja, a mediadora de toda salvação. Era una, indivisa e católica [universal]. Somente em associação os católicos poderiam ter vida. Fora de sua camaradagem sagrada, não havia nada além de erro e trevas. Os sacramentos, a ordenação episcopal, até a própria Bíblia, perdiam seu significado se empregados fora da verdadeira Igreja. A Igreja era também humana, comunidade visível, encontrada apenas sob uma forma organizada. O indivíduo não podia ser salvo mediante o contato direto com Deus. A hierarquia cuidadosamente graduada, sem a qual a Igreja organizada não poderia existir, foi estabelecida por Cristo e os apóstolos . . . a única instrução inequívoca nelas [as Escrituras] contidas era permanecer fiel à Igreja e obedecer às suas regras. Com Cipriano, pois, a liberdade pregada por Paulo e baseada no poder da verdade cristã foi retirada dos membros comuns da Igreja; somente os bispos, por meio de quem o Espírito Santo ainda operava e a quem se delegava coletivamente a representação da totalidade dos membros da Igreja, a mantiveram.28

 

Releia este parágrafo substituindo a palavra “igreja” por “organização.” Então pergunte-se se ele não descreve com exatidão o conceito inculcado entre as Testemunhas de Jeová por meio da repetição constante conforme demonstra a evidência a seguir.

 

Honrando a mãe organização

 

Na edição de 1º de maio de 1957 de A Sentinela (em inglês), página 274, faz-se a afirmação de que a “verdadeira mãe dos cristãos” não é uma organização terrestre, mas celestial, a “organização invisível e universal de Deus.” Todavia, diz-se que a ‘mãe’ espiritual tem um “canal visível de comunicação” para todos os membros da congregação e que esse canal é a organização terrestre. Em termos claros, isso significa que quando a “mãe” fala é através da “organização Teocrática visível” e assim, se alguém deseja escutar a “mãe celestial” deve fazê-lo por escutar à organização visível da Sociedade Torre de Vigia. O resultado, então, é que aquilo que se diz da ‘mãe invisível, espiritual, celestial,’ torna-se aplicável ao suposto canal terrestre dela, sem cuja direção os membros não podem entender a Bíblia. Após citar Provérbios 6:20, 23, o artigo declara:

 

3 Considere isso por um momento. Mencionam-se duas coisas: o mandamento do pai e o ensino ou lei da mãe. Daí, o provérbio explica que o mandamento do pai é uma lâmpada ardente, mas que há luz também provindo do ensino ou lei da mãe. O mundo está cheio de Bíblias, que contêm os mandamentos de Deus. Por que, então, as pessoas não sabem que caminho seguir? É porque não têm o ensino ou lei da mãe, que é luz. Jeová Deus proveu sua santa Palavra escrita para toda a humanidade e ela contém toda a informação necessária para que os homens tomem o rumo que conduz à vida. Mas Deus não determinou que essa Palavra falasse de modo independente ou fizesse brilhar as verdades vivificantes por si própria. Sua Palavra diz: “A luz brilhou para o justo.” (Sal. 97:11) É por meio de sua organização que Deus provê esta luz que o provérbio diz ser o ensino ou lei da mãe. Se havemos de andar na luz da verdade devemos reconhecer não apenas a Jeová Deus como nosso Pai, mas a sua organização como nossa mãe.

 4 Alguns que se chamam cristãos e que afirmam ter a Deus como Pai se jactam de que andam com Deus apenas, que ele pessoalmente lhes dirige os passos. Tais pessoas não só abandonam o ensino ou lei da mãe, mas literalmente jogam nas ruas a mulher de Deus. A luz da verdade de Deus não é para eles. Na nação de Israel Jeová tornou obrigatória a obediência aos pais. “Honra teu pai e tua mãe”, foi o quinto dos Dez Mandamentos. (Ex. 20:2-17; De. 5:16, NM) A recompensa pela obediência era uma vida longa; pela desobediência, a morte. “Caso um homem tenha um filho obstinado e rebelde, que não escuta a voz de seu pai nem a voz de sua mãe, e eles o tenham corrigido, porém, ele não os queira escutar, então . . . todos os homens da sua cidade têm de atirar nele pedras e ele tem de morrer.” (De. 21:18-21, NM) Exigia-se tal honra e obediência como devida não só aos pais carnais, mas também aos homens de mais idade com influência em Israel. Deixar de render tal respeito apropriado por Eliseu, profeta de Jeová, trouxe sobre um bando de delinqüentes juvenis uma justa sentença de execução veloz. (2 Rs. 2:24) Hoje, também, Jeová requer e exige de seus filhos, obediência, honra e respeito. Deve-se render estes não apenas ao próprio Deus vivente, mas também à sua organização-esposa.

 

Esta matéria está repleta de asserções. Apresenta um quadro  totalmente alheio ao que as Escrituras Cristãs revelam sobre a verdadeira relação dos crentes dentro da congregação cristã. Essas Escrituras mostram que homens podem ajudar outros a crescer em conhecimento e entendimento, mas de modo algum apresentam homens, ou uma corporação de homens, como essenciais a tal conhecimento e entendimento. Isto seria a negação do ensino de Jesus Cristo de que ele e apenas ele ocupa a posição de Instrutor nesse sentido essencial.29 A posição de A Sentinela, em vez de representar as Escrituras, reflete mais a linguagem de Cipriano no terceiro século, que escreveu, deste modo, sobre a “mãe Igreja”:

 

. . . de seu ventre nós nascemos, com seu leite nos nutrimos, por seu espírito somos animados . . . Não mais pode ter a Deus como Pai aquele que não tem a Igreja como mãe.30 

 

Substitua, de novo, a palavra “Igreja” pela palavra “organização” e a linguagem de toda a argumentação torna-se idêntica à encontrada na revista A Sentinela há pouco citada. Nas mentes dos membros, a distinção publicada entre a ‘mãe celestial’ e sua ‘filha terrestre’ passa a ser irrelevante, tornando-se uma distinção inútil, pois a voz da mãe só é ouvida por meio do canal terrestre. Embora se diga que não é assim, e que a voz da ‘mãe celestial’ é também ouvida através das Escrituras, os membros são claramente informados de que só podem entender essas Escrituras por meio da organização terrestre. Em virtude de tais pretensões, a organização visível assume uma espécie de co-paternidade com Deus, como a agência terrestre mediante a qual o Pai transmite todas as suas instruções a seus filhos da humanidade.

Pode-se avaliar o efeito rebaixador que este conceito pode ter sobre o papel de Jesus Cristo e do Espírito santo na mente dos que aceitam estas afirmações, e este é o aspecto mais sério da questão. Quando a “mãe” fala com o apoio do Pai, onde fica o Filho e quão necessária é a sua orientação? As referências a Cristo Jesus e ao Espírito santo na explicação desta Sentinela já citada só se destacam pela completa ausência. Hoje, apesar das afirmações em contrário, na mente e na conversa da maioria das Testemunhas a tendência comum é pensar e falar em termos de “Jeová e sua organização,” com Cristo Jesus recebendo apenas menção subalterna. Mesmo essa menção raramente é feita ao espírito santo. Quem achar que não é assim deveria tomar tempo para escutar a si próprio e aos outros em suas conversas.

A “verdade bíblica” e os “ensinos da organização” se confundem como essencialmente equivalentes, uma coisa só, na mente da maioria das Testemunhas, e o contínuo martelar da superioridade e autoridade da organização é que produz em seus pensamentos essa mistura mental. Geralmente esforçam-se em revestir as declarações autoritárias com palavras que até certo ponto disfarçam esta realidade. Ocasionalmente, porém, os redatores da Torre de Vigia, por meio de um termo simples típico da época de Rutherford, expressam inconscientemente o real panorama criado. Em 1959, por exemplo, o livro “Qualificados Para Ser Ministros” (páginas 143, 144) afirmava:

                              [SCAN DO LIVRO “QUALIFICADOS”, PÁGINAS 143, 144]

 

5 O primeiro essencial para o estudo é a correta condição da mente e do coração, apreciando que Jeová dá entendimento so-mente aos mansos, e não aos teimosos. Se tivermos amor a Jeová, e à organização de seu povo, não teremos suspeitas, mas como diz a Bíblia, ‘creremos em todas as coisas’, todas as coisas que A Sentinela esclarece, uma vez que tem sido fiel em nos dar conhecimento dos propósitos de Deus e em nos guiar no caminho da paz, da segurança e da verdade, desde seu início até o dia atual.

 

Nos primeiros séculos, as interpretações e decisões chegavam ao povo vindas “da Igreja.” Vinham, de fato, dos homens que dirigiam a Igreja naquela época específica, quer fossem os papas ou outros teólogos. Mas com a ênfase dada “à Igreja,” mais que aos homens envolvidos, a sujeição à autoridade do dogma tornava-se mais aceitável. O mesmo se dá com o uso do termo “organização.” Na época de Rutherford, o fato de seus escritos levarem ostensivamente seu nome, bloqueavam até certo ponto o efeito hoje obtido por meio de literatura e artigos cuja autoria fica, por norma, anônima. O autor humano é agora encoberto pelo manto da organização, e os leitores consideram que aquilo que lêem veio “da organização.” Significa, na realidade, que veio “dos homens que no momento ocupam  posições de autoridade na organização.” As Testemunhas são treinadas para não pensar assim e para sentir-se culpadas se o fizerem. E foi exatamente deste modo que as pessoas do segundo e do terceiro séculos foram treinadas para pensar, de modo a conseguir a submissão quase total à “Igreja,” a autoridade organizacional controladora.

