Me aventurando, com mochila às costas, pelas montanhas de Lesoto (um pequeno país ao sul da África), eu carregava comigo alguns alimentos para o caso de não encontrar algo para comer. Eu sempre tinha algumas latas de espaguete, biscoitos, pasta de
amendoim, e geleia.
Eu passava por um mercadinho certo dia e percebi um vidro de geleia de pêssego na prateleira. Eu já tinha visto algumas geleias em algumas lojas, até de morango. Mas de pêssego, a minha favorita, era a primeira vez que eu tinha visto. Agarrei-a,
imediatamente.
Nos dias seguintes, quando eu sentia a necessidade de um pequeno deleite, eu removia a tampa com muito cuidado e colocava um pouco sobre um biscoito. Mmm, delicioso. Eu não dividia com ninguém. Sentava-me em segurança em algum canto e me deliciava.
Um tarde fria e nublada, eu esperava por um ônibus local, tremendo de frio e parecia que o ônibus nunca chegaria.
Começou a cair uma fina chuva e muito rapidamente a garoa se transformou em um aguaceiro. Todos a minha volta procuraram abrigo. Eu, por minha vez, encontrei abrigo sob uma espécie de varanda em um frágil barraco feito de bambu. Eu estava encharcado
e procurei por alguma roupa seca em minha mochila.
Em minha desesperada afobação para evitar um maior desconforto, me esqueci que o frasco de geleia de pêssego estava enterrado em minha roupa. Um arranco forte e minha preciosidade foi ao chão, despedaçando-se.
Fiquei um tempo olhando entristecido para a lama, para aquilo em que se transformou minha geleia, lamentando minha perda. Foi quando observei aproximar-se uma velhinha. Olhou para mim, para a geleia e de volta para mim. Sem hesitar mais, ajoelhou-se
e apanhou o que sobrou do frasco.
Ainda inclinada, meteu dois dedos no frasco, puxou a geleia pra fora e colocou na boca. Com cuidado, como com espinhos de peixes, cuspiu fora os gagos de vidro e chupou seu dedo, e repetiu tudo até extrair a última gota. Estudou bem o frasco quebrado
até ter certeza que não havia mais nada.
Eu peguei minha mochila e, silenciosamente, lhe ofereci minhas latas de espaguete e meus biscoitos. Ela aceitou imediatamente. Entretanto, antes que eu pudesse lhe dar a manteiga de amendoim, ela correu apressada e eu fiquei prestando atenção
enquanto ela se dirigiu até seu faminto neto na entrada do miserável barraco.
Quando o ônibus chegou, enquanto eu corria até ele, olhei para trás e ainda pude ver a criança limpando a boca.
E eu descobri que geleia de pêssego nunca mais teria o mesmo sabor.
Tradução e adaptação de SergioBarros
Sobre texto de Steve Zikman
<< Os dez pontos de Tina
Meu companheiro de viagem >>