Poema 1 Poema 2 Poema 3

tanto tempo

Que não falo convosco,

E todavia passo a vida

A fazê-lo.

Não vos digo o que gostaríeis

De ouvir

Mas não deixo por isso

De sentir-vos e de ver-vos,

De estar presente

Mesmo quando ausente,

E de sofrer por vós

O amanhã.

Sangram-me os lábios

Se da boca me saem

Ríspidas tiradas,

Choram meus olhos,

Secos de lágrimas

Vertidas,

E o peito estala-me

Ferido,

Se tenho de manter-vos

Em sentido,

Alteando a voz desnecessariamente.

E acreditem que fico doente

Por não poder sorrir como queria ...

Mas o tempo não dá tempo

Ao tempo

E vossa amiga sincera

Eu não seria

Se deixasse correr as nossas aulas

Ao sabor da vossa fantasia.

Topo da Página

queria a vossa energia

Beber da vossa alegria

Ter também a vossa idade,

Como é linda a mocidade

Se é verdade o que dizemos

E nesse espelho nos vemos,

Lavados, sem pó de arroz,

Sem máscaras que denigram

A beleza do que temos

Do que somos e trazemos

Nas mãos, na razão, no seio.

Estar aqui no nosso meio

É reviver e torcer

Pelos dias que hão-de vir,

E pedir-vos que amanhã

Continueis a sentir

O pulsar dos corações

E a viver emoções

Que vos mantenham a rir.

E se chorardes um dia

Que seja com alegria,

Que ser capaz de chorar

É ser capaz de pensar,

De sonhar, de reflectir,

De crescer e de sofrer,

De recuar e temer,

De parar e avançar.

Topo da Página

Quando os sinos tocam

A rebate

O povo acorre e grita

Em sobressalto

E Deus espia lá do alto

Num controlo remoto de rebanho

Que agoniza e sofre,

Acreditando que o paraíso

Os espera no além,

E que aqui só estamos de passagem

Partilhando a pastagem colectiva.

Mas tu és diva

Do teu mundo

E única, contemplas

Os corpos que se movem

E agitam,

E impávida, escutas os ais

Destes mortais

Que se iludem numa crença

Que sustenta

As suas mágoas diárias

Que compensa

O pão que não comeram,

Os beijos que não deram,

As flores que não abriram

No jardim do seu imaginário

Ris, sarcástica,

Das penas por que já passaste

Do tempo em que também acreditaste,

Das noites que dormiste a sono solto,

Porque cada dia te trazia a esperança.

Congelaste as lágrimas

Mas não me enganaste

E o cloreto de sódio

Em cada canto dos teus olhos

Denuncia-te,

O mundo dos homens

Ainda te perturba

E a dor dos inocentes

Angustia-te.

Topo da Página

Glória Pereira, Professora da Escola Secundária do Cerco, Março de 2001


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