Assim como o termo “Igreja” ou ekklesia veio a ter duplo sentido, ora referindo-se à comunidade dos crentes, ora à autoridade religiosa que exercia controle sobre estes, também a palavra “organização” é usada de dois modos pela Torre de Vigia.31 Pode aplicar-se a todos que são Testemunhas no mundo inteiro, a comunidade das Testemunhas. Ou pode referir-se aos que formam a estrutura de autoridade que dirige e controla essa comunidade. Geralmente não é difícil dizer a qual delas o termo se aplica. Se há exortações a confiar, depositar , ser leal, escutar e mostrar submissão em relação “à organização,” se aplica sempre no segundo sentido. Esta idéia é que prevalece na mente das Testemunhas. Na afirmação “Jeová dirige seu povo mediante sua organização,” se “organização” fosse usada no primeiro sentido significaria “Jeová dirige seu povo mediante seu povo,” pois “organização” estaria aí se referindo à inteira comunidade das Testemunhas. Tais afirmações ocorrem regularmente nas publicações da Torre de Vigia e não criam problema simplesmente porque, na mente das Testemunhas, o termo “organização” relaciona-se quase automaticamente à estrutura de autoridade sediada em Brooklyn. Tem assim, o mesmo significado que tinha a palavra “Igreja” no período pós-apostólico.

Assim como naquela época incutia-se nos indivíduos que eles dependiam “da Igreja” para compreender as Escrituras, incute-se nas Testemunhas que elas não podem individualmente compreender as Escrituras sem a organização. Aprendem que ela é “a única para a qual a Palavra Sagrada de Deus, a Bíblia, não é um livro lacrado.” É “a única organização na terra que compreende as ‘coisas profundas de Deus’!”32 A dependência e a incapacidade individual das Testemunhas foram claramente expostas na Sentinela de 1º de junho de 1968, que afirmava que a Bíblia era o livro da organização (páginas 327, 330):

            [FOTOCÓPIA DE A SENTINELA DE 1/6/68, PÁGINAS 327, 330]

 

  9 À medida que o cânon dos livros da Palavra de Deus se expandiu e as Escrituras Gregas Cristãs foram adicionadas para terminar a Bíblia, cada livro foi escrito diretamente à congregação cristã ou a certo membro da congregação cristã em benefício desta. Assim, a Bíblia é um livro de organização e pertence à congregação cristã como organização, não a indivíduos, não importa quão sinceramente creiam poder interpretar a Bíblia. Por esta razão, a Bíblia não pode ser devidamente entendida sem se ter presente a organização visível de Jeová.

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Depois de limpar aqueles que pertenciam a esta casa e que estavam vivos na terra, Jeová derramou seu espírito sobre eles e lhes designou a responsabilidade de servirem como seu único canal visível, mediante o qual apenas deveriam vir as instruções espirituais. Aqueles que reconhecem a organização teocrática visível de Jeová, por conseguinte, têm de reconhecer e aceitar esta designação do “escravo fiel e discreto” e submeter-se a ela.33

 

Compare estas afirmações com o já citado artigo de 1946 e sua negação categórica da pretensão das hierarquias quanto a terem a ‘propriedade’ espiritual da Bíblia. Não poderia haver mudança mais completa de posição que esta adoção em bloco das mesmas pretensões da hierarquia antes condenadas. As pretensões da “Mãe Igreja” do catolicismo foram então igualadas pelas da “mãe organização” da Torre de Vigia.

Como disse o historiador já citado, a única instrução inequívoca que o líder eclesiástico Cipriano apresentou foi “permanecer fiel à Igreja e obedecer às suas regras.”34 Esta era a regra das regras para quem quisesse ficar seguro e ter a certeza de estar com a a aprovação de Deus. Cipriano e outros dos primitivos “Pais da Igreja” advertiram que rejeitar as instruções do bispo (superintendente presidente) equivalia a rejeitar a Cristo e a Deus. Inácio, por exemplo, em sua “Epístola aos Tralianos,” capítulo VII, dissera:

 

Pois o que é o bispo senão aquele que, mais que todos os outros, possui todo o poder e a autoridade, até onde é possível a um homem possuí-los, aquele que segundo sua capacidade foi constituído em imitador do Cristo de Deus . . . Aquele, portanto, que não presta obediência a tal homem, deve ser  alguém absolutamente sem Deus, homem ímpio, que despreza a Cristo e menospreza suas designações.

 

Embora suavizando o efeito por meio do uso de perguntas, A Sentinela de 15 de agosto de 1976 (páginas 507, 508) apresenta o mesmo ponto de vista distorcido com respeito aos que não acolhem as orientações provenientes da organização:

                         [SCAN DA SENT. DE 15 DE AGOSTO DE 1976, PP.507, 508]

 

19 Mas, não queremos aceitar a benignidade imerecida de Deus e desacertar o propósito ou motivo de termos sido introduzidos na organização limpa de Deus. (2 Cor. 6:1) Não devemos ser indiferentes. Não é sábio presumir as coisas. Não podemos dar-nos ao luxo de ficar estacionários. Temos de tomar a sério o que a sua Palavra diz e o que a sua organização nos revela. Conforme se fornece nova informação, temos de tomá-la a peito e sinceramente esforçar-nos a aplicá-la na nossa vida. Estamos na organização limpa de Deus, a fim de dar honra e louvor a Ele. Se falharmos nisso, desacertaremos o propósito de nos tornarmos limpos e “santos”. Na realidade, poderíamos então esperar as bênçãos e o apoio de Deus?

20 O modo de Deus governar é por meio do amor. (1 João 4:16) Ele quer que façamos as coisas porque são corretas. Em algum tempo futuro, talvez se nos imponha uma prova quanto a acatarmos certa informação que Deus traz a nossa atenção. Talvez atinja algo que prezamos muito. O que faremos? Hesitaremos em aplicar o conselho, talvez pensando no que nós gostaríamos de fazer a respeito? Se este for o caso, não estaremos realmente perguntando a nós mesmos: ‘Será que nós queremos mesmo o governo de Deus?’ Não indicaria o não acatarmos a orientação de Deus, por meio de sua organização, que na realidade rejeitamos o governo divino?

20 O modo de Deus governar é por meio do amor. (1 João 4:16) Ele quer que façamos as coisas porque são corretas. Em algum tempo futuro, talvez se nos imponha uma prova quanto a acatarmos certa informação que Deus traz a nossa atenção. Talvez atinja algo que prezamos muito. O que faremos? Hesitaremos em aplicar o conselho, talvez pensando no que nós gostaríamos de fazer a respeito? Se este for o caso, não estaremos realmente perguntando a nós mesmos: ‘Será que nós queremos mesmo o governo de Deus?’ Não indicaria o não acatarmos a orientação de Deus, por meio de sua organização, que na realidade rejeitamos o governo divino?

 

Não submeter-se à orientação da organização terrestre é igual a “rejeitar o governo divino.” É realmente assustador que homens façam tais comparações ou analogias. Mais assustador ainda é que o façam sem sentir que dizem algo impróprio, mas como se fosse até elogiável. Por afirmarem ser a fonte ou canal exclusivo de comunicação vindo do centro de comando, os que exercem autoridade na organização tornam-se, para todos os efeitos, o centro de comando. O perigo sério e implícito resultante de transferir-se tal submissão do tipo militar para líderes humanos religiosos falíveis, uma vez mais, parece nunca vir à mente do autor deste raciocínio dedutivo de A Sentinela.

 

A autoridade de um concílio religioso supremo

 

Nos primeiros séculos o controle de uma só congregação, ou talvez da área circunvizinha de uma cidade importante, foi implantado por meio da criação de um cargo, cuja autoridade cabia a um só bispo ou superintendente presidente. Foi por meio dos concílios religiosos que um corpo regente central terminou obtendo o poder internacional.

Até os anos 70, A Sentinela não se referia com freqüência a um “corpo governante.” A partir de então, porém deu-se forte ênfase à posição e autoridade desse grupo de homens. Nos primeiros séculos os líderes da Igreja começaram a fazer os cristãos encarar os corpos de anciãos como se fossem “o corpo dos apóstolos.” Esse mesmo conceito foi incutido com respeito aos concílios que mais tarde foram organizados. Embora afirme rejeitar o conceito da “sucessão apostólica” (como na Igreja Católica, onde os bispos são tidos como “sucessores dos apóstolos”), a Torre de Vigia encoraja uma crença similar, apresentando o Corpo Governante como equivalente hodierno do conselho dos apóstolos e anciãos de Jerusalém.

Com respeito aos que estão em posições de autoridade nos escalões subordinados, o Corpo Governante se põe essencialmente na mesma situação do apóstolo Paulo em relação a Timóteo, Tito ou os anciãos e demais membros das congregações. Já vimos (na página __) a incrível afirmação de que as Testemunhas podem hoje, com base na experiência, acatar o que vem do “escravo fiel e discreto” e seu Corpo Governante com prontidão e confiança maiores que as dos bereanos em acatar o que ouviam do apóstolo Paulo. Há, na verdade, uma apropriação, a usurpação de uma autoridade que não é simplesmente igual, mas em certos aspectos até superior à dos apóstolos. A “cadeia de comando” e comunicação de Deus para baixo é ilustrada deste modo em A Sentinela de 1° de junho de 1972 (página 333):

                        [GRÁFICO DA SENTINELA DE 1° DE JUNHO DE 1972, PÁGINA 333]

XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX

 

Na realidade, a verdadeira estrutura de autoridade segue o arranjo de escalões superiores e subordinados delineado aqui:

 

      CORPO GOVERNANTE

                                               |

                     COMISSÕES DE FILIAL

                                                |

     SUPERINTENDENTES DE DISTRITO

                                                |

           SUPERINTENDENTES DE CIRCUITO

                                                |

                                     ANCIÃOS

                                                |

          SERVOS MINISTERIAIS, PIONEIROS E PUBLICADORES DE CONGREGAÇÃO

 

Como eventualmente ocorreu nos primeiros séculos, um concílio religioso assumiu caráter permanente, de controle constante, internacional. A Sentinela de 15 de maio de 1986 trouxe um artigo com a pergunta: “São os Concílios Religiosos Aprovados por Deus?” Na página 24, ele definia um “concílio religioso” como:

 

. . . assembléia eclesiástica representativa com autoridade deliberativa e muitas vezes legislativa em questões de fé, moral e disciplina eclesiástica”

 

O autor passa a argumentar que Deus não aprova tais concílios, e evidentemente não percebeu que a definição citada descreve com exatidão o Corpo Governante das Testemunhas de Jeová. Suas reuniões têm exatamente o propósito de deliberar e, muitas vezes, de legislar em “questões de fé, moral e disciplina eclesiástica.” É isso o que nós fazíamos praticamente cada semana durante os nove anos em que fui membro desse Corpo.35

Falando do papel do imperador Constantino nos primeiros concílios, este artigo de A Sentinela, na página 25, cita o historiador H. G. Wells dizendo:

 

A idéia de extinguir toda controvérsia e divisão, de extinguir todo pensamento, com a imposição de um credo dogmático a todos os crentes, é a idéia do homem de uma só mão que sente que, para poder trabalhar, precisa de estar livre de oposição e crítica . . . Dele foi que a igreja adquiriu a predisposição para se fazer autoritária e indiscutível, para desenvolver uma organização centralizada . . .

