JUST-IN-TIME
A aplicação de algumas técnicas na produção japonesa permitiu reduzir
estoques, em todos os níveis, incrementar a capacidade disponível em grandes
investimentos adicionais, diminuir tempos de fabricação, melhorar a
produtividade e a qualidade dos produtos fabricados, etc. E uma destas técnicas
foi o JIT- Just-In-Time que tem o objetivo de dispor da peça necessária, na
quantidade necessária e no momento necessário, pois para lucrar necessita-se
dispor do inventário para satisfazer as demandas imediatas da linha de produção.
JUST-IN-TIME / KANBAN
Após a “imigração” do CCQ - que ainda permanece - as atenções de muitas
empresas estão voltando-se para um novo pólo aglutinador. O sistema
Just-in-time (no momento certo)/Kanban, aplicável principalmente na produção
em série (automóveis , auto peças, motores, etc.). Se por um lado esse
sistema é muito mais abrangente que o CCQ, pois envolve a produção como um
todo - trabalhadores, gerência e até clientes e fornecedores - , por outro
lado é muito menos conhecido em nosso país.
O JIT, surgiu no Japão nos meados da década de 70, com base na literatura
acerca da Toyota japonesa (empresa que desenvolveu o sistema tal como vem sendo
introduzido no Brasil, o que o leva muitas vezes a ser chamado de “Sistema
Toyota de Produção”).
FUNDAMENTOS E CARACTERÍSTICAS
O sistema Just-in-time/Kanban freqüentemente é associado a uma política de
redução do estoque de matérias-primas através da sua entrega em intervalos e
lotes menores. Na realidade, o sistema é muito mais abrangente do que essa
característica “externa”. Internamente a fábrica, há mudanças do
trabalho e do sistema de informações.
De uma maneira geral, dois são os princípios deste sistema de produtividade,
Just-in-time e controle autônomo dos defeitos. O Kanban propriamente dito é um
sistemas de informações para administrar o Just-in-time.
OBJETIVOS DO JUST-IN-TIME
· Flexibilizar a empresa;
· Produzir somente os produtos necessários;
· Produzir com qualidade requerida;
· Menor “Lead Time” na concepção de novos produtos;
· Menor “Lead Time” na manufatura;
· Melhor atendimento ao cliente;
· Menor perda (maior valor agregado ao produto);
Maior retorno de investimento;
· Reduzir estoques em processo, produtos acabados e eventualmente matérias-primas;
· Reduzir custos de fabricação;
· Gerar espaço de Fábrica;
· Produzir por métodos que permitam o envolvimento das pessoas (moral, satisfação,
desenvolvimento, autocontrole);
· Melhoramento contínuo (Kaizen) da qualidade e produtividade.
Pode-se considerá-lo como uma “filosofia” de produção que emerge num
tempo de crise. Com a crise mundial, a briga pela manutenção (ou ampliação)
de mercados, ganha contornos distintos, onde a diversificação é uma arma para
o atendimento dos consumidores. Portanto, as empresas de produção em massa
devem estar atentas ao mercado, contando para isso com uma estrutura de produção
flexível, com vistas e atender variações da quantidade e responder
rapidamente a pedidos ou mudanças no comportamento do mercado. O Just-in-time não
é uma solução rápida. JIT é um sistema que tanto pode produzir resultados
imediatos, quanto de longo prazo em todos os ambientes.
JIT é um enfoque moderno para a gerência pensar, recuperar e concentrar esforços
na volta dos fundamentos em todas as atividades da empresa.
O JIT não tem um enfoque linear para a solução de problemas; é um enfoque
circular sem local ideal para começar.
Em termos de produção, Just-in-time significa que, na montagem de um produto,
as necessárias submontagens (subconjuntos) precedentes devem chegar na linha no
momento necessário à montagem e na quantidade necessária. Dentro dessa lógica,
procura-se produzir somente o que terá utilização imediata, com lotes tanto
menores quanto possível.
Expandindo o conceito no contexto interempresarial é que se chegou ao “Kanban
externo”, com a matéria-prima também sendo recebida Just-in-time. A idéia,
portanto, é fazer o capital representado pelas matérias-primas e produtos em
processo circular o mais rápido possível.
