O VIAJANTE
 
Um homem, tendo que fazer uma longa viagem, se preparou como melhor lhe 
convinha.

Teria um longo caminho pela frente, quase cem anos, e neste tempo, 
enfrentaria muito sol, muita chuva, muito frio, enfim, inúmeros obstáculos.
Achava que nada poderia detê-lo. 

Para a sua caminhada, tomou calçados, roupas, chapéu, enfim, tudo o que 
achava necessário. E tudo era novo.

Pensou em seu destino e em tudo de valor que achava possuir. 

Abriu sua mochila, e nela colocou tudo, calçado, roupa, chapéu, achando 
que se não os usasse no seu dia a dia, ao final, teria tudo ao seu dispor, 
quando quisesse. E novo.

Colocou tudo às costa, e partiu.
Ao longo de sua vida, após varias trilhas, viu-se cansado e não pode mais 
continuar. Estava exausto.

O peso as suas costas, com os seu tesouro, já lhe era insuportável.
Seus pés, rachados e sangrando., seu corpo surrado e frágil, sua cabeça 
ferida e seu pensamento, sem direção.
Olhou para os seus pés e para seu calçado. O sapato continuava novo, e 
seus pés, acabados. Tomou a sua roupa nova e tocou o seu corpo velho e 
dolorido. Levantou o seu chapéu, novo, e tentou colocá-lo em sua cabeça 
inchada.

Faltava muito para chegar ao topo, e tudo que possuía, novo, tal como 
preservou, de nada lhe servia agora. Pensou em abandonar tudo. 

Já havia abandonado no princípio.

Em silêncio, e pela primeira vez, concluiu que se tivesse utilizado o seu 
calçado, ele estaria velho, mas seus pés, dolorido, apenas. Se tivesse se 
vestido, sua roupa estaria rota, mas, seu corpo não estaria cansado e 
sujo. Se tivesse usado o seu chapéu, ele estaria com sua abas caídas, mas 
sua cabeça não estaria por estourar de dor.

Refletiu, e reconheceu que ali estavam os seus verdadeiros amigos. Para 
servi-lo, a todo instante, porém tentando somente preservá-los, não 
permitiu que eles participassem de sua vida.

Lembre-se.

Os seus amigos não querem estar somente em uma mochila, como o calçado, 
a roupa, o chapéu, como um fardo.

Querem é estar contigo, em toda a sua jornada, mesmo que cheguem 
desgastados, sujos, cansados, porém, certos de que, de algum modo, 
aliviaram a sua dor, seu sacrifício e participaram de sua alegria, e 
chegaram ao fim.
Todos.
Juntos.


Alfredo Lyrio do Valle Neto
Enviado pelo autor 


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