Acusações de heresia revelaram-se uma forma cruel de eliminar os oponentes que se atrevessem a desafiar os concílios eclesiásticos da cristandade. Qualquer pessoa que expressasse opiniões divergentes ou mesmo tentasse apresentar provas bíblicas que refutassem os dogmas e cânones (leis da igreja) dos concílios era estigmatizada de herege.

 

O autor, mais uma vez, evidentemente não percebe que a descrição das predisposições de Constantino era a descrição exata das predisposições do segundo presidente da Torre de Vigia, J. F. Rutherford, em cujo mandato também ocorreu a firme centralização da autoridade. No livro patrocinado pela Sociedade, Faith on the March (A Fé em Marcha), de A. H. MacMillan, por muito tempo representante da sede, o autor fala de Rutherford (página 72):

 

Ele jamais tolerava algo que fosse contrário ao que ele claramente entendia como algo ensinado pela Bíblia. Era tão rigoroso quanto a isso que não permitia nada que parecesse uma transigência quando se tratava da verdade.

 

A autoridade pela qual ele “tolerava” ou “não tolerava,” “permitia” ou “não permitia” discordância por parte de outros ao que ele pessoalmente entendia como verdade, foi algo em que sempre insistiu como sua prerrogativa presidencial. Ele efetivamente tomou o controle exercido pela diretoria, eliminou completamente a comissão editora e assumiu plena autoridade sobre tudo o que se publicava, forçando a demissão dos membros da equipe que não queriam apoiar estas ações e outras similares. Isto foi anunciado como “eliminação do joio, um tempo de julgamento, uma limpeza da organização inteira, separada para tornar-se a família dos servos de Deus.”36 Como se vê em Crise de Consciência, a autoridade suprema da presidência pela qual ele lutou e que conseguiu, foi retirada desse cargo em 1976 e transferida a um grupo de homens, o Corpo Governante.37 Mas tudo o que aconteceu resumiu-se a apenas isso: a transferência de poder e autoridade de um homem para um corpo, um conselho religioso. Embora no início tenham sido feitas declarações auspiciosas de que a mudança promoveria um espírito mais humano e fraternal, o fato é que permaneceu a “predisposição para se fazer autoritária e indiscutível, para desenvolver uma organização centralizada,” conforme o historiador H. G. Wells. Como dissemos, a linguagem áspera e às vezes grosseira usada por Rutherford foi substituída por explicações mais eruditas e intelectualmente atraentes. Todavia, essa mesma predisposição que se ofende, critica e busca silenciar qualquer diferença de opinião, controla claramente os atos, decisões e perspectivas do conselho religioso chamado de Corpo Governante. A evidência até aqui apresentada e a que segue são só uma parte da que existe comprovando esta afirmação.

 

Uma organização é equiparada a Deus e a Cristo

 

De todas as alegações e argumentos dos líderes da igreja do segundo e terceiro séculos, que defendiam maior autoridade humana e controle centralizado, não há praticamente nada que se iguale às publicações da organização Torre de Vigia de época recente. Quando o estudo e a pesquisa por fim me conscientizaram disto, achei cada vez mais difícil harmonizar a auto-aprovação, o auto-enaltecimento e a auto-identificação da organização como o canal de Deus, com seus constantes apelos à humildade e à brandura por parte de todos os outros. Acima de tudo, senti-me profundamente perturbado por ela interpor-se entre o indivíduo e Deus. Por um lado encoraja as pessoas a buscar uma “relação pessoal” com Deus, ao mesmo tempo que sobrepõe-se a isto afirmando ser o meio indispensável para a obter a orientação e a bênção divinas. Ela insiste que Deus simplesmente não concederia seu favor a alguém à parte dela. Não pude conciliar isso com as palavras de Jesus em João capítulo 14, versículo 6:

 

Eu sou o caminho, e a verdade, e a vida. Ninguém vem ao Pai senão por mim.

 

ou com as palavras de Pedro em Atos, capítulo 4, versículo 12:

 

Outrossim, não há salvação em nenhum outro, pois não há outro nome debaixo do céu, que tenha sido dado entre os homens, pelo qual tenhamos de ser salvos.

 

ou com as de Paulo que, ao escrever sobre a edificação espiritual dos cristãos, conforme registrado em 1 Coríntios, capítulo 3, versículo 11 disse:

 

Pois nenhum homem pode lançar outro alicerce senão aquele que foi lançado, que é Jesus Cristo.

 

Parecia haver uma definitiva usurpação do papel divinamente designado a Jesus. Se ninguém vem ao Pai senão por ele, então, segundo as declarações publicadas já mostradas, afirmava-se que ninguém vem a Cristo senão por meio da organização Torre de Vigia, que deste modo se coloca entre o indivíduo e o Filho de Deus. Isto torna, logicamente, a organização humana essencial para a salvação. Não surpreende, portanto, concluir que as afirmações da “Mãe Igreja” de que ninguém pode achar a salvação fora da Igreja combinam claramente com as da “mãe organização,” conforme podemos ver nas seguintes citações de A Sentinela de 1° de junho de 1968 (páginas 331 e 332) e de 15 de julho de 1982 (página 21):

                                [FOTOCÓPIA DA SENTINELA DE 1/6/68, PP. 331, 332]

 

3 Apresse-se em identificar a organização teocrática visível de Deus que representa seu rei, Jesus Cristo. É essencial para a vida. Ao fazê-lo, torne-se completo em aceitar todos os seus aspectos. Não podemos afirmar que amamos a Deus e, todavia, negar sua Palavra e seu canal de comunicações.

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Portanto, ao submeter-nos à organização teocrática visível de Jeová, temos de estar em pleno e completo acordo com toda fase de suas normas e seus requisitos apostólicos.

                            ¾¾¾¾¾¾

 [FOTOCÓPIA  DA SENTINELA DE 15/7/82, P.21, PAR.18]

  18  Podemos esperar agora uma expansão similar de nossa atividade de pregação, neste clímax das eras. Sem dúvida, antes de acabar a “grande tribulação”, veremos o maior testemunho dado ao nome e ao reino de Deus na história deste mundo. E embora o testemunho dado agora ainda inclua o convite de vir à organização de Jeová para a salvação, sem dúvida virá o tempo em que a mensagem assumirá um tom mais duro, igual a um “grande grito de guerra”.

 

Num discurso para o pessoal da sede de Brooklyn em 23 de janeiro de 1981, Karl Klein, membro do Corpo Governante, expressou seu apoio pessoal à posição de que não há outro meio de ganhar a vida eterna senão por meio da organização Torre de Vigia, dizendo:

 

Não há dúvida, a Palavra de Deus serve como luz para nossos caminhos no que diz respeito à nossa conduta e nossas crenças. Mas Jeová Deus também proveu a organização do “escravo fiel de discreto” para nos ajudar a entender a Bíblia e a pô-la em prática. E a menos que estejamos em contato com esse “escravo fiel e discreto,” não avançaremos na estrada da vida, não importa quanto leiamos a Bíblia! . . .

Portanto, nunca esqueçamos o que Pedro afirmou quando Jesus perguntou a seus apóstolos se também queriam partir. Não existe simplesmente nenhum outro lugar aonde ir em busca de alimento espiritual e genuína associação cristã senão àqueles que são leais à organização do “escravo fiel e discreto.”38

 

Isto foi reafirmado num artigo subseqüente na Sentinela de 15 de agosto de 1981 (página 19):

                                         [FOTOCÓPIA DA SENTINELA DE 15/8/81, P.19]

 

     NOSSO CONCEITO SOBRE O “ESCRAVO”

 

Podemos tirar proveito desta consideração. Uma vez que verificamos qual o instrumento que Deus usa como seu “escravo” para distribuir o alimento espiritual ao seu povo, Jeová certamente não se agradará se recebermos este alimento como se pudesse conter algo prejudicial. Devemos ter confiança no instrumento que Deus usa. Na sede de Brooklyn, donde emanam as publicações bíblicas das Testemunhas de Jeová, há mais anciãos cristãos maduros, tanto do “restante” como das “outras ovelhas”, do que em qualquer outra parte da terra.

É verdade que os irmãos que preparam essas publicações não são infalíveis. Seus escritos não são inspirados assim como eram os de Paulo e dos outros escritores bíblicos. (2 Tim. 3:16) E assim, às vezes, tornou-se necessário corrigir conceitos, conforme o entendimento se tornou mais claro. (Pro. 4:18) No entanto, isto tem resultado no constante refinamento do conjunto de verdades baseadas na Bíblia, aceitas pelas Testemunhas de Jeová. No decorrer dos anos, ao passo que se fizeram ajustes neste conjunto de verdades, ele se tornou cada vez mais maravilhoso e aplicável na nossa vida, nestes “últimos dias”. Os comentadores bíblicos da cristandade tampouco são inspirados. Apesar de afir-marem ter grande conhecimento, deixaram de destacar até mesmo verdades bíblicas básicas ¾ tais como a vindoura terra paradísica, a importância do nome de Deus e a condição dos mortos.

