Contexto   Histórico

 

 

         1. O Brasil e do Rio Grande do Sul até o Século XIX

           É necessário compreendermos um pouco do contexto histórico, no qual o Brasil e o Estado do Rio Grande do Sul viviam no momento em que nossos familiares emigraram da Itália, quando no Brasil se fazia necessário a substituição do trabalho servil escravocrata pelo trabalho livre do imigrante, pois nosso país por quase 300 anos, havia sido implantado um sistema escravocrata apoiado na grande propriedade e na exploração agrícola monocultora, uma exploração pecuarista como o caso do nosso Estado Rio-Grandense.

          Por outro, lado havia o interesse da Inglaterra de que se abrissem novos mercados consumidores aos seus produtos industrializados no Brasil e para tanto iniciava uma campanha de libertação do escravo brasileiro, uma caminhada gradativa que iniciou com a lei inglesa Bill Abrdeen, no início dos anos de 1840, a qual determinava o fim do tráfico negreiro para o Brasil, culminando com uma lei brasileira, a Lei Áurea (1888). Libertação dos escravos no Brasil e vinda de imigrantes europeus comporiam um novo segmento social assalariado e consumidores de produtos industrializados vindos da Inglaterra.

         2. Diferenças entre Colonização e Imigração

           É necessário que se façam alguns esclarecimentos sobre erros que costumamos ver na imprensa, até mesmo em publicações de livros e às vezes em programas de televisão. Os dois termos não devem ser confundidos no contexto da História do Brasil e do Rio Grande do Sul, COLONIZAÇÃO e IMIGRAÇÃO.

      2.1 Colonização corresponde ao período histórico colonial brasileiro que vai desde o início dos anos de 1500 até as primeiras décadas dos anos de 1800, quando o Brasil esteve submisso ao processo colonial português, o qual tinha o único objetivo, o de retirar o máximo de riquezas da colônia brasileira, levando-as para Portugal e revendendo-as para outras nações européias, proporcionando altíssimos lucros para a burguesia e o governo português. Foi um processo exploratório e destrutivo de nossa terra, sem se preocupar com as conseqüências negativas. Portanto, foi um processo forçado, obrigatório e sem liberdade de escolha, sob ponto de vista político, econômico, social e cultural.

       2.2 Imigração corresponde ao período histórico do Brasil independente, após a suposta, ou como queiramos, a falsa independência, ocorrida a partir  de 1822. Foi a partir de 1824 que começaram vir para o Rio Grande do Sul os primeiros imigrantes alemães, acentuando-se após 1850 e mais tarde outras correntes imigratórias européias, principalmente italiana a partir de 1875.

          Imigração não é colonização, pois a diferença está  não só na época da vinda dos povos europeus, mas principalmente na maneira, nos objetivos e na mentalidade. Enquanto que a colonização pertence ao período colonial (a dos portugueses e espanhóis) era exploratória, destrutiva, apoiada no trabalho escravo (negro e indígena), com mentalidade escravocrata, sem se preocupar como o processo desenvolvimentista, a imigração foi ao contrário, um processo construtivo e livre, pois o imigrante veio para construir um novo lar, uma nova pátria, com mentalidade liberal, preocupando-se como o desenvolvimento das regiões onde os imigrantes se fixavam.

          Por outro lado, é perfeitamente compreensível o termo “colonização italiana, alemã, polonesa,...”, visto que as famílias dos nossos imigrantes ao chegarem no Rio Grande do Sul, adquiriam um lote de terra, o qual passou a ser denominado de “uma colônia de terra” e  conseqüentemente o termo “colono italiano”, a pessoa que trabalhava numa colônia de terra. Por isso, durante o desenvolvimento de nosso trabalho, sempre que possível usaremos o termo correto: “Núcleo de Imigração de Jaguari...”, porque julgamos ser o termo correto e não “colônia de Jaguari...”, sob o ponto de vista da História Científica e não da História Empírica como alguns fazem.

 

         3. Por que os italianos emigravam?

           Na segunda metade do século XIX, a Europa sofreu profundas transformações econômicas, sociais e políticas, devido a Revolução Industrial, que se expandiu pelos países ocidentais. O clima de transformações que vários países da Europa Ocidental tiveram que enfrentar uma série de problemas tais como: aumento da população, diminuição da oferta de oportunidades de trabalho e principalmente, conflitos sociais, de um lado o capital e de outro o trabalho, o que geraram grandes movimentos do século XIX, culminando com várias Revoluções Sociais, em alguns países, onde a classe operária, sob a ideologia do “Socialismo”, tentava tomar o poder político da classe burguesa, dona do capital.

Na 2ª metade do século XIX, a Itália, encontrava-se dividida em 7 Estados Independentes (pequenos países italianos): Reino Sardo-Piemonte, Ducado de Parma, Ducado de Módena, Ducado de Toscana, Reino Lombado-Veneziano, Estados Pontifícios, Reino das Duas Sicílias.

