A PALAVRA Inek le Tajini min a'chauk al'inab.
A palavra, marca da civilização, tem
poderes mágicos. Ela transforma, ela cria, ela destrói. Quando proferida, carregada pelo
hálito quente, ornada pela expressão e pelos gestos, faz marejar os olhos, iluminar os
rostos, gerar a ira, convulsionar as faces, soltar a gargalhada. Ela pode dar asas à
imaginação. Fazer chorar, sorrir, amar, odiar e sonhar sem amarras, mas, também, pode
fazer enlouquecer. Cria vergonha, produz o escárnio e autoriza o
flagelo. Quanto escrita, espreita, pela eternidade,
os seus autores. Mesmo perdida no brônzeo tempo, azinhavrada, ela, nem por isto, perde o
seu poder. Vagando, permanentemente, pelas dobras e esquinas, espera encontrar o
autor-criador para, com seu bafo gélido ou abrasador calor, acusadora, cobrar: porque me
renegaste? Ela é multiforme. Ela pode ser doce ou
ácida. Pode fazer sonhar acordado. Criar o pesadelo. Emocionar e mobilizar. Aterrorizar e
paralisar. Encontros impossíveis realizam-se
através das palavras. Pode conviver a política com a ética, a honra, a moral e a
honestidade? Poderá o impensado existir na concretude da vida e não só neste
infindável mundo das palavras? As possibilidades humanas são infinitas. Li, e recomendo, o excelente livro de
Carlos Cirne-Lima, "Dialética para Principiantes". O brilhante autor, filósofo
e professor da PUC, trata, entre importantes ensinamentos, da Linguagem e da Lógica: o
homem fala por frases que, em nossa língua, se compõem sempre de sujeito e predicado,
afirma. Desenvolve, então, didaticamente, as
relações para raciocinar. Passa pelo silogismo, por exemplo, que estabelece que duas
proposições iniciais com premissas verdadeiras, resulta numa conclusão necessariamente
verdadeira. Trata do Princípio da Não-Contradição,
de Aristóteles, onde um mesmo sujeito não pode ter predicado opostos, ao mesmo tempo e
sob o mesmo aspecto. Se isto ocorrer, um elimina o outro. Na parte referente à Ética,
quando se refere a Kant, Cirne-Lima aponta a limitação da "descida" do
Universal para o Particular. Que é a limitação do Imperativo Categórico através das
Máximas da Razão para realizar-se como decisão dos indivíduos. É Kant quem afirma:
Pretendo que estas questões sejam
referências para a insistente pergunta: a palavra pode ter vida? A palavra política pode
conviver com a ética para Para ele, o Individual e o Particular são
apenas recortes que se faz dentro do Universal. E mais: a Lei é, no Universal Concreto da
Sociedade, o que o Costume era na Família, o que a eticidade da ação boa é no
Indivíduo. O Estado é apenas a outra face, a face universal, da própria Ética. E
conclui:
É justo sublinhar que o excelente livro
não se resume ao que exponho e nem traduzo com precisão as opiniões do autor, a quem
peço, antecipadamente, desculpas. Mesmo correndo este risco, para a finalidade deste
texto considerei importante me socorrer das principais impressões que recolhi deste
ilustre professor. Acho que estas reflexões podem ajudar, mesmo que por
inferência, a elucidar o mundo abstrato das palavras - e o de desejo de alguns - que
teimam em juntar política e ética, política e honestidade, porque elas não encontram
vida no mundo real. Este encontro, nos gestos concretos, é um desafio e um dos dilemas
fundamentais das relações humanas. Porto Alegre, 12 de março de
2002.
* Engenheiro,
Vereador e Líder da Bancada do PT e do Governo na Câmara Municipal de Porto Alegre. Foi
Secretário Municipal de Obras e Viação de Porto Alegre de 1993 a 2000. |