Antes, os precedentes estabelecidos pela organiza-ção do “escravo fiel e discreto” nos mais de 100 anos passados obrigam-nos a chegar à conclusão que Pedro expressou quando Jesus perguntou se os seus apóstolos também queriam abandoná-lo, a saber: “Para quem havemos de ir?” (João 6:66-69) Não há dúvida sobre isso. Todos nós precisamos de ajuda para entender a Bíblia, e não podemos encontrar a orientação bíblica de que precisamos fora da organização do “escravo fiel e discreto”.

 

Entre as Testemunhas, disciplinadas para aceitar de modo submisso tudo que a organização provê, raramente suscita-se séria preocupação de que essa última declaração citada na prática substitui Jesus Cristo pela “organização do ‘escravo fiel e discreto.’” Após citar a pergunta de Pedro, “Para quem havemos de ir?,” o autor do artigo diz: “Não há dúvida sobre isso. Todos nós precisamos de ajuda para entender a Bíblia, e não podemos encontrar a orientação bíblica de que precisamos fora da organização do ‘escravo fiel e discreto.’”38

Quanto à pergunta de Jesus, o membro do Corpo Governante, Karl Klein, falou que não existe nenhum outro “lugar” aonde ir em busca de orientação espiritual senão à organização Torre de Vigia. Em contraste, o próprio apóstolo Pedro deu uma resposta bem diferente, falando não de um “lugar” mas de uma pessoa, dizendo:

 

    Tu [Jesus Cristo] tens declarações de vida eterna.

 

Apenas numa assistência cabalmente doutrinada poderia o redator de A Sentinela pôr a organização no lugar de Cristo sem causar o menor murmúrio de discordância. Tanto o discurso de Karl Klein como este artigo deram a impressão de que Cristo Jesus está tão firmemente comprometido numa relação contratual com a Sociedade terrestre que ele não pode agir independente dela, não pode falar a indivíduos senão por meio dela, não pode orientar ou esclarecer os indivíduos sem passar pela intermediação da organização Torre de Vigia. A maioria das Testemunhas deve admitir honestamente (pelo menos para si próprias) que muitas vezes usam a pergunta de Pedro, “Para quem havemos de ir,” para mostrar que “devemos nos apegar à organização,” o que de modo algum o próprio Pedro falou.

Assim, a usurpação do papel do Filho de Deus como único “caminho” para a verdade e a vida tornou-se um fato, como suas próprias mentes comprovam. Sua afirmação de ser “o caminho, a verdade e a vida” não é exclusivamente sua. Tem de compartilhá-la com a “mãe” organização, a Torre de Vigia, sem a qual ninguém pode entender a Bíblia nem achar o caminho da vida. Apoderam-se do que Cristo falou sobre seu papel nos propósitos de Deus e do que Pedro falou sobre o Filho de Deus e o atribuem a uma organização terrestre, humana, designando-lhe o papel de subgerente de Cristo. Sua autoridade é apresentada como merecendo submissão aproximada, senão equivalente, a que se concede a Cristo. Sem a organização simplesmente não existe vida. Negar essa pretensão arrogante é um convite à expulsão sob a espantosa acusação de “apostasia”!40

Tudo isto significa nem mais nem menos, que esta organização humana terrestre tornou-se, para todos os efeitos, mediadora. Assim como o homem imperfeito e pecaminoso não pode ir a Deus sem a mediação do Filho dele, cujo sacrifício resgatador provê o meio para a reconciliação com Deus, também se ensina que o homem não pode entrar numa relação aprovada com Cristo, e, por meio dele, com Deus, e que ele não pode sequer entender corretamente as verdades sobre Cristo, as quais são o fundamento da fé, sem passar pela organização terrestre humana, a organização Torre de Vigia e seu Corpo Governante. Ela atua, portanto, como uma organização mediadora. É por isso que todos os que deixam de associar-se com ela devem morrer na vindoura “grande tribulação,” segundo o ensino publicado.

Concluí que tudo isso está em total desacordo com a afirmação clara de 1 Timóteo 2:5, 6:

 

Pois há um só Deus e um só mediador entre Deus e homens, um homem, Cristo Jesus, o qual se entregou como resgate correspondente por todos.

 

Bem diferente da organização Torre de Vigia, que atribui a si própria a função de mediadora na salvação de outros, o apóstolo Paulo recusou energicamente ter tal pretensão, perguntando incisivamente àqueles a quem escreveu: “Foi Paulo crucificado em favor de vocês? Foram vocês batizados em nome de Paulo?” (1 Coríntios 1:13, NVI). Só Cristo morreu por nós em sacrifício de resgate, não os homens que compõem uma organização humana ou um corpo governante; só ele, portanto, recebeu o direito de atuar como mediador entre nós e Deus.

 

O batismo — quem o valida?

 

O historiador Johnson observou que no período pós-apostólico deu-se que, junto com a Bíblia, “os sacramentos . . . perdiam seu significado se empregados fora da Igreja.” Um dos principais “sacramentos” era o batismo.

No início, entre os Estudantes da Bíblia dos dias de Russell, não havia problema por alguém ter sido batizado quando filiado a uma das várias denominações cristãs. A única questão era quanto a se a pessoa entendera o significado do batismo e se este fora por imersão.41 Continuou assim por mais sete décadas. Em época mais recente, A Sentinela (em inglês) de 1° de julho de 1955 (página 412) afirmou que só seria necessário novo batismo se “o batismo anterior não tivesse sido em símbolo de dedicação,” ou não tivesse sido por imersão.

Um ano depois, na Sentinela (em inglês) de 1° de julho de 1956, a posição foi revertida. Dizia (página 406):

 

                                BATIZAR-SE PELA SEGUNDA VEZ                                                                                                                                                             

14 Pergunta-se com freqüência se a pessoa anteriormente batizada numa cerimônia realizada por algum outro grupo religioso deve ser novamente batizada quando vem a ter o conhecimento exato da verdade e faz a dedicação a Jeová. Por causa do que já foi dito, há agora uma razão compulsória para também dizer que sim, ela deve ser batizada novamente. Obviamente, em tais sistemas religiosos, a pessoa nunca foi realmente batizada “no nome do Pai, do Filho e do espírito santo,” pois se o tivesse feito ela teria apreciado a autoridade e o cargo destas autênticas Potestades Superiores. E se tivesse anteriormente se dedicado a Jeová, a pessoa teria se separado de tais sistemas babilônicos que desonram a Deus mesmo antes de se ter deixado batizar por eles. De modo que o importante não é o ato de ser batizado, mas sim o que é simbolizado pelo ato.

 

Uns seis meses mais tarde, porém, lançou-se uma “Pergunta dos Leitores” que especificava as condições para rejeitar como inválidos todos os batismos “fora da organização”— mesmo que por imersão. Agora dizia-se que a data limite para a possível validade de tais batismos era o ano de 1918. Por quê? Porque “em 1918 A. D. . . . Jeová Deus, acompanhado de seu Mensageiro do Pacto veio ao templo e rejeitou a cristandade.” Se a pessoa tivesse sido imersa em símbolo de dedicação a Deus e a Cristo antes dessa data, e tivesse também deixado sua anterior denominação e se filiado à organização Torre de Vigia antes de 1918, ficava a cargo da consciência da pessoa decidir se um novo batismo era necessário ou não.

Para todos os outros a posição firme era:

 

Portanto, agora que o chamado para sair de Babilônia está sendo claramente ressoado, se alguém ouviu este chamado e assim mesmo permanece em algum setor religioso da antitípica Babilônia, sendo imerso nesse setor religioso, sua imersão não vale. Sua decisão não pode ter sido em dedicação para fazer a vontade de Deus, pois, citando o parágrafo 14 “a pessoa teria se separado de tais sistemas babilônicos que desonram a Deus mesmo antes de se ter deixado batizar por eles.”42

 

Ela tinha de se rebatizar. O assunto foi resolvido em definitivo porque as palavras do “parágrafo 14” de A Sentinela o resolveram. A evidência bíblica aparentemente não foi necessária. No período pós-apostólico, o batismo “perdia seu significado se praticado fora da Igreja,” isto é, fora dos domínios da autoridade religiosa. A mesma posição era agora assumida pela organização Torre de Vigia com relação a qualquer batismo não realizado dentro de seus domínios.

Ainda em 1955 A Sentinela dissera:

 

Um cristão . . . não pode ser batizado no nome daquele que lhe está administrando a imersão, nem no nome de qualquer homem, nem no nome de qualquer organização, mas em nome do Pai, do Filho  e do espírito santo. Isto mostra, entre outras coisas, que o cristianismo não é uma questão denomina-cional . . . 43

 

Nos discursos que precedem a cerimônia de batismo, era costume o orador lembrar aos batizandos que “vocês não estão simbolizando a dedicação a uma obra, ou a dedicação a uma organização, mas sua dedicação a uma pessoa — Jeová Deus.”44 Algo parecido dizia A Sentinela de 1° de junho de 1967 (página 340):

 

Não nos dedicamos a uma religião, nem a um homem, nem a uma organização. Não, dedicamo-nos ao Soberano Supremo do Universo, o nosso Criador, o próprio Jeová Deus. Isto torna a dedicação uma relação muito pessoal entre nós e Jeová . . . .

 

Em 1942, as duas perguntas feitas aos batizandos eram estas:

 

(1) Crê em Jeová Deus, o Pai, que “a salvação pertence a Jeová,” e que Cristo Jesus é seu Filho, em cujo sangue os pecados são lavados, e por meio de quem lhe vem a salvação de Deus?

