Imigração
Italiana
Società:
A
defesa mútua dos
italianos
em Botucatu
Em
todas as cidades do Estado de São Paulo, onde o imigrante
italiano esteve presente, significativamente, foram montadas
sociedades que congregavam a colônia. Eram sociedades de
ajuda mútua, ou culturais, ou esportivas e, até mesmo,
recreativas. Auxiliavam nos contatos com os representantes do
governo Italiano, agregavam a colônia para comemorações cívicas
- a principal delas, a comemoração da Tomada da Porta Pia -,
ministravam aulas na língua pátria, propiciavam escolaridade
para os filhos de imigrantes e administravam os conflitos
dentro da própria comunidade.
Botucatu,
florescente cidade do oeste paulista, àquela época,
fronteira
de expansão das plantações do café, abrigando uma forte
colônia italiana, também viu ser organizada a sua sociedade
de ajuda mútua. Em 1886, um grupo desses italianos constituiu
a
primeira diretoria da "Società Italiana di Beneficenza
Croce di Savoia": presidente Stefanno Ferrari, vice
Emilio Noschese, secretário Guglielmo Acquarone, vice Sisto
Varoli e procuradores Vittorio Arrighi e Raffaele Patta.
No conselho da primeira entidade ainda figuravam
Miccheli Tocci, Giovanni Vignati, Enrico Scarpella, Vincenzo
Dannucci, Luigi Mirabeli, Emidio Varoli e Martino Proenza.
Esta
sociedade conviveu, até o início do século XX, com uma
colônia
explosiva, cheia de divisões e tentativas de montar novas
sociedades. Havia em Botucatu um agente consular designado
pelo governo italiano, surgido da própria comunidade. Era
Alessio Varoli, industrial que se transferira muito cedo de
Tietê para cá, ainda em 1884 ou 85. Alessio fixou-se na Rua
Curuzú, coração dos oriundi já estabelecidos na cidade. De
forte liderança, organizou ali uma das mais famosas Fabrica
de Licores, em torno da qual a vida econômica, de sua família
e de muitos italianos, iria se desenvolver. Diz a tradição
que teria acontecido em sua residência a formação da "Crocce
Di Savoia". Sendo ou não, a verdade é que coube a
Alessio a condição de ser o primeiro agente consular junto
aos italianos de Botucatu e região.
Para
eles, no entanto, a ausência da designação de um funcionário
do Governo Italiano e a Criação da Agência Régia local,
parece ter sido um permanente apelo ao desentendimento. A
presença de um representante oficial, sem dúvida, poderia
ser eficaz na mediação dos conflitos no seio da
comunidade. Essa situação perdurou longo tempo
e somente viria a mudar onze anos depois, quando, em
fevereiro de 1897 o governo italiano, quem sabe impressionado
pelas notícias que chegavam daqui, abre uma representação
sob responsabilidade do Marquez Adolfo Burlamacchi, chegado
para responder pela a função que vinha sendo desempenhada
por Alessio Varoli.
Vindo
a Botucatu para organizar a representação Consular, da qual
seria
seu
agente, a "Régia Agenzia Consolare d'Italia in
Botucatu", o nobre italiano acabou por converter-se num
fator de equilíbrio para a colônia.
Quando
chegou foi recebido festivamente por toda a comunidade da
cidade. Foram preparadas festividades amplas e convidados os
italianos que residiam nas fazendas de café, de toda a região,
inclusive os que trabalhavam e residiam em São Manoel do
Paraiso e Avaré.
O
marquez Burlamacchi instalou sua representação consular na
rua Curuzú, centro
comercial
da época. Procurado por toda a colônia, agraciado por todos
os homens da cidade, logo viu que estava metido num caldeirão.
Em agosto daquele ano, o napolitano Michelli Cioffi,
acompanhado de outros conterrâneos, faz uma nova
tentativa de criar outra entidade representativa dos
italianos locais. Chamaram-na de "Circolo Italiano Uniti
Recreativo Adolpho Burlamacchi", uma homenagem ao Consul
local, o que,
evidente, procuraria neutralizar a reação da outra
e primeira Società. E declara que a nova entidade se
dedicaria a unir italianos
e
brasileiros através de recreações. A iniciativa,
entretanto, não foi bem recebida pela "Croce de Savoia"
e, talvez por prudência, seus idealizadores fizeram-na cair
no esquecimento. Não sem antes engolirem, publicada pela seçcão
Livre do Jornal O Botucatuense, uma fina pilhéria cujo título
era: "Circolo Italiano Semicomico-BURL...ESCO "NOI".
O
Marquez mediava à distância, mas a colônia não ajudava.
Intempestiva, ela vai empurrando com a barriga, mal mantendo o
equilíbrio interno, à custa de eleições contínuas de
alguns nomes, de aceitação unânime. Mas, até estes,
esgotados, não agüentam mais.
Assim, o dono de padaria Francesco Paolo Gallucci não
consegue fugir das constantes indicações para presidir a
"Croce". Em agosto de 98 ele pede, pelos jornais,
que não o indiquem mais, "porque não tem mais
tempo". Dividido entre suas atividades empresariais e a
comunidade que insiste em manter-se animosa, Gallucci sente-se
prejudicado. Quer dedicar-se à empresa familiar, uma belíssima
padaria.