A Filosofia de atendimento ao mercado dá aos departamentos de vendas o papel de
detonadores do processo produtivo: só é produzido algo se for pedido por
vendas. A idéia de produzir o “empurrar” para os revendedores ficaria, então
, comprometida. Dentro da própria Fábrica, o fluxo deve ser olhado do fim para
o começo: a linha de montagem é que solicita aos departamentos precedentes que
tipo de peça necessita com vistas a atender as vendas . Assim, a usinagem não
“empurra” um lote de peças para a montagem, mas esta vai buscar as peças e
determina a usinagem o que ela tem que fazer.
Quem retira as peças de um posto de trabalho (ou departamento produtivo) é o
operador/departamento subseqüente. Isso ocorre pelo simples fato de o subseqüente
sentir a necessidade das peças. Quem da a ordem de produção a determinado
posto/departamento é o operador subseqüente.
Se este leva dez peças de um posto, este posto deve repor as dez peças ,
produzindo apenas o número de peças que foram retiradas.
A idéia é agir como um supermercado. Se dez pacotes de farinha são vendidos,
devem ser repostos na prateleira mais dez pacotes.
Para implantar um sistema desse tipo alguns pré requisitos são considerados
indispensáveis
PROJETO DE PROCESSOS
Os processos produtivos são projetados de acordo com a tecnologia de grupos,
conhecida também pelos nomes de ilhas de fabricação, sistemacélula ou group
technology. A idéia é reagrupar as máquinas em grupos da matéria-prima
bruta, determinados tipos de peça.
Para isso, as peças são classificadas em famílias a partir de similaridades
geométricas e de seqüência de processamento. Assim, todas as peças cilíndricas
que são cerradas, torneadas, fresadas e retificadas podem ser incluídas em uma
família a ser processada em uma ilha composta por serra, tornos, fresadoras e
retificadoras. Se uma peça não necessita de retifica, também pode ser feita
nesta ilha.
Procura-se com isso ganhar flexibilidade na fabricação e reduzir o estoque em
processo pelo processamento contínuo, linear, sem interrupções, de uma peça.
Uma produção onde as máquinas estejam agrupadas por função ( seção de
tornos, seção de fresas, etc.), há formação de estoque ou esperas entre os
processos. A idéia da tecnologia de grupos é reduzir esse estoque a uma
unidade e fazer a produção em processo fluir como água pela torneira, sem
interrupções.
Nessas condições, de posse da descrição das famílias de peças a administração
determina em que ilha vai ser produzido um tipo específico de peça.
Relativamente a mão-de-obra, procura-se prescindir do especialista, dando vez
ao operário polivalente. A polivalência vai no sentido de os operários
poderem operar mais de um tipo de máquina simultaneamente. As vantagens para a
empresa, aparentemente, são numeradas:
· Podem eliminar estoque e esperas entre processos, à medida que um operário
execute várias operações consecutivas.
· A uma intensificação do trabalho, fazendo com que diminua o número de operários
necessários à produção. Tal intensificação se da pela redução chamado
“tempo ocioso” ou porosidade, que seriam períodos de tempo em que o operário,
por exemplo, aguarda o término da operação de uma máquina.
· Mobilidade da mão-de-obra, que pode, a princípio a ser deslocada através
dos vários processos fabris de acordo com a conveniência da empresa num dado
momento.
· Os operários polivalentes podem ajudar-se mutuamente, pois um conhece o
trabalho do outro.
PADRONIZAÇÃO DAS TAREFAS
Cada operador (ou cada ilha de fabricação) recebe uma folha de operações que
é afixada para todos terem acesso. Ela contém três elementos:
1º - Tempo de ciclo. É o tempo-padrão na linha final de montagem de um dado
produto. Um observador postado no final dessa linha veria os produtos dela saírem
em intervalos iguais ao tempo de ciclo.
2º - Fluxo de Processo (fluxograma). Indica a seqüência de operações, inspeções,
etc.,que o trabalhador deve seguir em cada processo.
3º - Quantidade-padrão (mínima) no processo. Definida de acordo com o tempo
de ciclo. Com referência a esta quantidade, os trabalhadores podem ser
reposicionados de forma que cada processo seja operado por um número mínimo de
trabalhadores.
PRODUÇÃO NIVELADA
É a pedra angular do sistema, podendo ser entendido como um esforço para
minimizar a flutuação da produção na montagem final. Se o operador subseqüente
retira quantidades variáveis de peças, o operador anterior precisa produzir um
excesso a fim de se preparar para os picos. Com isso, há geração de estoque
indesejado, prejudicando o Just-in-time.
