SENHOR PALHA
 
"Era uma vez, há muitos e muitos anos atrás, é claro, porque as melhores 
histórias sempre se passam há muitos e muitos anos, um homem chamado 
Senhor Palha.

Ele não tinha casa, nem mulher, nem filhos. Para dizer a verdade, só 
tinha a roupa do corpo, pois o Senhor Palha não tinha sorte.

Era tão pobre que mal tinha o que comer e era magrinho como um fiapo de 
palha.

Por isso é que as pessoas o chamavam de Senhor Palha.

Todo dia o Senhor Palha ia ao templo pedir à Deusa da Fortuna para 
melhorar sua sorte, e nada acontecia. Até que um dia, ele ouviu uma voz 
sussurrar:
- A primeira coisa que você tocar quando sair do templo lhe trará grande 
fortuna.

O Senhor Palha levou um susto. Esfregou os olhos, olhou em volta, mas viu 
que estava bem acordado e o templo estava vazio. Mesmo assim, saiu 
pensando:
-"Eu sonhei ou foi a Deusa da Fortuna que falou comigo?"

Na dúvida, correu para fora do templo, ao encontro da sorte.

Mas na pressa, o pobre Senhor Palha tropeçou nos degraus e foi rolando aos 
trambolhões até o final da escada, onde caiu na terra. Ao se por de pé, 
ajeitou as roupas e percebeu que tinha alguma coisa na mão. Era um fiapo 
de palha.
"Bom", pensou ele, "um fiapo de palha não vale nada, mas, se a Deusa da 
Fortuna quis que eu pegasse, é melhor guardar."

E lá foi ele, segurando o fiapo de palha.

Pouco depois apareceu uma libélula zumbindo em volta da cabeça dele. Tentou 
espantá-la, mas não adiantou. A libélula zumbia loucamente ao redor da 
cabeça dele.
"Muito bem", pensou ele. "Se não quer ir embora, fique comigo."

Apanhou a libélula e amarrou o fiapo de palha no rabinho dela. Ficou 
parecendo uma pequena pipa, e ele continuou descendo a rua com a libélula 
no fiapo.

Logo encontrou uma florista com o filho, a caminho do mercado, onde iam 
vender flores. Vinham de muito longe. O menino estava cansado, suado, e a 
poeira lhe trazia lágrimas aos olhos. Mas quando o menino viu a libélula 
zumbindo amarrada no fiapo de palha, seu rostinho se animou.
- Mãe, me dá uma libélula? - pediu. - Por favor!

"Bom", pensou o Senhor Palha, "a Deusa da Fortuna me disse que o fiapo de 
palha traria sorte. mas esse garotinho está tão cansado, tão suado, que 
pode ficar mais feliz com um presentinho". E deu a libélula no fiapo para 
o garoto.
- É muita bondade sua - disse a florista. - Não tenho nada para lhe dar 
em troca além de uma rosa. Aceita?

O Senhor Palha agradeceu e continuou seu caminho, levando a rosa.

Andou mais um pouco e viu um jovem sentado num toco de árvore, segurando 
a cabeça entre as mãos. Parecia tão infeliz que o Senhor Palha lhe 
perguntou o que havia acontecido.
- Vou pedir minha namorada em casamento hoje à noite - queixou-se o rapaz.
- Mas sou tão pobre que não tenho nada para dar a ela.
- Bom, também sou pobre - disse o Senhor Palha. - Não tenho nada de valor, 
mas se quiser dar a ela esta rosa, é sua.

O rosto do rapaz se abriu num sorriso ao ver esplêndida rosa.
- Fique com essas três laranjas, por favor - disse o jovem. - É só o que 
posso dar em troca.

O Senhor Palha seguiu andando, carregando três suculentas laranjas.
Logo encontrou um mascate, ofegante.
- Estou puxando a carrocinha o dia inteiro e estou com tanta sede que acho 
que vou desmaiar. Preciso de um gole de água.
- Acho que não tem nem um poço por aqui - disse o Senhor Palha. Mas se 
quiser pode chupar estas três laranjas.

O mascate ficou tão grato que pegou um rolo da mais fina seda que havia na 
carroça e deu-o ao Senhor Palha, dizendo:
- O senhor é muito bondoso. Por favor, aceite esta seda em troca.

E o Senhor Palha mais uma vez seguiu pela rua, com o rolo de seda debaixo 
do braço.

Não deu dez passos e viu passar uma princesa numa carruagem. Tinha um olhar 
preocupado, mas sua expressão logo se alegrou ao ver o Senhor Palha.
- Onde arrumou essa seda? - gritou ela. - É justamente o que estou 
procurando. Hoje é aniversário de meu pai e quero dar um quimono real para 
ele.
- Bom, já que é aniversário dele, tenho prazer em lhe dar essa seda - disse 
o Senhor Palha.

A princesa mal podia acreditar em tamanha sorte.
- O senhor é muito generoso - disse sorrindo. - Por favor, aceite esta jóia 
em troca.

A carruagem se afastou, deixando o Senhor Palha segurando a jóia de 
inestimável valor refulgindo à luz do sol.
"Muito bem", pesou ele, "comecei com um fiapo de palha que não valia nada e 
agora tenho uma jóia. Acho que está bom."

Levou a jóia ao mercado, vendeu-a e, com o dinheiro, comprou uma plantação 
de arroz. Trabalhou muito, arou, semeou, colheu, e a cada ano a plantação 
produzia mais arroz. Em pouco tempo, o Senhor Palha ficou rico.

Mas a riqueza não o modificou. Sempre ofereceu arroz aos que tinham fome e 
ajudava a todos que o procuravam. Diziam que sua sorte tinha começado com 
um fiapo de palha, mas quem sabe foi com a generosidade?


Do "Livro das Virtudes - O Compasso Moral" - de William J. Bennett


<< Isto é amar o próximo
Problemas no céu >>