(2) Confessou, portanto, seus pecados a Deus, pedindo-lhe a purificação por Cristo Jesus, e afastou-se, portanto, do pecado e do mundo, consagrando-se sem reservas a Deus, para fazer sua vontade?45

 

Estas perguntas eram essencialmente próximas em conteúdo às declarações de Pedro e de outros do período apostólico, quando conclamavam às pessoas: “Arrependei-vos, e cada um de vós seja batizado em nome de Jesus Cristo para remissão dos vossos pecados, e recebereis o dom do Espírito Santo.”46 Em 1956 e (com pequenas variações) por muitos anos daí em diante as perguntas apresentadas por ocasião do batismo das Testemunhas de Jeová eram estas:

 

20  (1) Reconheceu-se perante Jeová Deus como pecador que necessita de salvação, e reconheceu perante ele que esta salvação procede dele, o Pai, por intermédio do seu Filho, Jesus Cristo?

21  (2) À base desta fé em Deus e na sua provisão de salvação, dedicou-se a Deus, sem reserva, para fazer doravante a Sua vontade conforme lhe é revelada por ele mediante Jesus Cristo e mediante a Bíblia sob o poder iluminador do espírito santo?47

 

Sem qualquer explicação bíblica para justificar uma mudança importante nestas perguntas básicas que as pessoas devem responder de modo afirmativo para habilitar-se ao batismo, A Sentinela de 1o de junho de 1985 (página 31) alistou estas como as perguntas a serem respondidas por todos os batizandos:

                                     [SCAN DA SENTINELA DE 1/6/85, P.31]

À base do sacrifício de Jesus Cristo, arrependeu-se dos seus pecados e dedicou-se a Jeová para fazer a vontade dele?

A segunda é:

Compreende que a sua dedicação e o seu batismo o identificam como uma das Testemunhas de Jeová, em associação com a organização de Deus, dirigida pelo espírito dele?

 

Respondendo com um sim a estas perguntas, os batizandos estão na condição correta de coração para se submeterem ao batismo cristão.

 

A Sentinela de 15 de abril de 1987 (página 12) dá esta estranha explicação do motivo desta mudança, dizendo: “Recentemente, as duas perguntas feitas aos batizandos foram simplificadas, para que esses batizandos possam responder com plena compreensão do que está envolvido em entrar numa relação íntima com Deus e sua organização terrestre.” Esta suposta “simplificação” só fez uma coisa: requerer de cada batizando uma declaração de submissão e obrigação a uma organização terrestre. Quando lemos as Escrituras Cristãs vemos que o fator crucial para validar o batismo era que, em todos os casos, os que davam esse passo “cressem no Senhor Jesus” como o Messias de Deus, seu Redentor capaz de salvá-los.48 Eles eram “batizados em Cristo Jesus.”49 Isto era bastante “simples” para que as pessoas pudessem compreendê-lo, e de fato o compreendiam num só dia, em poucas horas. Não há nada de apostólico no palavreado “carregado” do assunto, pois os apóstolos jamais expuseram a idéia de uma “organização terrestre,” a qual, como claramente demonstramos, refere-se a nada mais que uma estrutura de autoridade humana.

Cristo dissera aos seus discípulos que batizassem pessoas “em nome do Pai, e do Filho e do Espírito Santo.”50 A segunda pergunta do batismo da Torre de Vigia na verdade substitui o Espírito santo de Deus pela “organização dirigida pelo espírito.” Enquanto o Espírito recebe uma menção simbólica, encontramos mais uma vez a situação em que a organização se apropria de uma função divinamente designada. Ela passa claramente a idéia de que o Espírito santo de Deus não opera na pessoa que se batiza senão em conexão com a organização Torre de Vigia. Ela não destaca o fato de que a pessoa que é batizada será daí em diante dirigida pelo Espírito de Deus, mas ressalta, em vez disso, a “organização dirigida pelo espírito.” Parece incrível que a Sentinela chame isso de “simplificação” das perguntas anteriores. Fala de “uma relação íntima com Deus,” mas torna isso sem sentido quando envolve a organização terrestre no assunto, criando não uma relação com Deus, mas uma relação íntima “com Deus e sua organização terrestre.” Enquanto Jesus falava apenas sobre o “Pai, o Filho e o Espírito Santo,” a organização pretende colocar a si própria neste quadro sagrado, como parte indispensável dele. Isto equivale a um servo dizer às pessoas que elas podem manter contato e relacionamento com o amo desde que o servo sempre esteja presente também, atuando como intermediário, porta-voz, gerente, intérprete das decisões. Tal atitude só pode ser chamada de arrogante.

Por 19 séculos as pessoas foram batizadas sem que o batismo delas fosse antecedido por tais palavras. Por mais de cem anos os associados com a Torre de Vigia foram batizados sem tais palavras. Será que não entenderam corretamente o que representava o batismo delas? Por que, após mais de 100 anos, tornava-se agora necessária esta “simplificação” para que as pessoas tenham “plena compreensão” do significado do batismo delas?

Creio que a alteração de 1985 demonstra a preocupação de que as pessoas reconheçam seus vínculos formais com a organização, seu compromisso com ela como uma autoridade religiosa acima delas, e portanto, a aceitação implícita de que ela os governa, bem como o direito dela de designar “tribunais eclesiásticos para “julgar” os que ela achar que violaram suas regras e normas.

Nos últimos anos, um bom número de pessoas simplesmente deixou de associar-se com a organização das Testemunhas sem fazer qualquer comunicado formal de dissociação.Embora continuem a viver em boa moral, se posteriormente disserem ou fizerem algo que manifeste não estarem de pleno acordo com algum ou todos os ensinos e normas da organização, serão facilmente abordadas pelos anciãos, interrogadas, e muitas vezes intimadas a uma “audiência judicativa.” Alguns declararam que não viam razão alguma para comparecer a tal audiência, que não se consideravam sujeitos à autoridade eclesiástica da organização. Alguns até providenciaram que um advogado enviasse uma carta ao corpo de anciãos declarando sua posição e solicitando que não fossem submetidos a mais investigações, interrogatórios ou intimações. Praticamente em todos estes casos, o departamento jurídico da Sociedade Torre de Vigia despachou para a pessoa (ou para o advogado, se houvesse) um volumoso pacote na forma de súmula legal, apresentando farta evidência do êxito obtido pela organização nos tribunais em casos relacionados, e citando numerosos processos em apoio ao seu direito de atuar como governo “religioso” e “tribunal eclesiástico” com respeito a pessoas batizadas pelas Testemunhas. Em essência, a matéria afirma que a pessoa ou pessoas envolvidas têm apenas duas alternativas: comparecer à “audiência judicativa” ou se dissociarem formalmente.51 Como exemplo, a matéria cita uma decisão da Suprema Corte dos E.U.A., a qual, entre outras coisas, diz:

 

O direito de organizar associações religiosas voluntárias, em apoio à expressão e disseminação de qualquer doutrina religiosa, e de criar tribunais para atuar em decisões quanto a questões controvertidas de fé, dentro da associação, e para exercer o governo eclesiástico de todos os membros individuais, congregações e funcionários dentro da associação geral, é indisputável. Todos os que aderem a tal corpo o fazem com a aceitação implícita deste governo, e são obrigados a submeter-se a ele.

 

O “direito” mencionado é o direito legal que tem um “governo eclesiástico” de atuar da maneira descrita. Dessa forma, a súmula enviada pelo advogado da Sociedade Torre de Vigia enfatiza o fator “legal” quando resume o assunto deste modo:

 

C. Relação entre a congregação e seus membros. É axiomático que a essência do relacionamento de uma sociedade religiosa com seus membros é considerado, pelos tribunais, como sendo o acordo entre as partes e, de modo geral, uma profissão de fé, a adesão à doutrina da sociedade religiosa e a submissão a seu governo. (76 C.J.S. 755, seção 11) Tendo uma das partes voluntariamente consentido em tornar-se membro de uma congregação, sujeita-se ela, por este meio, às normas e procedimentos existentes na referida congregação e não pode negar-lhes a existência. Todos os que por si próprios se filiam a tal organização religiosa de modo voluntário o fazem com o reconhecimento implícito desse governo e estão obrigados a submeter-se a este. Ex rel. do Estado, Morrow v. Hill, 364 N.E. 2° 1156 (Ohio 1977), Watson v. Jones, 80 E.U. 679, 729 (1872), 13 Wallace 679.

 

Uma vez que seus clientes não se dissociaram da congregação, então, em virtude da lei, deram seu reconhecimento implícito à direção desta, sujeitando-se às normas e aos procedimentos existentes e estão legalmente obrigados a submeter-se a ela. O governo teocrático da congregação ao qual seus clientes se submete-ram inclui especificamente o Corpo Governante das Testemunhas de Jeová, sua agência legal, conhecida como Sociedade Torre de Vigia de Bíblias e Tratados de Nova York, Inc., e todos os seus representantes devidamente designados, inclusive os anciãos da congregação com a qual estão associados. As normas e os procedi-mentos aos quais seus clientes se submeteram incluem o arranjo das comissões judicativas conforme detalhado acima.

 

Objetando a serem investigados e “julgados” pelos anciãos, alguns dos que se afastaram argumentaram que no período pré-1985, quando foram batizados, eles ‘se dedicaram a Deus e não a uma organização.’ As perguntas modificadas agora dizem claramente ao batizando que ele está se comprometendo numa “dedicação e batismo” que ‘o identificam como uma das Testemunhas de Jeová, em associação com a organização de Deus, dirigida pelo espírito dele.’ Isto garante, sem dúvida, que lhe foi cassado qualquer direito “legal” de dizer que não está sujeito ao governo da organização e a seus tribunais eclesiásticos. Para o departamento jurídico da organização isto, sem dúvida, no mínimo “simplifica” as coisas. Vejo isto como triste evidência de preocupação com autoridade de uma organização, que se utiliza do passo sagrado e tão pessoal do batismo como ocasião para assegurar sua autoridade sobre a vida do batizado.