Então,
em 1900, acontece o que se temia. Um rompimento de antigos
fundadores
da "Croce", fissura a elite da comunidade, e resulta
na fundação de uma nova entidade. Nasceu a "Società di
Beneficenza e Mutuo Socorso Pró Pátria", agrupando
nomes como: Alessio Varoli, Salvatore De Vivo, Paolo Pinotti,
Giulio Tognozzi, Angelo Rafanelli, Pietro Delmanto, Virginio
Lunardi, Giuseppe Zani, Giuseppe Farina, Giuseppe Bellesi,
Domenico Puccinelli e Giuseppe Cassetari.
Rivais,
as duas entidades trabalharam separadas por dois anos, até
que em 16 de março de 1902, por iniciativa de seus membros,
celebraram a dissolução das mesmas e fundiram suas
diretorias, para criar, sob acordo, uma nova entidade, que
passou a chamar "Società Italiana di Beneficenza". Não foi fácil. Duas comissões trabalharam nas negociações,
cada qual defendendo sua Società. O comerciante, Francesco
Botti, genro de Alessio Varoli, já estabelecido na Curuzú
com uma Casa Bancária, com certeza mais habilidoso e
declarando-se território neutro, aceitou receber em 14
daquele mês, em sua casa, os representantes das duas
entidades. Logrou êxito.
Deixaram
lavrada uma ata na qual se lê: "In omaggio alla
concordia e alla fratellanza oggi, 16 marzo 1902, si sono
riunite le due società Croce di Savoia e Pró Patria sotto il
titolo di Società Italiana di Beneficenza". E
deliberaram fixar uma placa em mármore...que sumiu. Seu
primeiro presidente foi Alessio Varoli, secretário Giuseppe
Zani, tesoureiro Angelo Rafanelli e como conselheiros Stefanno
Ferrari, Gianuario Cianciarullo e Adelmo Ponchiroli. Foi uma
diretoria de conciliação, sem dúvida. Estavam fora dela
alguns nomes que iriam figurar nos próximos 30 anos, à
frente das várias sociedades, das empresas locais e de ações
de destaque. Mas entregam a nova Sociedade a outros,
reconhecidos por todos, num visível esforço por manter unida
a colônia. Era uma trégua e duraria bastante.
Em
1921 as coisas estavam, novamente, a tal ponto desagregadas
que surge uma nova e, desta vez, poderosa entidade. Agora a
polarização da colônia se dava sobre nomes que hoje ainda são
conhecidos, por serem de uma geração mais recente, que
conduziu a cidade nos meados do século passado.
Em
19 de outubro daquele ano foi fundado o "Circolo Italiani
Uniti di Botucatu" tendo como presidente honorário-perpétuo
o signori Petrarca Bacchi. Juntos estavam: Presidente
professor Vittone, vice Giuseppe
Bolognini, secretário cav.Zannoni, vice Manfredo
Fialdini e tesoureiro Ricardo Zanotto. No Conselho
Deliberativo figuravam Botti, Bolognini, Bresciani, Dromani,
Faconti, Fialdini, Ferrari, Lorenzetto, Losi, Rugna,
Scripilitti, Ciardella, Magnini, Ricci, Leotta, Mori, Zavasque.
O
Circolo e a Società Italiana de Beneficenza conviveram. Em
1937,
quando se comemorava os 50 anos da imigração italiana no
Brasil, a Società era administrada pelo seguinte Conselho:
presidente Cav. Mansueto Lunardi, vice Angelo Milanesi, secretário
Pietro Chiaradia, tesoureiro Pietro Stefanini; fiscais das
contas: Nello Pedretti e Guido Zanotto. Os conselheiros gerais
eram: dr. Michelle Losso, Domenico Marino, Stefanno Fioravanti,
Camillo Mazzoni, Eugênio Milanesi, Romolo Baronti, Angelo
Martin, Giuseppe Potiens e Giuseppe Paolini.
O
Marquez foi embora. Na sua ausência, a agência consular foi
assumida por vários "oriundi". Por volta de 1920 à
frente dela estava Giuseppe Bolognini - comerciante - e,
depois Pietro Stefanini. Este, comerciante e industrial
estabelecido num dos redutos históricos mais italianos da
cidade de Botucatu, esteve no cargo de Agente Consular por
longo tempo - 40 anos, tendo sido agraciado pelo governo
italiano, em 1959,com a comenda "Stela di Solidarietà
Italiana".
Se
o Circolo tinha no homem de Industria Pertrarca Bacchi seu
inspirador, a Società, teve como um de seus presidentes o cav.
Serafino Blasi, outro industrial da colônia oriundi e
continuava, ainda nos anos trinta, a ter na figura de Virginio
Lunardi, também industrial "il suo capo spirituale".
O
Circulo tem uma história que se perdeu no tempo e que, ainda,
está por ser contada. A Società, ao contrário, perdurou.
Construiu sua sede na Rua General Telles,
onde hoje se ergue a agência da Caixa Econômica
Federal, e onde manteve
escola de música, italiano, sede da banda, orquestra, jornal,
além de manter, também,
por muito tempo um Teatro - o Espéria, consumido pelas
chamas na manhã de 21 de setembro de 1951.
Da
Società nasceu a atual representação da cultura e tradições
italianas em Botucatu. Tendo adquirido o prédio do
tradicional Clube 24 de Maio, e reformado seus estatutos em
1974, A Società mudou de nome, passando a se chamar Centro
Cultural Brasil/Italia, tendo, presentemente, como
Correspondente Consular da Italia em Botucatu, o dr. Domingos
Scarpellini, advogado.
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