CAPÍTULO I

Ernesto chegou em Cidreira à tarde. O sol queimava a extremidade dos pinheiros, que se esparramavam ao lado do asfalto. Dirigia seu velho carro, com o toca-fitas mandando Ramones a todo vapor. No banco traseiro havia uma mochila verde-escuro e uma sacola marrom. Pelo chão, alguns livros e fitas cassetes empoeiradas. Uma garrafa de vidro, sem rótulo, acompanhava o movimento do automóvel em suas curvas e paradas bruscas. A noite não estava muito longe e ele precisava arranjar um canto para escorar seus ossos cansados da viagem. Rodou com seu Chevrolet até ver uma placa que dizia “Quartos a Preços Módicos”. 

Abriu a porta e o cheiro de sal entupiu suas narinas. O homem de trás do balcão alisava a pele de sua face tostada e decadente. Ernesto resolveu que dormiria por ali. Pediu um quarto e o homem lhe deu o número seiscentos e três. Subiu as escadas gritantes enquanto a areia, que se erguia do chão, chegava-lhe à garganta.

O aposento era pequeno e ensolarado. A cortina desbotada tinha desenhos de peixes e cavalos-marinhos. Ao lado da cama havia um criado-mudo, e sobre ele um abajur sem lâmpada. Uma escrivaninha de madeira barata, com a única gaveta aberta, completava o cenário. O banheiro era igual a todos os banheiros do litoral: azulejos de um azul empobrecido, luminária fraca e ducha potente. Ligou o rádio à tomada, sintonizou-o e cerrou a janela, de forma que a luz pudesse transpor algumas frestas. Tirou a roupa enquanto caminhava e abriu o chuveiro. Banhou-se de porta aberta. Ernesto podia escutar o locutor da rádio dizer que o fim-de-semana seria predominantemente de sol, com alguns períodos encobertos.

Saiu do banheiro ainda molhado e, ao mesmo tempo em que se secava, tirou um livro de sua mochila, jogou-o em cima da cama e curtiu a vista de seu apê. Viu algumas mulheres de biquíni. O vento o abençoou com uma ereção, devidamente saciada.

Eram umas oito horas quando sentiu fome. Vestiu uma bermuda e uma camisa branca, pegou as chaves do carro e desceu as escadas. Não disse nada ao porteiro. Foi caminhando, em direção ao centro, acompanhado do marulho gostoso e calmo de um mar esverdeado. 

De ambos os lados da calçada, podia ver os surfistas tomando Capeta em botecos e apreciando as mulheres. Algumas senhoras faziam compras em lojas de um e noventa e nove, garotinhos rechonchudos esbaldavam-se com sorvetes da Kibon, brigadianos a cavalo conversavam sobre o churrasco do fim-de-semana. Ele acendeu um cigarro, tragou e tirou os óculos. Secou o rosto com a camisa. Fazia calor. Ernesto sentiu cheiro de fritura saturada vindo de algum quiosque, e resolveu tomar uma cerveja. Duas, três. Algumas cervejas. Algumas cervejas com pastel de carne.

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João Carlos Dalmagro Júnior.