 

Assim como os líderes religiosos dos primeiros séculos recuaram aos tempos do conceito de uma classe sacerdotal especial do Antigo Testamento, rebaixando assim todos os cristãos que não eram dessa classe a uma posição inferior perante Deus, também a organização Torre de Vigia empenha-se regularmente em colocar seus membros num contexto similar ao do Antigo Testamento. Nas “assembléias de distrito” anuais os programas com freqüência apresentam dramas em que se retratam as atitudes para com homens como Moisés, mediador do pacto da lei, Aarão, o sumo sacerdote, o rei Saul, o rei Davi, e outros que tiveram posições especiais, elevadas, e até únicas. Então, descaradamente, a organização faz paralelos entre tais homens e ela própria com sua posição, e enfatiza firmemente que merece ser tratada com igual respeito e submissão. É como se a vinda de Cristo não tivesse ocorrido ou trazido a mudança radical que trouxe, removendo todas essas distinções e colocando a todos no mesmo nível do seu Pai celestial e no mesmo relacionamento com sua Cabeça e Amo, Cristo.

Um artigo da revista Christianity Today de 24 de outubro de 1980, mostrava a preocupação dos líderes da reforma ao verem que a igreja institucional se tornara um fim em vez de um meio, acrescentando:

 

    Aquilo que eles combatiam era uma igreja que atribuíra a si própria e a seus ensinos uma autoridade que os colocava além de correção por parte das Escrituras. A igreja deixara de ser um meio para inculcar o conhecimento de Deus e tornara-se um fim, a cujos ensinos todos estavam sujeitos.

 

Levou menos de cem anos para a organização erigida em torno da Torre de Vigia completar todo o padrão do passado. Nesse espaço de tempo relativamente curto ela passou, de uma situação razoavelmente modesta, despretensiosa e tolerante, para uma posição dogmática, de impor despoticamente às mentes dos adeptos o que ela descreve como “o grande conjunto de verdades” produzido por ela, seus ensinos tradicionais desenvolvidos como organização, seu credo oficial. Da condição de relativa liberdade como irmãos e membros iguais de um sacerdócio universal sob Cristo, ela passou a conceder a seus líderes não só a autoridade apostólica, mas o controle e o poder centralizado sobre os outros, poder que os apóstolos nunca pretenderam exercer sobre seus irmãos, já que viam a si mesmos ‘não como amos da fé dos outros, mas como colaboradores para a alegria deles.’52

Foi principalmente durante os anos 20 e 30 que se moldou este conceito e atitude na organização das Testemunhas. Lamentavelmente, deixou-se isto intacto até hoje. A liderança existente jamais foi capaz de romper com a rigidez deste conceito. Implica isto em que os homens em posições de autoridade dentro da organização são todos pessoas “ávidas de poder,” ditatoriais? Com certeza não é assim que os vejo, e com base na experiência pessoal estou convicto de que muitos não o são. Nos primeiros séculos existiam homens, como os “lobos” sobre os quais Paulo advertiu, que tentavam fazer as pessoas segui-los como líderes, e para conseguir isto exaltavam a autoridade humana. Existiam porém, sem dúvida, outros homens, cristãos professos que, confrontados com a situação frustrante de ver as pessoas serem levadas pelo que consideravam como ensinos errôneos, concordaram com a instituição da autoridade humana, movidos pela idéia falsa de que o fim justifica os meios, e assim cederam à sedução da autoridade. Essas mesmas influências atuam em nossa época.

O clima autoritário que se criou na administração das Testemunhas não reflete necessariamente a atitude íntima de todos os membros do Corpo Governante. Não há, de fato, meio eficaz de um homem “fazer campanha” para entrar nesse grupo seleto. Os convites aos novos membros resultam de sessões secretas do Corpo e geralmente pegam o convidado de surpresa. Alguns destes são realmente de natureza muito branda, sem inclinação a dominar outros. Nos debates, eles raramente falam, parecem temer certos membros, e quase sempre acompanham os votos destes. Outros, tornando-se membros a convite do Corpo, parecem, daí em diante, terem sido seduzidos, isto é, após sentirem o gosto de fazer parte da estrutura de autoridade, acham difícil ceder. Talvez até fossem a favor de uma atitude mais tolerante, menos dominadora, mas assemelham-se aos descritos nas palavras de Jesus em João 12: 42, 43. Eles se expressam, mas não ao ponto de “criar caso.” Restam aqueles que mostram definitivo interesse na autoridade não só organizacional, mas pessoal. Mesmo assim, não quero pessoalmente tomar a atitude de julgá-los como indivíduos. As causas de certas atitudes podem ser difíceis de compreender. Entre os humanos, a imposição da autoridade é muitas vezes sinal de fraqueza e insegurança ao invés de força. Trabalhar pacientemente com as pessoas,  raciocinar com elas, confiar no poder da verdade e buscar mostrar que uma posição é correta em face de uma atitude contrária, e, pela palavra e pelo exemplo edificá-las na fé, no amor e na compreensão, é uma tarefa bem mais difícil, bem mais cansativa do que simplesmente ordenar que façam algo, do que legislar e impor normas e reprimir o questionamento mediante a força da autoridade.53 Este último é um procedimento de fraqueza, e do mesmo modo que maridos, pais, empregadores e outros muitas vezes sucumbem a essa atitude, ora por uma sensação de exaspero, ora por um sentimento de desamparo, assim agem também os homens nos sistemas religiosos. E tudo isso ocorre na estrutura de autoridade da organização Torre de Vigia bem como em outras organizações religiosas.

Portanto, como declarei em Crise de Consciência, minha crença é que o erro fundamental reside no conceito de autoridade exclusiva divinamente conferida de que se investiu a organização Torre de Vigia junto com a idéia de que, apenas por meio do uso dessa autoridade é que se pode conseguir unidade, ordem e realização. É certo que alguns homens do Corpo Governante, se não todos, foram vítimas desse conceito, presos ao atrativo de um pensamento carnal.

A sedução enganosa do apelo à autoridade, porém, não nos livra da responsabilidade. Embora muito do que hoje existe, como se provou, seja um legado do passado — mesmo do passado longínquo, antes de existirem a organização Torre de Vigia e seus diversos presidentes e líderes — este continua a ser um legado que não precisa ser aceito. O caráter não-bíblico das declarações exaltadas e das usurpações da autoridade divina por parte da organização Torre de Vigia é visível. E isto acarreta certa responsabilidade tanto para os que a promovem como para os que a apoiam. Não querer exergar isso não exime dessa responsabilidade. Chegou-se ao ponto em que, para muitos, talvez a maioria, escutar à organização é escutar a Deus, rejeitar sua mensagem e seus ensinos é mostrar desrespeito para com Deus. Até hesitar em aceitar suas interpretações ou, pior ainda, duvidar delas, é mostrar falta de fé em Deus e duvidar Dele. Tampouco deve alguém sequer imaginar que tem capacidade mental para entender as Escrituras sem orientação da organização sediada em Brooklyn. Andar com ela para onde quer que vá, é andar com Deus. Concluir que ela está indo na direção errada e refrear-se de acompanhá-la é evidência de um espírito independente e rebelde. Chegar a um entendimento correto antes dela e, pior que tudo, expressá-lo, é sinal de presunção, de correr à frente de Deus. Não posso deixar de achar que o espírito do “homem que é contra a lei” tem agido para produzir tal situação, atuando de modo similar ao do passado.

A equivalência da organização a Deus é quase palpável entre as Testemunhas de Jeová, e está profundamente alojada na mente da maioria dos membros, muito mais do que possam imaginar. Não creio que todos concordem com essa equivalência, pois conheci pessoas, inclusive em posições de destaque, que disseram que não podiam dar total crédito às exaltadas afirmações feitas. Mas creio muito também que, para evitar essa equivalência, precisam constantemente “reeditar” mentalmente as afirmações publicadas, de fato adaptando-as para que digam algo diferente do que realmente dizem, de modo que possam justificar-se por aceitá-las. Há uma contínua racionalização de seus raciocínios para que se sujeitem passivamente aos apelos de submissão implícita e lealdade por parte da liderança. E, com tudo isto, precisam exercer constante cautela para assegurar-se de que suas verdadeiras opiniões não se tornem evidentes aos outros.

El colocar a la organización a la misma altura que a Dios es palpable entre los Testigos y ha calado profundamente en la mente de la mayoría de ellos, a un grado mucho mayor de lo que puedan darse cuenta. Creo que no todos participan de esa confusión, ya que conozco posiciones personales, incluso de algunos en posición prominente, que han expresado no estar dispuestos a otorgar plena credibilidad a las exaltadas alegaciones hechas. Pero también creo que para evitar ese criterio se requiere un constante ejercicio de "edición" mental de las declaraciones publicadas, reformando y remodelando mentalmente las declaraciones extremas (en realidad, ajustándolas a fin de que digan algo diferente de lo que dicen) a fin de justificar su aceptación. Hay un continuo ejercicio mental en sus razonamientos a fin de someterse pasivamente a los llamados de los líderes para obediencia y lealtad. Y, aún así, deben extremar la precaución a fin de asegurarse de que sus sentimientos no trascienden a los demás.

Isto certamente não pode ser chamado de liberdade cristã.

Con toda seguridad, a eso no se le puede llamar libertad cristiana.

 

 

1         Veja As Testemunhas de Jeová no Propósito Divino (em inglês), páginas 23-25.

2         A Sentinela, abril de 1882, citada nas páginas __,__.

3         Quando o livro A Nova Criação (em inglês) foi publicado em 1909 o ponto de vista sobre organização permanecia o mesmo que fora apresentado. Dizia, por exemplo: “O teste para se tornar membro da Nova Criação não consistirá em ser membro de qualquer organização terrena, mas em estar em união com o Senhor como membro de seu corpo místico: conforme diz o Apóstolo, ‘Se algum homem está em Cristo, ele é uma Nova Criatura . . .’”