Portanto, a montagem final deve ser despachar cada tipo de produto em seu lote mínimo,
recebendo também os processamentos anteriores em seus lotes também mínimos.
Se o plano de produção para um mês prevê 50% de modelos A, 25% de modelos B,
e 25% de modelos C, a produção diária deve também satisfazer as mesmas
proporções. Um observador postado no final da linha de montagem perceberia a
seguinte seqüência de modelos produzidos: A/B/A/C/A/C/A/C...
Este sistema reduz bastante a necessidade de produção para o estoque.
Imaginando um caso extremo, onde o modelo A seria produzido entre Janeiro e
Junho, a demanda dos outros seis meses deveria ser coberta pelos estoques
realizados no primeiro semestre. È reduzindo-se os lotes, a situação fica
menos problemática, até chegar ao ponto da produção nivelada.
O maior problema para a produção nivelada é o tempo de preparação das máquinas
(setup). A duas posturas básicas frente à questão: ou se aumenta o lote,
procurando diluir esse tempo, onde não há produção, numa série grande de peças,
ou se atua no sentido de reduzi-lo. Esta última é a postura adotada no
“sistema japonês”, e vem sendo bastante difundida nas empresas radicais no
Brasil.
Um baixo tempo de preparação possibilita a uma mesma máquina processar
produtos diferentes num curto espaço de tempo, o que aumenta a flexibilidade da
produção.
Kanban: a administração do just in time
Tomado em sua origem, o Kanban pode ser entendido como um sistema de informações
que controla a quantidade de produção em cada processo. O Kanban é um
instrumento (cartão, placa, anel etc.) que, visualmente, indica ao operador o
que fazer, em que quantidade, onde colocar.
Veja-se o seu funcionamento. A montagem final recebe um Kanban (“de
retirada”) que informa o próximo modelo a ser montado e, conseqüentemente, o
que vai ser retirado dos processos anteriores. Um operário do setor de montagem
(“carregador”, “abastecedor” ou alimentador”) vai buscar apenas as peças
necessárias àquela montagem. Ao chegar numa ilha de fabricação, retira as peças
e destaca um Kanban (“ordem de produção”) a elas conectado e coloca-o num
quadro apropriado.
Os operários da ilha são informados sobre o que produzirão por meio destes
kanbans ordens de produção. Após produzirem o que estava indicado, colocam as
peças e o Kanban ordem de produção num estoque (à semelhança de uma
prateleira de supermercado) ao lado da ilha, reiniciando-se o ciclo quando o
“alimentador” da montagem vier pegar mais peças.
Portanto, quem detona as ordens de produção na fábrica como um todo é a
montagem final. Com o Kanban administrando pequenos lotes, consegue-se um ajuste
fino na produção, que aceita sem prévio aviso uma variação diária de 10 a
15 % nas quantidades dos diversos produtos.
Controle autônomo dos defeitos
Para o Just-in-time funcionar, os lotes de produção ficam bastante reduzidos.
As peças enviadas para a frente não podem apresentar defeitos e seu fluxo deve
ser rítmico, sem interrupções, pois como não há estoque alto, corre-se o
risco de a linha ficar sem alimentação. O que importa, então, é a prevenção
da produção defeituosa. Isso tanto acontece a nível de máquina como a nível
de trabalhadores.
A nível de máquina seria o cheque autônomo de algo anormal num processo. Uma
máquina autônoma é aquela que pára sozinha quando apresenta defeito ou
quebra.
Expande-se a idéia de controle autônomo dos defeitos para o trabalho manual.
Um operário pode parar a linha de montagem se algo anormal acontecer.
Sustentando esta idéia está o fato de que, acontecendo algum problema, ele
deve ser imediatamente sanado. Se uma peça está fora de medida, é preferível
gastar um tempo para localizar o defeito, a continuar produzindo peças imprestáveis,
e quanto mais cedo se percebe o defeito, mais cedo é corrigido e menos peças são
“mortas”.
O controle autônomo dos defeitos e o Just-in-time materializado pelo sistema
Kanban são praticamente inseparáveis. Ao reduzir os lotes em processo, a
qualidade de conformação da fábrica fica mais exposta torna-se mais difícil
esconder peças inadequadas e chega-se mais facilmente à origem dos problemas.
Quem produz é responsável por aquilo que faz, sendo que quanto menos pessoal não
ligado diretamente à produção, à atividade de transformação, melhor.