Por volta de 1850, começou se espalhar pelos Estados Italianos, um grande movimento denominado de “Risorgimento”, o qual visava unir os Estados Italianos para formar uma Itália maior. A partir de 1859, iniciaram-se uma série de conflitos entre vários Estados, especialmente os do Norte que concretizou unificação em 1870.

              Após longas guerras entre os Estados Italianos, com envolvimento de países vizinhos, finalmente foi alcançado o sonho de formar uma só Itália. Mesmo vitorioso, o processo trouxe conseqüências, especialmente nos Estados do Norte, como a destruição material, da economia, pobreza e miséria entre os agricultores, operários e pequenos burgueses, somando-se ainda a perda de muitos filhos nos combates das Guerras pela Unificação.

            A Itália continuava atrasada, um país agrário condenando as massas populares à miséria e fome. Aquela situação de penúria da maioria da população, se constituiu na principal causa da emigração dos italianos para outros países, especialmente os do continente americano. Havia falta de recursos para o desenvolvimento industrial, no momento em que a maioria dos países europeus viviam em plena revolução industrial. A carência de carvão, ferro e petróleo condenaram a Itália às atividades agrícolas. Portanto, a falta de desenvolvimento econômico e o excesso populacional geraram a “emigração por causa da miséria”. É bom lembrar a expressão pronunciada entre os descendentes de imigrantes italianos: “porca la miséria”.

Mapa parcial da Província de Verona

Observe no mapa indicado c/ seta as origens dos Durlo    Roncà"

                                  "Terrossa" 

 

 

 

Monteforte d'Alpone onde se localiza a "Vila e Palácio Durlo"

 

 

4. Problemas enfrentados na Itália

 As dificuldades porque passavam a maioria da população italiana eram gravíssimas como:

    4.1 As terrasA Itália não havia se industrializado e as terras estavam nas mãos de poucos, nobres grandes proprietários ricos e privilegiados. A maioria da população era composta por agricultores que trabalhavam para proprietários, fazendeiros de propriedades rurais correspondendo a 5, 8, 10 hectares.

    4.2 O rigoroso inverno – era comum, principalmente nas regiões montanhosas, para enfrentar os rigores do inverno, com freqüência adotava-se a prática para amenizar o frio, colocavam os animais em galpões e as pessoas se colocavam nesses galpões próximos dos animais para se aquecerem. Nesses locais praticavam várias atividades como fazerem trança de palha de trigo para confeccionarem seus chapéus, costurar  e recuperar roupas novas e usadas, como outras atividades artesanais familiares.

      4.3 Alimentação – havia miséria na Itália unida após várias guerras, expressa em alguns exemplos:

a) O mesmo OSSO circulava por várias famílias para ser fervido a fim de extrair caldo para fazer uma sopa, principal refeição do dia.

b) Quando uma família abatia um porco, deveria comunicar as autoridades policiais por medida de segurança, pois pessoas de diversas famílias se aproximavam do local para ver se ganhassem algumas migalhas de carne e até um toresmo lhe era útil.

c) O QUEIJO que ficava sobre uma mesa, mas que não poderia ser comido, apenas esfregado por pedaços de polenta a ser comida com apenas o sabor do queijo. Logo, o queijo permanecia por muito tempo sobre a mesa criava alguns bichos e de vez em quando saia um do interior do queijo, andava sobre a mesa e esse era catado com um pedaço de polenta para ser comido. O pensamento era que o bicho representava a gordura do queijo, a qual deveria ser aproveitada.

d) O PRESUNTO (ossocolo)  era dependurado com um cordão sobre a mesa das refeições e as famílias se juntavam com um pouco de farinha de milho que cada uma levava, faziam uma polenta e na volta da mesa esfregavam pedaços de polenta para dar o sabor. Como o queijo, o presunto não era comido, servia apenas para dar sabor à polenta.

Para o Brasil, milhares de imigrantes foram atraídos muitas vezes por propaganda enganosa, através de cartazes desenhados que mostravam  a “Terra da Promissão”, “el paese de la cucagnna”, o país da fartura. Eram prometidas terras que poderiam ser reembolsadas no prazo de 5 anos, acompanhados de equipamentos e sementes para iniciar a produção. Esses últimos não cumpridos, pela falta de recursos e pela burocracia do governo provincial gaúcho, uma vez que o governo federal imperial passou essa responsabilidade às Províncias, depois Estados.

 

5. Por que o Brasil e o Rio Grande do Sul queriam os italianos?

O Brasil pretendia ocupar as regiões de baixa densidade demográfica, iniciar uma agricultura familiar apoiada na pequena propriedade, para atender o consumo interno, por fim à prática tradicional da monocultura de exportação, substituir a mão-de-obra escrava pela livre, a fim de atender os interesses do capitalismo e dos mercados consumidores de produtos industrializados.