4         O termo “organização teocrática” vem sendo usado, em particular, desde A Sentinela (em inglês) de 1° de dezembro de 1939.

5         Veja a íntegra desta matéria no capítulo 2, página __.

6         A outra “pessoa associada à Torre de Vigia” mencionada era, na verdade, Maria Russell, esposa de Russell, como se vê em A Sentinela, 15 de julho de 1906 (páginas 215, 216).

7         A Sentinela, 1° de dezembro de 1916, página 356.

8         Este testamento aparece na íntegra (em inglês) no “Apêndice” de Crise de Consciência, páginas 433-436; seu total controle da Sociedade Torre de Vigia está documentado nas páginas 64 e 65 daquela publicação.

9         A Sentinela, 15 de julho de 1906, página 229; veja Crise de Consciência, página 65, e também Testemunhas de Jeová — Proclamadores do Reino de Deus, página 143, parágrafo 2.

10      É digno de nota que quando A Sentinela de 15 de março de 1982 (página 25) citou este artigo, ele tenha deixado de fora a referência a outros associados da Torre de Vigia serem “conservos” juntamente com “aquele servo” que é o “um instrumento.”  Isto permitiu à revista passar a falsa impressão de que entendia-se o “escravo fiel” como sendo a revista A Sentinela, ao invés de Charles Taze Russell. Tal modo de editar só pode ser classificado como desonestidade jornalística.

11      A Sentinela, 1° de dezembro de 1916, página 356. Veja também Crise de Consciência, páginas __-__, sobre a insistência da Sociedade, durante os anos 20, em que Russell era o “servo fiel e prudente.”

12      Três meses depois, no número de 15 de dezembro de 1909 de A Sentinela, página 371, ele avisava aos leitores da revista de que uma prova estava ocorrendo, e que o “astucioso adversário” estava tentando “predispô-los contra os próprios instrumentos que Deus proveu para firmar os ‘pés’ [os membros finais do corpo] de Cristo neste dia iníquo.” Isto estava sendo feito por certos líderes de classes que estavam tentando suplantar as publicações da Torre de Vigia com a Bíblia, e Russell declara que fazendo assim eles se empenhavam “em colocar-se entre o povo de Deus e a divinamente provida luz sobre a Palavra de Deus.”

13      Compare com João 14:26; 1 João 2:27; 5:20.

14      Veja Crise de Consciência, páginas ___ a ___.

15      Veja Crise de Consciência, páginas ___ a ___.

16      As Testemunhas de Jeová no Propósito Divino (em inglês), página 96.

17      1 Coríntios 3:5-7.

18      A Sentinela (em inglês), 15 de dezembro de 1922, página 389.

19      Testemunhas de Jeová — Proclamadores do Reino de Deus, páginas 214, 638, 639.

20      Daniel 8:14; Revelação 4:5; 11:19; veja também As Testemunhas de Jeová no Propósito Divino (em inglês), página 127; “Seja Feita a Tua Vontade na Terra,” páginas 193 a 200;“Luz I,” em inglês (1930), páginas 104, 227-229.

21      “Luz I” (em inglês), páginas 122, 123.

22      “Luz I” (em inglês), páginas 108, 111, 118, 122-125, 139, 140; 218, 219; veja também Cumprir-se-á Então o Mistério de Deus (1971), páginas 209-247.

23      Quem escreveu isto foi Percy Harding, cuja experiência é relatada no capítulo 11 deste livro.

24      A decisão do tribunal de fato concedeu às Testemunhas de Jeová o reconhecimento como religião “estabelecida,” mas pronunciou-se contra reconhecer Walsh como “ministro ordenado.” Veja Anuário das Testemunhas de Jeová de 1974, páginas 133, 134.

25      O uso semelhante de tais táticas pôde ser visto numa questão jurídica bem mais recente, ocorrida em Bonham, Texas, em 1986. Os anciãos que eram fideicomissários do Salão do Reino de lá foram arbitrariamente substituídos pela Sociedade Torre de Vigia e levantou-se uma questão jurídica quanto a quem tinha o controle legal sobre o salão. A lei reconhecia apenas dois tipos de controle eclesiástico, o hierárquico e o congregacional. As publicações da Sociedade Torre de Vigia  têm declarado firmemente que sua direção “não era hierárquica.” Veja, por exemplo, o livro Vida Eterna na Liberdade dos Filhos de Deus (1966), páginas 169, 170; Qualificados Para Ser Ministros (1959), páginas 268, 269. Todavia, a fim de assegurar seu controle sobre este Salão do Reino de Bonham, os advogados da Sociedade foram autorizados a apresentar seu controle como “hierárquico” ao invés de “congregacional.” Don Adams, vice-presidente da corporação da Sociedade de Nova York, entregou uma declaração em garantia com este objetivo, afirmando no item 6: “Para implementar suas decisões, o Corpo Governante utiliza uma organização hierárquica juntamente com entidades jurídicas.” (Veja o Apêndice.) Daí, ele delineia as evidências da natureza hierárquica do arranjo em vigor, com a sede de Brooklyn no alto da estrutura de autoridade, seguida das comissões de filial, superintendentes de zona, superintendentes de distrito, superintendentes de circuito, corpos de anciãos e servos ministeriais. Neste caso, a declaração de natureza hierárquica era contrária às afirmações publicadas. Não era, contudo, contrária aos fatos, pois a natureza hierárquica da estrutura é visível.

26      Veja Crise de Consciência, páginas __-__, ___, ___.

27      God’s Outlaw (O Proscrito de Deus), livro de Brian Edwards sobre o tradutor bíblico William Tyndale, na página 7 alista como um dos três principais questionamentos de Martinho Lutero que “o papado era um corpo governante humano, capaz de errar e precisando ele próprio ser comprovado pelas Escrituras.”

28      História do Cristianismo, Paul Johnson, páginas 76, 77.  

29      Mateus 23:8, NM.

30      “Os Tratados de Cipriano,” Tratado I, parágrafos 5, 6.

31      Veja o capítulo 3, páginas __, __.

32      A Sentinela, 1º de janeiro de 1974, página 18.

33      A Sentinela (em inglês) de 1º de setembro de 1954 (na página 529), tinha feito essencialmente a mesma alegação, dizendo: “Em vista desta conexão inquebrantável com a organização Teocrática cristã, a Bíblia traz a idéia da organização e não pode ser plenamente compreendida sem termos em mente a organização teocrática. . . . Todas as ovelhas do rebanho de Deus ter presente a idéia da organização, como a Bíblia.”

34      História do Cristianismo, página 77.

35      É interessante que o artigo de A Sentinela (na página 26) cite uma obra histórica que declara que, além do único concílio de Jerusalém descrito em Atos, capítulo 15,  “todos os concílios são obra da igreja pós-apostólica. Não pertencem ao período da fundação da igreja.”

36      A Fé em Marcha (em inglês), página 81. Este livro é citado em Testemunhas de Jeová—Proclamadores do Reino de Deus, página 62, na nota de rodapé.

37      Veja páginas __, __.

38      Tirado de uma transcrição palavra por palavra do discurso, feito nessa data.

39      Este artigo provavelmente foi também escrito por Karl Klein, já que o uso de expressões como “Não há dúvida sobre isso” é quase uma marca registrada de seu modo de escrever e de falar.

40      Queiram observar o artigo da revista Time de 22 de fevereiro de 1982, que me cita como tendo dito: “Não existe vida fora da organização.” Fiz esta declaração a Ann Constable, repórter da Time, ao explicar-lhe o efeito que a desassociação tem sobre as Testemunhas, a atitude que muitas têm ao enfrentar a desassociação, de acharem “que não existe vida fora da organização.” Daí, quando o artigo foi lançado, o contexto deu a impressão de que isto expressava meus próprios sentimentos. Imediatamente escrevi uma carta aos editores, declarando, “Quando eu disse isto, estava descrevendo não minha própria opinião, mas o ponto de vista predominante entre a maioria das Testemunhas, e que está implícito nos ensinos da organização. O meu entendimento das Escrituras é que o Filho de Deus, exclusivamente, é ‘o caminho, a verdade, e a vida.’” O conteúdo desta carta foi publicado na seção “Cartas ao Editor” de um número subseqüente da Time. Veja o Apêndice.

41      Recordo meu tio, Fred Franz, quando já vice-presidente da Torre de Vigia, comentar comigo que, se o batismo dele na Igreja Presbiteriana tivesse sido por imersão (em vez de aspersão) ele o teria considerado válido.

42      A Sentinela (em inglês), 15 de dezembro de 1956, página 763.

43      A Sentinela (em inglês), 1° de julho de 1955, página 411.

44      Conforme recordo, este ponto era até incluído nos esboços fornecidos pela Torre de Vigia aos que proferiam os discursos de batismo.

45      A Sentinela (em inglês), 1° de outubro de 1942, página 302.

46      Atos 2:38, ARA; 1 Pedro 3:21, 22.

47      A Sentinela (em inglês), 1° de julho de 1956, página 407.

48      Atos 16:31-33; compare também com Atos 2:36; 8:5, 12, 27-38;  9:1-20; 10:34-48; 11:16.

49      Romanos 6:3; Gálatas 3:27.

50      Mateus 28:19, ARA.

51      Os motivos pelos quais muitos preferem não pedir tal dissociação formal são considerados nos capítulos 10, 11 e 17 deste livro.

52      2 Coríntios 1:24.

