Biografia Poesia

Paul Verlaine (1844-1896)

Poeta francês. Simbolista, seu lirismo musical abriu novos caminhos para a poesia na França.

O lirismo musical e evanescente de Verlaine exerceu influência decisiva no desenvolvimento do simbolismo e abriu novos caminhos para a poesia francesa. Com Mallarmé e Baudelaire, Verlaine compõe o grupo dos chamados poetas decadentes.
Paul-Marie Verlaine nasceu em Metz, França, em 30 de março de 1844. Filho de um militar abastado, estudou no Liceu Bonaparte -- hoje Condorcet -- de Paris e mais tarde conciliou o trabalho numa companhia de seguros com a vida boêmia nos círculos literários parisienses. Em seus primeiros livros, Poèmes saturniens (1866; Poemas saturninos) e Fêtes galantes (1869; Festas galantes), ouvem-se ecos do romantismo e do parnasianismo.
Em 1872, dois anos após casar-se, Verlaine abandonou mulher e filho e iniciou, com o jovem poeta francês Arthur Rimbaud, uma turbulenta ligação sentimental que os levou a percorrer vários países europeus. O relacionamento teve um final abrupto em Bruxelas, em 10 de julho de 1873, quando Verlaine feriu o amigo com um tiro de revólver e foi condenado a dois anos de prisão. Libertado, Verlaine tentou em vão reconciliar-se com Rimbaud. Viveu no Reino Unido até 1877, quando regressou à França. Datam desses anos dois magníficos livros de poesia, Romances sans paroles (1874; Romances sem palavras) e Sagesse (1880; Sabedoria), este a expressão de sua volta aos ideais de um cristianismo simples e humilde.
Apesar de sua crescente fama e de ser considerado um mestre pelos jovens simbolistas, o fracasso dos esforços que fez para recuperar a esposa e levar uma vida retirada conduziram Verlaine a uma recaída no mundo da boêmia e do alcoolismo que, durante o resto de seus dias, o obrigou a freqüentes hospitalizações.
Os vários livros de poemas que se seguiram apenas ocasionalmente recuperaram a antiga magia, como Amour (1888). Da produção posterior de Verlaine, o que mais se destaca são os textos em prosa, como o ensaio Les Poètes maudits (1884; Os poetas malditos), vital para o reconhecimento público de Rimbaud, Mallarmé e outros autores, e as atormentadas obras autobiográficas Mes hôpitaux (1892; Meus hospitais) e Mes prisons (1893; Minhas prisões). Paul Verlaine morreu em Paris em 8 de janeiro de 1896.

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Em 1863, surgia na Revue du Progrés Moral o primeiro poema de Paul Verlaine (1844-1896). Ele prenunciava uma obra tumultuada, infinitamente bela, que beirava os umbrais da modernidade e transtornou definitivamente o cometa Rimbaud. Por ocasião do centenário de sua morte, presta-se homenagem em toda a França àquele que, maldito entre os malditos, deu novos ritmos à arte poética.

Eu sou o Império no final da decadência / Que vê passarem os grandes Bárbaros brancos...". Extraídos do poema intitulado Langueurs da coletânea Jadis et Naguère (1884), esses versos estranhos – evocando uma história que se pressente ser paralelamente terrível, íntima e pública – contêm por si mesmos a originalidade e a odisséia de um escritor errante que oscila entre a libertinagem e o mais profundo remorso por haver abandonado o domicílio conjugal. Críticos bem intencionados do final do século XIX denominam Verlaine e mais alguns outros, entre os quais destaca-se Arthur Rimbaud, "os poetas malditos". A expressão aliás é de Verlaine, eleito por seus pares em 1894 o "Príncipe dos Poetas", ao final de urna vergonhosa vida de andarilho por Paris, Rethel, Bruxelas e Londres.
Lá em cima, em Ardenne (norte da França), quando chega o final do outono, que os rios se tornam vermelhos como o barro e a floresta fecha-se em seus abismos, pode-se ouvir nas estradas o lamuriar da alma dos malditos. Paul Verlaine passa. Mas ele canta o céu por cima dos telhados. Ele canta sua infância feliz numa chuva de pequenos poemas nostálgicos. Ele nasceu em Metz, no leste da França, no dia 30 de março de 1844, filho de um pai autoritário e unia mãe doente, carola e superprotetora que terá durante toda a vida urna afeição cega por esse filho tão fraco diante da bebida.

No entanto, Verlaine conheceu a felicidade. Próximo a Bouillon, na Bélgica, o pequeno Paul passou felizes verões com sua família paterna, no meio das paisagens das margens do Semois, que alternam lavouras, pastos, matas fechadas e pântanos. Uma região de lobos esguios, murtas negras e azinheiras à qual ele voltará mais tarde com a alma atormentada. Quando, em 1873, esse recém-casado e pai de um filho que acaba abandonando, tomado de fascínio pelo jovem Rimbaud, é procurado pela polícia por haver participado da Comuna de Paris, é para a Ardenne belga que parte em exílio. Ele acredita encontrar aí o prazer de um paraíso perdido.