Assim, agregam-se à tarefa dos operários certos tipos de inspeção.
O fato de os operários da produção assumirem tarefas do controle de qualidade
liga-se à idéia de que os que produzem é que fazem a qualidade e também à
constatação de que os trabalhadores do controle de qualidade não agregam
valor ao produto. Procura-se então, reduzir a um mínimo o número de pessoal não-produtivo.
Just-in-time, Kanban e Automação
Conforme visto acima, o Kanban seria um sistema de informações para viabilizar
o just in time, que por sua vez é um dos componentes de um sistema de produção
mais amplo.
Todavia, deve-se ressaltar que Kanban está praticamente consagrado com o nome
que se dá ao sistema de produção como um todo, apesar de, originalmente, isso
não estar correto.
Outro aspecto a ser ressaltado diz respeito às particularidades que podem
apresentar as diversas empresas em função dos meios empregados. Assim, uma indústria
de porte, ao introduzir sistemas automatizados de controle e emissão de ordem
de produção, pode conseguir o just in time sem a utilização tradicional do
sistema Kanban de informações.
Numa empresa automobilística do ABC paulista, as ordens de produção são
emitidas via computador e chegam a determinados pontos de trabalho através de
impressoras na produção.Quando uma ordem é emitida- produção do carro A,
com relógio, rádio FM, rodas especiais, bancos marrons -, uma impressora no início
da linha de montagem de painéis recebe um papelete que, destacado, é anexado
ao painel e todos vão montando segundo as instruções. O mesmo acontece na
montagem dos pneus, bancos, motor, transmissão etc.
Ao chegar na linha final de montagem, o carro terá afixado à sua carroçaria o
mesmo papelete e, sincronizadamente, chegarão as rodas, o painel e os bancos
requisitados, tudo just in time.
Ou seja, uma produção no9 momento certo (just in time), com todas as características
descritas (flexibilidade, ausência de estoques, redução do nível do refugo
etc.), pode ser obtida com ou sem auxílio de sistemas de automação microeletrônica.
O caso que será analisado a seguir é ilustrativo de uma produção just in
time sem nenhum equipamento da “nova automação”.
Pretende-se ressaltar, contudo, que a reorganização produtiva para alcançar
tal tipo de produção é meio caminho andado (ou até mais) para a automação
das operações fabris. Se se ohar os sistemas automáticos hoje existentes, com
uma linha de prensas alimentadas por ventosas, transportadores de linha de produção,
centros de usinagem, produção em fluxo, percebe-se que eles trabalham
internamente sem estoque intermediário. As próprias linhas de montagem também
seguem este princípio, pois os produtos são montados um a um, sem estoques
entre as diversas operações.
Um dos grandes trunfos do sistema just in time/Kanban é a produção sem
estoque em setores outros que não as linhas de montagem, e para isso conta com
o apoio decisivo da tecnologia de grupos (linhas de fabricação). Toda a
reorganização administrativa/produtiva que ocorre para a transformação de um
arranjo físico funcional (seções de tornos, seções de fresas etc.) em
linhas de fabricação é um pré-requisito indispensável à automação. A
classificação das famílias de peças e a definição da constituição das
diversas ilhas não exigem robôs, máquinas de comando numérico ou sistemas
integrados. Porém, feita a reorganização, basta trocar as máquinas, pois o
alicerce já está preparado para agüentar o prédio.
È preciso também definir de que automação se está falando. Não é a
simples troca de um torno universal convencional por um torno a comando numérico.
Fala-se de sistemas integrados flexíveis, adjetivados por “fábrica integrada
por computador”, “fábrica automatizada (automated factory)” etc. Não
basta uma empresa ter uma estrutura tradicional de produção, com seções de
tornos, seções de fresas etc., pois mesmo que as máquinas sejam de comando
numérico, não está garantida a integração automática do fluxo produtivo.
É nesse sentido que, pelas suas características, uma ilha de fabricação,
composta por máquinas de comando numérico integradas por um computador e com
alimentação automática, é um passo para a integração.
