Imigração
Italiana
Botequins,
confeitarias e boticas
Passando
o tempo na velha Botucatu
O
final do século XIX, foi também a época das grandes
Confeitarias.
Comer
um doce, um pãozinho ou tomar uma "gazoza" era um
programa familiar que ninguém dispensava...nem mesmo a
juventude. Em Botucatu já haviam começado a aparecer algumas
iniciativas nessa área, quando, em 1897, Francesco Perfetti,
mudando-se
de Sorocaba para cá, abriu a sua Confeitaria Italiana.
Acomodou-se
ao lado da Casa Galucci, de cujo proprietário alugou um espaço.
A
Confeitaria
Italiana estava localizada na rua do Comércio, atual do
Curuzú,
dizia ele "contando o proprietário desta casa, muitos
anos de fabricação de doces, incumbe-se de fornecer qualquer
encomenda...".
A
Confeitaria Italiana era, também, um misto de padaria e
buffet e
transformou-se
num centro de convergência, onde a colonia acostumou a se
encontrar mas, logo abriu-se-lhe um concorrente. Dois
italianos locais associaram-se para fundar uma Confeitaria,
também. Scripilliti e Magnani estabeleceram-se numa casa de
esquina da Marechal Deodoro, antiga Da Cadeia, em plena rua
Riachuelo.
Hoje,
naquele local, está a agência do Banco Banespa/Santander. Na
virada do século, quando Botucatu viu o início da iluminação
a energia elétrica, em 1907, coube a essa Confeitaria
organizar o fornecimento dos doces, em um tablado externo,
armado ao lado do coreto. Bem posicionada a Confeitaria do
Scripilliti,
como ficou conhecida, perdurou por longo tempo, mas
chamava-se, de fato, Confeitaria Central, "a mais bem
montada desta cidade e que melhores acomodações oferece às
exmas famílias".
Ficaram,
por várias razões, sendo o eixo dos passeios da cidade,
particularmente, dos italianos. Em 1921, quando alguns membros
da colonia organizaram o "Circolo", lá estavam os
dois, como "fundatori".
Um
outro estabelecimento que se transformou num centro da colonia
foi
uma das casas comerciais mais antigas da cidade, a Padaria do
Galucci.
Francesco
Paolo Galucci estava estabelecido há longo tempo em Botucatu
e, no final do século passado, diante de uma colonia
conflagrada, parece ter sido uma unanimidade. Permaneceu à
frente da "Crocce di Savoia", como seu presidente,
sempre reeleito, até que, cansado, solicitou que não o
elegessem mais. Galucci tinha a Padaria mas, também, casas de
aluguel. Alugava seus salões laterais para iniciativas da
colonia, conforme já relatamos. Tinha imóveis nas
duas
ruas principais e casas comerciais também: na Riachuelo a
Padaria, onde, no anexo, alugou para a Pharmácia Italiana. E
na
Rua
do Comércio, uma Casa Comercial, onde, também no anexo,
alugou para a Confeitaria Italiana do Perfetti. Muito bem
relacionado esse Galucci. Não fica difícil perceber-se que a
colonia
fazia
ponto por ali, e que seus estabelecimentos agregavam um
contingente
que esvoaçava feito borboletas, procurando-o para resolver
seus problemas e "assuntar" sobre os destinos da
entidade que presidia.
Foi
procurando por ele que apareceu por aqui, naquele final de século,
lá
pelo ano de 1897, um "boticário" italiano. Vindo da
capital, em busca de vender o que conhecia bem, para a
florescente cidade do Oeste, chegou Salvatore Mantelli para
montar uma novíssima "Grande Pharmácia Italiana".
Este estabelecimento, inicialmente na rua do Riachuelo, onde
funcionava "anexa à Padaria do Galucci",
coincidentente dono
da
casa e presidente da Società Italiana, mudou-se depois para a
Curuzú, onde permaneceu longo tempo. Mantelli vendia "águas
mineraes, vinhos, elixires reconstituintes, preparados siphylíticos
e peictoraes de frequentes prescrições médicas"... além
da famosa "limonada purgativa segundo a fórmula".
Funcionando
um bom tempo antes da mais famosa casa do ramo - a Farmácia
Lago -, a Pharmácia Italiana, a exemplo da congênere Lago,
transformou-se noutro dos centros de aglomeração da colonia.
Os boticários sempre fascinaram os botucatuenses. Mudada para
a Curuzú, a Grande Pharmácia Italiana acabou por mudar de mãos,
teve prédio próprio e continuava, nos anos 20, a ser
propriedade dos italianos...da família Maffei.