Primeiros amores, primeiros tormentos

Lá em Ardenne, nas pequenas estradas brancas que atravessam as matas, vem-nos a lembrança do spleen de "Ariettes Oubliés", de "Paysages Belges" e "Aquarelles" publicados em 1874 em "Romances sans Paroles" (Romances sem palavras) e que já prenunciavam os poemas musicais de "La Bonne Chanson" (1870) (A Boa Canção). Qual é realmente o mistério Verlaine? Por que tantos dons poéticos, tanto amor em torno dele e tanta infelicidade para viver? Que desordem é essa, que nostalgia, como vemos na quadra: "Il pleure dans mon coeur / Comme il pleut sur la ville / Quelle est cette langueur / qui pénètre rnon coeur?" (Chora em meu coração / Como chove sobre a cidade / Que langor é esse / que penetra meu coração?).

No mês de agosto de 1862, Verlaine completa os estudos secundários em Paris, onde seus pais se instalaram em 1851. Eles o enviam então para morar com a família materna no norte da França. Que alegria poder mergulhar numa paisagem melancólica que corresponde a seus estados depressivos! A crisálida transforma-se em poeta maldito. Ali, entre os campos de colza e a leitura de Baudelaire, apaixona-se pela prima Elisa Moncomble. Amor impossível que o fará afogar a tristeza à noite em um cabaré.

"Mon Dieu, mon Dieu, la vie est là !"

Em Paris, ele se deixa levar docemente pelas delícias da "fada verde", o absinto. Começa então a estudar direito. Nada lhe interessa. Emprega-se numa companhia de seguros e, em seguida, na Prefeitura de Paris. Aí ele passa sete anos, entediando-se. Nos cafés, esquece a melancolia, escreve versos e freqüenta os parnasianos (1). Em 1866, sua coletânea "Poèmes Saturniens" (Poemas Saturninos), editada graças a Elisa, que a financiou, faz com que seja percebido pela crítica. Em poemas de musicalidade lírica e singular, Verlaine expressa os arrebatamentos e quedas da alma, transpondo seus sentimentos em impressões e sensações através de paisagens nostálgicas e refinadas. Aos implorantes de absoluto como ele, resta o Belo, o Azul dos céus e o pesar pelos amores desvanecidos.
Mas Elisa não o amou. Foi a partir desse primeiro amor não correspondido que se cristalizou sua poesia melancólica e langorosa. Em 11 de agosto de 1870, ao casar-se com Mathilde Mauté de Fleurville - que não tinha mais do que dezesseis anos - ele tenta acomodar-se a uma burguesia "de boa família", "aspirando uma vida simples e tranqüila". Doce ilusão. Em setembro de 1871, o jovem Arthur Rimbaud escreve-lhe de Charlevile. Alguns dias mais tarde, "le voleur de feu aux semelles de vent" chega a Paris a chamado de Verlaine, que se torna seu pai-amante. Em fevereiro de 1872, Mathilde pede a separação. Para acalmar a esposa ultrajada, o poeta afasta Rimbaud, fora de si. Mas em julho acontece a grande escapada: o adolescente foi mais persuasivo. Os dois amantes pegam a estrada para Bruxelas. Mathilde tenta uma reconciliação, mas Rimbaud e Verlaine partem para Londres.

De volta ao continente, Verlaine trabalha em Romances sans Paroles (Romances sem Palavras), enquanto o adolescente publica algumas páginas que revolucionam a literatura moderna: Une Saison en Enfer (Uma temporada no inferno). Sucedem rupturas e reconciliações. Eles formam um par tumultuado. Em Bruxelas, em 1873, Verlaine dá um tiro de pistola em Rimbaud.

Ele é preso, condenado e passará dois anos na prisão. Em 1874, em seu cárcere de Mons, ele compõe poemas místicos, marcas de um sincero arrependimento, que serão publicados em Sagesse (Sabedoria) (1881) e Jadis et Naguère (Outrora e recentemente) (1884), mas também eróticos, como em Parallèlement (1889). Ao sair da prisão em 1875, Verlaine embarca para a Inglaterra, onde será professor durante dois anos. Ele volta lá em 1879, onde vive com seu novo amante Lucien Létinois, um ex-aluno da instituição em que Verlaine ensinou durante dois anos, em Rethel, nas Ardennes. Eles foram expulsos de lá por causa de sua "amizade particular".

Por que não se ouviu em Romances sans Paroles (1874), ou em La Bonne Chanson (A Boa Canção) (1870) inspirada por Mathilde, seu pedido de ajuda, para não ceder ao demônio? A Ardenne generosa ainda o esconderá por algum tempo. Em 1880, em Coulommes, perto de Rethel, o poeta compra uma fazenda para Létinois. Juntos, eles pretendem tornar-se camponeses. E vem mais uma vez o fracasso, a ruptura, o álcool. No ano seguinte, Verlaine volta a viver em Paris com sua mãe, na rua de la Roquette... Findo o tempo dos jovens amantes.