Nakane e Hall consideram que um dos pontos-chave para a produção sem estoques
(just in time) é os administradores “adotarem uma visão do futuro que inclui
a automação de toda a companhia”,bem como o desenvolvimento de sistemas de
produção integrados, pois “muitas companhias americanas dispõem de bits e
peças de sistemas computadorizados para projetos realizados com a ajuda de
computadores, acompanhamento computadorizado, planejamento das necessidades de
materiais, robotização e controle de estoques. Sem uma direção clara, estes
sistemas podem tornar-se empecilhos ao progresso, como, por exemplo, quando a
utilização de um programa de estoque não deixa perceber que é possível
prescindir do estoque do almoxarifado”. Não seria a produção just in time
uma das direções claras reclamadas pelos autores acima?
Estudo de caso: o sistema P-Zero sw uma fábrica de motores
A empresa estudada é considerada a pioneira na implantação do sistema just in
time/Kanban no Brasil. É filial de uma matriz japonesa, instalada desde a década
de 50. Fabrica motores diesel de pequena potência, motores marítimos e
microtratores.
A implantação do sistema P-Zero de produção, baseado nos princípios do just
in time/Kanban, ocorreu por ordem expressa do presidente da matriz, quando de
sua visita ao Brasil em l976. Em abril de 1977 teve início a implantação, sem
que houvesse aquisição de equipamento, que é em boa parte japonês, da época
de constituição da empresa.
Numa segunda-feira, quando os trabalhadores entraram na fábrica, tudo estava
mudado. O estoque intermediário, que chegava a quatro meses, foi
“escondido” por uma equipe no fim de semana. Isto, aliado às novas exigências
sobre os trabalhadores, gerou uma série de problemas.
A taxa histórica de defeitos elevou-se de 0,6% para 9% após três meses;
muitos trabalhadores que antes operavam uma só máquina dirigiram-se ao setor
de relações industriais (RI) pleiteando um salário tantas vezes maior quanto
o número de máquinas que seriam obrigados a tocar dali para a frente. Muitos
abandonaram a empresa.
Após cinco meses, a situação foi “normalizada” e a resistência dos operários
foi quebrada pela sua substituição, declarada fácil, pois o novo sistema de
produção quase não exige trabalhadores especializados. Em março de 1980, o
sistema como um todo foi considerado implantado, atingindo um desempenho-padrão
daí por diante.
No início da implantação não havia programa de CCQ na empresa. Algum tempo
depois foi implantado, e procurou-se fazer com que os círculos efetuassem
trabalhos para ajustar pequenos problemas do sistema P-Zero.
Reflexos do P-Zero para a empresa
Ao lado de uma redução global de custos, a flexibilidade, ou seja, uma maior
facilidade em termos de tempo e custo para mudar o produto em produção, foi um
dos principais benefícios trazidos pelo P-Zero.
A produção pode agorar aceitar sem prévio aviso uma variação de 15 a 20% na
composição do mix de produtos. Para tanto não é preciso alterar o plano de
produção, o próprio sistema Kanban administra as alterações.
Essa flexibilidade é particularmente importante num momento de retração de
mercado. Quando o marketing identificou-um pouco tardiamente em relação a
outras empresas do subsetor-o mercado ascendente de Serra Pelada , a produção
estava em condições de alterar imediatamente a composição do seu mix de
produtos.
É importante salientar que todo o esforço de racionalização simplificou o
trabalho, rotinizando-o . Nas ilhas de fabricação puderam ser admitidos
trabalhadores sem experiência (ou, em outras palavras, não qualificados)que em
alguns dias já estavam no ritmo exigido , pois o serviço a ser executado nas
ilhas era simples e padronizado. O nível de pessoal pôde , então, ser
rapidamente adequado às flutuações na demanda, uma vez que a demissão /
admissão não encontra maiores obstáculos quer legais , quer legais, quer
organizativos.
Os trabalhadores na produção considerados pela administração como mais
qualificados são os da montagem, pois precisam conhecer todos os produtos,
dispositivos e o funcionamento de outros setores para detectarem os problemas.
A redução de estoque em processo foi brutal – de dois a quatro meses para um
a três dias. Com isso, o giro do capital é bem mais rápido. Uma peça que
começa a ser trabalhada deve sair o mais rapidamente da fábrica. Com estoques
intermediários, o giro torna-se mais lento; demora-se mais para ocorrer o
faturamento sobre o investimento em capital circulante representados pelos
estoques.
conseqüência do sistema foi a economia de espaço. Antes da implantação
estava planejada a ampliação das instalações. O prédio não foi ampliado e
nele hoje sobram áreas livres. O fluxo de informações na produção foi
extremamente simplificado. Não há papéis e a contabilidade do produto em
processo é feita em 15/20 minutos.