O Rio Grande do Sul desejava ocupar as terras devolutas no nordeste da Província entre os rios das Antas, Caí e Taquari, na Depressão Central e Sul da Região do Planalto. Introduzir a agricultura, pois até então se dedicava à pecuária latifundiária e escravocrata. Queria criar o minifúndio produtivo (pequena propriedade rural), a policultura (diversificação de produtos), criar ainda uma classe média e sonhar com a possibilidade do desenvolvimento industrial, também estavam nos planos da Província do Rio Grande do Sul.

Foram entregues terras serranas, as piores que restavam da ocupação colonial luso-espanhola, porque os latifundiários pecuaristas gaúchos não queriam dividir suas boas terras com os imigrantes. Imaginemos se nossos antepassados imigrantes tivessem se fixado na depressão central, nas planícies e nos planaltos rio-grandenses, como nosso Estado teria maior progresso.

 

6. A Igreja e o Governo no processo imigratório

Os padres em suas missas estimulavam a emigração em massa das populações miseráveis italianas, para a América do Sul, especialmente para o Sul do Brasil, movidos pelo combustível das falsas promessas das autoridades governamentais brasileiras.

À essas populações pobres italianas, só existiam duas opções: 1ª) ficar na Itália morrer de fome ou roubar; 2ª) emigrar para a América. Por isso, pelo princípio ético cristão, a Igreja optou por defender a emigração para o Brasil, onde se dizia que no nosso país existia uma população predominante de católicos.

As autoridades governamentais da época, viam no processo de imigração uma das grandes soluções sociais e por isso esteve ao lado da Igreja, que era a grande incentivadora às grandes massas pobres para deixarem o país.

Não podemos esquecer que nessa época no Brasil, a Igreja e o Estado (governo), estavam atrelados, ou seja, a Igreja estava submissa à Monarquia de Pedro II, resquício de um governo português, logo a Igreja daqui também participava desse processo.

            Como se faria a transferência das populações italianas pobres e sem recursos?

Um milagre brasileiro que podemos chamar de “propaganda enganosa”. O governo brasileiro vendia na Itália uma falsa imagem do Brasil, para convencer os agricultores italianos a emigrarem para cá. Aqui era a terra dos sonhos, da vida promissora e descrevia o Brasil como “o país das mil maravilhas”, que o governo daria tudo o que eles necessitassem: transporte, alimentação, conforto durante a viagem e quando chegassem daria um lote de terra com 25 hectares, ou seja, 250.000 m2. Para quem era pobre e não tinha nada, ou porque trabalhava na Itália para fazendeiros de 5, 10, 15 hectares, era um verdadeiro “milagre que caia do céu”, como afirmavam os padres italianos em suas missas nas comunidades italianas. “Emigrar para o Brasil era a única oportunidade que Deus lhe dava e não deveria ser desperdiçada”.

Também lhes era prometido que receberiam casa, alimentação, ferramentas e sementes até produzirem a primeira colheita. Por isso, o Brasil enviava para a Itália, Agentes de Imigração para fazerem a propaganda e organizar a vinda das famílias. Os Agentes brasileiros eram bem treinados, convenciam não só os padres, possivelmente os bispos e até o Papa, se fosse necessário. Por isso, em certos casos a decisão de emigrar ficava nas mãos dos padres, que conheciam bem as famílias. Segundo os padres: “roubar não, emigrar sim”. O melhor mesmo era emigrar para o paraíso chamado “Brasil”.

As famílias acreditavam, especialmente os homens convictos sonhavam e faziam planos. Outros, desconfiavam que a oferta era boa demais, que  até os “santos desconfiavam”. Outros resistiam com medo de serem devorados por animais ferozes como serpentes, tigres, onças, enormes jacarés e até pelos índios (bugres). A maioria das mulheres resistiam chamando seus maridos de  fanáticos,  loucos e que era preferível morrer de fome na Itália, do que serem mortos, assados e  comidos pelos índios no Brasil. Mas elas acabavam resignadas e acompanhavam os sonhos dos maridos que viam no Brasil “el paese de la coccagnna”.

É importante lembrar que familiares Durlo, no passado eram detentores de grandes propriedades rurais e cargos importantes no cenário político, especialmente na primeira metade do século XIX. Muitas fotocópias de documentos históricos foi-nos enviado da Itália por Giancarlo Durlo, os quais comprovam posição econômica, social e política. Outros documentos comprovam sua descapitalização, através de vendas mobiliarias, inclusive em idioma alemão, quando a Áustria dominava parte da região norte da Itália. Assim sendo, as guerras externas e internas, as perseguições políticas francesas e austríacas contribuíram para sua decadência . 

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