Mas
os homens da colonia italiana tinham hábitos exclusivos. Atrás
da
antiga matriz, ao lado do cemitério velho, na Avenida Campo
Santo, livre de trânsito por aquela época, viviam os
italianos um jogo quase atávico: o lançamento do queijo, hábito
relatado pelos antigos membros da colonia, que consistia em
utilizar um bem curado
disco
de queijo, que, preso a uma alça, era lançado. Chamado jogo
do queijo, era praticado defronte ao Bar de Giuseppi Bolognini,
outro o riundi, que mantinha um estabelecimento onde se
reuniam pessoas como Francesco Botti, Angelo Raffanelli,
Giulio Tognozzi, Adolpho
Dinucci,
Adolpho Pardini, Alfredo Nardini, Angelo Lovato, entre
outros.
Bolognini Giuseppi, vai surgir em 1921 como vice-presidente do
"Circolo", a entidade concorrente à "Società
di Beneficenza", liderada pelo Bacchi, època em que
acumulava, também, a função de Agente Consular. Com a
demolição da antiga matriz e a abertura
da
Avenida (agora D. Lúcio) o Bar do Bolognini virou central. Na
verdade, o estabelecimento de Giuseppi Bolognini era um armazém
onde se vendia secos e molhados e ferragens, chapéus e
armarinhos.
Ali,
também, funcionava um outro clube da colônia, auto
intitulado Fanfulla Clube, formado pelo mesmo grupo de amigos,
que se reunia para jogar
tresetti, beber um bom vinho e comer muito. Conta o
historiador Sebastião de Almeida Pinto em seu livro No Velho
Botucatu que, ao final dessas festas gastronômicas, se fazia
um rateio para comprar caixões de defunto, sem dúvida, para
a parte
infeliz
da colônia, que viveu no Brasil dias amargos, invariavelmente
não lembrados. E eles existiram.
Falando
desses pontos de
encontro preferidos pelos
italianos, o
cronista
botucatuense, Mario Costa Novo,
hoje residente em Capivari, nos passa interessante episódio
ocorrido nos idos dos anos 30, quando boa parte da
colônia de imigrados da Vila dos
Lavradores
fazia do Bar do Urbas,
funcionando defronte ...s Industrias Lunardi,
um centro desses oriundi:
"O famoso
bar do Urbas tinha uma
boa cancha de "boccia",
uma mesa de bilhar
e uma sala onde os italianos se reuniam para jogar a
"bisca, o truco, o tresetti, o patronesoto, a
escopa e outros jogos trazidos
da pátria. Ali, ombreavam-se nobres e plebeus. Os industriais
Virgínio
e
Mansueto Lunardi, o
comerciante Matheus Giacóia,
o marceneiro
Basílio
Robega e seus filhos Antonio e o Picale, o Ângelo Milanesi, o
Maitan, o Pacheron e
muitos maquinistas da antiga Sorocabana, entre eles
o Alfredo Bueno, o
João Marsal, o Titão e sua
sanfona.
Certa vez o cavaglieri Virginio
Lunardi tinha como parceiro o Maitan
que, distraído, fez
uma jogada errada e a dupla
perdeu. No auge
da discussão o
cavaglieri disse para o Maitan: "farabuto, schifosso!". O
Maitan subiu a serra:
"U sinhore pensa
que,
porque é‚ rico, u sinhore pode
me xingá? E o lorde Virgínio:
"Me
senta, Maitan, siamo nel brasile,
porco cane. Dá as
cartas".
E
assim terminavam as rusgas entre aquela
turma que, já nos
anos 30 e 40, todas as tardes,
se reunia no que hoje denominam de
happy
hour".
Um
mesmo hábito, ou um vício repetido,
era esse tal jogo do queijo. Em memorável série de artigos
pelo antigo Correio da Serra, os professores Agostinho
Minicucci e Vinício Aloisi nos contam dos grupos de italianos
que ficavam a rolar um pesado e redondo queijo pela Avenida
Floriano Peixoto, a
partir da praça Anita Garibaldi
e buscando chegar o mais longe, pela descida,
até a Ponte do Bacchi. Alí, defronte à pensão Franchino e
à indústria Milanesi, buscavam
a
nobre meta, os italianos da pensão e
todos quantos quizessem
participar
das homenagens ao
aniversariante do
dia... o dono da pensão. Era a festa de formaggio,
num núcleo italiano cravado no
centro
mais industrial...e italiano da cidade: a Floriano.
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