O sistema propicia um aprofundamento da racionalização da produção. A redução
do estoque em processo traz à tona gargalos (estrangulamentos) na produção,
processos com problemas, acelerando a percepção dos defeitos, pois nada fica
mascarado pelo estoque. Ou seja, além da redução do capital circulante,
ocorre uma vantagem adicional, pois os problemas ficam mais evidentes, exigindo
pronta solução. A taxa de refugo cai a 0,3%, identificam-se os processos e máquinas
prioritárias para análise do tempo de preparação; há a possibilidade de um
balanceamento mais apurado.
Sendo a coordenação da produção incorporada ao sistema – os trabalhadores,
devido à organização produtiva integrada, são forçados a auto controlarem a
produção e a se controlarem mutuamente –, não chegam à administração
problemas que podem ser efetivamente resolvidos a nível de fábrica. Isso
possibilita empregar o tempo disponível para analisar e racionalizar o processo
produtivo (estudo de tempos e métodos, programação e controle da produção,
redução do tempo de preparação de máquinas, etc.), ao invés de ficar
somente resolvendo probleminhas cotidianos.
O mais significativo é que todo esse esforço racionalizador foi feito sem
investimento em equipamentos. Não há máquinas acopladas a computadores, robôs
ou coisas do gênero. Apenas foram alteradas a organização do processo de
produção e a organização do trabalho.
Reflexos do P-Zero sobre os trabalhadores
Como é comum a todo esforço racionalizador, o sistema P-Zero leva à
intensificação do trabalho. É evidente que, havendo queda de volume de produção
devido à retração do mercado, torna-se mais difícil visualizar esse efeito.
Mas um dos princípios perseguidos na reorganização do trabalho foi eliminar o
tempo dito ocioso (porosidade), o que se configura numa intensificação do
trabalho. A polivalência persegue o mesmo objetivo: flexibilização, isto é,
possibilidade de sempre estar ocupando produtivamente a mão-de-obra.
Outro aspecto a ser considerado diz respeito à forma de realização do
trabalho. O seu conteúdo só foi alterado no sentido de rotinizá-lo e padronizá-lo
– a tecnologia de grupos é uma arma neste sentido. Portanto, qualquer noção
de trabalho menos monótono, participativo, em grupo, não encontra sustentação:
o operário faz durante sua jornada uma seqüência limitada de operações
padronizadas e repetitivas; a polivalência significa a capacidade de alimentar
mais de um tipo de máquina, antes de ser operário especializado em cada uma
delas; o grupismo se refere a um grupo de máquinas e não a um grupo de
trabalhadores.
O fato de o sistema se autocontrolar, isto é, acusar onde e quem apresenta
desempenho fora do padrão, é mais uma forma de pressão. Se o montador tem
autonomia para parar a linha por causa de uma peça defeituosa, isto retorna
como pressão ao(s) operário(s) que a confeccionou. Com relação à
iniciativa, as própria máquinas incorporam dispositivos que as desligam quando
procedimentos não padronizados são verificados. Apesar de não contar com
maquinário eletronicamente controlado, a administração tem um controle muito
estreito da produção e dos trabalhadores. O próprio Just-in-time, aliado ao
sistema de informações e ao “autocontrole”, encarrega-se disto.A participação
dos trabalhadores com sugestões, afora CCQ, é praticamente obrigatória. Todo
o operário possui um quadro de trabalho, onde constam informações sobre sua
tarefa (fluxograma, tempo de ciclo e quantidade do lote). O quadro é datado de
acordo com a última modificação introduzida no processo por sugestão operária.
A data do quadro, então, é um critério de avaliação do funcionário: quanto
mais recente, melhor. A participação com sugestões, assim, não é só
obrigatória, como também determinante da carreira do operário. Recuperando os
acontecimentos da implantação do sistema, observa-se que houve inicialmente
uma resistência à sua introdução, e vários trabalhadores deixaram a
empresa. Quando se instala mais fortemente a crise de emprego no país, a resistência
operária a esses problemas parece amainar. Uma outra empresa, por exemplo, só
conseguiu fazer os trabalhadores operarem três máquinas simultaneamente,
quando do advento da recessão e do aumento do desemprego. A questão que se
coloca, com o aval de um executivo da última empresa, é; estariam os
trabalhadores aceitando este tipo de sistema somente em função da crise no
mercado de trabalho?