Depois de viver uma existência de pária, povoada de hospitais, prisões, móveis velhos e dramas sórdidos, Verlaine morre em Paris, aos cinqüenta e dois anos, em 8 de janeiro de 1896. Com a pena na mão, ele terá sido a imagem do velho iluminado. Bruscamente, enquanto é consumido por "reumatismo, cirrose, gastrite e icterícia", finalmente lhe chega uma parcela de glória. Em 1895, os jovens poetas reconhecem nele o mestre da arte poética moderna. Ele é então rodeado, solicitado na Bélgica, na Inglaterra e na Holanda. Tarde demais. "Qu’as -tu fait, ô toi que voilà / Pleurant sans cesse / Dis qu’as-tu fait, toi que voilà ? De ta jeunesse?" ( O que você fez, ei, você aí / que chora sem parar, / diga o que fez, você aí / de sua juventude?) (Sagesse).

Yves-Marie Lucot

* São poetas como Mallamé ou Théophile Gauthier que, em reação ao romantismo, perseguem um ideal de perfeição formal e defendem uma concepção da "arte pela arte".

"Música antes de qualquer coisa"

Verlaine renovou a poesia. Embora algumas vezes, por preguiça, tenha comprometido a sua. Ele abrandou as regras da versificação, recorrendo especialmente ao verso ímpar, "mais solúvel no ar", e criou uma poesia moderna pela profundeza canto e seu gosto pela confidência.
Composto em 1874, o poema "Art Poétique" foi considerado um manifesto simbolista quando surgiu dez anos mais tarde na coletânea Jadis et Naguère. Essa peça célebre define admiravelmente a concepção da poesia de Paul Verlaine. Seu primeiro verso é uma profissão de fé: "De Ia musique avant toute chose..."

Génio do sonho e das sutilezas da alma, Verlaine inventou uma poesia fluida e musical graças a um uso sutil do ritmo. Um exemplo: podemos "interpretar" de duas maneiras o ritmo do primeiro verso do soneto "Mon Rêve FamiIíer", "Je fais souvent ce rêve étrange et pénétrant". Se o virmos como um alexandrino (verso de doze sílabas) colocando a cesura na sexta sílaba (entre réve e étrange), o jogo da entonação destaca duas sonoridades diferentes (réve e "trant"). Se for um verso ternário romântico (uma cesura a cada quatro sílabas), é criada então uma assonância, uma cadeia de sons idênticos ("-vent", "-trange", "-trant"), uma ambigüidade rítmica envolvente... que inspirou os compositores Gabriel Fauré, Ravel, Débussy e Stravinski.


Paul Verlaine(1844-1896)

Notas Biográficas:

Poeta francês, nascido em 1844, de vida considerada atribulada e escandalosa, cuja poesia reflete a contradição entre uma conduta deplorável e um ideal quase primitivo de pureza e misticismo. Verlaine nasceu em Metz e fez seus estudos secundários em Paris, entrando depois, como funcionário, para a Prefeitura. Já nessa época, frequentava a boêmia dos cafés parisienses, sendo um funcionário relapso e pouco assíduo. É então que descobre a poesia.

Poèmes Saturniens ("Poemas Saturninos, 1866) é sua primeira coletânea publicada. Verlaine professa de início a impassibilidade parnasiana, mas já seu instinto poético o conduz a dar maior agilidade ao alexandrino, a utilizar os ritmos ímpares a sugerir vagos estados por estrofes vaporosas. Poucas obras na história da poesia francesa são mais sinceras e comoventes.

Inquieto e instável, o poeta conquista por algum tempo o equilíbrio e paz, quando se casa em 1870 com Mathilde Meauté. Porém sucedem-se logo os mal entendidos conjugais e Verlaine retoma seus antigos hábitos boêmios. Liga-se então ao jovem poeta Rimbaud e em sua companhia perambula pela Inglaterra e a Bélgica. Em julho de 1873, em Bruxelas, sob a influência da bebida, atira duas vezes no amigo, e é preso. Durante os dois anos de prisão em Mons vem a saber que a esposa pedira divórcio. Profundamente abalado, Verlaine se converte a fé católica. Testemunhas dessa fase de crise e conversão, são seus dois livros Romances sem palavras de 1874 e Sabedoria de 1881. Também é flagrante a influência do gênio de Rimbaud nos temas e nos ritmos. Foi admirado pelos simbolistas que o endeusaram, embora o próprio poeta se quisesse manter independente de qualquer corrente literária.

No final de sua vida, o poeta se esgota e o homem se degrada. Apesar da celebridade e do respeito da novas gerações que o consagram como o "Príncipe dos Poetas", ele vive miseravelmente perambulando de hospital em hospital e de café em café até sua morte em 1896.

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