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REVISTA DE FILOSOFIA E CULTURA

                              
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AQUI TERÁS UM CAMINHO



 
  


A vida passa. Que resta de Bagdad e de Balk?
O choque mais ligeiro é fatal à rosa completamente desabrochada...
Bebe vinho e contempla a lua, evocando
 as civilizações que ela já viu morrer.”
(Omar Kháyyám - Poeta Persa 1040-1124)

 
 
 

Para: Larissa com muitos fandangos

Venho hoje no Dia  Internacional das Mulheres não divinizá-las como jamais fiz, nem estritamente justificar meu apoio à sua emancipação como o faço todos os anos neste dia, sequer acusá-las pelo que não vem fazendo, mas lançar luz para o que é possível a elas fazer a si e à humanidade inteira. E todavia lançarei mão de todos esses recursos antes de assegurar-vos de que aqui terás um caminho, porquanto o caminho é abertura que caiba a todos e sobretudo a todos quantos possam interessar..
 Onde será este “aqui”, figura opaca e só aparentemente distante? Antes de tentarmos ensaiar umas respostas, retornemo-nos a si, pois não mais nos é patente divinizar a mulher. E destaquemos em especial o amor incondicional que ela pode exercer aos filhos. Eis aqui um primeiro motivo, haja vista que o amor exercitado ao homem ser-lhe-á percebido depois como um dos caminhos e não a estrada principal. É lhes digno de repressão o pensar assim, mulheres? Não! Por isso, em primeiro lugar, por outro lado, divinizemo-nas chamando-as MÃE.
 De todo modo, porém, não é o tema da maternidade o tema comemorativo nesse dia que representa a expressão do espírito combativo e o projeto dos dias melhores que certamente hão de nos contemplar e por que as estradas principais todas serão pisadas. Não! Hoje é por bem dia de reavaliarmos nossas forças para transformação do mundo em digno de si. Por isso, em segundo lugar, não a divinizaremos, faremo-nas sobretudo admitir e verem-se como HUMANAS.
 Consentir-se uma divindade é tarefa árdua. Naturalmente aí o amado emancipa o amante. Fácil motivo de se ver porque a extrema maioria das mulheres conhecidas acostumam-se com a ilusão do adepto. Feito deusa, uma mulher aceita a reverência, o incenso e o sacrifício. Alguns homens que verificaram isto explicaram-no pela educação na infância, super proteção dos pais e apoio social na “pureza (sagrada) da  mulher” (refiro-me à virgindade imposta e posteriormente auto-imposta e ainda mais posteriormente suspensa ou por ato de vontade ou por decreto de casamento). Homens inteligentes estes, quiseramos segui-los. Todavia não! Preferimos ouvir o mais profundo da mulher e além, aceitando no momento da juventude da mulher onde as experiências emancipatórias estão ainda aquém da assimilação de si por divindade e além da pureza imposta; este é o momento da emancipação sexual.
 Perguntar-me-iam pelas razões da insistência na sexualização da emancipação. Não deveria responder se de todo eu próprio as soubessem. No entanto, reafirmo algo permanentemente simples: enquanto aguardamos a emancipação dos homens pela das mulheres; vivenciemos todos, homens e mulheres um pouquinho dessa estrada na liberação sexual da mulher.
 Ainda assim, disseram-nos algumas vezes. “já vi mulheres liberadas que eram virgens...” Por obscuro, tive de concordar. Mas jamais ousaríamos deixar de arrematar uma coisa, ainda que desprezássemos como digna de exemplo Joana Dark e suas seguidoras: “- E no entanto, o motor de sua liberdade residiria ali mesmo próximo ao hímen...” E por fim era necessário que insistíssemos nessa visão sexual da liberdade. Não porque fosse a importância da liberdade o fim para o qual os impulsos da fruição, da natureza e da felicidade se guiassem. E sim móvel, desenvolvimento pelo qual se transporta a escolhas dignas de emancipação.
 Dito isso, pareceu-nos não haver discordância quanto a um ponto. A nova mulher e o novo homem se equivalem. O que se exprime daí a pergunta; houve conquistas? Sim, houve conquistas! A equivalência sentimental, visual, psicológica e social ( pensando no trabalho) etc. foram vistas por nós todos entortando nossos narizes. Mas é desta equivalência que gerará a pacificação das divergências para as próximas gerações. Será preciso fé; por que a fé é possível, constituinte sine qua non  da criação. É isso o que considero possível; é possível emancipar-se. Mas o que é emancipar-se? Poderiam me perguntar. Sim, eu respondo , poderemos nos fazer essa pergunta sempre. É filosoficamente impossível dar uma definição definitiva. Haja vista que emancipar-se não constitui-se apenas uma conquista. Emancipar-se , tarefa conjunta da humanidade inteira, refere-se  não apenas a um patamar, a uma elevação a ser conquistada, mas refere-se à renúncia diária dos pensamentos e ações cativos, ainda que sejam atingidas conquistas.
  Modo de ser que se resume minimamente assim:
 “A mulher não é divina, é humana; o que “ela” não fez foi desdivinizar-se humanizando-se; e aqui terás o caminho se construirmos o seu sexo livre.”
 

Renato Araújo
08/03/2003

 
 

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ALUNOS DA TURMA DE 1997 - UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO


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