53      Compare com Provérbios 16:32; 2 Timóteo 2:24, 25; Tiago 3:13-18; 1 Pedro 5:1-7.

 

 

 

1         Ver Los Testigos de Jehová en el Propósito divino, páginas 23-25.

2         La Atalaya de Abril de 1882, páginas 71, 72.

3         Cuando se publicó el libro La Nueva Creación en 1909, continuaba el mismo punto de vista con respecto a organización. Decía, por ejemplo: "el ser miembro de la nueva creación no es ser miembro de alguna organización terrestre, sino estar unido al Señor como miembro de su cuerpo místico; como dijo el Apóstol: ‘si alguien está en Cristo, es una Nueva Creación...’

4         La expresión "Organización teocrática" se ha utilizado desde 1939, particularmente a partir de La Atalaya del 1 de Diciembre de ese año.

5         Ver copia de este material en el capítulo 2, página nn.

6         La otra “persona asociada a la Torre del Vigía” mencionada era, en verdad, María Russell, mujer de Russell, como se ve en The Watch Tower del 15 de julio de 1906 (pp 215, 216.)

7         The Watch Tower del 1 de Diciembre de 1916, página 356.

8         Esta voluntad y testamento se presentó íntegramente en el "Apéndice" de Crisis de Conciencia, páginas 408 a 412; en las páginas 59 a 61 de dicha publicación se expone el control total que ejerció sobre la Sociedad Watch Tower

9         The Watch Tower del 15 de Julio de 1906, página 229; ver Crisis de Conciencia, páginas 60, 61

10      Es digno de mención que cuando La Atalaya del 1 de Marzo de 1982 (página 25, párrafo 16) citó este artículo dejó completamente al margen a otros asociados de la Watch Tower como "co-siervos" junto a este "siervo" que es el "único canal". Eso permitió a la revista dar la falsa impresión de que el "esclavo fiel" se había entendido que aplicaba a la revista La Atalaya más bien que a Charles Taze Russell. Ese tipo de escritura solamente puede ser calificada de periodismo deshonesto.

11      The Watch Tower del 1 de Diciembre de 1916, página 356. Ver también en las páginas 60-65 de Crisis de Conciencia fotocopia de documentación sobre las alegaciones de la Sociedad en los años 1920s en cuanto a la condición de Russel como el "esclavo fiel y discreto".

12      Tres meses después, en Diciembre de 1909, en la página 371 de The Watch Tower, advirtió a sus lectores que se estaba llevando a cabo una prueba y que el "astuto adversario" intentaba "predisponerlos contra el auténtico instrumento proporcionado por Dios para mantener los ‘pies’ (extremidades del cuerpo) de Cristo en estos días malos". Eso se estaba llevando a cabo por medio de unos líderes que intentaban suplantar las publicaciones de la Watch Tower por la Biblia y Russell establece que, al obrar así, se estaban esforzando por "interponerse entre el pueblo de Dios y la luz provista divinamente en su Palabra".

13      Compare con Juan 14: 26; 1 Juan 2: 27; 5:20.

14      Ver Crisis de Conciencia páginas 160 a 190.

15      Ver Crisis de Conciencia, páginas 199 a 220.

16      Los Testigos de Jehová en el Propósito Divino, página 98.

17      1 Corintios 3:5-7.

18      La Atalaya del 15 de Diciembre de 1922, página 389.

19      Los Testigos de Jehová en el Propósito divino, página 129.

20      Daniel 8:14; Revelación 4:5; 11: 19; ver también Los Testigos de Jehová en el Propósito Divino, página 129; "Hágase tu voluntad en la Tierra", páginas 227-233; Luz I (1930), páginas 104, 227-229.

21      "Luz" I, páginas 121 y 123.

22      "Luz" I, páginas 108, 110, 118, 122-125, 139, 140; 217, 218; ver también "Entonces queda terminado el Misterio de Dios" (1971), páginas 227-270. 

23      Percy Harding, cuyas experiencias se relatan en capítulo 11 de este libro, fue quien escribió eso.

24      La decisión de la corte estuvo de acuerdo en el reconocimiento de los testigos de Jehová como una religión "establecida", pero decidió en contra de conceder a Walsh el reconocimiento de "ministro ordenado".

25      Una utilización similar de manipulación táctica puede verse en un caso reciente ocurrido en 1986 en Bonham, Tejas. Los ancianos al cargo del Salón del Reino fuero sustituídos de manera arbitraria por la Sociedad Watch Tower y se abrió un caso en cuanto a las competencias sobre el control del salón. La ley reconocía únicamente dos tipos de control eclesiástico, jerárquico y congregacional. Las publicaciones de la Sociedad Watch Tower habían establecido firmemente que su dirección era "no jerarquizada". (Véase por ejemplo, Vida en Libertad de los Hijos de Dios, 1966, página 169, 170; Capacitados para ser Ministros, 1958, páginas 290-292. Con todo, a fin de obtener el control sobre el Salón del Reino de Bonham, se autorizó a los abogados de la Sociedad para presentar el control "jerárquico" en lugar de "congregacional". Don Adams, un vicepresidente de la corporación de Nueva York de la Sociedad, emitió una declaración a tal efecto en la que establecía en el punto 6: "para la toma de decisiones el Cuerpo Gobernante utiliza una organización jerárquica junto a entidades corporativas" (ver apéndice). A continuación él perfila la evidencia de... predominio de la naturaleza jerárquica en el asunto, seguido de los comités de sucursal, superintendentes de zona, superintendentes de distrito, superintendentes de distrito, cuerpos de ancianos, y siervos miniteriales. En este caso, la declaración de la naturaleza jerárquica era contraria a las declaraciones publicadas de la Sociedad. Sin embargo, no era contrario a los hechos. Es evidente la naturaleza jerárquica de la estructura.

26      Ver Crisis de Conciencia, páginas 15, 16, 221, 222.

27      El libro God’s Outlaw, escrito por Brian Edwuards, sobre la traducción de la Biblia de William Tyndale, en la página 7 anota como uno de los tres principales contenciosos de Martín Lutero la consideración "del papado como un cuerpo humano de gobierno, capaz de error y susceptible de ser puesto a prueba por la Escritura".

28      A History of Christianity, Paul Johnson, páginas 59, 60.

29      Mateo 23: 8 NM; TEV.

30      "Los Tratados de Cipriano". Tratado I párrafos 5, 6.

31      Ver capítulo 3, páginas nn, nn .

32      La Atalaya, 15 de Noviembre 1973, página 690.

33      La Atalaya del 15 de Enero de 1955 (página 49) hizo en esencia idéntica alegación al decir: Debido a su enlace inquebrantable con la organización Teocrática Cristiana, la Biblia lleva incrustada en sí la idea de organización y no nos es posible entenderla cabalmente si no tenemos presente la organización teocrática . . . Todas las ovejas de la manada de Dios tienen que tener presente la idea de organización, igual que la Biblia".,

34      A History of Christianity, página 60.

35      Es interesante notar que el artículo de La Atalaya (en la página 26) cita de un libro histórico en el que se establece que, salvo el Concilio de Jerusalén descrito en el capítulo 15 de Hechos, "todos los demás han sido producto de la Iglesia post-apostólica. No pertenecen al período de la fundación de la Iglesia." De nuevo, se hace patente que el escritor no reconoce que eso presenta al concilio de Jerusalén como ocasional, no como formando parte de algún arreglo permanente con sesiones regulares a cargo de algún tipo de "cuerpo gobernante".

36      Faith on the March, página 81.

37      Ver páginas 63-70.

38      De una transcripción literal de sus palabras de esa fecha.

39      Tal vez este artículo fue escrito también por Karl Klein, debido a que el uso de frases como "Sin duda", "No hay duda alguna" son características de su manera de hablar y escribir.

40      Puede notarse que el artículo del 22 de Febrero de la revista Time me cita diciendo: "No hay vida fuera de la organización". Yo hice esa declaración a Ann Constable, reportera de Time, ilustrándole el efecto que la expulsión tiene sobre los testigos de Jehová, la actitud de muchos hacia la expulsión, el sentimiento de que "no hay vida fuera de la organización". Puesto que, cuando apareció el artículo, el contexto daba a entender que esa era mi propia manera de sentir, inmediatamente escribí una carta a los editores en donde decía: "Cuando dije eso, no estaba haciendo una descripción de mis propios sentimientos, sino del punto de vista que prevalece entre la mayoría de los testigos y que está implícito en las enseñanzas de la organización. Lo que yo entiendo que dice la Escritura es que únicamente el Hijo de Dios es ‘el camino, la verdad y la vida’". El contenido de esa carta fue publicado en la sección "Cartas al editor" de un número posterior de Time. Ver Apéndice.

41      Recuerdo a mi tío, Fred Franz, siendo ya vicepresidente de la Watch Tower, remarcándome que si su bautismo se había llevado a cabo por inmersión en la iglesia Presbiteriana (en lugar de por aspersión) habría de ser considerado válido.

42      La Atalaya, 1 de Agosto de 1957 página 479.

43      La Atalaya, 15 de Noviembre de 1955, página 699.

44      Como he señalado, este punto era incluido en los bosquejos proporcionados por la Watch Tower a quienes pronunciaban el discurso de bautismo.

45      The Watch Tower, 1 de Octubre de 1942, página 302.

46      Hechos 2: 38 NEB; 1 Pedro 3:1, 22.

47      La Atalaya del 15 de Noviembre de 1956, página 693.

48      Hechos 16:31-33; compare también con Hechos 2:36; 8:5, 12, 27-38; 9:1-20; 10: 34-48; 11:16, 17; 18:8; 19: 3-5.

49      Romanos 6:3; Gálatas 3: 27.

50      Mateo 28:19, NEB.

51      Las razones por las que muchos no desean llevar a cabo el desasociarse formalmente se consideran en los capítulos 10, 11 y 17 de este libro.

52      2 Corintios 1: 24

53      Compare con Proverbios 16:32; 2 Timoteo 2:24, 25; Santiago 3:13-18; 1 Pedro 1:5-7.